
POLO ATIVO: ILDA DO NASCIMENTO
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: SILVIO GOMES CAMPOS - MT24861-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1019175-65.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença na qual foi julgado improcedente o seu pedido de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93, considerando que não restou comprovado o requisito da miserabilidade (fls. 155/156).
Nas suas razões, a apelante pugna pela reforma da sentença para que o seu pedido seja julgado procedente, sustentando haver implementado os requisitos legais exigidos para a concessão do benefício assistencial. Subsidiariamente, requer a anulação da sentença e o retorno dos autos a origem para realização de audiência de instrução e julgamento, uma vez que as provas produzidas nos autos foram insuficientes para o convencimento do juízo (fls. 234/241).
Embora intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Da nulidade da sentença
A parte autora, embora subsidiariamente, suscita a nulidade processual, sob o argumento de que a sentença se embasou em provas insuficientes para esclarecimento do magistrado, requerendo o retorno dos autos à origem para designação de audiência de instrução e julgamento.
Esta questão, todavia, se confunde com o mérito e somente com ele poderá ser analisada.
MÉRITO
Do benefício assistencial ao deficiente
Nos termos do art. 203, inciso V, da Constituição Federal de 1988, e da lei n. 8.742/93, é assegurado o benefício de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independentemente de contribuição à seguridade social.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, que são: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos de idade ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiarper capitainferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Do Critério de Miserabilidade
Em relação ao critério de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, entendeu que o parâmetro da renda mensal familiarper capitainferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento de Recurso Especial 1112557/MG, submetido ao rito dos Recursos Repetitivos, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. ACF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente ao cidadão social e economicamente vulnerável.
5. Alimitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.” (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Nesse contexto, tem-se utilizado como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Assim sendo, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem constatar a hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Da Deficiência
Conforme o disposto no art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742/93, “Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
O Caso Concreto.
No caso em análise, a perícia médica judicial realizada constatou que a parte autora, então contando 48 (quarenta e oito) anos de idade, foi diagnosticada com “perda total da audição à direita e parcial intensa a esquerda devido doença neurossensorial”, moléstia que a incapacita de forma total e permanente para qualquer atividade.
Por outro lado, foi realizado estudo socioeconômico em cujo laudo constam as seguintes informações: “Reside em casa cedida pela fazenda há 4 anos. Casa de alvenaria. Contém 2 quartos, 1 banheiros, 1 salas, 1 cozinha, 1 varanda nos fundos. Os moveis que guarnecem o ambiente são precários e em péssimo estado de conservação. A residência se encontrava limpa e organizada. O local não possui asfalto, tem rede de esgoto, possui água canalizada e iluminação pública. A família possui meio de transporte. Sobre as Condições Socioeconomicas: A Sra. Ilda esta desempregada. A renda é do marido que trabalha no Seringal. A renda familiar aproximada é de R$1.500,00”.
E ainda concluiu: “É possível constatar a perda gradativa da audição, porém não se constata na minha observação a incapacidade de inserção no mercado de trabalho e convívio social. Sugiro o acompanhamento continuo da equipe multidisciplinar do CRASS, para que a autora seja inserida em projetos sociais do município, afim de garantir a integridade física e psíquica, emocional e financeira (...).” (fls. 155/156).
Ademais disso, residindo apenas com seu esposo e com renda mensal aproximada de R$1.500,00, não comprovou renda per capta inferior a ½ (meio) salário mínimo, estabelecida na Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e no Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
É válido ressaltar, que as informações contidas no registro do Cadastro Único, se referem a fevereiro de 2023, sendo, portanto, posteriores ao ajuizamento da ação, não podendo ser consideradas na situação fática então existente.
Com base nestes elementos, embora comprovada a incapacidade da autora, esta não se desincumbiu do ônus de comprovar a alegada miserabilidade, embora não se afaste a possibilidade de que tal situação possa ser revertida em momento futuro haja vista ser evidente o estado de pobreza.
Quanto a alegada nulidade, não configura cerceamento de defesa a não realização de audiência de instrução para a produção de prova testemunhal, quando não essencial ao deslinde da questão, como na hipótese dos autos, em que o cerne da controvérsia é a incapacidade laboral e o estado de miserabilidade, requisitos comprovados através de prova médica pericial e de estudo socioeconômico.
Assim, não há nulidade na sentença que analisou as conclusões das perícias médica e socioeconômica e cujos laudos se mostram claros e suficientes para o deslinde da questão.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
Os honorários advocatícios recursais ficam fixados em quantia equivalente a 1% (um por cento) do valor da causa, ficando suspensa a respectiva cobrança em razão da concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS
RELATORA

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
100APELAÇÃO CÍVEL (198)1019175-65.2023.4.01.9999
ILDA DO NASCIMENTO
Advogado do(a) APELANTE: SILVIO GOMES CAMPOS - MT24861-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. . MISERABILIDADE NÃO COMPROVADA. NULIDADE PROCESSUAL POR CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Utiliza-se como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
3. Embora comprovada a incapacidade da autora, esta não se desincumbiu do ônus de comprovar a alegada miserabilidade.
4. Situação na qual a autora requer a anulação da sentença e o retorno dos autos a origem para realização de audiência de instrução e julgamento, uma vez que as provas produzidas nos autos foram insuficientes para o convencimento do juízo.
5. Afastada a alegação de nulidade da sentença por cerceamento de defesa, considerando que a prova testemunhal não é essencial ou necessária ao deslinde da questão, uma vez que a incapacidade laboral e o estado de miserabilidade são comprovados através de perícia médica judicial e de estudo socioeconômico.
6. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
