
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:BIANCA SOARES RAMOS e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: VALDELICE DA SILVA VILARINO - RO5089-A e DEBORA APARECIDA MARQUES - RO4988-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1014558-96.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: B. S. R.
REPRESENTANTE: VALDELICE MARTINS SOARES
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL em face da sentença que julgou procedente o pedido e concedeu o benefício assistencial desde a data do requerimento administrativo, em 31/10/2019.
Nas razões recursais (ID 215052025 – fls. 18 a 22), o apelante alega a ausência de impedimento de longo prazo, tendo em vista que o perito judicial atestou a incapacidade apenas temporária, estimada em 360 (trezentos e sessenta) dias. Requer, subsidiariamente, a fixação do termo inicial do benefício na data de ajuizamento da ação.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 215052025 – fls. 25 a 34).
Parecer ministerial pelo desprovimento da apelação (ID 217377065).
É o relatório.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1014558-96.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: B. S. R.
REPRESENTANTE: VALDELICE MARTINS SOARES
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Inicialmente, consigno que fica dispensada a remessa necessária no presente caso concreto, em face da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp. 1735097/RS; REsp. 1844937/PR).
A controvérsia recursal reside no requisito da deficiência como impedimento de longo prazo, nos termos da Lei nº 8.742/93, e no termo inicial do benefício. O requisito da miserabilidade restou incontroverso.
Quanto ao requisito da deficiência, o INSS alega a ausência de impedimento de longo prazo, tendo em vista que o perito judicial atestou a incapacidade apenas temporária, estimada em 360 (trezentos e sessenta) dias.
A Lei nº 8.742/93 dispõe o seguinte no art. 20:
§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
Verifica-se que a lei não exige uma incapacidade total nem permanente. Exige-se, na verdade, um impedimento de longo prazo (mínimo de dois anos) que obstrua a participação social do requerente em igualdade de condições.
No mesmo sentido, “A jurisprudência do STJ firmou entendimento segundo o qual, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a legislação que disciplina a matéria não elenca o grau de incapacidade para fins de configuração da deficiência, não cabendo ao intérprete da lei a imposição de requisitos mais rígidos do que aqueles previstos para a sua concessão” (REsp nº 1.962.868/SP, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 21/3/2023, DJe de 28/3/2023).
No caso dos autos, o perito judicial reconheceu a incapacidade total e temporária (ID 215052023). Declarou ainda que a doença da parte autora (cardiopatia congênita – CID-10 Q22.0) é passível de “remissão total” (fl. 4) e estimou um prazo de “360 dias para retorno. A contar da data desta perícia” (fl. 3).
Em complementação do laudo médico, o perito declarou o seguinte (ID 215052025 – fl. 6):
Sendo o período total superior a 02 anos – impedimento de longo prazo, dispõe a necessidade de reavaliação da necessidade de benefício porque a cardiopatia congênita apresentada pode apresentar remissão total conforme evolução favorável do quadro de saúde a partir de terapêuticas propostas pela equipe de cardiopediatria assistente.
Porém, sob qualquer possibilidade de interpretação do laudo médico pericial, fica evidente que a avaliada dispõe de restrições severas ligadas à condição cardíaca.
Dessa forma, verifico que o perito não declarou que o impedimento durou ou duraria apenas 360 (trezentos e sessenta) dias como argumenta o INSS. Atestou, na verdade, o início da doença em 17/09/2019 (ID 215052023 – fl. 3) e o seu prolongamento até pelo menos 05/2022 (um ano após a realização da perícia).
Portanto, a partir das declarações periciais, concluo que estava presente o impedimento de longo prazo, conforme exigido pelo art. 20, §§ 2° e 10, da Lei nº 8.742/93, devendo a sentença ser mantida.
Quanto ao termo inicial do benefício, também não assiste razão ao INSS ao pedir que seja fixado na data de ajuizamento da ação, pois os requisitos para a concessão do benefício estavam presentes à época do requerimento administrativo, em 31/10/2019, o qual não deveria ter sido indeferido.
Quanto ao índice dos juros de mora, o magistrado a quo deixou de aplicar a EC 113/2021.
Em que pese o INSS não ter impugnado o índice dos juros, a correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados de ofício pelos magistrados. Vejamos o entendimento do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA. ALTERAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Consoante o entendimento do STJ, a correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados pelas instâncias ordinárias até mesmo de ofício, o que afasta suposta violação do princípio do non reformatio in pejus. 2. Agravo interno não provido.
(AGINT NO RESP N. 1.663.981/RJ, RELATOR MINISTRO GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, JULGADO EM 14/10/2019, DJE DE 17/10/2019)
Dessa forma, sobre o montante da condenação, incidirão juros segundo o índice previsto no art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, desde a data da citação, e correção monetária mediante a aplicação do INPC até 08/12/2021 e, a partir de 09/12/2021, deverá incidir a SELIC, nos termos do art. 3º da EC 113/2021 e do Manual de Cálculos da Justiça Federal, respeitada a prescrição quinquenal.
Por fim, sobre os honorários advocatícios, sua fixação foi postergada para o momento da liquidação da sentença, nos termos do art. 85, § 4º, inciso II, do CPC (ID 215052025 – fl. 15).
Sendo ilíquida a sentença, essa norma deve ser observada inclusive pela instância recursal, cabendo ao juízo da liquidação considerar também o § 11 do art. 85 na fixação dos honorários. Nesse sentido, o STJ possui o seguinte posicionamento:
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA ILÍQUIDA. HONORÁRIOS. DECISÃO DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS QUE DETERMINA A FIXAÇÃO DO PERCENTUAL APÓS A LIQUIDAÇÃO DO JULGADO. APLICAÇÃO DO ART. 85, § 4º, II, DO CPC/2015. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS. IMPOSSIBILIDADE. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. FATO QUE DEVE SER CONSIDERADO PELO JUÍZO DA LIQUIDAÇÃO NA DEFINIÇÃO DO PERCENTUAL.
[...]
2. A embargante aponta omissão "quanto à necessidade de estipulação de novos honorários na fase recursal" (fl. 529, e-STJ).
3. Ocorre que, no caso, as instâncias ordinárias condenaram a embargada ao pagamento de honorários "em percentual incidente sobre o valor da condenação a ser fixado por ocasião da liquidação de sentença, na forma preconizada no inciso II, do § 4º, do art. 85 do CPC/2015" (fl. 90, e-STJ).
4. O referido dispositivo estabelece que, proferida sentença ilíquida nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a definição do percentual dos honorários só ocorrerá após a liquidação do julgado. O objetivo da norma é evitar desproporção na fixação da verba honorária, que tem maior chance de acontecer enquanto não conhecida a base de cálculo.
5. Sendo esse o caso dos autos, não há como o STJ majorar honorários ainda não definidos, não apenas por impossibilidade lógica, mas também porque o art. 85, § 4º, II, do CPC/2015, deve ser observado, inclusive, na instância recursal.
6. O fato de a parte sucumbente ter insistido em sua pretensão, sem êxito no recurso interposto, deve ser considerado pelo Juízo da liquidação no momento em que for definir o percentual da verba honorária.
7. Embargos de Declaração rejeitados.
(EDcl no REsp n. 1.785.364/CE, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 6/4/2021, DJe de 1/7/2021 – grifei)
Portanto, deixo de majorar os honorários de sucumbência em grau recursal, ante a ausência de fixação no primeiro grau de jurisdição.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à apelação e ALTERO, de ofício, os índices dos juros de mora e de correção monetária.
É como voto.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1014558-96.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: B. S. R.
REPRESENTANTE: VALDELICE MARTINS SOARES
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, CF/88. LEI Nº 8.742/93. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO CONFIGURADO. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA ALTERADOS DE OFÍCIO.
1. O apelante argumenta que a perícia médica atesta a ausência do impedimento de longo prazo e que o termo inicial do benefício deve ser fixado na data de ajuizamento da ação.
2. Quanto ao requisito da deficiência, verifica-se que a lei exige um impedimento de longo prazo que obstrua a participação social do requerente em igualdade de condições, sendo necessário um prolongamento desse impedimento por pelo menos 2 (dois) anos (Lei nº 8.742/93, art. 20, §§ 2º e 10).
3. No caso dos autos, o perito judicial reconheceu a incapacidade total e temporária da parte autora. Declarou ainda que a doença (cardiopatia congênita – CID-10 Q22.0) é passível de “remissão total” e estimou um prazo de “360 dias para retorno. A contar da data desta perícia”. Em complementação ao laudo médico, o perito declarou que o período total do impedimento já era superior a 2 (dois) anos e que “sob qualquer possibilidade de interpretação do laudo médico pericial, fica evidente que a avaliada dispõe de restrições severas ligadas à condição cardíaca”.
4. Verifica-se que o perito não declarou que o impedimento durou ou duraria apenas 360 (trezentos e sessenta) dias como argumenta o INSS. Atestou, na verdade, o início da doença em 17/09/2019 e o seu prolongamento até pelo menos 05/2022 (um ano após a realização da perícia).
5. A deficiência da parte autora, que não se confunde necessariamente com uma incapacidade total ou permanente, está presente no caso concreto, conforme exigida pela Lei nº 8.742/93.
6. O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo, em 31/10/2019, tendo em vista que os requisitos para a concessão do benefício estavam presentes à época. Sentença mantida no mérito.
7. Sobre o montante da condenação, incidirão juros segundo o índice previsto no art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, desde a data da citação, e correção monetária mediante a aplicação do INPC até 08/12/2021 e, a partir de 09/12/2021, deverá incidir a SELIC, nos termos do art. 3º da EC 113/2021 e do Manual de Cálculos da Justiça Federal, respeitada a prescrição quinquenal. Sentença reformada nesse ponto.
8. Apelação do INSS desprovida. Índices de correção monetária e de juros de mora alterados de ofício.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação e ALTERO, de ofício, os índices de correção monetária e dos juros de mora, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora
