
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ANTONIA DA SILVA DO ESPIRITO SANTO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WALTER DIEGO DA SILVA PEREIRA DE CAMPOS - GO32025-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1010685-54.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIA DA SILVA DO ESPIRITO SANTO
Advogado do(a) APELADO: WALTER DIEGO DA SILVA PEREIRA DE CAMPOS - GO32025-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença na qual foi julgado procedente o pedido de aposentadoria rural por idade, desde a data do requerimento administrativo.
O recorrente suscita, preliminarmente, a nulidade da sentença, pela ausência de fundamentação. No mérito, sustenta que a parte autora e seu cônjuge têm registro de vínculos urbanos em seu CNIS, além de possuir endereço urbano, o que descaracteriza a condição de segurada especial. Assim, requer a reforma da sentença com a improcedência do pedido inicial. Subsidiariamente, pugna pela observância da prescrição quinquenal; pela fixação da correção monetário pelo INPC e pela alteração da data de início do benefício para a data da sentença.
A parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1010685-54.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIA DA SILVA DO ESPIRITO SANTO
Advogado do(a) APELADO: WALTER DIEGO DA SILVA PEREIRA DE CAMPOS - GO32025-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DA PRELIMINAR
Da nulidade da sentença por ausência de fundamentação
Conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça, [o] órgão julgador não é obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos apresentados pelas partes em defesa da tese que sustentam, devendo apenas enfrentar as questões relevantes e imprescindíveis à resolução da demanda (AgRg no HC n. 705.639/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 22/5/2023, DJe de 26/5/2023).
No caso em análise, o juiz sentenciante enfrentou as questões relevantes e analisou o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício.
Logo, a preliminar não merece acolhimento.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado através do início de prova material, corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Convém registrar, ainda, que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 07/04/1964, preencheu o requisito etário em 07/04/2019 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 15/01/2020, o qual restou indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ajuizou a presente ação em 02/02/2021, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos: CTPS com registro de vínculos rurais: de 30/05/2012 a 29/06/2012 e de 03/06/2019 a 16/11/2019; certidão de casamento, em 1984, constando a profissão do esposo como lavrador.
Da análise dos documentos apresentados, verifica-se que a certidão de casamento, em 1984, constando a profissão do esposo como lavrador (condição extensível à requerente pela regra de experiência comum), e a CTPS com registro de vínculos rurais constituem início de prova material da condição de segurada especial da autora.
No caso, há início de prova material do labor rural no período descontínuo de 1984 a 2013, quando iniciou seu vínculo urbano de longa duração, e a partir de 2019, os quais somados ultrapassam o prazo de 180 meses necessário à concessão do benefício.
Vale ressaltar que o CNIS do seu esposo registra vínculos urbanos que não tiveram longa duração (05/04/1995 a 03/07/1995; 15/03/2011 a 13/05/2011; 09/08/2011 a 22/12/2011; 22/02/2012 a 21/05/2012; 01/06/2012 a 02/07/2012; 02/07/2012 a 10/08/2012), razão pela qual não descaracterizaram a sua condição de segurada especial, diante do conjunto probatório acostado aos autos.
Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida, que confirmou o exercício da atividade rural pela parte autora pelo prazo de carência necessário à concessão do benefício.
As testemunhas, que conhecem a autora há cinco e dez anos, foram firmes em declarar que a requerente sempre trabalhou no meio rural, como diarista, primeiramente com plantação de alho e cebola e depois com maracujá.
Mesmo que a prova testemunhal não tenha se referido especificamente ao período mais antigo (desde 1984), a existência de início de prova material quanto a tal período em conjunto com prova oral de atividade rurícola mais recente autoriza seu reconhecimento. Afinal, diante do longo tempo já transcorrido, a produção de prova oral específica se mostra bastante difícil, devendo incidir o princípio in dubio pro misero.
No tocante à alegação do INSS de que a parte autora possui endereço urbano, registro, por oportuno, o entendimento adotado por este e. Tribunal no sentido de que o fato de a parte autora possuir endereço urbano não descaracteriza a sua qualidade de segurada especial, uma vez que a própria redação do inciso VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91 prevê expressamente que o trabalhador rural pode residir tanto em imóvel rural quanto em aglomerado urbano próximo a área rural. (AC 1000402-69.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 31/03/2023 PAG.)
Assim, tendo em vista que a prova testemunhal colhida nos autos corrobora a pretensão da parte autora e considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurada especial, deve ser mantido o benefício de aposentadoria por idade rural.
Dos pedidos subsidiários
Não há parcelas prescritas, tendo em vista que não transcorreu prazo superior a cinco anos entre o requerimento administrativo e o ajuizamento da ação.
Quanto à data de início do benefício, esta foi corretamente fixada da DER, ocasião em que a parte autora já reunia todos os requisitos para a concessão do benefício pleiteado.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
A sentença deve ser alterada quando à incidência dos encargos moratórios a partir de 8/12/2021, nos termos acima explicitados.
DESPESAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
O INSS é isento de custas na Justiça Federal.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Tendo sido a apelação parcialmente provida sem inversão do resultado, descabe a majoração de honorários advocatícios na fase recursal (Tema 1059/STJ).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS para alterar os encargos moratórios, nos termos acima explicitados.
É o voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1010685-54.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIA DA SILVA DO ESPIRITO SANTO
Advogado do(a) APELADO: WALTER DIEGO DA SILVA PEREIRA DE CAMPOS - GO32025-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. ATIVIDADE RURÍCOLA DESCONTÍNUA. CNIS DO CÔNJUGE COM REGISTROS URBANOS DE CURTA DURAÇÃO. RESIDÊNCIA URBANA. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL. DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO CORRETAMENTE FIXADA NA DER. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA PELO INPC ATÉ 08/12/2021 E, APÓS ESSA DATA, APLICÁVEL SOMENTE A TAXA SELIC. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
- A concessão de aposentadoria por idade rural exige a comprovação da idade mínima (60 anos para homens e 55 anos para mulheres) e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, pelo período de carência correspondente, conforme o art. 48 da Lei nº 8.213/91.
- O início de prova material pode ser constituído por documentos variados, como a certidão de casamento que atesta a profissão do cônjuge como lavrador e registros de vínculos rurais em CTPS.
- A existência de vínculos urbanos do esposo, de curta duração, não descaracteriza a condição de segurada especial da autora, especialmente quando corroborada por prova material e testemunhal suficiente do exercício de atividade rurícola.
- A mera residência em área urbana não afasta a condição de segurada especial, conforme prevê o art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, que admite a residência em imóvel urbano próximo a área rural.
- Correção monetária pelo INPC até 08/12/2021 e, após essa data, aplica-se exclusivamente a taxa SELIC, conforme Emenda Constitucional nº113/2021.
- Apelação parcialmente provida para ajustar os encargos moratórios, mantendo a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Tese de julgamento:
"1. A concessão de aposentadoria rural por idade exige início de prova material corroborada por prova testemunhal.
2. Vínculos urbanos de curta duração não descaracterizam a condição de segurado especial, especialmente quando confirmados por prova suficiente de atividade rural.
3. Correção monetária pelo INPC até 08/12/2021, sendo aplicável a taxa SELIC a partir dessa data."
Legislação relevante citada:
Lei nº 8.213/1991, art. 48, §§ 1º e 2º
Lei nº 8.213/1991, art. 11, VII
Emenda Constitucional nº 113/2021, art. 3º
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp 1.719.021/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 23/11/2018
TRF1, AC 1000402-69.2023.4.01.9999, Rel. Desembargador Federal Pedro Braga Filho, Segunda Turma, j. 31/03/2023
STF, RE 870.947/SE, Rel. Min. Luiz Fux, j. 20/09/2017 (Tema 810)
STJ, REsp 1.495.146/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/02/2018 (Tema 905)
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
