
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: HENRIQUE BRAZAO BARRETO SCANTAMBURLO - MT17366/A
POLO PASSIVO:JACIRA PINTO DE SOUZA LIMA e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: HENRIQUE BRAZAO BARRETO SCANTAMBURLO - MT17366/A
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)1021162-73.2022.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de remessa necessária e de apelações interpostas pela parte autora e pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente o pedido inicial de concessão do benefício de aposentadoria rural por idade (fls. 94/97).
Em sua apelação, a parte autora pretende a reforma da "sentença de primeiro grau, fixando a data inicial do benefício no protocolo do requerimento administrativo", bem como para que sejam ajustados "os índices de juros e correção monetária na devida forma, aplicando o disposto no 'manual de cálculos da Justiça Federal'", e para que haja a condenação em honorários de sucumbência de 10% (dez por cento) — (fls. 99/106).
O INSS, por sua vez, em seu recurso, requer basicamente a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido inicial, ao argumento de que, após a cessação do auxílio-doença de que a apelada era beneficiária, não há prova material do retorno à atividade rural (fls. 112/118).
Contrarrazões apresentadas pela parte autora às fls. 123/128.
É o relatório.

VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Da remessa oficial
A sentença proferida na vigência do CPC/2015 — como é o caso dos autos — não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de atingir o limite de mil salários mínimos previsto no art. 496, § 3º, inciso I, do aludido diploma normativo.
Sendo assim, deixo de conhecer da remessa necessária determinada na sentença.
Da aposentadoria rural por idade
A concessão desse benefício exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade a partir de 60 anos, para homem, e de 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Período de carência. Esse requisito legal deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida: “O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Regime de economia familiar. Considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, conforme dispõe o art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, “a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
Início de prova material. Para o reconhecimento do tempo de efetivo exercício da atividade rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (Súmula 149 do STJ), não é necessário que a prova documental alcance todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior àquele a que especificamente se refira, desde que seja contemporânea à época da ocorrência dos fatos a comprovar (TNU, Súmula 34).
Aliando-se a esse aspecto, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol previsto no art. 106 da Lei n. 8.213/91 é meramente exemplificativo (AgRG no REsp 1073730/CE), tornando admissível, portanto, a utilização de outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, com indicação da parte autora, do seu cônjuge ou companheiro, na qualidade de trabalhador rural.
Do caso em exame
A parte autora, nascida em 20/10/1960, implementou o requisito etário em 20/10/2015 (55 anos), tendo formulado o requerimento administrativo do benefício em 11/06/2018.
Para a comprovação da qualidade de segurada e da carência, trouxe aos autos os seguintes documentos: a) Certidão de casamento própria, realizado em 09/1982, sem constar a qualificação dos nubentes (fl. 18); b) Escritura pública de compra e venda de imóvel rural, datada de 12/2002, na qual a Associação dos Pequenos Produtores Rurais da Comunidade de Assarizal, representada pelo cônjuge da parte autora, figura como compradora (fls. 19/30); c) Declarações de exercício de atividade rural emitidas por Sindicado de Trabalhadores Rurais (fls. 31/37); d) Ficha de cadastro no PRONAF, datada de 11/2003 (fl. 38); e) Nota fiscal de produtor, datada de 04/2004, em nome do esposo da autora (fl. 39); f) Carteira de identidade sindical e carteira de beneficiário do INAMPS (fl. 40); e g) Notas fiscais de compras de insumos e ferramentas (fls. 41/44).
Analisando a questão, verifico que, apesar de haver indícios de que o núcleo familiar já foi vinculado à lida rural, os documentos apresentados pela parte autora não representam um início razoável de prova material da condição de segurada especial durante todo o período de carência. Nesse sentido, o INSS apresentou o CNIS da apelante, no qual demonstra que ela foi beneficiária de auxílio-doença entre 28/05/2009 e 30/04/2018 (fl. 71).
Dessa forma, do conjunto probatório, conclui-se que não há informação sobre a manutenção da sua condição de rurícola após a cessação do benefício em abril de 2018, uma vez que, entre a data de entrada do requerimento administrativo pleiteando a aposentadoria rural (11/06/2018) e o término da incapacidade temporária (30/04/2018), houve o intervalo de apenas 42 dias.
Sobre o tema, vale anotar o quanto já decidiu o Supremo Tribunal Federal no RE 1.298.832/RS, com repercussão geral reconhecida: "É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalados com atividade laborativa". (Rel. Ministro Luiz Fux, DJe de 25/02/2021 Tema 1125).
No âmbito desta Corte Regional, merece destaque o julgado:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR URBANO. CÔMPUTO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE COMO PERÍODO DE CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO INTERCALADO COM PERÍODO CONTRIBUTIVO. TEMA 1125 STF. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. O benefício previdenciário de aposentadoria por idade do trabalhador urbano exige o cumprimento do requisito etário, carência mínima exigida e qualidade de segurado. 2. As anotações da Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) constituem, para efeitos previdenciários, prova suficiente do tempo de serviço, gozando de presunção relativa de veracidade, ainda que as anotações não constem do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), conforme Súmula 75 da TNU 3. O entendimento do eg. STJ é no sentido de que somente é possível a consideração dos períodos em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez como carência para a concessão de aposentadoria por idade, se intercalados com períodos contributivos. (Resp 1.422.081 SC Ministro Mauro Campbell Marques - Segunda Turma, julgado em 24/04/2014, DJ-e 02/05/2014) 4. No caso dos autos, a parte autora, embora tenha gozado de benefício por incapacidade do período de 21/02/2019 a 10/11/2022, conforme CNIS, este período não foi intercalado por contribuição. 5. Não atendidos os requisitos necessários para concessão do benefício de aposentadoria por idade, deve ser mantida a sentença nos moldes como prolatada. 6. Manutenção dos honorários advocatícios arbitrados na sentença, acrescidos de 1% (um por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC, cuja exigibilidade encontra-se suspensa por cuidar-se de beneficiário da Justiça Gratuita. 7. Apelação da parte autora a que se nega provimento.
(AC 1012672-28.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 22/05/2024 PAG.)
Assim sendo, torna-se impossível o reconhecimento da qualidade de segurada especial apenas e tão somente com base em prova testemunhal, valendo a transcrição, nesse sentido, do enunciado da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
“A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”.
Devo registrar, ainda, que no julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa” (REsp n. 1.352.721/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe de 28/4/2016).
Nesse contexto, ausente um dos requisitos necessários ao reconhecimento da qualidade de segurada especial, qual seja, o início de prova material da atividade rural exercida, carece a autora de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
Com esses fundamentos, não conheço da remessa oficial e, de ofício, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, declarando prejudicadas as apelações interpostas pelo INSS e pela parte autora.
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada

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APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)1021162-73.2022.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
Advogado do(a) ASSISTENTE: HENRIQUE BRAZAO BARRETO SCANTAMBURLO - MT17366/A
JACIRA PINTO DE SOUZA LIMA e outros
Advogado do(a) APELADO: HENRIQUE BRAZAO BARRETO SCANTAMBURLO - MT17366/A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. CÔMPUTO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE COMO PERÍODO DE CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE QUANDO NÃO INTERCALADO COM PERÍODO CONTRIBUTIVO. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO EFETIVO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. IRRELEVÂNCIA DA PROVA TESTEMUNHAL. PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. EXAME DAS APELAÇÕES PREJUDICADO.
1. A sentença proferida na vigência do CPC/2015 — como é o caso dos autos — não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de atingir o limite de mil salários mínimos previsto no art. 496, § 3º, inciso I, do aludido diploma normativo.
2. São requisitos para a aposentadoria de trabalhador(a) rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91).
3. Decidiu o STF no RE 1.298.832/RS, com repercussão geral reconhecida, fixando a seguinte tese: "É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalados com atividade laborativa". (Rel. Ministro Luiz Fux, DJe de 25/02/2021 Tema 1125).
4. Não tendo sido apresentado, ao menos, um início razoável de prova material suficiente para a comprovação do retorno ao exercício da atividade rural, em regime de economia familiar, resta afastado o direito à aposentadoria rural por idade, porque o exercício do labor campesino não pode ser reconhecido apenas e tão-somente com base em prova testemunhal (Súmula 149 do STJ).
5. No julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa” (REsp n. 1.352.721/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe de 28/4/2016.).
6. Processo julgado extinto, de ofício, sem apreciação do mérito. Exames dos recursos de apelação do INSS e da parte autora prejudicados. Remessa oficial não conhecida.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e, de ofício, extinguir o processo, sem resolução do mérito, declarando prejudicados os exames das apelações interpostas pelo INSS e pela parte autora, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada
