
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: LUCIO JUNIOR BUENO ALVES - RO6454-A
POLO PASSIVO:AUGUSTO ROBERTO VERISSIMO e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: LUCIO JUNIOR BUENO ALVES - RO6454-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1006217-13.2024.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSS e pela parte autora, de sentença na qual foi julgado procedente o pedido para conceder benefício assistencial à pessoa portadora de deficiência, desde a data do requerimento administrativo de benefício, apresentado em 14/03/2020, e pelo prazo de 18 meses a contar da sentença (fls. 242/246)¹.
Nas suas razões, o INSS requer a improcedência dos pedidos, sob o fundamento de que não foi constatado o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício assistencial (fls. 256/265).
Já a parte autora requer a reforma da sentença para que seja excluída a determinação de duração do benefício assistencial pelo prazo de 18 meses (fls. 282/296)
Sem contrarrazões.
É o relatório.
¹Os números de folhas indicados referem-se à rolagem única, ordem decrescente.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
Nos termos do art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e da lei n. 8.742/93, é assegurado o benefício de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independente de contribuição à seguridade social.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos de idade ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Da situação existencial de miserabilidade
Em relação ao estado de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, decidiu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, de sua vez, quando do julgamento de Recurso Especial 1112447/MG, submetido ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Ressalte-se, ainda, que se tem utilizado como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Nesse sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem a constatação, ou não, da hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal, portanto, apenas uma referência.
Da deficiência
Considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo (mínimo de dois anos) “de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (Lei 8.742/93, art. 20, §§ 2º e 10).
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, respectivamente, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
Do caso concreto
Extrai-se do laudo pericial (fls. 164/167) que a parte autora é portadora de sequelas de fratura ao nível do punho e da mão (CID: T-92.2).
Concluiu o perito que há deficiência física que a parte autora, ora apelante, de realizar trabalho manual e braçal, em razão da ausência de mobilidade dos dedos das mãos.
Por sua vez, o estudo socioeconômico (fls. 231/233) constatou que a requerente se encontra em estado de miserabilidade.
Vê-se que a parte autora mora sozinha no assentamento Irmã Doroty, em casa cedida. Não trabalha. Em seu parecer social, a assistente social concluiu:
“Diante da situação apresentada, considera-se que o Sr. Augusto não possui renda financeira. O mesmo possui apenas o recebimento do programa Social Auxilio brasil para poder ter suas necessidades básicas atendidas. Sendo assim o mesmo necessita da implantação do benefício para se manter e ter suas necessidades atendidas.”
Logo, restou demonstrado que a parte autora vive em situação de miserabilidade, sem condições de trabalhar para prover o seu sustento e dependendo da assistência governamental para suprir as suas necessidades básicas.
Comprovado o preenchimento dos requisitos, não merece reforma a sentença que julgou procedente o pedido.
Insurge-se a parte autora parcialmente contra a sentença, pugnando seja excluída da condenação a data de cessação do benefício.
Quanto a esse aspecto, merece reforma a decisão.
O art. 21 da Lei 8.742/93 estabelece que o benefício deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem, cessando no momento em que estas forem superadas:
Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
Tal previsão não impede, ainda, que o beneficiário seja convocado em período inferior para avaliação da manutenção das condições que ensejaram a concessão do benefício, ainda quando esta tiver ocorrido por determinação judicial. É o que se extrai do § 5º, do art. 21 da Lei 8.742/93:
Art. 21, § 5º O beneficiário em gozo de benefício de prestação continuada concedido judicial ou administrativamente poderá ser convocado para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção, sendo-lhe exigida a presença dos requisitos previstos nesta Lei e no regulamento.
Portanto, não há que se falar em fixação do termo de cessação, por ausência de previsão legal, sendo assegurada pela lei a possibilidade de revisão do benefício dentro do período de2 (dois) anos.
Esse inclusive foi o entendimento firmado pela Turma Nacional de Uniformização (TNU) ao analisar o Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei, processo n°0006040-96.2016.4.01.3807. In verbis:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. DATA DE CESSAÇÃO FIXADA NA SENTENÇA. IMPOSSIBILIDADE. POR FALTA DE PREVISÃO LEGAL, É INCABÍVEL A FIXAÇÃO ANTECIPADA DE DATA DE CESSAÇÃO DE BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO. (Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 0006040-96.2016.4.01.3807, FABIO DE SOUZA SILVA - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO, 30/09/2021.)
Ante o exposto, dou provimento à apelação interposta pela parte autora para excluir da sentença a fixação do prazo de 18 (dezoito) meses para a cessação do benefício. Por conseguinte, nego provimento à apelação do INSS.
Os honorários advocatícios recursais ficam fixados em 1% sobre o valor da condenação.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
65APELAÇÃO CÍVEL (198)1006217-13.2024.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
Advogado do(a) APELANTE: LUCIO JUNIOR BUENO ALVES - RO6454-A
AUGUSTO ROBERTO VERISSIMO e outros
Advogado do(a) APELADO: LUCIO JUNIOR BUENO ALVES - RO6454-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. REQUISITOS COMPROVADOS PELA PERÍCIA MÉDICA E PELO LAUDO SOCIAL. CABIMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 20 DA LEI 8.742/93. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DE DATA OU PEDRÍODO TEMPORAL PARA A CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO. FALTA DE PREVISÃO LEGAL. PRECEDENTE DA TNU.POSSIBILIDADE DE REVISÃO PELO INSS A CADA DOIS ANOS.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Comprovado pelo laudo social e pela perícia médica judicial que a parte requerente preenche os requisitos (vulnerabilidade social e deficiência) para a concessão do benefício assistencial, este é devido desde a data do requerimento.
3. O art. 21 da Lei 8.742/93 estabelece que o benefício deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem, cessando no momento em que estas forem superadas.
4. A Turma Nacional de Uniformização (TNU) ao analisar pedido de uniformização de interpretação de lei fixou o entendimento de que por falta de previsão legal, é incabível a fixação antecipada de data de cessação de benefício de prestação continuada.
5. Apelação da parte autora provida para excluir da sentença a fixação de período temporal de 18 (dezoito) meses para a cessação do benefício. Recurso do INSS não provido.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
