
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:EDIEDER LEMES DE LIMA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: JOSIANE CARNEIRO NUNES - GO25053
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1014423-50.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDIEDER LEMES DE LIMA
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL em face da sentença que julgou procedente o pedido de restabelecimento de benefício de amparo assistencial à pessoa com deficiência (LOAS), a partir da data da cessação, ocorrida em 01/12/2021.
Nas razões recursais (ID 335907643, fls. 153 a 253), a parte apelante alega que a genitora da parte autora possui vínculo empregatício, auferindo renda de R$ 1.400,00 na época da cessação. Também destaca que o padrasto é empresário e possui veículos em seu nome. Por fim, questiona os índices de correção monetária e de juros moratórios.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 335907643, fls. 257 a 264). Argumenta a parte apelada que a renda da genitora não é permanente, pois o vínculo será extinto em 10/2023. Destaca também que a microempresa oferece consertos de bicicletas, sendo baixíssimos os ganhos decorrentes da atividade.
É o relatório.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1014423-50.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDIEDER LEMES DE LIMA
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Inicialmente, assente-se a dispensa de remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da dispensa contida na norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp. 1735097/RS; REsp. 1844937/PR).
A pretensão formulada pela parte autora na inicial é de concessão de benefício de amparo assistencial à pessoa com deficiência previsto na Lei nº 8.742/93.
É cediço que é necessária a presença cumulativa dos seguintes requisitos para concessão do benefício de prestação continuada: a) ser a pessoa portadora de deficiência ou idosa (65 anos ou mais); e b) comprovar a condição de miserabilidade nos termos do art. 203, V, da Constituição Federal.
O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL alega em suas razões de apelação que não restou ou restou demonstrada nos autos a condição de miserabilidade da parte autora, como exigido pelo art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93, para fins de concessão do benefício de prestação continuada, razão pela qual pugna pela reforma da sentença.
Como a questão submetida a exame em sede de apelação cinge-se à demonstração da hipossuficência financeira da parte autora, limito-me a analisar a referida questão e não procedo ao exame da comprovação de ser a parte autora portadora de deficiência que acarreta impedimento de longo prazo, já reconhecida pela sentença.
Pois bem.
A respeito da miserabilidade, assim dispõe o art. 20 da Lei nº 8.742/93:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
(...)
§ 3º Observados os demais critérios de elegibilidade definidos nesta Lei, terão direito ao benefício financeiro de que trata o caput deste artigo a pessoa com deficiência ou a pessoa idosa com renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 14.176, de 2021)
(...)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3º deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 1998)
§9º Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
(...)
§11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
§11-A. O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o disposto no art. 20-B desta Lei. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021)
(...)
§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
Relativamente à transcrita norma do art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93, o Eg. STJ, quando do julgamento do REsp n. 1.112.557/MG, sob o regime de recursos repetitivos, firmou o entendimento de que “a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade” (REsp n. 1.112.557/MG, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, julgado em 28/10/2009, DJe de 20/11/2009.)
A referida norma também passou pelo crivo do Plenário do STF quando do julgamento dos RE 567985 e 580963, e da Reclamação nº 4374, oportunidade em que foi declarada a inconstitucionalidade parcial da norma, sem declaração de nulidade.
Diante da constatação de que uma nova realidade normativo-social alterou a realidade objetiva verificada à época do julgamento da ADI nº 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal assentou que o parâmetro previsto pelo mencionado art. 20, §3º, não mais atende à aferição da situação de hipossuficiência do idoso ou do deficiente, para fins de percepção do benefício, daí porque não pode ser ele invocado como fundamento exclusivo para o seu indeferimento.
Assim, a hipossuficiência financeira do requerente do benefício assistencial deve ser avaliada pelo julgador considerando todo o conjunto probatório apresentado no bojo dos autos e não apenas a renda per capita.
No caso dos autos, o laudo socioeconômico realizado em 13/12/2022 informa que a parte autora reside em casa própria com sua genitora e com seu padrasto (ID 335907643 – fls. 127 a 128).
A renda familiar consistia em salário recebido pela mãe no valor de R$ 1.400,00 e em remuneração variável recebida pelo padrasto e estimada em R$ 500,00 mensais, em razão de trabalho autônomo. A renda per capita, portanto, era de R$ 633,33, sendo o salário mínimo vigente no valor de R$ 1.212,00.
Embora o INSS apresente CNIS da genitora com salários mais altos entre 10/2022 e 05/2023 (ID 335907643 – fl. 155), verifico que na data da cessação, em 01/12/2021, o valor era de R$ 1.400,00.
Também alega o INSS que o padrasto é empresário e possui veículos. Contudo, constato que ele é empresário individual e exerce atividade relacionada com a venda e consertos de bicicletas (fl. 156), atividade simples, compatível com a renda informada no laudo socioeconômico e inapta para afastar, por si só, a condição de miserabilidade da família.
Quanto aos veículos (fl. 156), verifico que um é um carro popular fabricado em 2005 e o outro é um reboque. Portanto, não representam um valor expressivo que, no caso dos autos, possa afastar a miserabilidade do grupo familiar.
Portanto, considerando as circunstâncias do caso e a flexibilização do requisito legal relativo à renda per capita, conforme entendimento do STF e do STJ, verifico que foi comprovada a condição de miserabilidade, existente à época da cessação, nos termos do art. 203, V, da Constituição Federal e do art. 20 da Lei nº 8.742/93.
Impõe-se, portanto, a manutenção da sentença.
Relativamente aos índices de correção monetária e juros de mora, o INSS pede a observância do Tema Repetitivo n° 905 do STJ e da EC n° 113/2021.
Contudo, a sentença determinou o “pagamento das parcelas atrasadas desde sua cessação administrativa, na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal” (ID 335907643 – fl. 149), que já prevê a observância do Tema Repetitivo n° 905 do STJ e da EC n° 113/2021.
Portanto, não merece reforma a sentença.
Majoro os honorários de sucumbência em 2%, ante o oferecimento de contrarrazões, nos termos do § 11 do art. 85 do Código de Processo Civil, e determino a sua incidência com base na Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS.
É como voto.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1014423-50.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDIEDER LEMES DE LIMA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, CF/88. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº LEI Nº 8.742/93. MISERABILIDADE CONFIGURADA. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA.
1. A questão principal submetida a exame em sede de apelação cinge-se à demonstração da hipossuficência financeira da parte autora, conforme exigido pelo art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93, para fins de restabelecimento do benefício de prestação continuada.
2. Relativamente à norma do art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93, o Eg. STJ, quando do julgamento do REsp n. 1.112.557/MG, sob o regime de recursos repetitivos, firmou o entendimento de que “a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade” (REsp n. 1.112.557/MG, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, julgado em 28/10/2009, DJe de 20/11/2009.)
3. O Plenário do STF quando do julgamento dos RE 567985 e 580963, e da Reclamação nº 4374, declarou a inconstitucionalidade parcial da norma, sem declaração de nulidade.
4. O Supremo Tribunal Federal assentou que o parâmetro previsto pelo mencionado art. 20, §3º não mais atende à aferição da situação de hipossuficiência do idoso ou do deficiente, para fins de percepção do benefício, daí porque não pode ser ele invocado como fundamento exclusivo para o seu indeferimento.
5. A hipossuficiência financeira do requerente do benefício assistencial deve ser avaliada pelo julgador considerando todo o conjunto probatório apresentado no bojo dos autos e não apenas a renda per capita.
6. No caso dos autos, o laudo socioeconômico realizado em 13/12/2022 informa que a parte autora reside em casa própria com sua genitora e com seu padrasto. A renda familiar consistia em salário recebido pela mãe no valor de R$ 1.400,00 e em remuneração variável recebida pelo padrasto e estimada em R$ 500,00 mensais, em razão de trabalho autônomo. A renda per capita, portanto, era de R$ 633,33, sendo o salário mínimo vigente no valor de R$ 1.212,00.
7. Embora o INSS apresente CNIS da genitora com salários mais altos entre 10/2022 e 05/2023, verifico que na data da cessação, em 01/12/2021, o valor era de R$ 1.400,00. O padrasto é empresário individual e exerce atividade relacionada com a venda e consertos de bicicletas; atividade simples, compatível com a renda informada no laudo socioeconômico e inapta para afastar, por si só, a condição de miserabilidade da família.
8. A família possui um carro popular fabricado em 2005 e um reboque, os quais não representam um valor expressivo que, no caso dos autos, possa afastar a miserabilidade do grupo familiar.
9. Considerando as circunstâncias do caso e a flexibilização do requisito legal relativo à renda per capita, conforme entendimento do STF e do STJ, verifica-se que foi comprovada a condição de miserabilidade, existente à época da cessação, nos termos do art. 203, V, da Constituição Federal e do art. 20 da Lei nº 8.742/93.
10. A sentença determinou o “pagamento das parcelas atrasadas desde sua cessação administrativa, na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal”, que já prevê a observância do Tema Repetitivo n° 905 do STJ e da EC n° 113/2021.
11. Portanto, a sentença não merece reforma.
12. Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora
