
POLO ATIVO: IRAN COELHO MENDES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: JOAQUIM COELHO E SILVA JUNIOR - MA14243-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Juíza Federal DAYANA BIÃO DE SOUZA M. MUNIZ
APELAÇÃO CÍVEL (198)1023016-05.2022.4.01.9999
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença em que foi julgado improcedente o seu pedido de concessão do benefício de auxílio-doença, formulado na petição inicial, sob o fundamento de que não foi comprovada a carência legal (fls. 151/153).¹
Em seu recurso (fls. 156/163), a parte alega que se cuida de incapacidade decorrente de acidente de qualquer natureza, situação que dispensa o cumprimento da carência legalmente exigida. Formula os seguintes pedidos: a reforma da sentença para que seja concedido o benefício de aposentadoria por invalidez ou, subsidiariamente, do auxílio-doença, “concedendo-se ainda a antecipação dos efeitos da tutela nos termos requeridos na exordial” (fl. 162).
O INSS não apresentou contrarrazões.
É o relatório
¹ Os números de folhas indicados referem-se à rolagem única, ordem crescente.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Juíza Federal DAYANA BIÃO DE SOUZA M. MUNIZ
VOTO
A apelação interposta pela parte autora preenche os requisitos de admissibilidade e, portanto, merece ser conhecida.
Mérito
A concessão de benefício por incapacidade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei n. 8.213/91, in verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
......
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Dessa forma, os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade são: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de doze contribuições mensais, quando necessário, e 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente e total (aposentadoria por invalidez) ou de forma temporária ou parcial (auxílio-doença).
Impende ter mira, nesse prumo, que a concessão dos benefícios por incapacidade pressupõe a averiguação, por meio de exame médico-pericial, da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado.
O Caso Concreto
A parte autora, nascida em 29/01/1964, última ocupação como abatedor de matadouro, ingressou em Juízo em 06/11/2018, pleiteando a concessão do benefício de auxílio-doença.
Apresentou requerimento administrativo em 04/01/2018, que foi indeferido sob o fundamento de que não foi comprovada a qualidade de segurado (fl. 18).
Bem de ver, em perícia médica realizada em 14 de março de 2018, o INSS, em âmbito administrativo, reconheceu a existência de incapacidade total e temporária, desde 27 de novembro de 2018, em face de fratura da extremidade proximal da tíbia (CID S821), decorrente de acidente de moto, estimando o tempo de cessação do benefício em 30 de agosto de 2018.
Realizada a perícia judicial, em 10/09/2019, constou do laudo respectivo que o autor, com ensino fundamental incompleto, foi acometido de fratura da extremidade distal da tíbia esquerda (CID S.82.3), em razão de acidente sofrido há aproximadamente dois anos.
De acordo com o Perito do Juízo, o autor foi submetido a “tratamento cirúrgico com colocação de placa e parafuso, evoluindo com dor crônica em membro citado associado a restrição do movimento. Ao exame, deambula sem auxílio de órteses, andar claudicante, restrição no movimento de flexão e extensão do joelho e tornozelo esquerdo. Periciado apresenta restrição importante ao trabalho (...)”.
Concluiu-se pela incapacidade parcial e permanente para o trabalho, sem possibilidade de reabilitação (quesito 4, fl. 95). Não foi possível estimar a data de início da incapacidade (fls. 94/96).
Em que pese a informação do Perito do Juízo no sentido de que não é possível indicar a data de início da incapacidade, não há dúvida de que o impedimento remonta à data do acidente (26/11/2017 – fls. 39 e 41), evento causador da fratura óssea e, por conseguinte, da inaptidão apontada, tanto em âmbito judicial, quanto em âmbito administrativo.
O magistrado de 1º grau entendeu que, tendo a incapacidade tido início em novembro de 2017, época em que o autor não havia recolhido mais de doze contribuições, seria indevido o benefício, por não implemento da carência legal.
Do extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS, no que interessa para o caso, verifica-se que o último vínculo de emprego do autor cessou em 19 de outubro de 2015, tendo contraído novo vínculo de emprego, com o Município de Loreto, em 1º de janeiro de 2017, que cessou em 30 de dezembro de 2017.
Considerando as normas do artigo 15 da Lei n. 8.213/1991, vê-se que, a princípio, a qualidade de segurado se estendeu até 15 de dezembro de 2016, abstraídas eventuais hipóteses de prorrogação do período de graça.
O Juízo a quo considerou que houve perda da qualidade da segurado e que, após o reingresso ao RGPS (Regime Geral de Previdência Social), em janeiro de 2017, o autor não teria vertido a quantidade mínima de contribuições para o implemento da carência legal, nas forma reclamada pelos artigos 27 e 27-A da Lei n. 8.213/1991.
Não se pode olvidar, no entanto, que a incapacidade laboral decorreu de acidente de qualquer natureza, caso em que resta dispensado o implemento da carência legal, conforme artigo 26, inciso II da Lei n. 8.213/91.
Assim, presente a qualidade de segurado na data em que restou comprovado o impedimento para o trabalho, não deve subsistir o julgamento de improcedência do pedido por não ter sido comprovada a carência legal, pois não exigida na espécie.
Outrossim, o fato de ter constado no laudo pericial que se cuida de incapacidade parcial não impede a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, ainda mais porque foi reconhecido que não tem a parte autora condições de exercer suas atividades habituais.
De qualquer forma, nos termos dos artigos 371 e 479 do Código de Processo Civil, o juiz não fica adstrito ao laudo pericial havendo outros elementos suficientes para deixar de considerar suas conclusões.
No caso, verifica-se que se cuida de pessoa com 59 anos idade (nascido em 29/01/1964 – fl. 14), ensino fundamental incompleto, acometida de limitações graves e irreversíveis, que impedem o exercício da atividade habitual e das que demandem esforço físico, o que torna a reabilitação, senão impossível, sobremaneira difícil.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o juiz pode afastar-se das conclusões do laudo pericial convencendo-se, pelos demais elementos dos autos, a respeito da incapacidade para o trabalho. Nesse sentido é o seguinte precedente:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL.AFERIÇÃO POR CRITÉRIOS SOCIAIS E CULTURAIS. POSSIBILIDADE. NÃO VINCULAÇÃO AO LAUDO PERICIAL.
1. Esta Corte tem entendimento no sentido de que, para a concessão da aposentadoria por invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela incapacidade laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado. 2. Agravo regimental não provido.(AgRg no AREsp 103.056/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 02/08/2013)
Nesse contexto, apesar da conclusão do laudo pericial no sentido de que a incapacidade é apenas parcial, diante do conjunto probatório, deve-se concluir que o segurado não tem mais condições de exercer atividade laboral e de ser reabilitado, tendo direito à aposentadoria por invalidez.
O benefício deve ter o seu termo inicial fixado na data do requerimento administrativo, ou seja, em 04/01/2018.
Por fim, no tocante à correção monetária e aos juros de mora incidentes sobre as parcelas vencidas, deverão ser aplicados os índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, visto que este se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
Com esses fundamentos, dou provimento à apelação interposta pela parte autora, para condenar o INSS a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por invalidez, desde a data do requerimento administrativo (04/01/2018), bem como a pagar as parcelas vencidas, com correção monetária e juros moratórios nos termos da fundamentação supra.
Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor das parcelas vencidas até a data da prolação do acórdão (Súmula n. 111 do STJ).
Em se tratando de verba de natureza alimentar e porque fortes os elementos evidenciadores da probabilidade do reconhecimento definitivo do direito postulado (CPC/2015, art. 300), concedo a tutela provisória de urgência para que seja implantado o benefício de aposentadoria por invalidez, no prazo de trinta dias, a contar da intimação do presente julgamento.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal DAYANA BIÃO DE SOUZA M. MUNIZ
RELATORA CONVOCADA

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - JUÍZA FEDERAL DAYANA BIÃO DE SOUZA M. MUNIZ
53APELAÇÃO CÍVEL (198)1023016-05.2022.4.01.9999
IRAN COELHO MENDES
Advogado do(a) APELANTE: JOAQUIM COELHO E SILVA JUNIOR - MA14243-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TRABALHADOR URBANO. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. ACIDENTE DE QUALQUER NATUREZA. CARÊNCIA NÃO EXIGIDA. CONDIÇÕES PESSOAIS. BENEFÍCIO CONCEDIDO. SENTENÇA REFORMADA.
1. A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nessa condição.
2. De acordo com o artigo 26, inciso II da Lei n. 8.213/91, independe de carência a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza, tal como o que ocorreu na espécie (acidente de moto, ensejando fratura da tíbia e limitação funcional).
3. Ainda que no laudo pericial tenha se concluído pela incapacidade parcial e permanente, o juiz pode, considerando outros aspectos relevantes, como a idade, instrução, condição socioeconômica, natureza das atividades desenvolvidas, concluir pela concessão de aposentadoria por invalidez. Precedente do Superior Tribunal de Justiça.
4. Estando demonstrado que o autor não tem mais condições de exercer sua atividade habitual (abatedor em matadouro), tem ensino fundamental incompleto, conta atualmente com 59 anos de idade (nascido em 29/01/1964) e com sugestão médico-pericial de impossibilidade de reabilitação profissional, deve-se reconhecer o direito à aposentadoria por invalidez.
5. No tocante à correção monetária e aos juros de mora incidentes sobre as parcelas vencidas, deverão ser aplicados os índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, visto que este se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
6. Apelação da parte autora provida para condenar o INSS a lhe conceder o benefício de aposentadoria por invalidez desde o requerimento administrativo.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação interposta pela parte autora, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal DAYANA BIÃO DE SOUZA M. MUNIZ Relatora Convocada
