
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:CLAUDETE ALVES DE LIMA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ANA PAULA CARVALHO MARTINS E SILVA MORENO - MT11206-A e JOSE RENATO SALICIO FABIANO - SP277787-S
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001422-32.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAUDETE ALVES DE LIMA
Advogados do(a) APELADO: ANA PAULA CARVALHO MARTINS E SILVA MORENO - MT11206-A, JOSE RENATO SALICIO FABIANO - SP277787-S
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) nos termos do art. 20 da Lei nº 8.742/93 – LOAS a CLAUDETE ALVES DE LIMA.
Nas razões apresentadas, busca, preliminarmente, o reconhecimento da litispendência/coisa julgada. No mérito, requer a revisão da sentença, argumentando que os requisitos necessários para a concessão do BPC não foram demonstrados. Por fim, solicita, de forma subsidiária, a reforma do termo inicial.
Em contrarrazões, a parte autora defende a manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001422-32.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAUDETE ALVES DE LIMA
Advogados do(a) APELADO: ANA PAULA CARVALHO MARTINS E SILVA MORENO - MT11206-A, JOSE RENATO SALICIO FABIANO - SP277787-S
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Efeito suspensivo e tutela antecipada
Diante do julgamento da apelação nesta oportunidade, resta prejudicado o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso.
Coisa Julgada e litispendência
Nos termos do art. 337, do CPC, verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada, ou seja, quando há duas ações idênticas com as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
A jurisprudência desta Corte entende que, em se tratando de ação previdenciária,a coisa julgada opera secundum eventum litis ou secundum eventum probationis e, desse modo, havendo oportunidade de se mover nova ação, fundada em novas provas que até então o autor não tivera acesso, é possível rediscutir o direito vindicado.
Confiram-se, por oportuno, os seguintes julgados, in verbis:
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. INEXISTÊNCIA DE PROVA DA QUALIDADE DE SEGURADO. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA INIDÔNEA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INFIRMADO PELAS DEMAIS PROVAS CONSTANTES DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO COM BASE UNICAMENTE NA PROVA TESTEMUNHAL. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
(...).
3. Considerado o caráter social que permeia o Direito Previdenciário, a coisa julgada opera efeitos secundum eventum litis ou secundum eventum probationis, permitindo a renovação do pedido, ante novas circunstâncias ou novas provas. Precedentes. (...)(AC 0019721-30.2014.4.01.9199 / MG, rel. Juiz Federal Carlos Augusto Pires Brandão (Conv.), e-DJF1 de 14/01/2015 p. 638)
Em seu voto, o nobre relator colocou a questão mais especificadamente:
(...)
Esclareço, por oportuno, que a coisa julgada na espécie deve produzir efeitos secundum eventum litis, de forma que, na hipótese de alteração das circunstâncias verificadas, poderá a parte autora postular a aposentadoria almejada, fundando-se em outras melhores provas.
(...)(Sem grifos no original).
Neste contexto, observa-se o acórdão apresentado pelo INSS, em particular, a APELAÇÃO CÍVEL N. 0004232-11.2018.4.01.9199/MT, que justificou a rejeição do pleito da autora com base na ausência de vulnerabilidade social. Contudo, o relatório técnico do estudo social realizado neste processo (fls. 58/60, rolagem única) destaca uma mudança na situação econômica familiar, chegando à conclusão de hipossuficiência socioeconômica.
Dessa forma, considerando a alteração no cenário social e econômico da requerente, não se verifica a ocorrência da coisa julgada, uma vez que os aspectos fáticos analisados nesta ação se mostram diferentes daqueles apreciados na decisão anterior.
Além disso, merece destaque o processo nº 1004027-98.2020.4.01.3603 em trâmite no Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Sinop–MT, instaurado posteriormente à presente demanda. Nele, foram apresentados um novo requerimento administrativo, documentos médicos atualizados e uma nova composição familiar.
Diante desse quadro, não se vislumbra a caracterização da litispendência, uma vez que os elementos em análise no presente processo divergem daqueles debatidos no processo em trâmite no Juizado Especial. De todo modo, se houvesse litispendência, ela deveria ensejar a extinção do processo mais recente.
DO MÉRITO
Nos termos do art. 20, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
A compreensão de “família” é elucidada no § 1º do artigo supracitado e compreende, além do requerente, seu cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Para fazer jus ao benefício assistencial, o idoso ou o deficiente devem comprovar o seu estado de miserabilidade, sendo que, de acordo com a legislação em vigor, a renda mensal per capita da família não pode ultrapassar ¼ do salário mínimo.
Na análise do requisito da renda per capita, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Recursos Extraordinários nº 567.985/MT e 580.963/PR, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, da lei nº 8.742/93, e a inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, em observância ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da isonomia, com a finalidade de alargar os critérios de aferição da hipossuficiência, não limitando apenas à análise da renda inferior a 1/4 do salário mínimo, bem como para determinar a exclusão do cálculo da renda familiar per capita os benefícios assistenciais conferidos a deficientes e os benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo percebidos por idosos.
No presente caso, a controvérsia cinge-se a respeito da comprovação do impedimento de longo prazo da parte autora.
O laudo médico pericial, documentado às fls. 78/88, reitera a condição clínica da autora, evidenciando um quadro de obesidade grau III, miomatose uterina, diabetes tipo II, ansiedade e depressão. O perito, ao analisar os aspectos clínicos, atribui à obesidade mórbida uma condição de deficiência moderada. Além disso, destaca que a parte autora apresenta uma incapacidade parcial e temporária para o exercício de atividades laborativas, prevendo um período de recuperação dentro de um ano, datando o início da incapacidade no ano de 2016.
Ressalta-se que os trabalhadores com baixa instrução e/ou que ao longo da vida desempenharam atividades que demandassem esforço físico e que não mais puderem a ele se submeter devem ser considerados como incapacitados, não sendo possível exigir destes a reabilitação para outra atividade dissociada do histórico profissional até então exercido.
Nas circunstâncias do caso concreto, impõe-se reconhecer que a autora, ao tempo da perícia, estava incapacitada totalmente para o trabalho, considerando sua idade (45 anos), formação (analfabeta), histórico profissional (lavadeira) e “a condição de obesidade mórbida que ocasiona severa dificuldade em locomoção e em execução de simples atividades, como sentar e levantar de uma cadeira ou subir em um ônibus”. Segundo a perícia realizada em 2020, a incapacidade remontava a 2016, caracterizando-se, portanto, o impedimento de longo prazo.
Desse modo, incontestável o impedimento de longo prazo para fins do art. 20 da lei 8.472/93, estando presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício de prestação continuada.
Data do início do benefício – DIB
Sentença fixou a DIB nos seguintes termos:
“Em face do exposto, extingo o processo com resolução do mérito, com supedâneo no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para o fim de condenar o INSS a implantar definitivamente o benefício de “amparo social” em favor da parte requerente, retroativos à data do requerimento administrativo, ocorrido em 24/04/2013 (ID 19036403).” (Sem grifos no original)
Entendimento consolidado do STJ indica que o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da citação (REsp nº 1369165/SP).
A parte autora requereu administrativamente o benefício em 24/04/2013. Ocorre que a perícia médica foi clara ao apontar a Data de Início da Incapacidade (DII) no "início de 2016".
Nesse contexto, não se justifica a fixação da Data de Início do Benefício (DIB) na Data de Entrada do Requerimento (DER), visto que, naquela data, a parte autora não reunia os requisitos necessários para a concessão do benefício assistencial. Além disso, não se configura a situação de reafirmação da DER, uma vez que a Data de Início da Incapacidade (DII) foi estabelecida em um momento posterior ao indeferimento administrativo.
Diante disso, em consonância com o que foi determinado no Recurso Especial nº 1369165/SP, cumpre reformar a sentença, a fim de fixar a Data de Início do Benefício (DIB) na data da citação. A adoção dessa medida justifica-se pelo fato de que, anteriormente à propositura da presente ação, a parte já preenchia os requisitos essenciais para a concessão do benefício assistencial.
Juros de mora e correção monetária
Sentença determinou a utilização dos índices de correção monetária de acordo com o IPCA-E.
Contudo, ante o entendimento firmado no julgamento do Tema 810-STF e do Tema 905-STJ, em se tratando de condenação de natureza previdenciária imposta à Fazenda Pública, a correção monetária segue o Manual de Cálculos da Justiça Federal (IGP-DI/IPC-R/IRSM/IPC/BTN, etc.) até a vigência da Lei nº. 11.430/2006, quando passa a incidir o INPC. “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, concedendo o benefício assistencial pleiteado a partir da data da citação, nos termos acima explicitados.
Ex officio, altero os índices relativos aos encargos moratórios.
Tendo a apelação sido parcialmente provida sem inversão do resultado, descabe a majoração de honorários advocatícios na fase recursal (Tema 1059/STJ).
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001422-32.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAUDETE ALVES DE LIMA
Advogados do(a) APELADO: ANA PAULA CARVALHO MARTINS E SILVA MORENO - MT11206-A, JOSE RENATO SALICIO FABIANO - SP277787-S
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA E AO IDOSO. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93. LITISPENDÊNCIA E COISA JULGADA. NÃO CONFIGURADAS. OBESIDADE GRAU III, MIOMATOSE UTERINA, DIABETES TIPO II. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO COMPROVADO. DIB. ENCARGOS MORATÓRIOS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Observa-se que o acórdão apresentado pelo INSS, em particular, a APELAÇÃO CÍVEL N. 0004232-11.2018.4.01.9199/MT, justificou a rejeição do pleito da autora com base na ausência de vulnerabilidade social. Contudo, o relatório técnico do estudo social realizado neste processo (fls. 58/60, rolagem única) destaca uma mudança na situação econômica familiar, chegando à conclusão de hipossuficiência socioeconômica. Dessa forma, considerando a alteração no cenário social e econômico da requerente, não se verifica a ocorrência da coisa julgada, uma vez que os aspectos fáticos analisados nesta ação se mostram diferentes daqueles apreciados na decisão anterior.
2. Além disso, no processo nº 1004027-98.2020.4.01.3603, em trâmite no Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Sinop–MT, instaurado posteriormente à presente demanda, foram apresentados um novo requerimento administrativo, documentos médicos atualizados e uma nova composição familiar. Diante desse quadro, não se vislumbra a caracterização da litispendência, uma vez que os elementos em análise no presente processo divergem daqueles debatidos no processo em trâmite no Juizado Especial. De todo modo, se houvesse litispendência, ela deveria ensejar a extinção do processo mais recente.
3. Nos termos do art. 20, caput, da Lei nº 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
4. No presente caso, a controvérsia cinge-se a respeito da comprovação do impedimento de longo prazo da parte autora. O laudo médico pericial, documentado às fls. 78/88, reitera a condição clínica da autora, evidenciando um quadro de obesidade grau III, miomatose uterina, diabetes tipo II, ansiedade e depressão. Além disso, destaca que a parte autora apresenta uma incapacidade parcial e temporária para o exercício de atividades laborativas, prevendo um período de recuperação dentro de um ano, datando o início da incapacidade no ano de 2016.
5.Trabalhadores com baixa instrução e/ou que ao longo da vida desempenharam atividades que demandassem esforço físico e que não mais puderem a ele se submeter devem ser considerados como incapacitados, não sendo possível exigir destes a reabilitação para outra atividade dissociada do histórico profissional até então exercido
6. Nas circunstâncias do caso concreto, impõe-se reconhecer que a autora, ao tempo da perícia, estava incapacitada totalmente para o trabalho, considerando sua idade (45 anos), formação (analfabeta), histórico profissional (lavadeira) e “a condição de obesidade mórbida que ocasiona severa dificuldade em locomoção e em execução de simples atividades, como sentar e levantar de uma cadeira ou subir em um ônibus”. Segundo a perícia realizada em 2020, a incapacidade remontava a 2016, caracterizando-se, portanto, o impedimento de longo prazo.
7. Na data do requerimento administrativo (24/04/2013), não havia evidência do impedimento de longo prazo, o qual foi comprovado apenas em 2016. Ademais, não se configura como reafirmação da DER, uma vez que a comprovação do impedimento de longo prazo surgiu somente após a decisão administrativa que indeferiu o benefício. Portanto, deve o termo inicial ser fixado na data da citação (REsp nº 1369165/SP).
8. Ante o entendimento firmado no julgamento do Tema 810-STF e do Tema 905-STJ, em se tratando de condenação de natureza previdenciária imposta à Fazenda Pública, a correção monetária segue o Manual de Cálculos da Justiça Federal (IGP-DI/IPC-R/IRSM/IPC/BTN, etc.) até a vigência da Lei nº. 11.430/2006, quando passa a incidir o INPC. “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
9. Apelação do INSS parcialmente provida para fixar a DIB na data da citação. Ajuste, de ofício, dos índices relativos aos encargos moratórios.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e ajustar, de ofício, os índices relativos aos encargos moratórios, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
