
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:OTACILIA ALVES FEITOSA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: JESUALDO SIQUEIRA BRITO - PE00825-S
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

APELAÇÃO CÍVEL (198)0000247-16.2015.4.01.4001
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS objetivando reforma da sentença que julgou procedente o pedido para declarar a inexistência de débito para ressarcimento ao erário dos valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário/assistencial.
Em suas razões recursais, a apelante pugna pela reforma total da sentença para que os valores percebidos indevidamente pelo autor sejam restituídos e cobrados pelos meios legais cabíveis. Recebidos de boa ou má-fé os valores, ressalvada à possibilidade de parcelamento da dívida.
É o relatório.

VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
O benefício de prestação continuada está previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, que garante o pagamento de um salário-mínimo à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, nos termos da lei.
No caso dos autos, o INSS realizou cobrança administrativa dirigida à parte autora informando sobre a constatação de irregularidade, referente ao pagamento do benefício assistencial após o óbito da titular por parte da irmã que era curadora. A parte ré argumentou que é idosa, analfabeta e entendeu que após a morte ficaria com o benefício.
O Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema n. 979 - REsp 1.381.734) decidiu que, nos casos de valores pagos indevidamente pela Previdência Social em decorrência de erro administrativo (material ou operacional), sem que a hipótese seja de interpretação errônea ou equivocada de lei pela Administração, é devido o ressarcimento ao erário de tais verbas percebidas pelo segurado/beneficiário, salvo quando comprovada a sua boa-fé com a demonstração de que não lhe era possível constatar que o pagamento era indevido. Em virtude da modulação dos efeitos, apenas os processos distribuídos na primeira instância, a partir da data da publicação do acórdão (23/04/2021) estarão sujeitos à devolução em caso de erro da administração (material ou operacional), ressalvada a comprovação de boa-fé do beneficiário.
Ressalte-se que é a obrigação do INSS revisar periodicamente à concessão dos benefícios, nos termos do art. 11 da Lei n. 10.666/2003.
Demais disso, verifica-se que a apelada é vulnerável social e tecnicamente, não podendo ser exigido conhecimento específico para
compreender o correto atendimento das exigências dispostas na lei para concessão do benefício.
Desse modo, o conjunto probatório mostra-se suficiente para demonstrar que a apelada não detinha conhecimento acerca do recebimento indevido do benefício. Denota-se, portanto, que agiu de boa-fé.
É pacífico no Superior Tribunal de Justiça, o entendimento, segundo o qual é incabível a devolução de valores recebidos de boa-fé pelos beneficiários do INSS, pois reconhecidas a natureza alimentar da prestação e a presunção de boa-fé do segurado. Incidência da Súmula 83/STJ. 2. Agravo regimental não provido"(STJ, AgRg no AREsp 820.594/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELLMARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 01/03/2016).
Nessa linha é o entendimento desta Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. LOAS DEFICIENTE E APOSENTADORIA POR IDADE. PERCEPÇÃO SIMULTÂNEA. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. DESNECESSIDADE. VERBA ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA-FÉ. 1. Infundada a alegação de inadequação da via eleita, eis que, no caso em exame, a análise do mérito não depende de dilação probatória. 2. No tocante à percepção de benefícios previdenciários, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça quanto à irrepetibilidade de valores percebidos de boa-fé pelo segurado, em decorrência de erro administrativo em seu pagamento (REsp 1674457/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 09/08/2017; REsp 1666580/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 30/06/2017) 3. Hipótese em que a impetrante continuou recebendo benefício assistencial de seu filho após a concessão da própria aposentadoria por idade em 08/06/2009, porém não há comprovação nos autos de que o tenha feito por má-fé, mormente considerando o entendimento jurisprudencial no sentido de que o recebimento de benefício previdenciário por idade pode ser excluído do cômputo da renda familiar para fins de análise do critério econômico. Portanto, não há que se falar em má-fé e obrigatoriedade de restituição dos valores percebidos, em homenagem aos princípios da irrepetibilidade das verbas alimentares e da presunção de boa-fé. 4. Os princípios da segurança das relações jurídicas, da boa-fé, da confiança e da presunção de legitimidade dos atos administrativos justificam a adoção dessa linha de raciocínio, porque confia o administrado na regularidade do pagamento operacionalizado pela Administração, passando a dispor dos valores percebidos com a firme convicção de estar correto o pagamento implementado, de sorte que não haveria riscos de vir a ter que devolvê-los. 5. Apelação e remessa oficial desprovidas. (AC 1000046-93.2017.4.01.3303, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 22/09/2022 PAG.)
Quanto à percepção de benefícios previdenciários, também já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça acerca da irrepetibilidade dos valores percebidos de boa-fé pelo segurado, em decorrência de erro administrativo em seu pagamento.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL E AO ART. 154 DO DECRETO 3.048/1999. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ COMPROVADA. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. FUNDAMENTO AUTÔNOMO NÃO IMPUGNADO. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULAS 283 E 284 DO STF. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. REVISÃO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. REQUISITOS. ART. 203, V, DA CF/1988. LEI 8.742/93, ART. 20, § 3º. MISERABILIDADE AFERIDA POR OUTROS CRITÉRIOS QUE NÃO A LIMITAÇÃO DA RENDA PER CAPITA FAMILIAR. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA.
1. Cuida-se, na origem, de ação ordinária em que a parte autora requereu o restabelecimento do benefício de amparo social, bem como a declaração de inexistência de débito perante a Previdência Social.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido apenas para declarar a inexistência de débito do autor perante o INSS.
RECURSO ESPECIAL DO INSS 2. Em relação aos arts. 884 e 885 do Código Civil e ao art. 154 do Decreto 3.048/1999, a Corte local não emitiu juízo de valor sobre a alegada matéria. É necessária a efetiva discussão do tema pelo Tribunal a quo, ainda que em Embargos de Declaração. O Superior Tribunal de Justiça entende ser inviável o conhecimento do Recurso Especial quando os artigos tidos por violados não foram apreciados pelo Tribunal de origem, a despeito da oposição de Embargos de Declaração, haja vista a ausência do requisito do prequestionamento.
Incide, na espécie, a Súmula 211/STJ. 3. Nas razões do Recurso Especial, o INSS sustenta apenas a necessidade de restituição do benefício previdenciário indevidamente pago, sendo esta a
interpretação dos arts. 115, II, parágrafo único, da Lei 8.213/1991 e 154, II, § 3°, do Decreto 3.048/1999. Todavia, no enfrentamento da matéria, o Tribunal de origem consignou que "o benefício foi requerido e recebido de boa-fé"e que "não pode agora a autarquia exigir a repetição dos respectivos valores, notadamente por terem caráter alimentar" (fl. 424, e-STJ).
4. Sendo assim, como o fundamento não foi atacado pela parte recorrente e é apto, por si só, para manter o decisum combatido, permite-se aplicar na espécie, por analogia, os óbices das Súmulas 284 e 283 do STF, ante a deficiência na motivação e a ausência de impugnação de fundamento autônomo.
5. Ademais, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que, em razão do caráter alimentar dos proventos aliado à percepção de boa-fé, é impossível a devolução de valores recebidos a título de benefício previdenciário por razão de erro da Administração, aplicando-se ao caso o princípio da irrepetibilidade dos alimentos.
6. Tendo o Tribunal de origem reconhecido a boa-fé em relação ao recebimento do benefício objeto da insurgência, descabe ao STJ iniciar juízo valorativo a fim de alterar tal entendimento, ante o óbice da Súmula 7/STJ.
RECURSO ESPECIAL DO SEGURADO 7. A Terceira Seção do STJ, ao apreciar o REsp 1.112.557/MG, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC, firmou a compreensão de que o critério objetivo de renda per capita mensal inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo - previsto no art. 20, § 3°, da Lei 8.742/93 - não é o único parâmetro para aferir hipossuficiência, podendo tal condição ser constatada por outros meios de prova. Precedentes: AREsp 110.176/CE, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 4/6/2013; AREsp 332.275/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 27/5/2013; AREsp 327.814/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 22/5/2013. 8. No presente caso, a negativa de concessão do benefício assistencial não se limitou apenas ao critério objetivo fixado no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993, porquanto considerou também o contexto fático da situação na qual vive a parte autora.
9. Modificar a conclusão a que chegou a Corte de origem, de modo a acolher a tese do recorrente, demanda reexame do acervo fático-probatório dos autos, inviável em Recurso Especial, sob pena de violação da Súmula 7 do STJ. 10. O óbice da Súmula 7 do STJ atinge também o Recurso Especial interposto com fundamento na alínea c do inciso III do artigo 105 da Constituição da República, porque impede o exame de dissídio jurisprudencial, uma vez que falta identidade entre os paradigmas apresentados e
os fundamentos do acórdão, tendo em vista a situação fática do caso concreto, com base na qual a Corte de origem deu solução à causa. CONCLUSÃO 11. Recursos Especiais não conhecidos.
(REsp 1666580/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 30/06/2017)
Desse modo, o conjunto probatório é suficiente a demonstrar que a apelada não detinha conhecimento acerca do recebimento indevido do benefício. Denota-se, portanto, que agiu de boa-fé.
Em razão de a apelada ter recebido o benefício assistencial de boa-fé, está desobrigada a restituir os valores já recebidos. Portanto, a sentença deve ser mantida em todos os seus termos.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação interposta.
Mantidos os honorários fixados na sentença, acrescidos de 1% (um por cento) a título de honorários recursais, nos termos do art. 85, §11, do CPC, a incidirem sobre as prestações vencidas até a sentença (súmula 111 do STJ).
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada

128APELAÇÃO CÍVEL (198)0000247-16.2015.4.01.4001
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
OTACILIA ALVES FEITOSA
Advogado do(a) APELADO: JESUALDO SIQUEIRA BRITO - PE00825-S
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. APELAÇÃO DO INSS. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA.
1. O benefício de prestação continuada está previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, que garante o pagamento de um salário-mínimo à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, nos termos da lei.
2. O Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema n. 979 - REsp 1.381.734), decidiu que, nos casos de valores pagos indevidamente pela Previdência Social em decorrência de erro administrativo (material ou operacional), sem que a hipótese seja de interpretação errônea ou equivocada de lei pela Administração, é devido o ressarcimento ao erário de tais verbas percebidas pelo segurado/beneficiário, salvo quando comprovada a sua boa-fé com a demonstração de que não lhe era possível constatar que o pagamento era indevido. Em virtude da modulação dos efeitos, apenas os processos distribuídos na primeira instância, a partir da data da publicação do acórdão, estarão sujeitos à devolução em caso de erro da administração (material ou operacional), ressalvada a comprovação de boa-fé do beneficiário.
3. No caso, verifica-se que a parte autora é vulnerável social e tecnicamente, não podendo ser exigido conhecimento específico para compreender o correto atendimento das exigências dispostas na lei para concessão do benefício. O conjunto probatório é suficiente a demonstrar que a apelada não detinha conhecimento acerca do recebimento indevido do benefício. Denota-se, portanto, que agiu de boa-fé.
4. Descabe a devolução dos valores recebidos a título de LOAS, se as circunstâncias em que foi concedido o benefício previdenciário evidenciam a boa-fé objetiva da parte autora. (STJ, AgRg no AREsp 820.594/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 01/03/2016). Portanto, deve ser mantida a sentença em sua integralidade.
5. Apelação interposta pelo INSS a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada
