
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:BRENO XAVIER DE SENA e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1004808-36.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente o pedido de concessão de benefício assistencial legalmente assegurado à pessoa portadora de deficiência, considerando descabida a sua suspensão, ocorrida em 1/2/2020 (fls. 515/520).
Nas suas razões, o recorrente sustenta haver sido constatada a existência de irregularidade na concessão do benefício, motivando a sua suspensão e a cobrança dos valores indevidamente auferidos pela parte autora, pugnando pela licitude da sua obrigação de repetir o indébito.
Requer a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido (fls. 521/529).
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 535/544).
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo, portanto, ser conhecido.
DO MÉRITO
Do benefício assistencial legalmente assegurado à pessoa portadora de deficiência.
No termos do art. 203, inciso V da Constituição Federal/88 e da Lei nº 8.742/93 é garantido o benefício correspondente a um salário mínimo mensal, independente de contribuição à seguridade social, à pessoa com deficiência e ao idoso, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Do critério de miserabilidade
Em relação ao critério de miserabilidade, o Plenário do STF, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, entendeu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento de Recurso Especial 1112447/MG, submetido ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)(negritei)
Utiliza-se como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei nº 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022 referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Nesse sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem constatar a hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Da deficiência
Considera-se deficiente a pessoa que apresenta impedimentos de longo prazo (mínimo de 2 anos), inviabilizam a sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas (§ 2º do art. 20, da Lei 8.742/93).
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
Do caso concreto
De acordo com o laudo da perícia médica judicial realizada em 21/10/2020, a parte autora apresenta o foi diagnóstico de “retardo mental” (fls. 50/52).
O perito informou que se trata de impedimento de longa duração, de natureza mental e intelectual, o que acarreta a sua incapacidade total e permanente para o exercício do labor.
Dessa forma, restou comprovado que a parte autora apresenta impedimento de longo prazo que inviabiliza a sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas.
Por sua vez, o estudo socioeconômico constatou que o requerente se encontra em estado de miserabilidade.
A renda do núcleo familiar é de um salário mínimo mensal, proveniente do recebimento do benefício de pensão por morte da genitora do autor, que reside somente com o pai em uma casa que não se encontra em boas condições de conservação.
A assistente social assim concluiu em seu parecer:
“Diante dos dados colhidos nas entrevistas, com o Sr. Gilberto Gomes de Sena de 58 anos de idade, pai biológico do requerente da ação, evidenciou-se que vivem em vulnerabilidade social, pois não possui meio de provê renda, necessitando da ajuda e caridade de outrem. Verificou-se também a necessidade de tratamento e cuidados (saúde debilitado). Contudo o que foi relatado e observado durante a entrevista técnica para a realização do Estudo Socioeconômico, damos parecer favorável ao requerente e adolescente Breno Xavier de Sena de 15 anos de idade” (fls. 65/85).
Evidente, portanto, que a parte autora também atende ao requisito de hipossuficiência, por não auferir renda própria e não ter o seu sustento devidamente provido pela família, nos termos do art. 20 da Lei n. 8.742/93, não merecendo prosperar o inconformismo do INSS.
Ante o exposto, nego provimento à apelação interposta pelo INSS.
Os honorários advocatícios recursais ficam fixados em 1% do valor da condenação.
É o voto.
Brasília, 20 de março de 2024.
DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS
RELATORA

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1004808-36.2023.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
B. X. D. S. e outros
Advogado do(a) REPRESENTANTE: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
Advogado do(a) APELADO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE DO REQUERENTE. REGULARIDADE DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. APLICAÇÃO DO ART. 20 DA LEI 8.742/93 E DA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão indicados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Comprovado pelo laudo social e pela perícia médica judicial que a parte requerente preenche os requisitos legalmente exigidos para a concessão do benefício (vulnerabilidade social e deficiência), cabe o seu deferimento desde a data da sua indevida suspensão.
3. Apelação do INSS a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto da relatora.
Brasília, 20 de março de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
