
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:LUZIA MARIA DE JESUS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: LUIZ PAULO NEGRAO GOMES - GO47102-S
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1024141-42.2021.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUZIA MARIA DE JESUS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL ALYSSON MAIA FONTENELE (RELATOR CONVOCADO):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) em face de sentença que deferiu o benefício previdenciário de aposentadoria híbrida desde a data de entrada do requerimento administrativo (18 de dezembro de 2018). Houve antecipação dos efeitos da tutela.
Nas suas razões recursais (ID 153152074, fls. 108 a 111), a autarquia sustenta que a parte autora não faz jus à qualificação como segurada especial no período de carência, que a sentença é nula por falta de fundamentação adequada e que não houve individualização dos períodos de atividade urbana e rural e quais os documentos que foram considerados como início de prova material da condição de segurada especial.
Por fim, requer seja o recurso provido e a sentença reformada, a fim de julgar improcedentes os pedidos da inicial.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 153152074, fls. 121 a 127).
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Alysson Maia Fontenele
Juiz Federal
Relator Convocado

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1024141-42.2021.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUZIA MARIA DE JESUS
VOTO
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL ALYSSON MAIA FONTENELE (RELATOR CONVOCADO):
Inicialmente, assente-se a dispensa de remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp 1.735.097/RS e REsp 1.844.937/PR).
A questão discutida nos autos refere-se ao direito da parte autora na contagem mista da carência (não contributiva rural e contributiva urbana), para fins de aposentadoria por idade híbrida.
Dispõe a Lei nº 8.213/1991 que os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade são os seguintes: a) a idade completa de 55 anos, se mulher, e 60 anos, se homem (art. 48, § 1º); b) a comprovação do exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício (art. 48, § 2º, c/c 143); e (c) a condição de empregado prestador de serviço de natureza rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado (art. 11, I, a), ou de trabalhador autônomo rural (art. 11, V, ‘g’), trabalhador avulso rural (art. 11, VI) ou de segurado especial (art. 11, VII).
A jurisprudência do STJ admite, inclusive, que a comprovação da condição de rurícola seja feita com base em dados do registro civil, como em certidão de casamento ou de nascimento dos filhos e, ainda, em assentos de óbito, no caso de pensão, em suma, por meio de quaisquer documentos que contenham fé pública, o que é extensível, inclusive, ao cônjuge do segurado, sendo certo que o art. 106 da Lei nº 8.213/1991 contém rol meramente exemplificativo, e não taxativo (REsp 1.081.919/PB, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 02/06/2009, DJe 03/08/2009).
A existência de nascimento de filhos em comum do casal é prova da existência de união estável, transmitindo-se, assim, a condição de rurícola do companheiro à companheira (TRF1, AC 0002043-51.2004.4.01.9199, Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, DJ de 29.4.2010).
Assim como a condição de rurícola do companheiro é extensível à companheira. Precedentes desta Corte: AC 2004.01.99.054025-8; AC 2004.01.99.021835-5 e AC 1999.01.00.051827-2.
Com o advento da Lei nº 11.718/2008, a qual acrescentou os §§ 3º e 4º ao art. 48 da Lei nº 8.213/1991, o ordenamento jurídico passou a admitir expressamente a soma do tempo de exercício de labor rural ao período de trabalho urbano, para fins de concessão do benefício da aposentadoria rural por idade aos 60 (sessenta) anos, se mulher, e aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem. Assim, permite-se ao segurado mesclar o período urbano ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício etário híbrido.
Na hipótese, verifica-se que os documentos de identificação existentes nos autos comprovam haver a parte autora, atendido ao requisito etário, da Lei nº 8.213/1991, pois completou 60 anos em 2018, devendo comprovar período de labor em atividade urbana e rural no período de 2003 a 2018.
Para constituir início de prova material de suas alegações, a parte autora anexou nos autos: a) Certidão de Nascimento, datada de 1958, com a qualificação de seu genitor da parte autora como lavrador; b) Certidão de Casamento do filho Fernando Vergílio da Silva, datada de 1996, qualificando a parte autora como lavradora e c) Escritura Pública de Compra e Venda de Imóvel Rural, datada de 10/07/2013, qualificando seu filho e nora como lavradores, sendo nesta propriedade a residência da parte autora que alega laborar em conjunto com seu filho e nora em regime de economia familiar.
Os depoimentos pessoais colhidos no Juízo de primeiro grau, por sua vez, são uníssonos e corroboram as mencionadas condições fáticas (ID 153152075 e 153152078).
Porém, necessárias algumas considerações no caso em concreto. A certidão de nascimento da parte autora em que seu genitor é qualificado como lavrador não tem como ser estendida para a parte autora, uma vez que não houve comprovação de exercício de atividade rural em regime de economia familiar. Não foram apresentadas quaisquer provas de que a parte autora também laborava no campo e nem mesmo se seu pai era segurado especial.
Quanto à certidão de casamento do filho da parte autora, essa é infirmada pelo CNIS que considera que na data do documento a parte autora era empregada urbana, também não podendo ser considerado como início de prova material.
Já a escritura de terras em nome do filho e da nora da parte autora, poderia, em tese, ser a ela estendido como início de prova material, uma vez que o filho e a nora são lavradores, sem anotação no CNIS. Porém, não há elementos nos autos que possam de fato constatar que a parte autora reside e labora com o filho e a nora em regime de economia familiar, uma vez que não há nenhum documento em nome da parte autora nessa localidade.
A comprovação de atividade urbana pela parte autora pode ser constatada no CNIS. O documento demonstra os vínculos nos períodos de 01/03/1993 a 03/12/1997. Conforme demonstrativo de simulação de cálculo do tempo de contribuição, a autora alcança 04 anos e 9 meses e 3 dias de tempo de contribuição.
Compulsando os autos, atesto que não foi produzido início de prova material da condição de segurada especial da parte autora. Nenhum dos documentos acostados nos autos traz informação de trabalho em regime de economia familiar, ou mesmo individual, da parte autora no período de carência.
Observo, portanto, que a prova apresentada não constitui início de prova material suficiente à comprovação da atividade rurícola alegada, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/1991, ainda que corroborada por prova testemunhal.
Nesse contexto, destaco que o STJ fixou, no Tema Repetitivo nº 629, a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial (art. 283 do CPC/1973 e art. 320 do CPC/2015) implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC/1973 e art. 485, IV, do CPC/2015) e a consequente possibilidade de a parte autora intentar novamente a ação (art. 268 do CPC/1973 e art. 486 do CPC/2015), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa.
No caso presente, houve deferimento da tutela antecipada, é, portanto, devida a restituição dos valores porventura recebidos, tendo em vista a conclusão do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça na revisão do Tema Repetitivo 692/STJ, em que restou decidido que: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
Inverto o ônus de sucumbência. Deixo de majorar os honorários advocatícios, em face do entendimento firmado pelo STJ no Tema 1.059 (Resp. n. 1865663/PR), segundo o qual a aplicação da norma inserta no art. 85, §11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal.
Assim, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS e extingo o processo, de ofício, sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade do segurado, nos termos do art. 485, IV, CPC/2015.
É como voto.
ASSINADO DIGITALMENTE
Alysson Maia Fontenele
Juiz Federal
Relator Convocado

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1024141-42.2021.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUZIA MARIA DE JESUS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE MISTA OU HÍBRIDA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO. PROCESSO EXTINTO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. APELAÇÃO DO INSS PARCIAMENTE PROVIDA.
1. O pleito do recorrente consiste na reforma da sentença para julgar improcedente o pedido autoral de aposentadoria por idade híbrida. A autarquia sustenta que a parte autora não preenche o requisito de qualidade de segurada especial.
2. Com o advento da Lei nº 11.718/2008, a qual acrescentou os §§ 3º e 4º ao art. 48 da Lei nº 8.213/1991, o ordenamento jurídico passou a admitir expressamente a soma do tempo de exercício de labor rural ao período de trabalho urbano, para fins de concessão do benefício da aposentadoria rural por idade aos 60 (sessenta) anos, se mulher, e aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem. Assim, permite-se ao segurado mesclar o período urbano ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício etário híbrido.
3. Na hipótese, verifica-se que os documentos de identificação existentes nos autos comprovam haver a parte autora, atendido ao requisito etário, da Lei nº 8.213/1991, pois completou 60 anos em 2018, devendo comprovar período de labor em atividade urbana e rural no período de 2003 a 2018.
4. Para constituir início de prova material de suas alegações, a parte autora anexou nos autos: a) Certidão de Nascimento, datada de 1958, com a qualificação de seu genitor da parte autora como lavrador; b) Certidão de Casamento do filho Fernando Vergílio da Silva, datada de 1996, qualificando a parte autora como lavradora e c) Escritura Pública de Compra e Venda de Imóvel Rural, datada de 10/07/2013, qualificando seu filho e nora como lavradores, sendo nesta propriedade a residência da parte autora que alega laborar em conjunto com seu filho e nora em regime de economia familiar. Os depoimentos pessoais colhidos no Juízo de primeiro grau, por sua vez, são uníssonos e corroboram as mencionadas condições fáticas
5. Porém, necessárias algumas considerações no caso em concreto. A certidão de nascimento da parte autora em que seu genitor é qualificado como lavrador não tem como ser estendida para a parte autora, uma vez que não houve comprovação de exercício de atividade rural em regime de economia familiar. Não foram apresentadas quaisquer provas de que a parte autora também laborava no campo e nem mesmo se seu pai era segurado especial. Quanto à certidão de casamento do filho da parte autora, essa é infirmada pelo CNIS que considera que na data do documento a parte autora era empregada urbana, também não podendo ser considerado como início de prova material. Já a escritura de terras em nome do filho e da nora da parte autora, poderia, em tese, ser a ela estendido como início de prova material, uma vez que o filho e a nora são lavradores, sem anotação no CNIS. Porém, não há elementos nos autos que possam de fato constatar que a parte autora reside e labora com o filho e a nora em regime de economia familiar, uma vez que não há nenhum documento em nome da parte autora nessa localidade.
6. A comprovação de atividade urbana pela parte autora pode ser constatada no CNIS. O documento demonstra os vínculos nos períodos de 01/03/1993 a 03/12/1997. Conforme demonstrativo de simulação de cálculo do tempo de contribuição, a autora alcança 04 anos e 9 meses e 3 dias de tempo de contribuição.
7. Compulsando os autos, atesta-se que não foi produzido início de prova material da condição de segurada especial da parte autora. Nenhum dos documentos acostados nos autos traz informação de trabalho em regime de economia familiar, ou mesmo individual, da parte autora no período de carência. Observa-se, portanto, que a prova apresentada não constitui início de prova material suficiente à comprovação da atividade rurícola alegada, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/1991, ainda que corroborada por prova testemunhal.
8. Nesse contexto, destaca-se que o STJ fixou, no Tema Repetitivo nº 629, a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial (art. 283 do CPC/1973 e art. 320 do CPC/2015) implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC/1973 e art. 485, IV, do CPC/2015) e a consequente possibilidade de a parte autora intentar novamente a ação (art. 268 do CPC/1973 e art. 486 do CPC/2015), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa.
9. No caso presente, houve deferimento da tutela antecipada, é, portanto, devida a restituição dos valores porventura recebidos, tendo em vista a conclusão do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça na revisão do Tema Repetitivo 692/STJ, em que restou decidido que: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
10. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS para EXTINGUIR o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485, IV, do CPC, nos termos do voto do relator.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Alysson Maia Fontenele
Juiz Federal
Relator Convocado
