
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:JOAO AMERICO DE SOUZA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: FILIPE REIS SOUZA - BA53665-A e ISADORA MAGALHAES TANAJURA OLIVEIRA - BA47811-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 0007301-10.2017.4.01.3307
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JOAO AMERICO DE SOUZA
Advogados do(a) APELADO: FILIPE REIS SOUZA - BA53665-A, ISADORA MAGALHAES TANAJURA OLIVEIRA - BA47811-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, em oposição à sentença que declarou a inexistência do débito no montante de R$ 73.162,48 (setenta e três mil, cento e sessenta e dois reais e quarenta e oito centavos), determinando, assim, a restituição integral de todos os valores descontados administrativamente pela Autarquia Previdenciária.
Em suas razões de apelação, o INSS, argumenta pela necessidade de restituição dos valores indevidamente recebidos, mesmo quando provenientes de ações de boa-fé.
Contrarrazões foram devidamente apresentadas, defendendo a manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 0007301-10.2017.4.01.3307
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JOAO AMERICO DE SOUZA
Advogados do(a) APELADO: FILIPE REIS SOUZA - BA53665-A, ISADORA MAGALHAES TANAJURA OLIVEIRA - BA47811-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A matéria controvertida versa sobre a inexigibilidade de reposição ao erário de valores pagos, em razão do recebimento indevido de benefício assistencial.
Na situação em análise, a parte autora obteve benefício assistencial no intervalo compreendido entre julho de 1996 e julho de 2014 (NB 100175285), apesar de o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) evidenciar a existência de vínculo empregatício a partir de 01/01/1999 (páginas 74 a 82, ID 68153596).
Dessa forma, em decorrência da revisão administrativa, o benefício da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) foi suspenso, e posteriormente, a Autarquia procedeu à retenção de valores na aposentadoria por idade do autor, como meio de se reembolsar dos montantes recebidos indevidamente a título de benefício assistencial, sem que haja evidências de fornecimento de informações inverídicas por parte do beneficiário.
Ressalta-se que a boa-fé é presumida, enquanto a má-fé necessita de comprovação. Em outras palavras, é essencial demonstrar a má-fé do beneficiário ou, inversamente, refutar a boa-fé da pessoa que alegadamente recebeu de forma indevida determinado benefício previdenciário.
A jurisprudência tem manifestado a orientação de que seria preciso avaliar a aptidão do segurado "para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento", tal como decidiu o Ministro Benedito Gonçalves, no julgamento do REsp 1381734/RN, Rel. Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021.
No presente caso, o INSS não demonstrou, de forma inequívoca, a má-fé da segurada, pois não há elementos que indiquem concessão indevida do benefício, tendo apenas posteriormente surgido uma situação fática capaz de ensejar sua revogação (contratos de trabalho).
Além disso, a continuidade do recebimento do benefício, concedido licitamente, sem prova de afirmação de fato inverídico pelo beneficiário destinada a evitar sua revogação, não afasta a boa-fé no caso concreto.
Afinal, para o cidadão comum, é razoável acreditar que a continuidade do pagamento de um benefício concedido licitamente, sem revogação pelo INSS, indica a licitude dos pagamentos.
Sobre a matéria, o Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema n. 979 - REsp 1.381.734), decidiu que, nos casos de valores pagos indevidamente pela Previdência Social em decorrência de erro administrativo (material ou operacional), sem que a hipótese seja de interpretação errônea ou equivocada de lei pela Administração, é devido o ressarcimento ao erário de tais verbas percebidas pelo segurado/beneficiário, salvo quando comprovada a sua boa-fé com a demonstração de que não lhe era possível constatar que o pagamento era indevido.
No julgamento do REsp n. 1.381.734 (Tema 979/STJ) foi firmada a seguinte tese:
"Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido." (Sem grifos no original).
No mesmo julgamento foi decidida a modulação dos efeitos da decisão, nos seguintes termos:
Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
Ante a modulação dos efeitos, apenas os processos distribuídos na primeira instância, a partir da data da publicação do acórdão, estarão sujeitos à devolução em caso de erro da administração (material ou operacional), ressalvada a comprovação de boa-fé do beneficiário. Tal não é a situação dos autos, uma vez que a ação foi proposta antes da publicação do acórdão em referência.
Portanto, o fato de a parte autora ter obtido renda não invalida, por si só, a boa-fé, especialmente considerando que se trata de um vínculo formal, cuja informação era amplamente acessível ao INSS por meio do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS).
Nesse sentido, o INSS não demonstrou, de forma inequívoca, a má-fé da segurada. Deveria ter feito isso na esfera administrativa, inclusive para possibilitar a aplicação da teoria dos motivos determinantes
Assim, tendo em vista a modulação dos efeitos aplicada pelo STJ no Tema n. 979 e ante a ausência de comprovação de má-fé, verifica-se que, no caso dos autos, é indevida a cobrança dos valores pagos como benefício assistencial irregularmente concedido.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos acima explicitados.
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 0007301-10.2017.4.01.3307
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JOAO AMERICO DE SOUZA
Advogados do(a) APELADO: FILIPE REIS SOUZA - BA53665-A, ISADORA MAGALHAES TANAJURA OLIVEIRA - BA47811-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. IRREGULARIDADE NO DEFERIMENTO. VÍNCULOS EMPREGATÍCIOS. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. TEMA 979 DO STJ. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA.
1. A matéria controvertida versa sobre a inexigibilidade de reposição ao erário de valores pagos, em razão do recebimento indevido de benefício assistencial.
2. Na situação em análise, a parte autora obteve benefício assistencial no intervalo compreendido entre julho de 1996 e julho de 2014, apesar de o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) evidenciar a existência de vínculo empregatício a partir de 01/01/1999. Dessa forma, em decorrência da revisão administrativa, o benefício da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) foi suspenso, e posteriormente, a Autarquia procedeu à retenção de valores na aposentadoria por idade do autor, como meio de se reembolsar dos montantes recebidos indevidamente.
3. A jurisprudência tem manifestado a orientação de que seria preciso avaliar a aptidão do segurado "para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento", tal como decidiu o Ministro Benedito Gonçalves, no julgamento do REsp 1381734/RN, Rel. Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021.
4. A continuidade do recebimento do benefício, concedido licitamente, sem prova de afirmação de fato inverídico pelo beneficiário destinada a evitar sua revogação, não afasta a boa-fé no caso concreto. Para o cidadão comum, é razoável acreditar que a continuidade do pagamento de um benefício concedido licitamente, sem revogação pelo INSS, indica a licitude dos pagamentos.
5. A má-fé necessita de comprovação. Em outras palavras, é essencial demonstrar a má-fé do beneficiário ou, inversamente, refutar a boa-fé da pessoa que alegadamente recebeu de forma indevida determinado benefício previdenciário. Nesse sentido, o INSS não demonstrou, de forma inequívoca, a má-fé da segurada. Deveria ter feito isso na esfera administrativa, inclusive para possibilitar a aplicação da teoria dos motivos determinantes.
6. Tendo em vista a modulação dos efeitos aplicada pelo STJ no Tema n. 979 e ante a ausência de comprovação de má-fé, verifica-se que, no caso dos autos, é indevida a cobrança dos valores pagos como benefício assistencial irregularmente concedido.
7. Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
