
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARGARETH PEREIRA VIEIRA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ANDREIA FERREIRA MOREIRA GONCALVES - GO31953
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004318-77.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARGARETH PEREIRA VIEIRA
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA FERREIRA MOREIRA GONCALVES - GO31953
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de aposentadoria rural por idade.
Em suas razões, o INSS sustenta que a parte autora não trouxe aos autos documentos suficientes que pudessem servir de início razoável de prova material do efetivo exercício das atividades campesinas no período total afirmado, tal como exigido pelo §3º, do art. 55 da Lei 8.213/91.
Em contrarrazões, a parte autora pugna pela manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004318-77.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARGARETH PEREIRA VIEIRA
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA FERREIRA MOREIRA GONCALVES - GO31953
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Da prescrição
A parte recorrente suscita a prejudicial de mérito de prescrição da pretensão de rever o ato de indeferimento/cessação de benefício praticado há mais de cinco anos.
Consoante o entendimento pacífico deste Tribunal, não há prescrição de fundo do direito em relação à concessão de benefício previdenciário, por ser este um direito fundamental, em razão de sua natureza alimentar.
Assim, a prescrição atinge apenas as parcelas vencidas antes do quinquênio que precede o ajuizamento da ação.
No caso, não ocorre a prescrição quinquenal das parcelas vencidas, tendo em vista que não transcorreu o prazo de cinco anos entre a data do ajuizamento da ação e da apresentação do requerimento administrativo.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado, no mínimo, mediante razoável início de prova material corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que ateste a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Por fim, convém registrar que documentos tais como carteiras, comprovantes e declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
A parte autora, a parte autora, nascida em 16/10/1964, preencheu o requisito etário em 16/10/2019 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurada especial em 21/03/2023, que foi indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ato contínuo, ajuizou a presente ação em 12/07/2023 pleiteando a concessão do benefício supracitado, a contar do requerimento administrativo.
Para comprovar sua qualidade de segurada especial e o exercício de atividade rural pelo prazo de carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos: fatura de energia rural em nome do cônjuge; certidão de casamento, celebrado em 08/02/1985, em que consta a profissão cônjuge como agricultor; CTPS sem vínculos trabalhistas; declaração de dados cadastrais em nome do cônjuge da autora, emitida pela Agência Goiana de Defesa Agropecuária, referente à Cadastro/Registro/Programa Fiscalização/Saúde/Animal (2021) e à vacinação de febre aftosa (2014); recibos de leite emitidos para o cônjuge da autora; CCIR e ITRs em nome do cônjuge; escritura pública de inventário extrajudicial e partilha, de 14/08/2015, em que consta o cônjuge da autora qualificado como agropecuarista; e escritura pública de divisão amigável, de 29/12/2016, em que consta o cônjuge da autora qualificado como agropecuarista e possuidor de imóvel rural.
Da análise das provas apresentadas, verifica-se que a certidão de casamento, celebrado em 08/02/1985, em que consta a qualificação do cônjuge como agricultor; a declaração em nome do cônjuge, emitida pela Agência Goiana de Defesa Agropecuária, referente à Fiscalização/Saúde/Animal (2021) e à vacinação de febre aftosa (2014); a fatura de energia rural, os recibos de leite em nome do cônjuge de 2001 a 2021; CCIR em nome do cônjuge, de 2015 a 2022 e ITRs de 2017 a 2022 em nome do cônjuge; escritura pública de inventário extrajudicial e partilha, de 14/08/2015, em que consta o cônjuge da autora qualificado como agropecuarista; e escritura pública de divisão amigável, de 29/12/2016, em que consta o cônjuge da autora qualificado como agropecuarista e possuidor de imóvel rural, constituem início de prova material do labor rural alegado pela parte autora.
O início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal, que confirmou o exercício de atividade rural pelo prazo necessário.
Não há registros de vínculos urbanos na CTPS da parte autora ou no extrato de dossiê previdenciário dela ou do cônjuge.
A alegação do INSS de que a parte autora exerceu atividade empresarial, o que descaracteriza a sua condição de segurada especial, não merece acolhimento. Conforme pesquisa externa acostada aos autos, a empresa cadastrada entre 1991 a 2018 encontra-se com a situação cadastral inapta e não consta nos autos qualquer informação acerca de eventuais faturamentos em decorrência dessa empresa. Logo, não há como reconhecer efetivo exercício de atividade empresarial pela parte autora no período correspondente à carência do benefício.
Quanto à alegação de que a autora possui veículos em seu nome, registra-se o entendimento deste e. Tribunal no sentido de que a mera existência de veículos populares ou utilitários em nome da parte autora não se afigura bastante e suficiente para elidir o conjunto probatório dos autos (AC 1027917-21.2019.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 23/03/2021 PAG). No caso, os veículos informados pelo INSS são um VW/GOL 2007/2007 (com alienação fiduciária) e um FIAF/SIENA ESSENCE 2014/2013. No caso, exercendo atividade como rurícola ao longo da vida, é razoável que consiga adquirir veículos de baixo valor, como ocorre no presente caso.
O valor elevado do imóvel rural atualmente não descaracteriza a qualidade de segurada especial da parte autora, tendo em vista que provavelmente decorre da valorização ao longo do tempo.
Considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos, tempestivamente, outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurado especial, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo (21/03/2023), nos termos do art. 49 da Lei nº 8.213/91.
Juros e correção monetária
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
A sentença destoa dessa diretriz, devendo ser ajustada quanto ao ponto.
CUSTAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
A sentença já determinou a isenção de custas ao INSS.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Verifica-se que, na sentença, os honorários advocatícios foram fixados em 10%. Nesse ponto, assiste ao INSS parcial razão, pois, embora os honorários advocatícios tenham sido fixados corretamente no mínimo legal, não foi observada a Súmula 111 do STJ.
Dessa forma, a sentença deve se adequar à Súmula 111 do STJ, que estabelece que “os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.”
Tendo a apelação sido parcialmente provida sem inversão do resultado, descabe a majoração de honorários advocatícios na fase recursal (Tema 1059/STJ).
Outros pedidos subsidiários
Não assiste razão ao INSS no que tange à apresentação de autodeclaração, pois se trata de procedimento a ser realizado na esfera administrativa, inclusive por meio dos canais remotos de atendimento do INSS, nos termos do art. 62, parágrafo único da Portaria 450/2020
A sentença não obsta o desconto de valores pagos administrativamente ou a título de benefícios inacumuláveis, o que deverá ser demonstrado pelo INSS na fase de cumprimento do julgado.
Desnecessária a imposição de preenchimento de declaração de inacumulabilidade na esfera judicial.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS, a fim de ajustar os encargos moratórios e limitar os honorários advocatícios na forma da Súmula 111/STJ, nos termos explicitados acima.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004318-77.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARGARETH PEREIRA VIEIRA
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA FERREIRA MOREIRA GONCALVES - GO31953
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. VEÍCULOS DE BAIXO VALOR NÃO DESCARACTERIZAM A CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC E JUROS DE MORA NOS TERMOS DO MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
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Para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, exige-se a comprovação do exercício da atividade campesina, mediante início de prova material corroborado por prova testemunhal, ainda que de forma descontínua, conforme arts. 48, §§ 1º e 2º, e 142 da Lei nº 8.213/91.
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A certidão de casamento, celebrado em 08/02/1985, em que consta a qualificação do cônjuge como agricultor; a declaração em nome do cônjuge, emitida pela Agência Goiana de Defesa Agropecuária, referente à Fiscalização/Saúde/Animal (2021) e à vacinação de febre aftosa (2014); os recibos de leite em nome do cônjuge de 2001 a 2021; CCIR em nome do cônjuge, de 2015 a 2022 e ITRs de 2017 a 2022 em nome do cônjuge; escritura pública de inventário extrajudicial e partilha, de 14/08/2015, em que consta o cônjuge da autora qualificado como agropecuarista; e escritura pública de divisão amigável, de 29/12/2016, em que consta o cônjuge da autora qualificado como agropecuarista e possuidor de imóvel rural, constituem início de prova material do labor rural alegado pela parte autora.
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A mera posse de veículos populares ou utilitários de baixo valor não descaracteriza a condição de segurado especial, conforme entendimento jurisprudencial desta Corte.
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Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem ser limitados às parcelas vencidas até a sentença, conforme Súmula 111 do STJ.
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As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros de mora nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, observando-se a incidência da taxa SELIC a partir de 08/12/2021, nos termos do art. 3º da EC nº 113/2021.
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Apelação do INSS parcialmente provida para ajustar os encargos moratórios e limitar os honorários advocatícios na forma da Súmula 111 do STJ.
Tese de julgamento:
“1. O início de prova material corroborado por prova testemunhal é suficiente para comprovar o exercício da atividade rural. 2. Veículos de baixo valor não descaracterizam a condição de segurado especial. 3. Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, incidem apenas sobre as prestações vencidas até a sentença.”
Legislação relevante citada:
Lei nº 8.213/91, arts. 48, §§ 1º e 2º, 55, § 3º, 106.
EC nº 113/2021, art. 3º.
CPC, art. 1.003, § 5º.
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 23/11/2018.
STJ, Súmula 111.
TRF1, AC 1027917-21.2019.4.01.9999, Des. Fed. Wilson Alves de Souza, PJe 23/03/2021.
TRF1, AC 1017905-06.2023.4.01.9999, Des. Fed. Nilza Reis, PJe 26/03/2024.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
