
POLO ATIVO: IVO DE SOUSA RAMALHO
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: JULIANA MARIA PRATA BORGES SILVA - MG87487-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1001845-21.2024.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora de sentença na qual foi julgado improcedente o pedido, considerando que, de acordo com a prova pericial, não foi comprovada a existência de deficiência capaz de autorizar a concessão do benefício assistencial (fls. 292/299) ¹
Em suas razões, a parte pugna pela reforma da sentença pra que lhe seja concedido o Benefício Assistencial de Prestação Continuada assegurado à pessoa com deficiência, a partir da data do requerimento administrativo. Alternativamente, suscita a nulidade da sentença e requer seja realizada nova perícia médica por médico especializado em oftalmologia (fls. 306/319).
Sem contrarrazões.
É o relatório.
¹ Os números de folhas indicados referem-se à rolagem única, ordem crescente.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Nulidade – realização de nova perícia
A parte autora argui a nulidade da sentença, afirmando a existência de cerceamento de defesa e requer a realização de nova perícia por médico especialista em oftalmologia, com indicação de perito judicial que atua nessa área.
Ocorre que o laudo foi elaborado por médico perito de confiança do juízo, que se encontra em posição equidistante dos interesses das partes, estando bem fundamentado, com respostas claras e objetivas aos quesitos apresentados pelas partes.
Não fosse isso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem se firmado no sentido de que a pertinência da especialidade médica, em regra, não consubstancia pressuposto de validade da prova pericial, de forma que o perito médico nomeado é quem deve escusar-se do encargo, caso não se julgue apto à realização da perícia solicitada.
Nesse sentido é o seguinte precedente:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. PROVA PERICIAL. NOMEAÇÃO DE PERITO MÉDICO ESPECIALISTA COMO PRESSUPOSTO DE VALIDADE. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES. CERCEAMENTO DE DEFESA. INCAPACIDADE. SÚMULA 7/STJ.
1. O presente recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo 3/STJ: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".
2. A jurisprudência desta Corte perfilha entendimento no sentido de que a pertinência da especialidade médica, em regra, não consubstancia pressuposto de validade da prova pericial, de forma que o perito médico nomeado é quem deve escusar-se do encargo, caso não se julgue apto à realização do laudo solicitado.
3. O acolhimento da pretensão recursal requer o revolvimento da matéria de prova, providência inviável em sede de recurso especial em razão do óbice contido na Súmula 7/STJ.
4. Agravo interno não provido.
(AgInt nos EDcl no AREsp 1696733/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/03/2021, DJe 18/03/2021)
Dessa forma, não está configurada a necessidade de realização de nova perícia. A mera discordância da parte com as conclusões do laudo não é suficiente para justificar a designação de nova perícia, quando os quesitos foram satisfatoriamente respondidos.
Rejeito, portanto, a preliminar de cerceamento de defesa suscitada.
Do benefício assistencial à pessoa com deficiência
No termos do art. 203, inciso V e da lei nº 8.742/93 é assegurado à pessoa com deficiência e ao idoso, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, o benefício de um salário mínimo mensal, independente de contribuição à seguridade social.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Do critério de miserabilidade
Em relação ao critério de miserabilidade, o Plenário do STF, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, entendeu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento de Recurso Especial 1112447/MG, submetido ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)(negritei)
Ressalta-se, ainda, que se tem utilizado como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Nesse sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem constatar a hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Da deficiência
Considera-se pessoa com deficiência aquela que apresenta impedimentos de longo prazo (mínimo de 2 anos), de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, inviabilizam sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (§ 2º do art. 20, da Lei 8.742/93).
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
Do caso concreto
No caso em análise, extrai-se do laudo pericial que a parte autora apresenta fratura consolidada do fêmur, porém não há critérios para fundamentar a existência de impedimento de longo prazo ou incapacidade laboral. De acordo com o perito, não há déficit de força, limitação de movimentos ou dificuldade para deambular.
A perícia também constatou opacidade ocular à direita, porém, ainda assim concluiu pela ausência de impedimento de longo prazo de qualquer natureza (fls. 168/173)
De acordo com a perícia, a patologia existe desde a infância da parte aurora e se encontra estabilizada e controlada, não existindo, portanto, a incapacidade laboral (fls. 142/186).
Ressalta-se que os demais elementos probatórios acostados aos autos não permitem o afastamento das conclusões inseridas no laudo pericial.
Assim, não restou caracteriza deficiência para fins de concessão do benefício assistencial uma vez que, apesar da patologia, não há impedimento de longo prazo capaz de inviabilizar a participação plena e efetiva da autora em sociedade, nos termos do § 2º, do art. 20, da Lei 8.742/93.
Portanto, não merece reforma a sentença que julgou improcedente o pleito autoral.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
Os honorários advocatícios recursais ficam fixados em quantia equivalente a 1% (um por cento) do valor da causa, ficando suspensa a respectiva cobrança em razão dos benefícios da assistência judiciária concedidos.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS
RELATORA

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
123APELAÇÃO CÍVEL (198)1001845-21.2024.4.01.9999
IVO DE SOUSA RAMALHO
Advogado do(a) APELANTE: JULIANA MARIA PRATA BORGES SILVA - MG87487-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO DA INEXISTÊNCIA DE DEFICIÊNCIA. NÃO CABIMENTO DO BENEFÍCIO. APLICAÇÃO DO ART. 20 DA LEI N° 8.742/93.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Consta no laudo da perícia médica judicial que, apesar da patologia da parte autora, não há impedimento de longo prazo capaz de inviabilizar a sua participação plena e efetiva em sociedade. Logo, não restou caracterizada a deficiência para fins de concessão do benefício assistencial pleiteado.
3. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
