
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:GILMA DE FATIMA FERREIRA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WESLEY NEIVA TEIXEIRA - GO24494-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001410-47.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GILMA DE FATIMA FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: WESLEY NEIVA TEIXEIRA - GO24494-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de ação em que a parte autora requereu o restabelecimento do Benefício de Prestação Continuada (BPC), previsto no art. 20 da Lei nº 8.742/93 – LOAS.
O Magistrado proferiu sentença julgando procedente o pedido da parte autora e condenando o INSS ao pagamento de aposentadoria por invalidez.
Foram opostos, e rejeitados, embargos de declaração, nos quais se alegou que o Magistrado sentenciante julgou um pedido diverso do requerido no presente processo.
Em apelação, o INSS requereu:
a) Preliminarmente, a anulação da sentença, fundamentada na alegação de sentença extra petita e violação patente dos princípios do contraditório, da ampla defesa e da correlação entre o pedido da inicial e a sentença.
b) No mérito, a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido inicial, condenando a parte autora ao pagamento das custas do processo e da verba honorária, com fulcro no art. 85, §§ 2º e 6º, do CPC.
Em contrarrazões, a parte autora defende a manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001410-47.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GILMA DE FATIMA FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: WESLEY NEIVA TEIXEIRA - GO24494-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Efeito suspensivo
Diante do julgamento da apelação nesta oportunidade, resta prejudicado o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso.
Prescrição
Em conformidade com a jurisprudência dominante no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, os benefícios previdenciários são imprescritíveis, uma vez que podem ser requeridos a qualquer tempo, atendidos os requisitos legais, não havendo falar em decadência ou prescrição do fundo de direito, na hipótese de pretensão de concessão inicial do benefício previdenciário.
Porém, tratando-se de relação jurídica de trato sucessivo, prescrevem as prestações vencidas no período anterior ao quinquênio que precede ao ajuizamento da ação, nos exatos termos da Súmula n. 85/STJ.
No caso em análise, não há que se falar em prescrição, não tendo transcorrido o lustro prescricional entre a cessação do benefício assistencial e o ajuizamento da ação.
Sentença extra petita
Na presente demanda, objetiva-se o restabelecimento do benefício assistencial previsto no art. 20 da Lei 8.742/93 - LOAS. Contudo, observa-se que todas as seções da sentença fazem referência ao pleito de "aposentadoria por invalidez".
Não obstante tenham sido opostos embargos de declaração, estes foram rejeitados pelo Magistrado a quo.
Evidencia-se, sem sombra de dúvidas, tratar-se de julgamento extra petita, configurando uma questão de ordem pública passível de ser reconhecida de ofício. Tal circunstância implicaria na nulidade da sentença por vício in procedendo, com a determinação de que outra fosse proferida, conforme disposto nos artigos 141, 490 e 492 do Código de Processo Civil.
Entretanto, considerando que o processo encontra-se em condições de imediato julgamento, entendo que a situação em questão autoriza a aplicação do disposto nos incisos II e III do art. 1.013, §3º, do Código de Processo Civil ("causa madura").
DO MÉRITO
Nos termos do art. 20, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
A compreensão de “família” é elucidada no § 1º do artigo supracitado e compreende, além do requerente, seu cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Para fazer jus ao benefício assistencial, o idoso ou o deficiente devem comprovar o seu estado de miserabilidade, sendo que, de acordo com a legislação em vigor, a renda mensal per capita da família não pode ultrapassar ¼ do salário mínimo.
Na análise do requisito da renda per capita, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Recursos Extraordinários nº 567.985/MT e 580.963/PR, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, da lei nº 8.742/93, e a inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, em observância ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da isonomia, com a finalidade de alargar os critérios de aferição da hipossuficiência, não limitando apenas à análise da renda inferior a 1/4 do salário mínimo, bem como para determinar a exclusão do cálculo da renda familiar per capita os benefícios assistenciais conferidos a deficientes e os benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo percebidos por idosos.
A perícia médica (fls. 160/161, ID 389448156) ratifica o diagnóstico da parte autora, apontando a ocorrência de epilepsia (CID G40) e déficit cognitivo (CID F71). O especialista atesta que, em virtude das mencionadas enfermidades, a requerente apresenta completa e permanente incapacidade para o exercício laboral desde o momento de seu nascimento. Nesse contexto, evidencia-se claramente o impedimento de longo prazo.
Acrescento que, com a comprovação de que a enfermidade está presente desde o nascimento, não se mostra plausível o argumento apresentado nas contrarrazões acerca da "fungibilidade entre benefícios assistenciais e previdenciários", notadamente considerando que a concessão de aposentadoria por invalidez pressupõe a realização de atividade laborativa, circunstância essa categoricamente afastada pela perícia médica.
O laudo social (fls. 112/126, ID 389448156) evidencia que a parte autora compartilha a residência com seus genitores, ambos idosos, ultrapassando a idade de 65 (sessenta e cinco) anos. A assistente social ressalta que a fonte de renda do núcleo familiar provém das aposentadorias por idade rural, percebidas pelos pais da requerente, em montante mínimo. A partir dessas constatações, a conclusão do laudo é a caracterização da situação de vulnerabilidade socioeconômica.
Ressalto que o benefício previdenciário, cujo valor não ultrapasse 1 (um) salário-mínimo, concedido a idoso com idade superior a 65 (sessenta e cinco) anos, não será computado no cálculo da renda para fins de concessão do benefício de prestação continuada a pessoa com deficiência da mesma família, conforme estabelece o art. 20, § 14 da Lei 8.742/93.
Assim, ao excluir as rendas provenientes dos genitores, compreendo que está configurada a situação de vulnerabilidade socioeconômica da parte autora.
Portanto, uma vez que o INSS não apresentou elementos que contrapusessem as conclusões das perícias médica e socioeconômica, compreendo que o impedimento de longo prazo e a hipossuficiência socioeconômica estão configurados.
Por fim, no âmbito da questão referente ao restabelecimento do benefício assistencial indevidamente cessado, fixo o termo inicial em 31/12/2021, data que configura a sua cessação inadequada, conforme evidenciado no documento constante à fl. 18, ID 389448156.
Encargos moratórios
Ante o entendimento firmado no julgamento do Tema 810-STF e do Tema 905-STJ, em se tratando de condenação de natureza previdenciária imposta à Fazenda Pública, a correção monetária segue o Manual de Cálculos da Justiça Federal (IGP-DI/IPC-R/IRSM/IPC/BTN, etc.) até a vigência da Lei nº. 11.430/2006, quando passa a incidir o INPC.
Os juros de mora, por sua vez, devem seguir a remuneração oficial da caderneta de poupança, na forma preconizada pelo art. 1º-F da Lei nº. 9.494/97, na redação dada pela lei nº. 11.960/2009 (No mesmo sentido: AC 0017122-79.2018.4.01.9199, Desembargador Federal Wilson Alves de Souza, TRF1 – Primeira Turma, e-DJF1 24/04/2019 PAG.).
Honorários advocatícios
Honorários advocatícios, a cargo do INSS, fixados no mínimo legal, ou seja, em 10% sobre o valor das prestações vencidas até a prolação deste acórdão, observando-se a Súmula 111 do STJ, segundo a qual “os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença”.
Custas processuais
Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020).
Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas por força do art. 4º, inc. I, da Lei n. 9.289/96.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS para anular a sentença.
No mérito, respaldado no art. 1013, §3º do CPC, julgo procedente o pedido formulado pela parte autora, determinando o restabelecimento do benefício assistencial a partir da data de sua indevida cessação, em 31/12/2021.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001410-47.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GILMA DE FATIMA FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: WESLEY NEIVA TEIXEIRA - GO24494-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA E AO IDOSO. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93. JULGAMENTO EXTRA PETITA. ERROR IN PROCEDENDO. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA. SENTENÇA ANULADA. JULGAMENTO DE MÉRITO PELA INSTÂNCIA AD QUEM (ART. 1013, § 3º, DO CPC).PRESCRIÇÃO. EPILEPSIA E DÉFICIT COGNITIVO. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. HIPOSSUFICIÊNCIA COMPROVADA PELA EXCLUSÃO DE RENDA DE IDOSO COM MAIS DE 65 ANOS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PEDIDO INICIAL DA PARTE AUTORA PROCEDENTE.
1. Na presente demanda, objetiva-se o restabelecimento do benefício assistencial previsto no art. 20 da Lei 8.742/93 - LOAS. Contudo, observa-se que todas as seções da sentença fazem referência ao pleito de "aposentadoria por invalidez". Evidencia-se, sem sombra de dúvidas, tratar-se de julgamento extra petita, configurando uma questão de ordem pública passível de ser reconhecida inclusive de ofício.
2. Caso em que, considerando que o processo encontra-se em condições de imediato julgamento, aplica-se o disposto nos incisos II e III do art. 1.013, §3º, do Código de Processo Civil ("causa madura").
3. Em conformidade com a jurisprudência dominante no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, os benefícios previdenciários são imprescritíveis, uma vez que podem ser requeridos a qualquer tempo, atendidos os requisitos legais, não havendo falar em decadência ou prescrição do fundo de direito, na hipótese de pretensão de concessão inicial do benefício previdenciário. Porém, tratando-se de relação jurídica de trato sucessivo, prescrevem as prestações vencidas no período anterior ao quinquênio que precede ao ajuizamento da ação, nos exatos termos da Súmula n. 85/STJ. No caso em análise, não há que se falar em prescrição, não tendo transcorrido o lustro prescricional entre a cessação do benefício assistencial e o ajuizamento da ação.
4. Nos termos do art. 20, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
5. A perícia médica ratifica o diagnóstico da parte autora, apontando a ocorrência de epilepsia (CID G40) e déficit cognitivo (CID F71). O especialista atesta que, em virtude das mencionadas enfermidades, a requerente apresenta completa e permanente incapacidade para o exercício laboral desde o momento de seu nascimento. Nesse contexto, evidencia-se claramente o impedimento de longo prazo.
6. O laudo social evidencia que a parte autora compartilha a residência com seus genitores, ambos idosos, ultrapassando a idade de 65 (sessenta e cinco) anos. A assistente social ressalta que a fonte de renda do núcleo familiar provém das aposentadorias por idade rural, percebidas pelos pais da requerente, em montante mínimo. A partir dessas constatações, a conclusão do laudo é a caracterização da situação de vulnerabilidade socioeconômica.
7. O benefício previdenciário, cujo valor não ultrapasse 1 (um) salário-mínimo, concedido a idoso com idade superior a 65 (sessenta e cinco) anos, não será computado no cálculo da renda para fins de concessão do benefício de prestação continuada a pessoa com deficiência da mesma família, conforme estabelece o art. 20, § 14 da Lei 8.742/93. Portanto, comprovada a hipossuficiência socioeconômica da requerente.
8. As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE em sede de repercussão geral (Tema 810) e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905).
9. Sentença anulada. Apelação do INSS parcialmente provida. Procedente o pedido da parte autora de restabelecimento do benefício assistencial desde a cessação indevida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, anulando a sentença e julgando procedente o pedido formulado pela parte autora, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
