
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:EDUARDO ROSA DE OLIVEIRA SILVA e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MONICA DIVINA GONCALVES CARREIRO - GO40315-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1004937-07.2024.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS, de sentença na qual foi julgado procedente o pedido inicial de concessão do benefício assistencial à pessoa portadora de deficiência, a partir da data do requerimento administrativo (fls. 237/242).¹
Em suas razões (fls. 254/261), a autarquia previdenciária alega a ausência do requisito da miserabilidade e pugna pela reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial. Também formula pedidos subsidiários, constantes dos itens "1" a "5" da parte final da sua peça recursal.
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 254/260).
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da apelação do INSS (fls. 264/268).
É o relatório.
¹Número de folhas refere-se à rolagem única em ordem crescente.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
Nos termos do art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e da Lei n. 8.742/93, é assegurado o benefício de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independente de contribuição à seguridade social.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos de idade ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Da situação de miserabilidade
Em relação ao estado de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, decidiu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, quando do julgamento de Recurso Especial 1112557/MG, submetido ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Ressalte-se, ainda, que se tem utilizado como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Nesse sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem a constatação da hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Da deficiência
Considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo (mínimo de dois anos) “de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (Lei 8.742/93, art. 20, §§ 2º e 10).
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
O caso concreto
No caso em análise, apesar de haver sido constatada, na perícia médica judicial, a existência de impedimento de longo prazo, diante do diagnóstico de “Outras anomalias dos cromossomos, não classificadas em outra parte" e "Retardo mental moderado CID10: Q99.9 + F71.0”, havendo incapacidade total e permanente, desde o ano de 2019 (fls. 191/198),a situação existencial de miserabilidade não restou demonstrada.
Nesse sentido, pela análise do laudo social e demais provas acostadas aos autos, verifica-se que o autor não atende ao requisito da vulnerabilidade social.
Com efeito, consta no laudo social (fls. 202/206) que o demandante reside em casa cedida pela avó materna, com duas irmãs e a sua mãe, sendo esta a responsável pela manutenção do grupo familiar, mediante a renda de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) advinda do seu trabalho.
Constatou-se que o valor aproximado das despesas mensais é de R$ 2.548,70 (dois mil quinhentos e quarenta e oito reais e setenta centavos), e que a genitora e a irmã do autor realizam tratamento de saúde com psiquiatra e psicólogo. De acordo com o laudo, o autor necessita de ajuda para se alimentar, para tomar banho e realizar a troca de fraldas. Por fim, verificou-se que a renda do núcleo familiar não é suficiente para arcar com as despesas básicas informadas.
Examinando, todavia, os dados do CNIS da genitora do autor, apresentados pelo INSS em sua apelação (fl. 147), constato a existência de situação diversa da informada durante o estudo socioeconômico, de modo que resta demonstrado que. em novembro de 2020, a sua renda foi no importe de R$ 5.309,75 (cinco mil trezentos e nove reais e setenta e cinco centavos) . Ademais, conquanto não integre a renda per capita (Lei n. 8.742/93, art. 1º, §1º), vê-se que uma das irmãs solteiras do requerente (Fernanda), possui vínculo empregatício com remuneração superior a um salário mínimo, o que se verifica da informação apresentada pelo INSS, à fl. 212.
Assim, vê-se que a renda mensal da genitora do autor é suficiente para arcar com os gastos da família. Logo, em que pese o parecer médico pericial atestar o impedimento de longo prazo, não se verifica a existência de situação de vulnerabilidade social que garanta à parte autora o recebimento de benefício assistencial. Isso porque a renda familiar per capita supera ½ salário mínimo, critério objetivo que atualmente se tem utilizado como parâmetro razoável.
Com esses fundamentos, dou provimento à apelação interposta pelo INSS, para reformar a sentença que concedeu o benefício de prestação continuada ao autor, ante a ausência de comprovação do requisito da miserabilidade, julgando improcedente o pedido formulado na inicial.
Condeno o autor no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em quantia equivalente a 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando, todavia, suspensa a exigibilidade nos termos do art. 98, § 3º, do CPC (fl. 135).
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
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APELAÇÃO CÍVEL (198)1004937-07.2024.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EDUARDO ROSA DE OLIVEIRA SILVA e outros
Advogado do(a) APELADO: MONICA DIVINA GONCALVES CARREIRO - GO40315-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. NÃO CABIMENTO DO BENEFÍCIO. APLICAÇÃO DO ART. 20 DA LEI 8.742/93. SENTENÇA REFORMADA.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Ausente a situação de vulnerabilidade quando identificado que a renda familiar é suficiente para prover as despesas mensais e necessidades básicas do seu núcleo familiar, à semelhança do que ocorre no caso concreto..
3. Apelação interposta pelo INSS provida, para reformar a sentença que concedeu o benefício de prestação continuada, ante a ausência de comprovação do requisito da miserabilidade, julgando improcedente o pedido formulado na inicial.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
