
POLO ATIVO: EVERTON MYROSMAR OLIVEIRA MENEZES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: HELDER LUIS NUNES MARTINS DOS SANTOS - BA57101-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004286-14.2020.4.01.3306
APELANTE: EVERTON MYROSMAR OLIVEIRA MENEZES
Advogado do(a) APELANTE: HELDER LUIS NUNES MARTINS DOS SANTOS - BA57101-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por EVERTON MYROSMAR OLIVEIRA MENEZES contra sentença que julgou improcedente o pedido para concessão de Benefício de Prestação Continuada (BPC) do art. 20 da lei nº 8.742/93 – LOAS.
Na apelação, em síntese, argumenta-se que está comprovada a hipossuficiência socioeconômica, conforme estipulado pelo artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS).
Sem a apresentação de contrarrazões, os autos foram encaminhados até esta Corte.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004286-14.2020.4.01.3306
APELANTE: EVERTON MYROSMAR OLIVEIRA MENEZES
Advogado do(a) APELANTE: HELDER LUIS NUNES MARTINS DOS SANTOS - BA57101-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
Nos termos do art. 20, caput, da Lei nº 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
A compreensão de “família” é elucidada no §1º do artigo supracitado e compreende, além do requerente, seu cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Para fazer jus ao benefício assistencial, o idoso ou o deficiente devem comprovar o seu estado de miserabilidade, sendo que, de acordo com a legislação em vigor, a renda mensal per capita da família não pode ultrapassar ¼ do salário-mínimo.
Na análise do requisito da renda per capita, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Recursos Extraordinários nº 567.985/MT e 580.963/PR, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, da lei nº 8.742/93, e a inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, em observância ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da isonomia, com a finalidade de alargar os critérios de aferição da hipossuficiência, não limitando apenas à análise da renda inferior a 1/4 do salário mínimo, bem como para determinar a exclusão do cálculo da renda familiar per capita os benefícios assistenciais conferidos a deficientes e os benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo percebidos por idosos.
No presente caso, a controvérsia se refere à questão da hipossuficiência socioeconômica, uma vez que o impedimento de longo prazo foi demonstrado pelo laudo pericial (ID 403842622).
Foram elaborados dois laudos periciais (ID 403842618 e ID 403842664). Após análise dos documentos, constata-se que a família é composta pelo autor, seus genitores e uma irmã menor de idade. A renda familiar é proveniente do bolsa família recebido pela genitora e do trabalho como agricultor do pai (em média R$ 600,00). Por fim, a perita concluiu ser justificável a inclusão da parte autora para o recebimento de benefícios sociais.
Ressalta-se que os valores percebidos a título de Bolsa Família não devem ser incluídos na composição da renda familiar para efeitos de análise do direito à concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS), em conformidade com o disposto no Decreto nº 6.214/2007, que regulamenta o referido benefício assistencial. Vejamos:
Art. 4º Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
[…]
§ 2o Para fins do disposto no inciso VI do caput, não serão computados como renda mensal bruta familiar: (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)
[…]
II – valores oriundos de programas sociais de transferência de renda;" (Sem grifos no original).
Ademais, a atualização legislativa na própria Lei 8.742/93 positivou o teor do Decreto nº 6.214/2007 e os entendimentos jurisprudenciais correspondentes:
“Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória, bem como as transferências de renda de que tratam o parágrafo único do art. 6º e o inciso VI do caput do art. 203 da Constituição Federal e o caput e o § 1º do art. 1º da Lei nº 10.835, de 8 de janeiro de 2004. (Redação dada pela Lei nº 14.601, de 2023)". (Sem grifos no original).
Assim sendo, não obstante o Magistrado tenha utilizado a renda percebida pela mãe por meio do programa Bolsa Família para refutar a conclusão da assistente social, torna-se imprescindível destacar que referida renda não deve ser incluída no cálculo da renda familiar.
O fato do genitor já ter possuído veículos automotores antigos não afasta a vulnerabilidade econômica atual do grupo familiar.
Igualmente, a mudança da irmã “para melhorar na vida pelos estudos” não revela, por si só, boa condição financeira do grupo familiar. Afinal, isso pode ter ocorrido, por exemplo, mediante favores de terceiros.
Desta maneira, resta evidenciada a hipossuficiência socioeconômica.
Ressalto que o benefício assistencial em análise não detém caráter vitalício, estando sujeito à revisão por parte da Autarquia Previdenciária, nos termos do artigo 21 da Lei 8.742/93, especialmente em situações como a do autor, nas quais há possibilidade de alteração no quadro socioeconômico.
Data do Início do Benefício - DIB
A parte autora requer, em apelação:
“Isto posto, aguarda a Recorrente a decisão dessa Turma Recursal, requerendo o acolhimento do presente recurso, procedendo à REFORMA da Respeitável Sentença a fim de ajustá-la ao melhor direito, reformando-a para:
I - Conceder o benefício assistencial à pessoa com deficiência ( BPC LOAS – Deficiente) desde a Data do Requerimento Administrativo (D.E.R).
II- Subsidiariamente, que a D.E.R seja fixada em 05/02/2021, data anterior à apresentação da contestação, momento em que o Genitor do Autor precisou se desfazer do Fiat Strada, ano 2013.”
Entendimento consolidado do STJ indica que o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da citação (REsp nº 1369165/SP).
Verifica-se que não existem elementos que comprovem que a situação atestada nos laudos socioeconômicos, realizados em 2020 e 2022, reflita fielmente a condição indicada em 2009 (ou de qualquer outro requerimento administrativo posterior), sobretudo em virtude do extenso lapso temporal. Portanto, a Data de Início do Benefício (DIB) não deve ser fixada na Data de Entrada do Requerimento (DER) requerida pelo demandante.
Adicionalmente, a compra de um veículo automotor no período compreendido entre a Data de Entrada do Requerimento (DER) e a interposição da ação sugere que a família detinha recursos financeiros consideráveis o suficiente para cobrir despesas familiares.
Essa aquisição contradiz a alegação de falta de recursos, pois é improvável que o genitor estivesse em condição de vulnerabilidade socioeconômica e, ao mesmo tempo, tivesse condições financeiras para adquirir um veículo, mesmo que fosse para fins de trabalho. O investimento em um bem de valor considerável como um veículo sugere uma estabilidade financeira que não condiz com a vulnerabilidade socioeconômica prevista no art. 20 da LOAS.
Portanto, após uma análise minuciosa dos documentos mencionados, conclui-se que a vulnerabilidade socioeconômica só foi efetivamente comprovada com a realização do segundo laudo social, datado de 17/08/2022, após venda de veículo automotor pelo genitor da parte autora. Diante disso, a DIB deve ser fixada nessa data, refletindo de forma mais precisa a situação socioeconômica do requerente.
Juros de mora e correção monetária
Ante o entendimento firmado no julgamento do Tema 810-STF e do Tema 905-STJ, em se tratando de condenação de natureza previdenciária imposta à Fazenda Pública, a correção monetária segue o Manual de Cálculos da Justiça Federal (IGP-DI/IPC-R/IRSM/IPC/BTN, etc.) até a vigência da Lei nº. 11.430/2006, quando passa a incidir o INPC.
Os juros de mora, por sua vez, devem seguir a remuneração oficial da caderneta de poupança, na forma preconizada pelo art. 1º-F da Lei nº. 9.494/97, na redação dada pela lei nº. 11.960/2009 (No mesmo sentido: AC 0017122-79.2018.4.01.9199, Desembargador Federal Wilson Alves de Souza, TRF1 – Primeira Turma, e-DJF1 24/04/2019 PAG.).
Custas processuais
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
O INSS é isento de custas na Justiça Federal.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação interposta pela parte autora, concedendo o benefício de prestação continuada a partir da realização do segundo laudo social, datado de 17/08/2022, nos termos acima explicitados.
Sucumbência mínima da parte autora. Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus (art. 85, §11, CPC), que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da condenação, consideradas a parcelas vencidas até a prolação do acórdão de procedência.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004286-14.2020.4.01.3306
APELANTE: EVERTON MYROSMAR OLIVEIRA MENEZES
Advogado do(a) APELANTE: HELDER LUIS NUNES MARTINS DOS SANTOS - BA57101-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA E AO IDOSO. ART. 203, V, CF/88. LEI 8.742/93. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO COMPROVADO. HIPOSSUFICIÊNCIA SOCIOECONÔMICA COMPROVADA. DIB. ENCARGOS MORATÓRIOS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Nos termos do art. 20, caput, da Lei nº 8.742/93, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
2. No presente caso, a controvérsia se refere à questão da hipossuficiência socioeconômica, uma vez que o impedimento de longo prazo foi demonstrado pelo laudo pericial.
3. Foram elaborados dois laudos periciais. Após análise dos documentos, constata-se que a família é composta pelo autor, seus genitores e uma irmã menor de idade. A renda familiar é proveniente do bolsa família recebido pela genitora e do trabalho como agricultor do pai (em média R$ 600,00). Por fim, a perita concluiu ser justificável a inclusão da parte autora para o recebimento de benefícios sociais.
4. Não obstante o Magistrado tenha utilizado a renda percebida pela mãe por meio do programa Bolsa Família para refutar a conclusão da assistente social, torna-se imprescindível destacar que referida renda não deve ser incluída no cálculo da renda familiar (§2º, II, art.4, do Decreto nº 6.214/2007). Desta maneira, resta evidenciada a hipossuficiência socioeconômica.
5. Entendimento consolidado do STJ indica que o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da citação (REsp nº 1369165/SP).
6. Entretanto, não existem elementos que comprovem que a situação atestada nos laudos socioeconômicos, realizados em 2020 e 2022, reflita fielmente a condição indicada em 2009 (ou de qualquer outro requerimento administrativo posterior), sobretudo em virtude do extenso lapso temporal. Portanto, a Data de Início do Benefício (DIB) não deve ser fixada na Data de Entrada do Requerimento (DER) requerida pelo demandante.
7. Adicionalmente, a compra de um veículo automotor no período compreendido entre a Data de Entrada do Requerimento (DER) e o ajuizamento da ação sugere que a família detinha recursos financeiros consideráveis o suficiente para cobrir despesas familiares.
8. Caso em que a vulnerabilidade socioeconômica só foi efetivamente comprovada com a realização do segundo laudo social, datado de 17/08/2022, após venda de veículo automotor pelo genitor da parte autora. Diante disso, a DIB deve ser fixada nessa data.
9. As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE em sede de repercussão geral (Tema 810) e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905).
10. Apelação parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
