
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:NELCIVAN BAPTISTA PAIVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CARINE MARIA BARELLA RAMOS - RO6279
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1018113-87.2023.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NELCIVAN BAPTISTA PAIVA
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença que julgou procedente o pedido de restabelecimento do benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência previsto na Lei nº 8.742/93, desde a data de cessação (01/05/2021).
O INSS, em suas razões recursais, pugnou pela reforma do julgado para que seja julgado improcedente o pedido inicial aduzindo que “não foi demonstrada a irregularidade do ato administrativo que determinou a cessação do benefício, e imposição de cobrança de parcelas pagas indevidamente”. Subsidiariamente, requer que DIB seja fixada na data da intimação dos laudos periciais produzidos neste processo.
Contrarrazões apresentadas.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1018113-87.2023.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NELCIVAN BAPTISTA PAIVA
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
O benefício de prestação continuada está previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, que garante o pagamento de um salário mínimo à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, nos termos da lei.
No que toca a renda familiar per capita, o Plenário do STF manifestou-se, por ocasião da ADIN n. 1.232-1/DF, no sentido de que a lei estabeleceu hipótese objetiva de aferição da miserabilidade, contudo, o legislador não excluiu outras formas de verificação de tal condição. Para tal, cite-se outros benefícios de cunho assistencial instituídos posteriormente com critério objetivo de renda familiar per capita inferior a 1/2 do salário-mínimo (Lei nº 10.689/2003 e Lei n. 9.533/1997).
Quanto à aferição da miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento da Reclamação nº 4374/PE sinalizou compreensão no sentido de que o critério de renda per capita de ¼ do salário-mínimo não é mais aplicável, motivo pelo qual a miserabilidade deverá ser aferida pela análise das circunstâncias concretas do caso analisado.
Nessa linha, a jurisprudência pátria entende que, do mesmo modo em que o benefício assistencial pago a um integrante da família não deve ser considerado para fins de renda per capita, nos termos do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003, os benefícios previdenciários de até um salário-mínimo, pagos a pessoa maior de 65 anos, também não deverão ser considerados (REsp 1355052/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015 – Tema 640).
Assim, a vulnerabilidade social deve ser aferida pelo julgador na análise do caso concreto, de modo que o critério objetivo fixado em lei deva ser considerado como um norte, podendo o julgador considerar outros fatores que viabilizem a constatação da hipossuficiência do requerente.
Importante consignar que fora dos requisitos objetivos previstos em lei, a comprovação da miserabilidade deverá ser viabilizada pela parte requerente, mediante a apresentação de prova idônea.
No caso dos autos, o autor nascido em 20/07/1982, possui o diagnóstico de paraplegia, disfunção neuropática da bexiga e cólon neurogênico. CID 10: G82.2, N31.9 e K59.2 (ID351260633 - P. 272). Recebia o benefício assistencial desde 26/06/2003 quando foi suspenso, em 01/05/2021, em razão da renda per capita ser superior a ¼ do salário mínimo, conforme apurado em processo administrativo ( ID 351260633 – p. 17).
A controvérsia dos autos cinge-se à verificação da comprovação da vulnerabilidade social da parte autora.
Quanto ao processo de apuração de irregularidade, entendo que não merece reparos a sentença que declarou a inexistência de débito pelas razões a seguir expostas.
De fato, ao inscrever-se no CadÚnico (ID 351260633 –P. 95), o autor declarou que o grupo familiar era composto por ele, sua genitora e uma sobrinha, sendo a renda de R$ 1.996,00, proveniente do seu benefício assistencial, objeto dos presentes autos, e do benefício previdenciário de pensão por morte percebido por sua genitora.
Pois bem. Cumpre esclarecer que nos termos do art. 20, §14º da Lei n° 8.742/1993 é possível a exclusão do cômputo da renda familiar o benefício assistencial de até 01 salário mínimo percebido por pessoa com deficiência do mesmo grupo familiar. Assim, no momento da apuração da renda familiar do autor, o INSS deveria ter excluído o benefício assistencial do cômputo.
Ademais, verifico que não houve recebimento ilegal do benefício assistencial, já que o direito à concessão do benefício é amparado legalmente e pela jurisprudência majoritária que permite que outros elementos sejam verificados na análise da miserabilidade.
Posteriormente, o autor atualizou os dados do CadÚnico, excluindo do seu grupo familiar sua genitora e a sobrinha.
Do estudo socioeconômico (ID 351260633 – p. 263), elaborado em 08/10/2022, extrai-se que o autor reside sozinho. A residência é “uma construção (tipo meia água) de alvenaria (tijolo a vista) medindo 4x5m, um cômodo que serve como cozinha e quarto conjugado e um banheiro, estrutura bem precária, com telha de amianto, sem forração piso bruto (cimento queimado), e somente no banheiro possui piso de cerâmica. Possui água encanada cedida do poço da casa da irmã Gisele e um rabicho de energia”.
Segundo relato, “o requerente não possui renda, pois não exerce atividade laboral devido as condições de saúde (pessoa em cadeira de rodas)”. “O requerente faz uso no momento do medicamento: Retemic 5mg, (três caixas mensais) tendo um custo de R$ 190,00 a R$ 200,00 que ultimamente está sendo pago pela genitora, pois mostrou os documentos que já fazem três anos que esse medicamento não é disponibilizado na Unidade Básica, que já deu entrada varias vezes solicitando, contudo, o município sempre diz que ainda estão em processo de licitação. Com relação à alimentação, foi beneficiado com cestas básicas mensais pelo Centro de Referência de Assistência Social – CRAS, contudo ultimamente não estão distribuindo, acaba ficando na casa da genitora, por vezes do irmão, da irmã, até de terceiros, pois não tem como sobreviver”.
Concluiu a assistente social que “Considerando as informações obtidas no Estudo Socioeconômico realizado, foi verificado que o requerente é economicamente vulnerável, não provê os meios para sua subsistência pois não tem condições de exercer atividade remunerada devido as condições de saúde (paraplegia) dentre outras complicações especificadas em laudos”.
Considerando o entendimento jurisprudencial consolidado no sentido de que podem ser utilizados outros elementos probatórios para aferição da capacidade da família de prover suas necessidades básicas e os fatos narrados e comprovados pelos documentos anexados à exordial, resta comprovada a situação de vulnerabilidade social da parte autora.
Cabe ressaltar que há possibilidade de revisão administrativa do benefício assistencial a cada 02 (dois) anos, a fim de avaliar a continuidade das condições que ensejaram a concessão do benefício, conforme preceitua o artigo 21, da Lei 8.742/1993.
Mantenho os honorários fixados na sentença, acrescidos de 1% (um por cento) a título de honorários recursais, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença.
Juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do TEMA 905 STJ e 810 (STF).
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS.
É o voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1018113-87.2023.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NELCIVAN BAPTISTA PAIVA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 20 DA LEI 8.742/93. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE. ELEMENTOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA.
1. O benefício de prestação continuada está previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, que garante o pagamento de um salário mínimo à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, nos termos da lei.
2. A vulnerabilidade social deve ser aferida pelo julgador na análise do caso concreto, de modo que o critério objetivo fixado em lei deve ser considerado como um norte, podendo o julgador considerar outros fatores que viabilizem a constatação da hipossuficiência do requerente.
3. Quanto ao processo de apuração de irregularidade, não merece reparos a sentença que declarou a inexistência de débito.
4. Verifica-se dos autos que o apelado, ao realizar inscrição no CadÚnico (ID 351260633 –P. 95), declarou que o grupo familiar era composto por ele, sua genitora e uma sobrinha, e que a renda de R$ 1.996,00, era proveniente do seu benefício assistencial, objeto dos presentes autos, e do benefício previdenciário de pensão por morte percebido por sua genitora.
5. Cumpre esclarecer que, nos termos do art. 20, §14º da Lei n° 8.742/1993, deve ser excluído do cômputo da renda familiar o benefício assistencial de até 01 salário mínimo percebido por pessoa com deficiência do mesmo grupo familiar. Assim, no momento da apuração da renda familiar do autor, o INSS não poderia computar o benefício assistencial percebido pelo requerente.
6. Do estudo socioeconômico (ID 351260633 – p. 263), elaborado em 08/10/2022, extrai-se que o autor reside sozinho. A residência é “uma construção (tipo meia água) de alvenaria (tijolo a vista) medindo 4x5m, um cômodo que serve como cozinha e quarto conjugado e um banheiro, estrutura bem precária, com telha de amianto, sem forração piso bruto (cimento queimado), e somente no banheiro possui piso de cerâmica. Possui água encanada cedida do poço da casa da irmã Gisele e um rabicho de energia”. Segundo relato, “o requerente não possui renda, pois não exerce atividade laboral devido as condições de saúde (pessoa em cadeira de rodas)”. Concluiu a assistente social que “Considerando as informações obtidas no Estudo Socioeconômico realizado, foi verificado que o requerente é economicamente vulnerável, não provê os meios para sua subsistência, pois não tem condições de exercer atividade remunerada devido às condições de saúde (paraplegia) dentre outras complicações especificadas em laudos”.
7. Atendidos os requisitos legais para a concessão do benefício de prestação continuada, deve ser mantida a sentença que restabeleceu o benefício assistencial em exame.
8. Mantidos os honorários fixados na sentença, acrescidos de 1% (um por cento) de que trata o art. 85, § 11, do CPC, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença.
9. Juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do TEMA 905 STJ e 810 (STF).
10. Apelação do INSS a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
