
POLO ATIVO: CARLOS ALBERTO BARBOSA DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ALEXANDRE VIEIRA DE MELO - GO25912-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1010384-73.2024.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, de sentença na qual foi rejeitado o pedido de concessão de benefício assistencial, considerando que a perícia judicial realizada não comprovou a sua deficiência, nos moldes estabelecidos pela Lei 8.742/93, c/c com a Lei 13.146/15.
Houve, ainda, a condenação da recorrente no pagamento das custas e despesas processuais, bem como em honorários advocatícios, ficando suspensa a exigibilidade dessas verbas, em face da concessão da gratuidade da justiça.
Em suas razões, a apelante suscita, preliminarmente, a necessidade de anulação da perícia, requerendo a produção de nova prova técnica. No mérito, alega a suficiência da prova documental produzida para a comprovação do seu impedimento de longo prazo, pleiteando a reforma da sentença para que o seu pedido seja julgado procedente.
Sem contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
A apelação interposta pela parte autora preenche os requisitos de admissibilidade e, portanto, merece ser conhecida.
Da nulidade processual - realização de nova perícia por médico especialista
Não tem razão a parte autora quando alega a nulidade da sentença, em razão de ter sido fundamentada em laudo pericial produzido por médico destituído de especialidade.
Esta Corte tem decidido que não há necessidade de designação de médico especialista para a realização da perícia, o que somente encontra justificativa em situações excepcionais, diversamente do que acontece na hipótese ora submetida a julgamento.
Ora, a perícia foi realizada por médico de confiança do juízo, que respondeu a todos os quesitos apresentados pelas partes, além de estar bem fundamentado e à margem de qualquer vício dotado de habilidade para autorizar a realização de uma nova prova técnica.
Em caso semelhante assim decidiu esta Corte:
“Não há nulidade da perícia judicial quando esta é de lavra de profissional médico perito do juízo que respondeu aos quesitos apresentados, mesmo não sendo especialista na área da doença alegada. O título de especialista em determinada área da medicina não é requisito para ser perito médico do juízo, inexistindo cerceamento de defesa na hipótese” (AC200538040006621, Rel. Conv. Juiz Federal Mark Yshida Brandão, TRF da 1ª Região – Primeira Turma Suplementar, e-DJF1 p. 77 de 01/06/2011).
Da mesma forma no Superior Tribunal de Justiça a matéria foi assim decidida:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. PROVA PERICIAL. NOMEAÇÃO DE PERITO MÉDICO ESPECIALISTA COMO PRESSUPOSTO DE VALIDADE. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES. CERCEAMENTO DE DEFESA. INCAPACIDADE. SÚMULA 7/STJ.
1. O presente recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo 3/STJ: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".
2. A jurisprudência desta Corte perfilha entendimento no sentido de que a pertinência da especialidade médica, em regra, não consubstancia pressuposto de validade da prova pericial, de forma que o perito médico nomeado é quem deve escusar-se do encargo, caso não se julgue apto à realização do laudo solicitado.
3. O acolhimento da pretensão recursal requer o revolvimento da matéria de prova, providência inviável em sede de recurso especial em razão do óbice contido na Súmula 7/STJ.
4. Agravo interno não provido.
(AgInt nos EDcl no AREsp 1696733/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/03/2021, DJe 18/03/2021)
Trata-se de prova técnica realizada por profissional habilitado, equidistante das partes e submetido ao crivo do contraditório, inserindo todos os elementos necessários à avaliação da existência de incapacidade alegada pela parte recorrente.
Ressalta-se ainda, que foram objetivas e claras as respostas ofertadas aos quesitos formulados pelas partes, possibilitando o adequado acertamento da lide, não havendo como referir a configuração de qualquer nulidade da sentença.
Também é desnecessária a reabertura da instrução para a produção de prova oral, uma vez que a incapacidade depende da produção de prova técnica, sendo irrelevante a ouvida de testemunhas.
Mérito
Nos termos do art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e da Lei n. 8.742/93, é assegurado o benefício de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independente de contribuição à seguridade social.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos de idade ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Da situação existencial de miserabilidade
Em relação ao estado de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, decidiu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, de sua vez, quando do julgamento de Recurso Especial 1112557/MG, submetido ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. "Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).
Utiliza-se como parâmetro razoável a renda per capita igual ou inferior a ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Nesse sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem a constatação da hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Da deficiência
Considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo (mínimo de dois anos) “de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (Lei 8.742/93, art. 20, §§ 2º e 10).
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, respectivamente, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
Do caso concreto
Na hipótese ora submetida a julgamento, o laudo da perícia judicial constatou que a parte autora, então contando com 50 (cinquenta) anos de idade, vendedor de roupas é “Portador de transtorno afetivo bipolar hipomaníaco associado a depressão a partir de julho de 2014, conforme documentos médicos, realizado tratamento clínico até os dias atuais com uso de carboltium, carbamazepina, olanzapina e participando de grupos terapêuticos”.
O Perito afirmou que “Não comprova a incapacidade para suas atividades habituais”.
Em que pese a parte autora impugnar o laudo pericial, requerendo a decretação da sua nulidade, porque não foi elaborado por médico perito especialista em psiquiatria, constata-se que o seu subscritor respondeu, adequadamente, a todos os quesitos formulados pelas partes, motivando, inclusive, a apresentação de laudo complementar, no qual o perito reforçou as conclusões inseridas no laudo inicial, assim afirmando: "O autor não portador, no momento, de doença incapacitante para sua atividade laboral habitual, conforme detalhado no item Exame físico direcionado desta" (fl. 201/206).
Assim sendo, não restou caracteriza a existência de deficiência para fins de concessão do benefício assistencial, considerando que a patologia diagnosticada não ocasiona impedimento de longo prazo capaz de inviabilizar a participação plena e efetiva da parte autora na sociedade, nos termos do §2º, do art. 20, da Lei n. 8.742/93.
Os demais elementos probatórios produzidos não são suficientes para afastar as conclusões do laudo pericial.
Dispõe o art. 480 do Código de Processo Civil que o juiz deve determinar, de ofício ou a requerimento da parte, a realização de nova perícia quando a matéria não estiver suficientemente esclarecida. Não é a hipótese dos autos.
Com efeito, com o já ficou assentado, a perícia médica judicial foi realizada sob o crivo do contraditório, sem vícios, e por profissional da confiança do juízo, que respondeu a todos os quesitos apresentados pelas partes, estando bem fundamentado, sendo suficiente, para autorizar a formação do convencimento livre e motivado do juízo, afastando a alegação encaminhada à decretação da sua nulidad, co o quer a apelante.
Com esses fundamentos, nego provimento à apelação interposta pela parte autora.
Fixo os honorários advocatícios recursais, devidos pela parte autora, em quantia equivalente a 1% (um por cento) do valor atualizado da causa, ficando suspensa a respectiva exigibilidade, em razão da gratuidade da justiça concedida nos autos.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
116
APELAÇÃO CÍVEL (198)1010384-73.2024.4.01.9999
CARLOS ALBERTO BARBOSA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE VIEIRA DE MELO - GO25912-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA PORTADORIA DE DEFICIÊNCIA. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO DA INEXISTÊNCIA DE DEFICIÊNCIA. REJEIÇÃO DA NULIDADE DO LAUDO PARA A REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA AFASTADA. APELAÇAO DA PARTE AUTORA NÃO PROVIDA.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos de idade ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime; e c) ter renda mensal familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade). Utiliza-se como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
2. Não faz jus ao benefício a pessoa que, apesar de apresentar limitação funcional, não possui impedimento de longo prazo capaz de inviabilizar a sua participação plena e efetiva em sociedade.
3. Estando a matéria suficientemente esclarecida, não se verifica a necessidade de realização de nova perícia, com médico especialista, nos termos do art. 480 do Código de Processo Civil.
4. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação interposta pela parte autora, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora
