
POLO ATIVO: TALITA VLAXIO SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: THATY RAUANI PAGEL ARCANJO - RO10962-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1026237-93.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: TALITA VLAXIO SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora de sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de prestação continuada.
Em suas razões, a parte autora requer a reforma da sentença, alegando fazer jus ao benefício pleiteado, ante a comprovação da deficiência.
Não foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1026237-93.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: TALITA VLAXIO SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Nos termos do art. 203, V, da Constituição Federal e do art. 20 da Lei 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
A Lei 8.742/1993, em seu art. 20, § 2º, na redação original dispunha que a pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
No entanto, mencionado dispositivo, em sua redação atual, dada pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), define, de forma mais ampla, pessoa com deficiência como aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
A Súmula n. 48 da TNU, em consonância com a nova redação da Lei 8.742/93, estabelece o seguinte: "Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, é imprescindível a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde a data do início sua caracterização".
Nesse sentido também é o entendimento do STJ:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REVALORAÇÃO DE PROVAS. POSSIBILIDADE. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. A LOAS, EM SUA REDAÇÃO ORIGINAL, NÃO FEZ DISTINÇÃO QUANTO À NATUREZA DA INCAPACIDADE, SE PERMANENTE OU TEMPORÁRIA, TOTAL OU PARCIAL. ASSIM NÃO É POSSÍVEL AO INTÉRPRETE ACRESCER REQUISITOS NÃO PREVISTOS EM LEI PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO INTERNO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O STJ tem entendimento consolidado de que a errônea valoração da prova permite a esta Corte Superior a revaloração dos critérios jurídicos utilizados pelo Tribunal de origem na apreciação dos fatos incontroversos. 2. A Constituição Federal/1988 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. 3. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/1993, em seu art. 20, § 2o., em sua redação original dispunha que a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho. 4. Em sua redação atual, dada pela Lei 13.146/2015, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. 5. Verifica-se que em nenhuma de suas edições a Lei impôs como requisito ao benefício assistencial a incapacidade absoluta. 6. Não cabe ao intérprete a imposição de requisitos mais rígidos do que aqueles previstos na legislação para a concessão do benefício. 7. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento. (Relator: Napoleão Nunes Maia Filho, STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Primeira Turma, AINTARESP - AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – 1263382, 2018.00.60293-2, data da publicação: 19/12/2018)
Ademais, nos termos do art. 20 § 6º, da referida lei, a concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social – INSS.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 07/10/1985, requereu benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência em 29/09/2019, o qual fora indeferido em razão de “não atende ao critério de deficiência para acesso ao BPC-LOAS” (ID 259740563 – p. 18).
A controvérsia dos autos cinge-se à comprovação da deficiência.
Do laudo médico pericial (ID 259740563 – p. 186), elaborado em 13/12/2021, extrai-se que a parte apresenta diagnóstico de ceratocone em ambos os olhos (CID 10 – H18.6), com baixa visual acentuada. Conclui o expert que há incapacidade parcial e permanente.
Não obstante o laudo médico pericial tenha concluído pela inexistência de incapacidade laboral, entendo que o caso merece ser analisado em conjunto com os exames particulares colacionados aos autos, já que, conforme art. 479, do CPC, o juiz não está adstrito ao laudo.
Conforme se verifica do relatório médico juntado pela parte autora, datado em 10/06/2021, “sob o aspecto oftalmológico a paciente apresenta um quadro de ceratocone em ambos os olhos. Desta maneira sugiro que a mesma realize uma tentativa de adaptação de lente de contato rígida gás permeável em ambos os olhos e senão obtiver melhora, encaminhá-la para cirurgia de implante de anel intraestromal ou transplante penetrante de córnea em ambos os olhos”.
No caso, verifico que o impedimento de longo prazo impossibilita que a parte autora concorra em igualdade de condição com as demais pessoas.
Nesse sentido, entendimento desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA E AO IDOSO. ART. 203, V, CF/88. LEI 8.742/93. PERICIA. INCAPACIDADE COMPROVADA. COMPROVAÇÃO DE MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. Nos termos do §2º, do art. 20, da Lei 8.742/93, para concessão do benefício considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. No caso concreto, o perito afirma que o requerente apresenta visão subnormal em ambos os olhos, devido a ceratocone avançado, apresentando limitações próprias da visão, o que tem comprometida sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com outras pessoas. Sabe-se que o Magistrado não fica adstrito ao laudo pericial, podendo formar sua livre convicção por outros fatores e elementos de prova. Verifica-se que embora o laudo tenha atestado pela incapacidade parcial, mostra-se imperiosa a concessão do benefício, tendo em vista o dispendioso tratamento médico necessário. Quanto ao laudo social, relatório social, realizado em 02/03/2017, informa que o grupo familiar da parte autora é composto por 08 pessoas. Renda familiar proveniente da atividade exercida pelos adultos na agricultura, produzindo para própria subsistência na área rural do Município, pensão enviada pelo pai do apelante no valor de R$ 140,00 mensais e bolsa família de R$ 292,00 mensais. O fato de a renda familiar per capita ser superior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo não impede que outros fatores sejam considerados para a avaliação das condições de sobrevivência da parte autora e de sua família, fazendo com que a prova da miserabilidade necessária à concessão do benefício assistencial seja mais elástica. (AG 0016474-03.2008.4.01.0000 / AM, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.36 de 27/10/2011) Presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício de prestação continuada denominados amparo social à pessoa portadora de deficiência física (art. 203 da CF/88 e art. 2º, V, Lei 8.742/93), pois comprovado que a parte requerente atendeu ao REQUISITO DEFICIÊNCIA e que não possui meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. O STF, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 870.947-SE, em sede de repercussão geral, afastou a utilização da remuneração oficial da caderneta de poupança (composta pela Taxa Referencial TR mais juros de 0,5% ao mês ou 70% da meta anual da taxa Selic), prevista pelo art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, como critério de atualização monetária das condenações judiciais contra a Fazenda Pública. O STJ, em sede de recurso repetitivo (REsp 1.495.146/MG Tema 905), estabeleceu que as condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária. No que se refere aos juros de mora incidentes sobre as condenações impostas à Fazenda Pública, o STF considerou constitucional a sua fixação segundo o índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, a partir da vigência da Lei n. 11.960/2009. Apelação da parte autora parcialmente provida para, reformando a sentença, julgar procedente, em parte, o pedido autoral.
(AC 1004037-34.2018.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 05/10/2021 PAG.)
Do estudo socioeconômico (ID 259740563 – p. 174), elaborado em 27/11/021, verifica-se que a parte autora reside com o esposo e dois filhos menores de idade. A residência é cedida, construída em alvenaria. A renda familiar é composta de R$ 400,00 provenientes do Auxílio Brasil. O esposo encontrava-se desempregado. Recebem ajuda de terceiros com alimentação, roupas, calçados e esporadicamente custeios da conta de água ou energia. Concluiu a assistente social que “considerando as informações e análises contidas neste documento, caracterizou-se que o núcleo familiar da Sr.ª Talita Vlaxio Santos, possui renda mensal, mas essa está toda comprometida, vivenciando situação de vulnerabilidade socioeconômica”.
Considerando o entendimento jurisprudencial consolidado no sentido de que podem ser utilizados outros elementos probatórios para aferição da capacidade da família de prover suas necessidades básicas e os fatos narrados e comprovados pelos documentos anexados à exordial, resta comprovada a situação de vulnerabilidade social da parte apelante.
Dessa forma, estão comprovados os requisitos legais para a concessão do benefício de prestação continuada, sendo a reforma da sentença medida que se impõe.
Condeno o INSS a pagar honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, a incidirem sobre as prestações vencidas até o acórdão (Súmula 111 do STJ).
Juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do TEMA 905 STJ e 810 (STF).
Levando-se em conta o caráter alimentar do benefício previdenciário em exame e diante da presença dos requisitos autorizadores para o reconhecimento definitivo do direito, aliado ao fato de não ser atribuído efeito suspensivo os recursos cabíveis, em tese, contra este acórdão, defere-se a tutela provisória de urgência, nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil. Deverá a implantação ocorrer no prazo de 30 dias (obrigação de fazer), por aplicação do art. 497 do CPC.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação interposta pela parte autora para, reformando a sentença, conceder o benefício de prestação continuada, com termo inicial na data do requerimento administrativo (29/09/2019).
É o voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1026237-93.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: TALITA VLAXIO SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 20 DA LEI 8.742/93. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. COTEJO DA PERÍCIA COM O CONJUNTO PROBATÓRIO. ELEMENTOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Nos termos do art. 203, V, da Constituição Federal e do art. 20 da Lei 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
2. A Lei 8.742/1993, em seu art. 20, § 2º, na redação original dispunha que a pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
3. No entanto, mencionado dispositivo, em sua redação atual, dada pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), define, de forma mais ampla, pessoa com deficiência como aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
4.Do laudo médico pericial (ID 259740563 – p. 186), elaborado em 13/12/2021, extrai-se que a parte apresenta diagnóstico de ceratocone em ambos os olhos (CID 10 – H18.6), com baixa visual acentuada. Conclui o expert que há incapacidade parcial e permanente.
5. Não obstante o laudo médico pericial tenha concluído pela inexistência de incapacidade laboral, o caso merece ser analisado em conjunto com os exames particulares colacionados aos autos, já que, conforme art. 479, do CPC, o juiz não está adstrito ao laudo.
6. O relatório médico juntado pela parte autora, datado em 10/06/2021, constatou que “sob o aspecto oftalmológico a paciente apresenta um quadro de ceratocone em ambos os olhos. Desta maneira sugiro que a mesma realize uma tentativa de adaptação de lente de contato rígida gás permeável em ambos os olhos e senão obtiver melhora, encaminhá-la para cirurgia de implante de anel intraestromal ou transplante penetrante de córnea em ambos os olhos”.
7. Diante das informações constantes na perícia médica e no conjunto probatório dos autos, resta comprovado o impedimento de longo prazo da parte autora. Assim, a reforma da sentença para conceder o benefício pleiteado é medida que se impõe.
8. Juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do TEMA 905 STJ e 810 (STF).
9. Condeno o INSS a pagar honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, a incidirem sobre as prestações vencidas até a data do acórdão (Súmula 111 do STJ).
10. Deferida a tutela provisória de urgência, nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil. Deverá a implantação ocorrer no prazo de 30 dias (obrigação de fazer), por aplicação do art. 497 do CPC.
11. Apelação da parte autora provida para conceder o benefício prestação continuada, com termo inicial na data do requerimento administrativo (29/09/2019).
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
