
POLO ATIVO: DEIVID COSTA DOS SANTOS e outros
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: LIDIANE DIAS DA SILVA - DF48604-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1050882-94.2022.4.01.3400
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido de concessão de benefício assistencial à pessoa portadora de deficiência, no valor de 01 (um) salário mínimo, desde a data da do ajuizamento da ação (fls. 467/472) ¹.
Nas suas razões, a parte recorrente sustenta haver auferido o benefício assistencial legalmente assegurado à pessoa com deficiência, o que ocorreu até dezembro de 01/03/2021. Relata que o benefício foi cessado indevidamente, porque a parte apelada entendeu que a sua situação de miserabilidade foi superada, o que, todavia, não aconteceu. Pugna pela reforma da sentença para alterar a DIB, de modo que ela seja fixada na data da cessação administrativa do benefício (fls. 475/482).
Embora intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
¹ Número de folhas refere-se à rolagem única em ordem crescente.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Do benefício assistencial à pessoa com deficiência
No termos do art. 203, inciso V e da lei nº 8.742/93 é assegurado o benefício de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independente de contribuição à seguridade social.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Do estado existencial de miserabilidade
Em relação ao estado de miserabilidade, o Plenário do STF, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, entendeu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento de Recurso Especial 1112447/MG, submetido ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. “Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009) (grifos nossos)
Ressalta-se, ainda, que se tem utilizado como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Neste sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem constatar a hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Da deficiência
Considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que apresenta impedimentos de longo prazo (mínimo de dois anos), de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, inviabilizam a sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (§ 2º do art. 20, da Lei 8.742/93).
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, respectivamente, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
Do caso concreto
Verifica-se pelo laudo social (fls. 182/231) realizado em 10/04/2023, que a parte autora reside com 02 (duas) irmãs e 02 (sobrinhos) menores. A renda do grupo familiar é proveniente do trabalho das duas irmãs, Aparecida Costa, 43 anos, com renda mensal no valor de R$ 1.515,99 (Um mil quinhentos e quinze reais e noventa e nove centavos.) e Cristiane Costa dos Santos, 41 anos, com renda mensal no valor de R$ 1.203,00 (Um mil, duzentos e três reais).
O imóvel é próprio e os móveis e eletrodomésticos que o guarnecem estão em péssimo estado de conservação. Além de não possuir as adaptações necessárias para atender, de forma mais adequada, a deficiência da parte autora. As despesas do grupo familiar totalizam o valor aproximado de R$ 1.600,00 (Um mil e seiscentos reais).
Ora, verifica-se que a renda do grupo familiar é baixa e no grupo familiar possuem, além da parte autora, pessoa com deficiência, dois menores, sendo uma criança de 13 (treze) anos e outra com 10 (dez) meses, aumentando a necessidade de auxílio capaz de assegurar a subsistência da família.
Nas considerações finais, afirmou o assistente social: “O requerente é pessoa com deficiência e se encontra em estado vulnerabilidade social e hipossuficiência, preenchendo os requisitos para o restabelecimento do benefício de prestação continuada”. (475/482).
Da perícia médica realizada no dia 20/06/2023, extrai-se que a parte autora é portadora de “CID 10: F72.0, G80.0, R47.1.- Paralisia cerebral tetraparética espástica e Retardo mental grave”.
Em sua conclusão apontou o perito: “O periciando apresenta incapacidade laboral permanente, omniprofissional, total e definitiva para o trabalho e exige acompanhamento permanente de outra pessoa para realização de atos da vida diária”.
Pois bem, em detida análise do laudo social e do laudo pericial, resta evidente que a parte requerente se encontra em situação existencial de vulnerabilidade e possui deficiência, desde o nascimento, não possuindo meios próprios através dos quais possa prover a sua subsistência.
Dessa forma, a perícia constatou que, desde o nascimento, há incapacidade permanente da parte autora, ora recorrente, para qualquer atividade, deixando claro, assim, a existência da referida incapacidade entre a data da cessação do benefício auferido anteriormente e a data da realização da perícia, neste processo.
No que diz respeito ao critério de miserabilidade, verifica-se que ao tempo da cessação anterior do benefício, o irmão da parte autora esteve um tempo fazendo parte do grupo familiar, estando, porém, desempregado e sem qualquer possibilidade de contribuir para as despesas da família, conforme demonstra extrato do CNIS de fls. 42.
Logo, desde a data de cessação do benefício anterior, a parte autora, ora apelante, vivenciava o estado existência de miserabilidade.
Nesse contexto, a sentença deve ser reformada, para que seja alterada a data da DIB, que passará a coincidir cos a data relativa à cessação do benefício anterior, ou seja, 01/03/2021.
Finalmente, quanto à correção monetária e aos juros de mora, os termos do que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal no RE 870.947 (tema 810) e pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar o REsp 1.495.146/MG (Tema 905), devem ser aplicados o IPCA-E para a atualização monetária e os juros moratórios nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação da Lei nº 11.960/09, até o dia 8/12/2021, depois do que passará a incidir apenas a taxa SELIC, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional - EC n.º 113/2021, até o efetivo pagamento.
O Manual de Cálculos da Justiça Federal, já está harmonizado com a jurisprudência das Cortes Superiores. Desse modo, sobre as parcelas em atraso devem incidir juros de mora e correção monetária apurados nos seus termos.
Ante o exposto, dou provimento à apelação interposta pela parte autora para reformar a sentença, alterando a data da DIB, que ora fixo em 01/03/2021.
Os honorários advocatícios recursais ficam fixados em quantia equivalente a 1% do valor da condenação.
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
107
APELAÇÃO CÍVEL (198)1050882-94.2022.4.01.3400
DEIVID COSTA DOS SANTOS e outros
Advogado do(a) APELANTE: LIDIANE DIAS DA SILVA - DF48604-A
Advogado do(a) REPRESENTANTE: LIDIANE DIAS DA SILVA - DF48604-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. CABIMENTO.ALTERAÇÃO DA DIB. CESSAÇÃO ADMINISTRATIVA INDEVIDA.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime, e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Comprovado pelo laudo social e relatório médico que a parte requerente preenche os requisitos (vulnerabilidade social e deficiência) para a concessão do benefício assistencial, este é devido desde a data da sua cessação anterior.
3. Apelação da parte autora provida para, reformando a sentença, alterar a DIB para a data da cessação do benefício (01/03/2021).
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos temos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
