
POLO ATIVO: PATRICIA DA CRUZ ALVES CORREIA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ARIANE DE PAULA MARTINS TATESHITA - TO4130-S e AERTON LUIZ OLIVEIRA - TO9028-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1001499-03.2021.4.01.4300
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença na qual foi julgado improcedente o pedido inicial de concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, com a condenação da demandante no pagamento das custas e dos honorários advocatícios, ficando suspensa a exigibilidade dessas verbas, nos termos do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil (fls. 323/328).
Em suas razões, a apelante pede a reforma da sentença para que seja julgado procedente o seu pedido, ao argumento de que houve o preenchimento de todos os requisitos necessários à concessão do benefício (fls. 332/344).
Sem contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
No mérito, impõe-se examinar se os requisitos legalmente estabelecidos para a concessão do benefício estão presentes ou não.
Da aposentadoria rural por idade. A concessão desse benefício exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade a partir de 60 anos, para homem, e de 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Período de carência. Este requisito legal deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida: “O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade, na qualidade de trabalhador rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Regime de economia familiar. Considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, conforme dispõe o art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, “a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
Início de prova material. Para o reconhecimento do tempo de exercício efetivo da atividade rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149), não é necessário que a prova documental alcance todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que seja contemporânea à época dos fatos a comprovar (TNU, Súmula 34).
Aliando-se a esse aspecto, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol previsto no art. 106 da Lei n. 8.213/91 é meramente exemplificativo (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), tornando admissíveis, portanto, a utilização de outros documentos hábeis à comprovação do exercício da atividade rural, nos quais esteja especificada a profissão de trabalhador rural da parte autora, do seu cônjuge ou companheiro.
O caso concreto
A parte autora, nascida em 23/12/1959, implementou o requisito etário em 23/12/2014 (55 anos), tendo formulado o requerimento administrativo do benefício em 19/12/2014.
Para a comprovação da qualidade de segurada e da carência, trouxe aos autos os seguintes documentos: a) Certidão de casamento própria, realizado em 1988, na qual o marido consta como lavrador (fl. 19); b) Certidão de nascimento da filha, nascida em 06/1993, constando o genitor como lavrador (fl. 20); c) Ficha de renovação de matrícula escolar em nome da filha (fl. 21); d) Documentos de imóvel rural em nome do avô (fls. 22/33); e) Certidões de óbito do pai e do avô, falecidos em 11/2010 e em 11/1980 (fls. 34/35); f) Nota fiscal de compra de ferramenta, datada de 01/2015 (fl. 38); g) Ficha de assistência médico-sanitária (fls. 39/52); h) CTPS da autora com anotação de contrato de trabalho no cargo de porteira entre 04/1987 e 05/1989 (fls. 55/56); e i) Declaração de tempo de contribuição no cargo em comissão de auxiliar de serviços gerais, entre 10/1998 e 12/1998, emitido pela Prefeitura Municipal de Monte do Carmo (fl. 57).
O INSS, por sua vez, apresentou o extrato CNIS para demonstrar o registro de vínculos em nome da parte autora com o Município de Monte do Carmo em 01/04/1986 e de 01/10/1998 a 05/2000, e do seu cônjuge, nos períodos de 07 a 10/2000, bem como recolhimentos como contribuinte individual de 12/2011 a 05/2013. Juntou, ainda, consulta de cadastro de CNPJ na receita federal, no qual o seu cônjuge figura como empresário individual de empresas de fabricação de imóveis com predominância de madeira, uma com início da atividade em 2011 e situação baixada em 02/2018 e outra com início da atividade em 25/09/2019 - situação ativa.
Verifico, todavia, que os documentos apresentados pela parte autora não representam um início razoável de prova material da condição de segurada especial.
De fato, alguns documentos, tais como carteiras, comprovantes e declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações, além de outros que a esses possam se assemelhar, não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de formalidades legais das quais decorre a sua veracidade, extreme de dúvida, ou a sua fé pública.
Além disso, os documentos em nome do avô são irrelevantes para o deslinde da questão, pois a parte autora já havia constituído família e pertencia a outro núcleo familiar. E, vale ressaltar, são tão antigos que não são capazes de provar o labor rural por ela desempenhado.
A sua certidão de casamento e a certidão de nascimento da filha, nas quais constam a qualificação profissional do seu cônjuge como lavrador são extemporâneas, uma vez que o fato registrado na mais recente ocorreu em época remota, ou seja, há mais de 30 anos. Ademais tiveram seu valor probatório afastado em razão do registro do marido como empresário e dos vínculos urbanos posteriores, que extrapolam o limite previsto no artigo 11, § 9º, III, da LEI 8.213/91.
Importa registrar que o enquadramento como segurado especial, em regime de economia familiar, pressupõe que o trabalho rural seja indispensável à manutenção da própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o fato de o cônjuge exercer atividade urbana não é suficiente para afastar a condição de segurada especial do outro, mas afasta a eficácia probatória dos documentos apresentados em nome do seu consorte, evidenciando que o interessado deve trazer aos autos prova material dos fatos concernentes à sua pessoa, evidenciando, assim, que devem ser expedidos em seu próprio nome.
Nesse sentido é o seguinte precedente, entre outros:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ATIVIDADE RURAL. EXTENSÃO DE CONDIÇÃO DE RURAL AO CÔNJUGE. IMPOSSIBILIDADE. VÍNCULO URBANO. AUSÊNCIA DE PROVA EM NOME PRÓPRIO. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL DE ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ.
1. O labor campesino, para fins de percepção de aposentadoria rural, deve ser demonstrado por início de prova material e ampliado por prova testemunhal, ainda que de maneira descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento, pelo número de meses idêntico à carência.
2. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que o exercício de atividade urbana pelo cônjuge, por si só, não descaracterizaria a parte autora como segurada especial, mas afasta a eficácia probatória dos documentos apresentados em nome do consorte, devendo ser juntada prova material em nome próprio.
3. No caso, a Corte de origem, após minucioso exame dos elementos fáticos contidos nos autos, consignou a fragilidade do conjunto probatório, haja vista que, a par de a documentação estar no nome do esposo da parte autora, que passou a exercer atividade urbana e se aposentou por tempo de contribuição, todo o acervo probatório juntado aos autos revelou-se insuficiente à comprovação de trabalho rural no período de carência.
4. A alteração dessas conclusões, tal como colocada a questão nas razões recursais, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, a teor do óbice previsto na Súmula 7/STJ.
5. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1749069/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/05/2021, DJe 20/05/2021)
Nesse contexto, não remanesce dúvida de que a parte autora, ora recorrente, não se desincumbiu do ônus de instruir a petição inicial com início razoável de prova material, em nome próprio, da atividade rural em regime de economia familiar, no período de carência legalmente exigida.
Importa registrar, mais uma vez, que a prova testemunhal não pode ser considerada suficiente para a comprovação do exercício da atividade rural, nos termos do entendimento consolidado na Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça.
No julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que nas ações previdenciárias, em vista da natureza das normas de proteção social, a ausência de prova a instruir a petição inicial implica no reconhecimento de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito, podendo o autor ajuizar novamente a ação reunindo novos elementos probatórios (Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julg. 16/02/2015).
Ante o exposto, DECLARO EXTINTO o processo, sem apreciação do mérito, e julgo PREJUDICADO o exame do recurso de apelação interposto pela parte autora.
É como voto.
Brasília, 19 de junho de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1001499-03.2021.4.01.4300
PATRICIA DA CRUZ ALVES CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: ARIANE DE PAULA MARTINS TATESHITA - TO4130-S
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SENTENÇA JULGOU IMPROCEDENTE O PEDIDO. VÍNCULOS URBANOS EM NOME DO CÔNJUGE. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO EFETIVO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL E DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. PROCESSO JULGADO EXTINTO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. EXAME DA APELAÇÃO PREJUDICADO.
1. São requisitos para a aposentadoria de trabalhador(a) rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91).
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que o exercício de atividade urbana pelo cônjuge, por si só, não descaracteriza a qualidade de segurada especial da parte autora, mas afasta a eficácia probatória dos documentos apresentados em nome do consorte, devendo ser juntada prova material em nome próprio. Precedentes.
3. Não tendo sido apresentado, em nome próprio, um início de prova material da condição de segurado especial, o direito à aposentadoria rural, por idade não se configura, porque o benefício não pode ser concedido apenas com base em prova unicamente testemunhal (Súmula nº 149, Superior Tribunal de Justiça).
4. O Superior Tribunal de Justiça decidiu, em sede de recurso repetitivo, que, nas ações previdenciárias, em vista da natureza das normas de proteção social, a ausência de prova a instruir a inicial implica no reconhecimento de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem apreciação do mérito, podendo o autor ajuizar novamente a ação desde que reunidos novos elementos probatórios (Tema 629).
6. Processo julgado extinto, sem exame do mérito. Exame do recurso de apelação da parte autora prejudicado.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma, por unanimidade, extinguir o processo, sem apreciação do mérito, dando por prejudicado o exame do recurso de apelação interposto pela parte autora, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, 19 de junho de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
