
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:IVONE CAROLINA DA SILVA e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MONICA GOMES PEIXOTO FONSECA - GO14460-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1028176-11.2022.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença que julgou procedente o pedido para restabelecer benefício assistencial a deficiente, a partir da data da cessação (30/09/2021), com pagamento dos valores atrasados corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios, de acordo com as orientações do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. (fls. 134/138)¹.
Nas suas razões, a autarquia previdenciária requer o recebimento do recurso em seu efeito suspensivo. No mérito, pugna pela reforma da sentença para que o pedido seja julgado improcedente, sustentando que a parte autora não preenche os requisitos legais para a obtenção do benefício pleiteado. Subsidiariamente, pede a aplicação da Lei 11.960/09 em relação aos juros e correção monetária. (fls. 218/223).
Foram apresentadas contrarrazões às fls. 229/240.
O Ministério Público Federal apresentou parecer favorável ao desprovimento da apelação (fls. 243/248).
É o relatório.
¹Os números de folhas indicados referem-se à rolagem única, ordem decrescente.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Do efeito suspensivo
Tratando-se de sentença que condenou a parte ré a implementar benefício assistencial, parcela de natureza alimentar, não merece acolhida o pedido de recebimento do recurso no efeito suspensivo, por força do disposto no art. 1.012, §1º, inciso II e V do CPC.
MÉRITO
Do benefício assistencial ao deficiente
No termos do art. 203, inciso V e da lei nº 8.742/93 é assegurado à pessoa com deficiência e ao idoso o benefício de um salário mínimo mensal, independente de contribuição à seguridade social, desde que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Do critério de miserabilidade
Em relação ao critério de miserabilidade, o Plenário do STF, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, entendeu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento de Recurso Especial 1112447/MG, submetido ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. “Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)(negritei)
Ressalta-se, ainda, que se tem utilizado como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores às LOAS, como a Lei nº 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022 referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Nesse sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem constatar a hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Da deficiência
Considera-se deficiente a pessoa que apresenta impedimentos de longo prazo (mínimo de 2 anos), de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, inviabilizam sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (§ 2º do art. 20, da Lei 8.742/93).
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
Do caso concreto
Analisando os elementos contidos nos autos, verifico que foi realizada perícia médica judicial, de cujo laudo se extrai que a parte autora é portadora de “Retardo mental grave – CID F72”.
O expert informou que o requerente “não tem interação social e possui dificuldade em adaptação”, para concluir que tal moléstia ocasiona a sua incapacidade total e permanente desde o ano de 1997, razão pela qual entende que benefício deveria ser restabelecido a partir da data em que foi cessado (outubro/2021) (fls. 86/90).
Também foi realizado estudo socioeconômico, em cujo laudo contem a informação de o autor vive com a mãe, que é beneficiária de aposentadoria e de pensão por morte; o padrasto, que recebe aposentadoria por idade; um irmão, também deficiente e um sobrinho, menor e estudante (fls. 99/109).
A renda do núcleo familiar totaliza R$3.633,00 (três mil seiscentos e trinta e três reais) e as despesas somam R$2.253,00 (dois mil duzentos e cinqüenta e três reais). Acerca do tema, é importante ressaltar que a aposentadoria da mãe do autor e a aposentadoria do padrasto, no valor de um salário mínimo, devem ser excluídas da renda familiar, de acordo com a previsão contida no art. 20, §14°, da Lei 8.742/93, in verbis:
§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo
Com base nestes elementos, há conclusão pela existência de vulnerabilidade social, nos seguintes termos:
“Concluo que a família vivencia situação de vulnerabilidade e risco social que diz respeito pessoa com deficiência e acesso à saúde.
“Evidencio que o requerente também vivencia situação de isolamento, sem interação social e necessita do Benefício de Prestação Continuada para que tenha seus direitos sociais garantidos.”
Portanto, vê-se que o núcleo familiar vive em situação de miserabilidade, sem condições de manter o sustento apenas com o valor proveniente da pensão por morte recebida pela genitora.
Devo anotar, por fim, que no tocante à correção monetária e aos juros de mora incidentes sobre as parcelas vencidas, deverão ser aplicados os índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, visto que este se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
Logo, tendo em vista que a sentença determinou o pagamento das parcelas vencidas corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, nos termos deste Manual, não merece reforma a decisão.
Ante o exposto, nego provimento à apelação interposta pelo INSS.
Os honorários advocatícios recursais ficam fixados em 1% do valor da condenação.
É o voto.
Brasília, 31 de janeiro de 2024.
DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS
RELATORA

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1028176-11.2022.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
IVONE CAROLINA DA SILVA e outros
Advogado do(a) APELADO: MONICA GOMES PEIXOTO FONSECA - GO14460-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. DATA DA CESSAÇÃO DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CABIMENTO. APLICAÇÃO DO PRECEDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Nos termos do art. 20, §14°, da Lei 8.742/93, o benefício de prestação continuada previdenciário de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado para fins de concessão do benefício de prestação continuada.
3. Comprovado pelo laudo social e pela perícia médica judicial que a parte requerente preenche os requisitos (vulnerabilidade social e deficiência) para a concessão do benefício assistencial, este é devido desde a data da cessação.
4. Apelação do INSS a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto da relatora.
Brasília, 31 de janeiro de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
