
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:EDINALVA DA CONCEICAO SOUSA PEREIRA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ANDERSON UILIAM LEAO DE JESUS - BA56707-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1023840-27.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDINALVA DA CONCEICAO SOUSA PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: ANDERSON UILIAM LEAO DE JESUS - BA56707-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença na qual foi julgado procedente o pedido de aposentadoria rural por idade, desde a data do requerimento administrativo apresentado em 13/04/2021.
O recorrente alega que a parte autora não comprovou a sua condição de segurado especial. Sustenta que a parte autora recebe pensão por morte em valor acima do salário mínimo desde 31/01/2010. Requer a improcedência do pedido. Subsidiariamente pugna pela: observância da prescrição quinquenal; na hipótese de concessão de aposentadoria, a intimação da parte autora para firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ; declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; desconto dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período e a cobrança de eventuais valores pagos em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada.
A parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1023840-27.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDINALVA DA CONCEICAO SOUSA PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: ANDERSON UILIAM LEAO DE JESUS - BA56707-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado através do início de prova material corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Convém registrar, ainda, que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 12/04/1966, preencheu o requisito etário em 12/04/2021 (5c anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 13/04/2021 e 10/09/2021, os quais restaram indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ajuizou a presente ação em 10/03/2022, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do primeiro requerimento administrativo.
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos: ITR do Sítio Várzea Verde anos 2000 a 2020; certidão eleitoral; caderneta de vacinação; certidão de óbito do esposo (2010) constando residência em Várzea Verde e qualificação profissional como lavrador; certidão de casamento do filho (2014) constando a profissão deste como lavrador; certidões de nascimento das filhas (1995 e 2000), constando a profissão da autora e do seu esposo como lavradores; certidão de casamento da parte autora (1991), constando a profissão do esposo como lavrador; CTPS sem registro de vínculos.
Da análise dos documentos apresentados, vê-se que a certidão de casamento da parte autora (1991), constando a profissão do esposo como lavrador; as certidões de nascimento das filhas (1995 e 2000), constando a profissão da autora e do seu esposo como lavradores; a certidão de óbito do esposo (2010) constando residência em Várzea Verde e qualificação profissional como lavrador; e as declarações de ITR do Sítio Várzea Verde anos 2000 a 2020 constituem início razoável de prova material da sua condição de segurada especial.
A condição de rurícola do esposo estende-se à parte autora, pela regra de experiência comum, desde a data da celebração do casamento em 1991. Ainda, presume-se que a autora permaneceu laborando do campo após o falecimento do esposo em 2010. Tal fato é corroborado pelas declarações de ITR dos anos 2000 a 2020 acostadas aos autos.
Assim, demonstrado que a autora permaneceu desempenhando a lida campesina após o falecimento do esposo, não merece acolhimento a alegação do INSS de que o recebimento de pensão por morte rural acima do valor mínimo afastaria a sua condição de segurada especial. A regra do art. 11, § 9º, inciso I, da Lei n. 8.213/91 deve ser interpretada teleologicamente, de modo a não excluir a condição de segurado especial daquele que recebe pensão por morte rural deixada por cônjuge/companheiro, mesmo que em valor pouco superior ao salário mínimo. Afinal, a obtenção de ganhos superiores ao salário mínimo pelo exercício de atividade rural pelo cônjuge/companheiro não obsta a qualificação do outro como segurado especial. Assim, não pode o óbito de um, ensejando benefício de pensão por morte rural, obstar o recebimento de benefício rural próprio pelo outro (ex.: aposentadoria por idade). Não se trata de afirmação de inconstitucionalidade de dispositivo legal, mas apenas de sua interpretação teleológica.
Vale ressaltar que, pelo extrato previdenciário e pela CTPS do esposo, o último vínculo de emprego deste foi na condição de empregado rural, na função de trabalhador da cultura de arroz junto a Rio Corrente Agrícola S/A, no período de 11/03/2009 a 11/09/2009. Tal fato apenas corrobora a condição de trabalhadora rural da autora e do seu cônjuge.
Registra-se ainda que não consta no CNIS ou na CTPS da requerente vínculo urbano e que o INSS já reconheceu a condição de segurada especial da requerente nos períodos de 26/09/2001 a 23/11/2004 e de 01/03/2006 a 31/12/2009.
Somam-se a isso os informativos de benefício juntados aos autos que indicam que a autora recebeu auxílio-doença (24/11/ 2004 a 28/02/2006) e salário- maternidade (10/08/1995 a 07/12/1995 e 19/09/2000 a 2001) na condição de segurada especial.
Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida, que confirmou o exercício da atividade rural pela parte autora pelo prazo necessário à concessão do benefício.
Assim, tendo em vista que a prova testemunhal colhida nos autos corrobora a pretensão da parte autora e considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurado especial, deve ser mantido o benefício de aposentadoria por idade rural.
Dos pedidos subsidiários
A parte recorrente requer a observância da prescrição quinquenal. Tendo em vista que a presente ação foi ajuizada em 10/03/2022, não incide prescrição quinquenal, pois não transcorreu prazo superior a cinco anos da data do requerimento administrativo (Súmula n. 85/STJ).
Desnecessária a imposição de preenchimento de declaração de inacumulabilidade na esfera judicial.
A sentença não obsta o desconto de valores pagos administrativamente ou a título de benefícios inacumuláveis, o que deverá ser demonstrado pelo INSS na fase de cumprimento do julgado.
A sentença já determinou a observância da Súmula 111 do STJ e concedeu isenção de custas à autarquia.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
A sentença não merece reparo, pois já determinou a observância do Manual de Cálculos da Justiça Federal quanto aos encargos moratórios.
DESPESAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
O INSS é isento de custas na Justiça Federal.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Ressalvando meu ponto de vista pessoal sobre a questão, “é cabível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais (art. 85, § 11, do CPC), impondo-se a majoração do percentual já fixado, relativo aos honorários advocatícios, independentemente de comprovação do efetivo trabalho adicional pelo advogado da parte recorrida, sendo devida mesmo quando não apresentadas contrarrazões” (AgInt nos EDcl nos EDcl no AREsp n. 2.236.428/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 23/10/2023, DJe de 26/10/2023).
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS, nos termos da fundamentação do voto.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1023840-27.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDINALVA DA CONCEICAO SOUSA PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: ANDERSON UILIAM LEAO DE JESUS - BA56707-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. RECEBIMENTO DE PENSÃO POR MORTE. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. BENEFÍCIO MANTIDO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. NÃO INCIDÊNCIA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS. APELAÇÃO DESPROVIDA.
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Para a concessão da aposentadoria rural por idade, é necessário o cumprimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulheres, além da comprovação do exercício de atividade rural pelo período correspondente à carência do benefício, nos termos do art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142 da Lei nº 8.213/91.
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A condição de segurado especial pode ser comprovada por início de prova material, complementado por prova testemunhal idônea, conforme entendimento pacificado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e da Turma Nacional de Uniformização (TNU).
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No caso concreto, os documentos apresentados, como certidões de casamento e de nascimento dos filhos, certidão de óbito do cônjuge e declarações de Imposto Territorial Rural (ITR) referentes ao imóvel rural onde residia a autora, constituem início razoável de prova material, suficiente para corroborar sua condição de segurada especial.
- A qualidade de segurada especial não é afastada pelo recebimento de pensão por morte rural em valor superior ao salário mínimo, uma vez que a parte autora comprovou a continuidade do labor rural após o falecimento do cônjuge. A regra do art. 11, § 9º, inciso I, da Lei n. 8.213/91 deve ser interpretada teleologicamente, de modo a não excluir a condição de segurado especial daquele que recebe pensão por morte rural deixada por cônjuge/companheiro, mesmo que em valor pouco superior ao salário mínimo. Afinal, a obtenção de ganhos superiores ao salário mínimo pelo exercício de atividade rural pelo cônjuge/companheiro não obsta a qualificação do outro como segurado especial. Assim, não pode o óbito de um, ensejando benefício de pensão por morte rural, obstar o recebimento de benefício rural próprio pelo outro (ex.: aposentadoria por idade). Não se trata de afirmação de inconstitucionalidade de dispositivo legal, mas apenas de sua interpretação teleológica.
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Não há incidência da prescrição quinquenal, pois o ajuizamento da ação ocorreu antes do transcurso de cinco anos da data do requerimento administrativo, conforme Súmula 85 do STJ.
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Os juros de mora e a correção monetária devem seguir o Manual de Cálculos da Justiça Federal, com aplicação da taxa SELIC a partir de 08/12/2021, nos termos da Emenda Constitucional nº 113/2021, conforme decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no Tema 905.
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Honorários advocatícios majorados em R$ 2.000,00 (dois mil reais) na fase recursal, além do valor já fixado pelo juízo de origem, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
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Apelação desprovida.
Tese de julgamento:
"1. O recebimento de pensão por morte rural não descaracteriza a qualidade de segurado especial, desde que comprovado o exercício de atividade rural. 2. O início de prova material, corroborado por prova testemunhal, é suficiente para a concessão de aposentadoria rural por idade."
Legislação relevante citada:
Lei nº 8.213/91, art. 48, §§ 1º e 2º; art. 106
Emenda Constitucional nº 113/2021
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp 1.719.021/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 23/11/2018
STJ, AgRg no REsp 967344/DF, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJe 07/04/2008
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
