
POLO ATIVO: MARILZA APARECIDA DOS SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ROBERTO ANTONIO FACCHIN FILHO - MT13947-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1024883-33.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: MARILZA APARECIDA DOS SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença que julgou improcedente o pedido de benefício de amparo assistencial previsto na Lei nº 8.742/93.
A parte autora, em suas razões recursais, alega que a sentença deve ser reformada uma vez que preenchidos os requisitos legais para concessão do benefício pleiteado, ante a comprovação da deficiência.
Contrarrazões não apresentadas.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1024883-33.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: MARILZA APARECIDA DOS SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
O benefício de prestação continuada está previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, que garante o pagamento de um salário mínimo à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, nos termos da lei.
A Lei 8.742/1993, em seu art. 20, § 2º, na redação original, dispunha que a pessoa com deficiência era aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
No entanto, mencionado dispositivo, em sua redação atual, dada pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), define, de forma mais ampla, pessoa com deficiência como aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
A Súmula n. 48 da TNU, em consonância com a nova redação da Lei 8.742/93, estabelece o seguinte: "Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, é imprescindível a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde a data do início sua caracterização".
Nesse sentido também é o entendimento do STJ:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REVALORAÇÃO DE PROVAS. POSSIBILIDADE. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. A LOAS, EM SUA REDAÇÃO ORIGINAL, NÃO FEZ DISTINÇÃO QUANTO À NATUREZA DA INCAPACIDADE, SE PERMANENTE OU TEMPORÁRIA, TOTAL OU PARCIAL. ASSIM NÃO É POSSÍVEL AO INTÉRPRETE ACRESCER REQUISITOS NÃO PREVISTOS EM LEI PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO INTERNO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O STJ tem entendimento consolidado de que a errônea valoração da prova permite a esta Corte Superior a revaloração dos critérios jurídicos utilizados pelo Tribunal de origem na apreciação dos fatos incontroversos. 2. A Constituição Federal/1988 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. 3. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/1993, em seu art. 20, § 2o., em sua redação original dispunha que a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho. 4. Em sua redação atual, dada pela Lei 13.146/2015, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. 5. Verifica-se que em nenhuma de suas edições a Lei impôs como requisito ao benefício assistencial a incapacidade absoluta. 6. Não cabe ao intérprete a imposição de requisitos mais rígidos do que aqueles previstos na legislação para a concessão do benefício. 7. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento. (Relator: Napoleão Nunes Maia Filho, STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Primeira Turma, AINTARESP - AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – 1263382, 2018.00.60293-2, data da publicação: 19/12/2018)
No que toca a renda familiar per capita, o Plenário do STF, ao julgar a ADIN n. 1.232-1/DF, no sentido de que a lei estabeleceu hipótese objetiva de aferição da miserabilidade, contudo, o legislador não excluiu outras formas de verificação de tal condição, a exemplo dos benefícios de cunho assistencial previstos nas Leis n. 9.533/1997 e 10.689/2003 e Lei n. 9.533/1997.
Posteriormente, a Suprema Corte, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE firmou entendimento no sentido de que o critério de renda per capita de ¼ do salário-mínimo não é mais aplicável, motivo pelo qual a miserabilidade deverá ser aferida pela análise das circunstâncias concretas do caso analisado.
Assim, a vulnerabilidade social deve ser aferida pelo julgador na análise do caso concreto, de modo que o critério objetivo fixado em lei deve ser considerado como um norte, podendo o julgador considerar outros fatores que viabilizem a constatação da hipossuficiência do requerente.
Importante consignar que fora dos requisitos objetivos previstos em lei, a comprovação da miserabilidade deverá ser viabilizada pela parte requerente, a qual incumbe apresentar meios capazes de incutir no julgador a convicção de sua vulnerabilidade social.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 29/05/1979, requereu benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência em 16/06/2016, o qual fora indeferido em razão de “não atende ao critério de deficiência para acesso ao BPC-LOAS” (ID 255690043 – p. 14).
Do laudo médico pericial (255690043 – p. 26), elaborado em 11/07/2017, extrai-se que a parte autora é portadora de transtorno depressivo (CID 10- F 33.1). Ao exame físico, a parte autora “apresenta patologia mental descompensada clinicamente, estando inapta temporariamente para a atividade laborativa”. O médico perito aponta o início da incapacidade em agosto de 2017 e sugeriu prazo de 180 dias para reavaliação clínico-pericial. Concluiu que “a pericianda apresenta incapacidade laborativa total e temporária. Não apresenta limitação para a vida independente”.
Destaca-se que não há que se falar em incapacidade laborativa, visto que a espécie do benefício pleiteado não está condicionada a isto, mas à averiguação de impedimento de sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com outras pessoas, conforme artigo supramencionado.
Pois bem.
Em que pese o laudo médico pericial concluir pela incapacidade laboral total e temporária, entendo que o caso merece ser analisado junto aos exames particulares colacionados aos autos, já que, conforme art. 479, do CPC, o juiz não está adstrito ao laudo.
Da análise dos documentos juntados na inicial, a parte autora colacionou relatório médico (ID 255690043 – p. 10), datado de 25/04/2016, em que é possível verificar as mesmas condições de saúde da parte autora: “portadora de transtorno depressivo recorrente grave inibindo sua vida social de maneira significativa CID 10 – F33.2”.
Assim, diante das informações constantes na perícia médica e no conjunto probatório, resta comprovado o impedimento de longo prazo da parte autora.
Do estudo socioeconômico (ID 255690043 – p. 46), verifica-se que a parte autora reside com o esposo e um filho, menor de idade, em casa própria na zona rural. A requerente relata que possui outros 03 filhos, dois residem com a tia materna e outra filha com o genitor. Extrai-se, ainda, que a renda declarada é proveniente do trabalho informal do cônjuge da parte autora que aufere, em média, R$ 500,00 e de R$ 300,00 provenientes do Programa Bolsa Família. Ainda, a requerente relatou que possui histórico de internação psiquiátrica no Hospital Adauto Botelho em Cuiabá – MT e que após internação passou a fazer uso das medicações risperidona e fluoxetina. Atualmente, faz consulta e renovação de receia no posto de saúde e está em uso de maxoplam, equilid, rivotril e risperidona (receita médica nos autos – ID 25569004 p. 11), porém está sem fazer uso porque não tem como comprar as medicações.
Concluiu a assistente social que “a família sobrevive em situação de vulnerabilidade social e situação econômica precária, embora possua fonte de renda de seu esposo não é fixa e é insuficiente para gerir sua vida e manter as despesas”. Ressaltou, também, que “a requerente é portadora de transtorno mental grave com histórico de internação psiquiátrica, comprometimento este que interfere nas respostas emocionais normais e de comprometimento esperado em situações sócias, exigindo tratamento e uso de medicações contínuas, dificultando a inserção da requerente ao mercado de trabalho”.
Considerando o entendimento jurisprudencial consolidado no sentido de que podem ser utilizados outros elementos probatórios para aferição da capacidade da família de prover suas necessidades básicas e os fatos narrados e comprovados pelos documentos anexados à exordial, resta comprovada a situação de vulnerabilidade social da parte apelante.
Dessa forma, estão comprovados os requisitos legais para a concessão do benefício de prestação continuada, sendo a reforma da sentença medida que se impõe.
Condeno o INSS a pagar honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, a incidirem sobre as prestações vencidas até a data da sentença (súmula 111 do STJ).
Juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do TEMA 905 STJ e 810 (STF).
Levando-se em conta o caráter alimentar do benefício previdenciário em exame e diante da presença dos requisitos autorizadores para o reconhecimento definitivo do direito, aliado ao fato de não ser atribuído efeito suspensivo os recursos cabíveis, em tese, contra este acórdão, defere-se a tutela provisória de urgência, nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil. Deverá a implantação ocorrer no prazo de 30 dias (obrigação de fazer), por aplicação do art. 497 do CPC.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação interposta pela parte autora para, reformando a sentença, conceder o benefício de prestação continuada, com termo inicial na data do requerimento administrativo (16/06/2016).
É o voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1024883-33.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: MARILZA APARECIDA DOS SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 20, DA LEI 8.742/93. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. COTEJO DA PERÍCIA COM O CONJUNTO PROBATÓRIO. ELEMENTOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES. APELAÇÃO PROVIDA.
1. O benefício de prestação continuada está previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, que garante o pagamento de um salário mínimo à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, nos termos da lei.
2. A avaliação da deficiência terá como escopo concluir se dela decorre incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Conforme Súmula nº 48 da TNU, o conceito de deficiência não se confunde, necessariamente, com incapacidade laborativa, devendo ser avaliado se o impedimento de longo prazo impossibilita ou não que a pessoa concorra em igualdade de condições com as demais pessoas. .
3. A controvérsia cinge-se à existência ou não de impedimento de longo prazo da parte autora. Do laudo médico pericial (255690043 – p. 26), elaborado em 11/07/2017, extrai-se que a parte autora é portadora de transtorno depressivo (CID 10- F 33.1). Ao exame físico, a parte autora “apresenta patologia mental descompensada clinicamente, estando inapta temporariamente para a atividade laborativa”. O médico perito aponta o início da incapacidade em agosto de 2017 e sugeriu prazo de 180 dias para reavaliação clínico-pericial. Concluiu que “a pericianda apresenta incapacidade laborativa total e temporária. Não apresenta limitação para a vida independente”.
4. Da análise dos documentos juntados na inicial, a parte autora colacionou relatório médico (ID 255690043 – p. 10), datado de 25/04/2016, em que é possível verificar as mesmas condições de saúde da parte autora: “portadora de transtorno depressivo recorrente grave inibindo sua vida social de maneira significativa CID 10 – F33.2”.
5. Concluiu a assistente social que “a família sobrevive em situação de vulnerabilidade social e situação econômica precária, embora possua fonte de renda de seu esposo não é fixa e é insuficiente para gerir sua vida e manter as despesas”. Ressaltou, também, que “a requerente é portadora de transtorno mental grave com histórico de internação psiquiátrica, comprometimento este que interfere nas respostas emocionais normais e de comprometimento esperado em situações sócias, exigindo tratamento e uso de medicações contínuas, dificultando a inserção da requerente ao mercado de trabalho”.
6. Diante das informações constantes na perícia médica e no conjunto probatório dos autos, resta comprovado o impedimento de longo prazo da parte autora. Assim, a reforma da sentença para conceder o benefício pleiteado é medida que se impõe.
7. Juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do TEMA 905 STJ e 810 (STF).
8. Condeno o INSS a pagar honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, a incidirem sobre as prestações vencidas até a data da sentença (súmula 111 do STJ).
9. Deferida a tutela provisória de urgência, nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil. Deverá a implantação ocorrer no prazo de 30 dias (obrigação de fazer), por aplicação do art. 497 do CPC.
10. Apelação da parte autora provida para conceder o benefício prestação continuada, com termo inicial na data do requerimento administrativo (16/06/2016).
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
