
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ADRIEL GUILHERME SILVA BUSATO e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: GILMAR BENTO DE SALES - MT12338-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1007261-67.2024.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente o pedido de concessão do benefício assistencial à pessoa com deficiência, no valor de 01 (um) salário mínimo mensal, desde a data da citação.
Houve ainda a condenação da aludida autarquia no pagamento das custas e dos honorários advocatícios, estes fixados em 20% (vinte por cento) do valor das parcelas vencidas (fls. 147/150).¹
Nas suas razões, o INSS pugna pela reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido inicial, diante da ausência do critério da miserabilidade, alegando que a renda per capita do grupo familiar é de cerca de metade de um salário mínimo. Também formulou pedidos subsidiários relacionados à prescrição e à isenção de custas processuais, entre outros (fls. 154/168).
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 170/172).
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da apelação (fls. 203/205).
É o relatório.
¹Os números de folhas indicados referem-se à rolagem única, ordem crescente.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
Nos termos do art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e da Lei n. 8.742/93, é assegurado o benefício de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independente de contribuição à seguridade social.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos de idade ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Da situação existencial de miserabilidade
Em relação ao estado de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, decidiu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é o mais adequado para a aferição da situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, quando do julgamento de Recurso Especial 1112557/MG, submetido ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. ACF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Ressalte-se, ainda, que se tem utilizado como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Nesse sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a situação existencial de vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem a constatação, ou não, da hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal, portanto, apenas uma referência.
Da pessoa portadora de deficiência
Considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo (mínimo de dois anos) “de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (Lei 8.742/93, art. 20, §§ 2º e 10).
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, respectivamente, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
O caso concreto
Verifica-se que o laudo médico pericial (fls. 108/109) atestou que a parte autora é portadora de Síndrome de Down, apresentando limitações físicas, o que torna necessário o seu acompanhamento regular com fisioterapia motora e fonoaudióloga, além de terapia ocupacional e acompanhamento em consultas regulares com médico pediatra.
Logo, restou comprovada a existência de impedimento de longo prazo e capaz de obstruir a participação plena e efetiva do autor, ora recorrido, na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Por sua vez, extrai-se do laudo social (fls. 122/123) que a parte requerente reside com os seus genitores e dois irmãos. O genitor trabalha como motorista na empresa Amaggi e recebe aproximadamente R$ 2.900,00 (dois mil e novecentos reais). Constatou-se que a família reside em casa cedida pela Amaggi e recebe cestas básicas da APAE.
Nessa seara, após análise do laudo pericial e do estudo social trazidos aos autos, constata-se que a requerente se encontra em situação existencial de vulnerabilidade social, considerando-se um núcleo familiar composto por 5 (cinco) pessoas, no qual a renda familiar per capita é inferior a ½ salário mínimo, parâmetro atualmente utilizado na jurisprudência.
Sendo assim, a insurgência do INSS contra a sentença que deferiu o benefício assistencial não merece prosperar, ante a inegável comprovação do preenchimento dos requisitos legais exigidos para a concessão do benefício assistencial, nos termos do art. 20 da Lei n. 8.742/93.
Dos pedidos subsidiários
Conforme se observa da apelação, o INSS formulou os seguintes pedidos subsidiários (fls. 167/168):
“a. a observância da prescrição quinquenal;
“b. a fixação dos juros moratórios nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97, alterado pela Lei 11.960/09, bem como a fixação dos índices de correção monetária conforme Tema 905/STJ, sem prejuízo da aplicação imediata da Emenda Constitucional nº 113, de 8 de dezembro de 2021, segundo a qual nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente;
“c. a fixação do percentual de honorários advocatícios no patamar mínimo (cf. artigo 85, § 3º, inciso I do NCPC), com a limitação da verba honorária ao comando do Súmula 111-STJ;
“d. a declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias.”
Quanto à prescrição quinquenal, nada há que ser decidido, porque a sentença recorrida já tratou da questão em sua parte dispositiva, ordenando a observância do prazo prescricional.
Em relação aos juros moratórios e à correção monetária, a sentença objeto de apelação também não carece de reforma, visto que determinou a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que, como se sabe, se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
No que se refere ao pedido do INSS direcionado à sua isenção do pagamento das custas processuais, também não lhe assiste razão, uma vez que não há previsão nesse sentido na nova redação da Lei n. 7.603/2001, dada pela Lei n. 11.077/2020, do Estado do Mato Grosso, conforme se pode ver abaixo:
Art. 1º As custas relativas às atividades desenvolvidas pelos órgãos do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso no foro judicial, inclusive no exercício da jurisdição federal, serão cobradas de acordo com os valores, notas explicativas e parâmetros estabelecidos nas Tabelas “A” - Custas da Segunda Instância, “B” - Custas da Primeira Instância, “C” - Custas dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania e “D” - Custas dos Cartórios Não Oficializados. (Redação dada pela Lei nº 11077, D.O. de 13/01/2020)
Parágrafo único O recolhimento dos valores relativos aos atos praticados no Foro Judicial, previstos no art. 1º desta Lei, será feito por meio de Guia do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, vinculado ao respectivo processo, em qualquer instituição financeira. (Redação dada pela Lei nº 11077, D.O. de 13/01/2020)
[...]
Art. 3º Além dos casos previstos em lei, são isentos do pagamento de emolumentos, despesas e custas:
I - o Estado e o Município, salvo quanto aos valores despendidos pela parte vencedora da demanda; (Redação dada pela Lei nº 11077, D.O. de 13/01/2020)
II - o réu pobre, nos processos criminais;
III - qualquer interessado, nos processos relativos a menor em situação de risco (ECA);
IV - o Ministério Público, nos atos de ofício.
V - os advogados, na execução dos honorários advocatícios. (Acrescentado[a] pela Lei nº 11077, D.O. de 13/01/2020)
[...]
Ademais, sobre o tema em destaque, vale conferir o seguinte precedente desta Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADORA RURAL. QUALIDADE DE SEGURADA RECONHECIDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO PROCEDENTE. [...] 12. Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção. A Lei nº 7.603/01 do Estado de Mato Grosso, alterada pela lei 11.077/20, não prevê isenção para União. 13. Apelação da parte autora provida.(AC 1011363-06.2022.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 19/03/2024 PAG.)
Sendo assim, não há fundamento legal para o acolhimento do pedido direcionado à isenção de custas processuais, formulado pelo INSS.
Por outro lado, entendo assistir razão à autarquia apelante no tocante aos honorários advocatícios, uma vez que estes devem ser reduzidos para 10% (dez por cento), em razão da reduzida complexidade da causa.
Com esses fundamentos, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS, apenas para reduzir os honorários advocatícios fixados na sentença em 20% (vinte porcento), para 10% (dez por cento).
Em razão da sucumbência do autor em parte mínima do pedido (CPC, art. 86, parágrafo único), condeno o INSS no pagamento de honorários advocatícios recursais em quantia equivalente a 1% (um por cento) do valor da condenação.
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
51APELAÇÃO CÍVEL (198)1007261-67.2024.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
A. G. S. B. e outros
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA: SÍNDROME DE DOWN. SENTENÇA JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. CABIMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 20 DA LEI 8.742/93 E DA JURISPRUDÊNCIA DO STF. CUSTAS PROCESSUAIS. ESTADO DO MATO GROSSO. AUSÊNCIA DE ISENÇÃO DO INSS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONSECTÁRIOS DA CONDENAÇÃO. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime, e c) ter renda mensal familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Restou comprovado nos autos que a parte autora atende aos requisitos para a concessão do benefício assistencial à pessoa portadora de deficiência, e não há elementos probatórios capazes de demonstrar a existência de qualquer alteração no seu estado de fato ou de direito, desde a data da citação da parte ex-adversa.
3. O INSS não goza de isenção quanto ao pagamento das custas processuais, uma vez que não há previsão nesse sentido na nova redação da Lei n. 7.603/2001, dada pela Lei n. 11.077/2020, do Estado do Mato Grosso. Com efeito, assim já decidiu esta Corte Regional: "Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção. A Lei nº 7.603/01 do Estado de Mato Grosso, alterada pela lei 11.077/20, não prevê isenção para União." (AC 1011363-06.2022.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 19/03/2024 PAG.).
4. Em se tratando de causa de reduzida complexidade, os honorários advocatícios devem ser reduzidos, de 20% (vinte por cento), para o percentual de 10% (dez por cento) do valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça
5. Não merece reforma a sentença recorrida no ponto em que determina a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal, visto que este se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
6. Apelação interposta pelo INSS parcialmente provida, apenas para reduzir os honorários advocatícios fixados na sentença para 10% (dez por cento).
ACÓRDÃO
Decide a nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
