
POLO ATIVO: RAWILLEAN DA COSTA NOBRE e outros
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: VICTOR THEMISTOCLES COSTA TAVARES - PA23486-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002646-71.2019.4.01.3900
APELANTE: RAWILLEAN DA COSTA NOBRE, MARIA SANTANA SOUZA COSTA, KEILA CHRYS DE SOUZA COSTA
Advogado do(a) APELANTE: VICTOR THEMISTOCLES COSTA TAVARES - PA23486-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de recurso interposto pelo espólio da Sra. KEILA CHRYS DE SOUZA COSTA contra sentença que julgou improcedente o pedido de restabelecimento de benefício de prestação continuada.
Nas razões de recurso sustenta que ficou comprovado os requisitos necessários para o restabelecimento do benefício assistencial. Requer ainda a condenação do INSS ao pagamento de indenização por danos morais.
Houve apresentação de contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002646-71.2019.4.01.3900
APELANTE: RAWILLEAN DA COSTA NOBRE, MARIA SANTANA SOUZA COSTA, KEILA CHRYS DE SOUZA COSTA
Advogado do(a) APELANTE: VICTOR THEMISTOCLES COSTA TAVARES - PA23486-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
Nos termos do art. 20, caput, da Lei nº 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Para fazer jus ao benefício assistencial, o idoso ou o deficiente devem comprovar o seu estado de miserabilidade, sendo que, de acordo com a legislação em vigor, a renda mensal per capita da família não pode ultrapassar ¼ do salário-mínimo.
Na análise do requisito da renda per capita, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Recursos Extraordinários nº 567.985/MT e 580.963/PR, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, da lei nº 8.742/93, e a inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, em observância ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da isonomia, com a finalidade de alargar os critérios de aferição da hipossuficiência, não limitando apenas à análise da renda inferior a 1/4 do salário mínimo, bem como para determinar a exclusão do cálculo da renda familiar per capita os benefícios assistenciais conferidos a deficientes e os benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo percebidos por idosos.
In casu, o pedido formulado na inicial é o “restabelecimento do benefício assistencial nº 544.916.017-4, desde a sua suspensão em 01/05/2011”. A suspensão ocorreu em razão da alegada ausência de hipossuficiência socioeconômica, uma vez que a genitora da beneficiária possuía renda por ser servidora pública estadual.
Constata-se que a beneficiária do BPC veio a óbito no dia 07/07/2020 (ID 334479119).
A genitora, Sra. Maria Santana Souza Costa, se habilitou como sucessora. O INSS não opôs ao pedido de habilitação.
Neste ponto, embora o BPC seja pessoal e intransferível, os sucessores têm direito de receber os valores reconhecidos no processo até a data do falecimento do beneficiário, nos termos do parágrafo único do artigo 23 do Decreto n.º 6.214/2007:
"Art. 23. O Benefício de Prestação Continuada é intransferível, não gerando direito à pensão por morte aos herdeiros ou sucessores.
Parágrafo único. O valor do resíduo não recebido em vida pelo beneficiário será pago aos seus herdeiros ou sucessores, na forma da lei civil."
Portanto, os sucessores têm legitimidade para receber os valores que porventura não foram pagos ao beneficiário falecido, uma vez que esses valores já estavam incorporados ao patrimônio jurídico do falecido na data do óbito.
Realização de perícia indireta
Na situação em análise, não é aplicável o disposto no art. 1.013, § 3º, do Código de Processo Civil (causa madura) à espécie, uma vez que o processo não está em condições de ser julgado, visto que a perícia socioeconômica não foi realizada.
A referida perícia é prova essencial em casos que envolvem o restabelecimento do benefício assistencial suspenso em decorrência da superação da condição de hipossuficiência socioeconômica do beneficiário (art. 20, §§ 3º e 6º ,da Lei n.º 8.742/93).
Com relação à possibilidade de produção de prova indireta, destaco precedentes desta Corte:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA E AO IDOSO. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93. ÓBITO DA PARTE AUTORA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. ESTUDO SOCIAL REALIZADO POR MEIO DE PERÍCIA INDIRETA. POSSIBILIDADE. 1. Recurso de apelação interposto contra sentença que negou a concessão de benefício assistencial. 2. Embora o benefício assistencial seja pessoal e intransferível, os sucessores têm direito de receber os valores reconhecidos no processo até a data do falecimento do beneficiário, nos termos do parágrafo único do artigo 23 do Decreto nº 6.214/2007. 3. Os sucessores têm legitimidade para receber os valores que não foram pagos ao segurado falecido, uma vez que esses valores já estavam incorporados ao patrimônio jurídico do falecido na data do óbito. 4. No presente caso, o falecimento da parte autora ocorreu antes da realização do estudo social. O estudo social é uma prova essencial em casos que envolvem a concessão do benefício assistencial, conforme previsto nos §§ 2º e 6º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93. É necessário realizar um estudo social indireto para comprovar a condição de miserabilidade. 5. A sentença deve ser anulada e os autos devem retornar ao juízo de origem para dar continuidade ao processo, com a habilitação dos herdeiros e a realização do estudo social indireto. 6. Apelação parcialmente provida. (AC 1016648-43.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/03/2024). (Destaquei).
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ÓBITO DA AUTORA NO CURSO DOS AUTOS. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. RETORNO DOS AUTOS AO JUIZO DE ORIGEM. NECESSIDADE REALIZAÇÃO DE PERÍCIAS INDIRETAS. APELAÇÃO PROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra sentença que julgou extinto o processo sem resolução do mérito, por ser a ação considerada intransmissível, nos termos do art. 485, inciso IX, do Código de Processo Civil, em razão do óbito da parte autora no curso do processo, antes da realização das perícias médica e social. 2. O óbito da parte autora no curso dos autos não impede aos sucessores o recebimento dos valores atrasados devidos, até a data do falecimento, não havendo que se falar em ilegitimidade ativa ou falta de interesse processual, sob pena de ofensa ao direito sucessório. 3. O feito não se encontra maduro para julgamento, considerando que não foi concluída a fase instrutória, devendo a sentença ser anulada, com o retorno à origem para o devido prosseguimento, procedendo-se à habilitação dos herdeiros e realização de perícia médica e social indiretas. Precedente. 4. Apelação da parte autora a que se dá provimento. (AC 1005917-85.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 05/04/2024). (Destaquei).
Ante o exposto, a sentença deve ser anulada, de ofício, com o retorno dos autos à origem, para a realização da perícia socioeconômica indireta e posterior prosseguimento do feito.
Apelação da parte autora prejudicada.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002646-71.2019.4.01.3900
APELANTE: RAWILLEAN DA COSTA NOBRE, MARIA SANTANA SOUZA COSTA, KEILA CHRYS DE SOUZA COSTA
Advogado do(a) APELANTE: VICTOR THEMISTOCLES COSTA TAVARES - PA23486-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RESTABELECIMENTO. ÓBITO DA BENEFICIÁRIA NO CURSO DO PROCESSO. LEGITIMIDADE DOS SUCESSORES. PERÍCIA SOCIOECONÔMICA INDIRETA. NECESSIDADE. SENTENÇA ANULADA.
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Nos termos do art. 20, caput, da Lei nº 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
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Embora o BPC seja pessoal e intransferível, os sucessores têm direito de receber os valores reconhecidos no processo até a data do falecimento do beneficiário, nos termos do parágrafo único do artigo 23 do Decreto n.º 6.214/2007.
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Nos casos de suspensão ou cessação do benefício assistencial, a análise da condição de hipossuficiência é requisito essencial para o restabelecimento do benefício, conforme previsto nos §§ 3º e 6º do art. 20 da Lei n.º 8.742/93.
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Precedentes desta Corte reconhecem a possibilidade de perícia indireta para aferição das condições socioeconômicas do falecido, legitimando o recebimento de valores atrasados por sucessores.
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Sentença anulada, de ofício, com retorno dos autos à origem para a realização da perícia socioeconômica indireta e posterior prosseguimento do feito. Apelação prejudicada.
Tese de julgamento:
"1. É cabível a realização de perícia socioeconômica indireta para fins de comprovação da condição de miserabilidade e eventual restabelecimento de benefício assistencial cessado antes do falecimento do beneficiário."
Legislação relevante citada:
Lei n. 8.742/1993, art. 20.
Decreto n. 6.214/2007, art. 23, parágrafo único.
Código de Processo Civil/2015, art. 1.013, §3º.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, anular a sentença de ofício e declarar prejudicada a apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília - DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
