
POLO ATIVO: EDENIR FELIX DE ALMEIDA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ANGELO MARCIO PEREIRA - GO27591
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1000406-09.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, de sentença na qual foi julgado procedente o seu pedido de concessão de benefício assistencial legalmente assegurado à pessoa portadora de deficiência, com eficácia retroativa à data do requerimento administrativo (fls. 311/315)¹.
O INSS opôs embargos de declaração a fim de que fosse sanada omissão existente na sentença, no que se refere à análise do interesse processual da autora, pelo fato de haver decorrido prazo superior a cinco anos entre a data do requerimento administrativo e a do ajuizamento da ação (fls. 318/322).
O recurso foi parcialmente provido para “fazer constar a eficácia retroativa do benefício à data do último requerimento administrativo formulado pela autora, qual seja, 06/11/2019 (evento 83)” (fls. 346/347).
Nas suas razões de apelação, a parte autora sustenta que já preenchia os requisitos para a concessão do benefício na data do primeiro requerimento administrativo. Requer a reforma da sentença para que lhe seja assegurado o pagamento retroativo das prestações do benefício, desde a data do seu primeiro requerimento apresentado em 01/02/2013 até a respectiva implantação, com a incidência de correção monetária e de juros de mora. Por fim, requer a condenação do INSS em honorários advocatícios de 20% (vinte por cento) do valor do proveito econômico obtido (fls. 351/363).
Sem contrarrazões.
É o relatório.
¹O número de folhas indicados refere-se à rolagem única, ordem crescente.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
A parte autora se insurge quanto a sentença recorrida, que lhe deferiu o benefício postulado, estabelecendo o respectivo termo inicial a partir do último requerimento administrativo que formulou, pelo fato de haver decorrido prazo superior a cinco anos entre a data do primeiro (1/2/2013) e o ajuizamento da ação.
Conforme entendimento jurisprudencial, o termo inicial do benefício deve ser estabelecido na data do requerimento administrativo, e, na ausência deste, na data da citação válida do INSS.
Quanto ao tema, o e. STJ reformulou o seu entendimento anterior, em que reconhecia a ocorrência da prescrição do fundo de direito quando transcorridos mais de 05 (cinco) anos entre o indeferimento administrativo do benefício previdenciário e a propositura da ação, e passou a adotar a orientação jurisprudencial consagrada pela Suprema Corte no julgamento da ADI n. 6.096/DF, no qual se declarou a inconstitucionalidade do art. 24 da Lei n. 13.846/2019, que deu nova redação ao art. 103 da Lei n. 8.213/91, afastando, por consequência, a incidência de prazo decadencial para o caso de indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício previdenciário (AgInt no REsp n. 1.525.902/PE, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 21/3/2023, DJe de 27/3/2023).
Assim, afastada a hipótese de incidência da prescrição do fundo de direito, é de se reconhecer apenas a prescrição quinquenal das parcelas anteriores ao lustro que antecedeu ao ajuizamento da ação, nos termos do enunciado da Súmula n. 85/STJ.
No caso sob exame, o primeiro requerimento administrativo foi formulado em 1/2/2013, e não há nos autos outros elementos probatórios que demonstrem a existência de qualquer alteração subsequente no estado de fato ou de direito da parte autora, desde então.
Ora, nos termos do art. 20 da Lei n° 8.742/93, a concessão do benefício assistencial reivindica o atendimento do requisito da deficiência, com espécies indicas na própria lei, e a configuração do estado de miserabilidade de quem o pleiteia.
De acordo com o laudo médico pericial, a parte autora apresenta o diagnóstico de transtorno bipolar com episódios maníacos e HIV desde dezembro de 2012, patologias que a incapacitam de forma total para o exercício de atividade laboral (fls. 235/252). Ademais disso, a requerente trouxe aos autos atestados públicos que indicam a existência de incapacidade desde o ano de 2013.
Logo, restou comprovado que a parte autora possui impedimento de longo prazo dotado de idoneidade para obstruir a sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas, o que ocorre desde dezembro de 2013, data do seu primeiro requerimento administrativo.
Por sua vez, o estudo social (fls. 224/230) constatou que a autora está submetida a uma situação de vulnerabilidade social, diante das condições socioeconômicas e ambientais desfavoráveis ao seu viver, por possuir escassos meios de recursos com os quais possa prover, adequadamente, a própria manutenção e, sendo portadora de doenças estigmatizantes, não ser submetida a restrições no meio social que frequenta.
Sobre o tema, destaca-se a seguinte jurisprudência desta Corte:
"CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93. PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA FÍSICA E/OU MENTAL. PERÍCIA MÉDICA. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E VIDA INDEPENDENTE. HIPOSSUFICIÊNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. 1. A Constituição Federal, em seu artigo 203, inciso V, e a Lei n. 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social) garantem um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independentemente de contribuição à seguridade social. 2. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão estabelecidos no art. 20 da Lei n. 8.742/93. São eles: i) o requerente deve ser portador de deficiência ou ser idoso com 65 anos ou mais; ii) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e iii) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade). 3. O Col. STF, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.232-1/DF, declarou que a regra constante do art. 20, § 3º, da LOAS não contempla a única hipótese de concessão do benefício, e sim presunção objetiva de miserabilidade, de forma a admitir a análise da necessidade assistencial em cada caso concreto, mesmo que o “quantum” da renda “per capita” ultrapasse o valor de ¼ do salário mínimo, cabendo ao julgador avaliar a vulnerabilidade social de acordo com o caso concreto. 4. Também o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, consagrou a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade do beneficiário por outros meios de prova, quando a renda per capita do núcleo familiar for superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo. Nesse sentido, cf. REsp 1.112.557/MG, Terceira Seção, Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 20/11/2009. 5. Firmou-se o entendimento jurisprudencial de que, para fins de cálculo da renda familiar mensal, não deve ser considerado o benefício (mesmo que de natureza previdenciária) que já venha sendo pago a algum membro da família, desde que seja de apenas 1 (um) salário mínimo, forte na aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). Precedentes. 6. Considera-se deficiente aquela pessoa que apresenta impedimentos (físico, mental, intelectual ou sensorial) de longo prazo (mínimo de 2 anos) que podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Tal deficiência e o grau de impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, consoante o § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social. 7. Na hipótese, a incapacidade da parte-autora ao trabalho restou comprovada pelo laudo médico acostado; já a condição de miserabilidade, nos termos alinhavados acima, encontra-se escudada no Estudo Social e documentos catalogados ao feito, autorizando, assim, a concessão do benefício vindicado, conforme deferido pelo juízo a quo 8. O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da citação, conforme definição a respeito do tema em decisão proferida pelo e. STJ, em sede de recurso representativo da controvérsia (REsp 1369165/SP), respeitados os limites do pedido inicial e da pretensão recursal, sob pena de violação ao princípio da ne reformatio in pejus. 10. Os honorários advocatícios devem ser majorados para 12% (doze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a prolação da sentença, em razão do disposto no art. 85, § 11º do CPC. 11. A correção monetária e os juros de mora devem observar os termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. 12. Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora provida para que a DIB e os honorários advocatícios sigam o disposto nos itens 9 e 10. (AC 1002941-47.2019.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 15/08/2023)" (grifos nossos).
Desta forma, tendo em vista que nos autos não contém prova que demonstre qualquer modificação temporal no estado fático da requerente, não há dúvida quanto à percepção do benefício assistencial, com efeitos retroativos à data do seu primeiro requerimento administrativo, em 1/2/2013.
Por fim, não merece reforma a sentença que fixou os honorários advocatícios no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da prolação da sentença, pois se encontra em consonância com o disposto no art. 85, §§ 2º e 3º, I, do CPC e da súmula nº 111 do STJ.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação interposta pela parte autora para, reformando parcialmente a sentença, fixar como termo inicial do benefício a data do primeiro requerimento administrativo (1/2/2013), observada a prescrição quinquenal e compensados os valores recebidos a títulos de benefício inacumulável.
É o voto.
Brasília, 24 de abril de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1000406-09.2023.4.01.9999
EDENIR FELIX DE ALMEIDA
Advogado do(a) APELANTE: ANGELO MARCIO PEREIRA - GO27591
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL LEGALMENTE ASSEGURADO ÁPESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. DATA DO PRIMEIRO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CABIMENTO. APLICAÇÃO DO PRECEDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Nos termos da jurisprudência pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça, inexistindo alteração de fato ou de direito na condição do beneficiário, o termo inicial para a concessão do benefício é a data do primeiro requerimento administrativo - quando existe mais de um -, ocasião em que já estavam configurados os requisitos legais necessários à sua obtenção.
3. Comprovado que a parte autora atende aos requisitos para a concessão do benefício assistencial destinado à pessoa portadora de deficiência, e não existindo elementos probatórios demonstrando a ocorrência de qualquer alteração no seu estado de fato ou de direito, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo.
4. Apelação da parte autora a que se dá parcial provimento para, reformando parcialmente a sentença, fixar como termo inicial do benefício a data do primeiro requerimento administrativo (1/2/2013), observada a prescrição quinquenal.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto da relatora.
Brasília, 24 de abril de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
