
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:EDUARDO AMBROSINO PEREIRA e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MAYKON DOUGLAS MOREIRA PIACENTINI - RO9463
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004561-21.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDUARDO AMBROSINO PEREIRA, HELENA POLAKE DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: MAYKON DOUGLAS MOREIRA PIACENTINI - RO9463
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a sentença que julgou procedente o pedido de não reconhecimento de débito e restabelecimento do Benefício de Prestação Continuada (BPC), conforme previsto no art. 20 da Lei nº 8.742/93 - LOAS.
Ao fundamentar sua apelação, alega que os critérios estabelecidos no artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social não foram devidamente comprovados.
Foram apresentadas contrarrazões..
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004561-21.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDUARDO AMBROSINO PEREIRA, HELENA POLAKE DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: MAYKON DOUGLAS MOREIRA PIACENTINI - RO9463
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Prescrição
Em conformidade com a jurisprudência dominante no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, os benefícios previdenciários são imprescritíveis, uma vez que podem ser requeridos a qualquer tempo, atendidos os requisitos legais, não havendo falar em decadência ou prescrição do fundo de direito, na hipótese de pretensão de concessão inicial do benefício previdenciário.
Porém, tratando-se de relação jurídica de trato sucessivo, prescrevem as prestações vencidas no período anterior ao quinquênio que precede ao ajuizamento da ação, nos exatos termos da Súmula n. 85/STJ. No caso em análise, não há que se falar em prescrição, não tendo transcorrido o lustro prescricional entre a suspensão do benefício e o ajuizamento da ação.
DO MÉRITO
Do reconhecimento da cobrança indevida de valores
No que concerne ao reconhecimento da cobrança indevida de valores, considerando que não foi objeto de questionamento pelas partes, reiteram-se os termos da sentença.
Do restabelecimento do benefício assistencial
No caso em questão, a parte autora veio a óbito durante o curso do processo judicial, sendo seus pais seus sucessores processuais. Os pais da parte falecida requerem o pagamento dos valores correspondentes ao período desde a suspensão indevida do benefício assistencial até o momento do óbito do autor.
Nos termos do art. 20, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
A compreensão de “família” é elucidada no § 1º do artigo supracitado e compreende, além do requerente, seu cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Para fazer jus ao benefício assistencial, o idoso ou o deficiente devem comprovar o seu estado de miserabilidade, sendo que, de acordo com a legislação em vigor, a renda mensal per capita da família não pode ultrapassar ¼ do salário mínimo.
Na análise do requisito da renda per capita, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Recursos Extraordinários nº 567.985/MT e 580.963/PR, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, da lei nº 8.742/93, e a inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, em observância ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da isonomia, com a finalidade de alargar os critérios de aferição da hipossuficiência, não limitando apenas à análise da renda inferior a 1/4 do salário mínimo, bem como para determinar a exclusão do cálculo da renda familiar per capita os benefícios assistenciais conferidos a deficientes e os benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo percebidos por idosos.
O laudo social (fls. 446/450, rolagem única), elaborado de forma indireta, concluiu que nos meses que aguardavam para o desbloqueio do Benefício de Prestação Continuada/BPC, este núcleo familiar estava em situação de vulnerabilidade socioeconômica e risco social. Vejamos:
“III – CONSIDERAÇÕES FINAIS
(...) por mais que a renda per capita seja superior a ¼ do salário mínimo, quando o adolescente Bryan ainda estava vivo, os gastos com medicação, fraldas, alimentação específica para sonda, sondas, plano de saúde, combustível para locomoção, comprometia toda a entrada deste núcleo familiar.
É de extrema importância destacar que, esse adolescente nos últimos meses de vida, foi privado de ter os mínimos para uma vida digna se assim podemos exclamar!
(...)
Diante do exposto, há de se firmar que Bryan Polake Pereira não auferia nenhuma renda, ainda em vida. Observa-se que nos meses que aguardavam para o desbloqueio do Benefício de Prestação Continuada/BPC, este núcleo familiar estava em situação de vulnerabilidade socioeconômica e risco social”. (Sem grifos no original).
Em sede de apelação, o INSS não apresentou qualquer elemento capaz de refutar a conclusão do laudo social, limitando-se a citar trechos da legislação que rege a matéria. Diante disso, resta comprovada a vulnerabilidade socioeconômica do autor, conforme atestado pelo referido laudo.
Em relação à perícia médica, é entendimento consolidado desta Corte que sua realização é um procedimento indispensável em causas que demandem a constatação da incapacidade. Entretanto, excepcionalmente, em casos como o presente, a realização da perícia se torna desnecessária, pois o impedimento de longo prazo do autor é evidente, considerando a natureza das enfermidades elencadas:
1) PCD – Cid 10: M21
2) Microcefalia – Cid 10: Q02
3) ADNPM – Cid 10: F84
4) Broncopneumonia aspirativa de repetição – Cid 10: J 18.2
5) Gastrotomia Botton Permanente – Cid 10: Z93
6) DPOC – Cid 10: J42
7) Dieta Enteral Hiperproteica via gastronomia permanente e exclusiva – Cid 10: E63.9
8) Acamado – Cid 10: Z74
9) Deformidades de membros – Cid 10: M21
10) Epilepsia – Cid 10: G40
11) Malformação congênita do pulmão – Cid 10: Q33
12) Necessita de supervisão contínua – Cid 10: Z74.3
13) Atrofia muscular espinal – Cid 10: G12
Adicionalmente, é fundamental ressaltar que o INSS cessou o benefício exclusivamente com base na alegação de superação da renda bruta familiar (fls. 71/72, rolagem única), sem que em momento algum do processo administrativo tenha sido indicada a existência de dúvidas quanto ao impedimento de longo prazo do autor. Diante das circunstâncias do caso, considero que houve reconhecimento administrativo do impedimento de longo prazo do autor.
Portanto, considero que o impedimento de longo prazo está comprovado, mesmo diante da ausência da realização da perícia médica indireta.
Assim sendo, a parte autora faz jus ao recebimento dos valores do benefício assistencial desde a cessação do benefício (30/12/2021) até a data do falecimento do autor (01/09/2022).
Encargos moratórios
Magistrado fixou os encargos moratórios nos seguintes termos:
“(...)os valores não pagos devem sofrer correção monetária e juros legais de 6% ao ano, permitido desde já o abatimento de qualquer quantia eventualmente já promovida ao Autor no período.”
Ante o entendimento firmado no julgamento do Tema 810-STF e do Tema 905-STJ, em se tratando de condenação de natureza previdenciária imposta à Fazenda Pública, a correção monetária segue o Manual de Cálculos da Justiça Federal (IGP-DI/IPC-R/IRSM/IPC/BTN, etc.) até a vigência da Lei nº. 11.430/2006, quando passa a incidir o INPC.
Os juros de mora, por sua vez, devem seguir a remuneração oficial da caderneta de poupança, na forma preconizada pelo art. 1º-F da Lei nº. 9.494/97, na redação dada pela lei nº. 11.960/2009 (No mesmo sentido: AC 0017122-79.2018.4.01.9199, Desembargador Federal Wilson Alves de Souza, TRF1 – Primeira Turma, e-DJF1 24/04/2019 PAG.).
Honorários advocatícios e custas processuais
Os honorários advocatícios foram fixados no mínimo legal, ou seja, em 10% sobre o valor a ser pago a título de retroativos.
Não incide a limitação da Súmula 111 do STJ, uma vez que o óbito do autor e, consequentemente, o termo final do benefício se deu antes da prolação da sentença.
Reconheceu-se a isenção de custas do INSS.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, nos termos acima explicitados.
Ex officio, altero os índices de juros de mora e correção monetária, nos termos acima explicitados.
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004561-21.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDUARDO AMBROSINO PEREIRA, HELENA POLAKE DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: MAYKON DOUGLAS MOREIRA PIACENTINI - RO9463
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA E AO IDOSO. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93.PRESCRIÇÃO. COBRANÇA DE VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL INDEVIDO. RESTABELECIMENTO. PERÍCIA SOCIAL INDIRETA. COMPROVAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA SOCIOECONÔMICA. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO COMPROVADO PELA ANÁLISE DO PROCESSO. DESNECESSIDADE DE PERÍCIA MÉDICA INDIRETA. ENCARGOS MORATÓRIOS. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. Tratando-se de relação jurídica de trato sucessivo, prescrevem as prestações vencidas no período anterior ao quinquênio que precede ao ajuizamento da ação, nos exatos termos da Súmula n. 85/STJ. No caso em análise, não há que se falar em prescrição, não tendo transcorrido o lustro prescricional entre a suspensão do benefício e o ajuizamento da ação.
2.No que concerne ao reconhecimento da cobrança indevida de valores, considerando que não foi objeto de questionamento pelas partes, reiteram-se os termos da sentença.
3. Nos termos do art. 20, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
4. O laudo social (fls. 446/450, rolagem única), elaborado de forma indireta, concluiu que nos meses que aguardavam para o desbloqueio do Benefício de Prestação Continuada/BPC, este núcleo familiar estava em situação de vulnerabilidade socioeconômica e risco social.
5. O INSS não apresentou qualquer elemento capaz de refutar a conclusão do laudo social, limitando-se a citar trechos da legislação que rege a matéria. Diante disso, resta comprovada a vulnerabilidade socioeconômica do autor, conforme atestado pelo referido laudo.
6. Em relação à perícia médica, é entendimento consolidado desta Corte que sua realização é um procedimento indispensável em causas que demandem a constatação da incapacidade. Entretanto, excepcionalmente, em casos como o presente, a realização da perícia se torna desnecessária, pois o impedimento de longo prazo do autor é evidente, considerando a natureza das enfermidades elencadas.
7. Adicionalmente, é fundamental ressaltar que o INSS cessou o benefício exclusivamente com base na alegação de superação da renda bruta familiar (fls. 71/72, rolagem única), sem que em momento algum do processo administrativo tenha sido indicada a existência de dúvidas quanto ao impedimento de longo prazo do autor. Diante das circunstâncias do caso, considero que houve reconhecimento administrativo do impedimento de longo prazo do autor.
8. No que diz respeito à correção monetária, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RE 870947 (Tema 810), em regime de repercussão geral, afastou a utilização da remuneração oficial da caderneta de poupança (composta pela Taxa Referencial TR mais juros de 0,5% ao mês ou 70% da meta anual da taxa Selic), prevista no artigo 1º-F da Lei n. 9.494/1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960/2009, como critério de atualização monetária das condenações judiciais contra a Fazenda Pública.
6. Apelação do INSS NÃO provida. Ajuste, de ofício, dos encargos moratórios.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e ajustar, de ofício, os encargos moratórios, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
