
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:JOSEFA DIAS DA COSTA SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: FLAVIO ANTONIO RAMOS - RO4564 e RONALDO DE OLIVEIRA COUTO - RO2761-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1004881-47.2019.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEFA DIAS DA COSTA SANTOS
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) em face de sentença que julgou procedente o pedido da parte autora de concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente desde o requerimento administrativo em 15/08/2017.
Nas suas razões recursais (ID 13661921), o INSS alega, em síntese, que a parte autora não comprovou sua qualidade de segurada especial pelo tempo de carência e que a sentença é nula por ausência de fundamentação por não especificar quais documentos foram considerados para deferir o benefício na condição de segurada especial.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 13661923).
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1004881-47.2019.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEFA DIAS DA COSTA SANTOS
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Inicialmente, assente-se a dispensa de remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp 1.735.097/RS e REsp 1.844.937/PR).
Anoto que "o pleito de atribuição de efeito suspensivo à apelação do INSS não merece acolhimento, pois o CPC/73, em seu artigo 520, inciso VII, e o NCPC/2015, em seu artigo 1012, par. 1º, V, estabelecem que, em se tratando de sentença na qual restou confirmado o deferimento do pedido de antecipação da tutela, a apelação interposta deve ser recebida, tão somente, no efeito devolutivo. Além disso, não ficou demonstrado risco de lesão grave e de difícil reparação, tampouco fundamentação relevante para justificar a concessão de efeito suspensivo em caráter excepcional" (TRF1, AC 1021037-76.2020.4.01.9999/GO, Nona Turma, Rel. Des. Fed. Antônio Oswaldo Scarpa, unânime, PJe 16/08/2023).
Pretende a parte apelante a reforma da sentença que concedeu a aposentadoria por incapacidade permanente.
Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de incapacidade temporária ou incapacidade permanente são: a) qualidade de segurado; b) carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213/1991; c) incapacidade para o trabalho ou atividade habitual por mais de 15 dias ou, na hipótese da aposentadoria por invalidez, incapacidade (permanente e total) para atividade laboral. O nível da incapacidade e a possibilidade de reabilitação são o que diferenciam os benefícios.
A concessão de benefício de incapacidade permanente ao trabalhador rural, segurado especial, independe do cumprimento de carência, entretanto, a condição de rurícola deve estar alicerçada em início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, quando se fizer necessária ao preenchimento de eventuais lacunas (art. 39, I c/c 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991).
Quanto aos documentos que fazem início de prova material, a jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada para se comprovar a atividade rural, em qualquer das suas formas, permite que documentos, ainda que não dotados de fé pública e não especificados no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário, desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais como: a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ, AgRG no REsp 967.344/DF), a certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1.067/SP, AR 1.223/MS), a declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR 3.202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/1991).
Além disso, a Súmula 34 da TNU dispõe que, para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar e a Súmula 149 do STJ disciplina que a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
A lei não exige que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/1991).
Anterior concessão do auxílio-doença pela autarquia previdenciária comprova a qualidade de segurado da parte autora, bem como cumprimento do período de carência, salvo se ilidida por prova em contrário.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
Quanto à preliminar de nulidade da sentença por ausência de fundamentação, essa não deverá ser acolhida.
O magistrado a quo fundamentou de forma suficiente sua decisão com base nos parâmetros legais e pelos documentos juntados aos auto, não sendo o magistrado obrigado a especificar quais documentos considerou como início de prova material, sendo que o mero inconformismo com o julgamento razão suficiente para declarar nula a sentença.
A Autarquia não contesta a incapacidade total e permanente da parte autora, por isso, deixo de analisar esse ponto.
Quanto à qualidade de segurada especial, a parte autora juntou aos autos: a) certidão de casamento com o senhor José Teixeira Santos em 1977, em que o cônjuge é qualificado como lavrador e a parte autora como doméstica e b) título de domínio, sob condição resolutiva, de pequeno imóvel rural, fornecida pelo INCRA em nome do casal, qualificados como lavradores/agricultores, de 2003.
A prova testemunhal corroborou as alegações da parte autora de que é segurada especial, tendo se mudado para a cidade em virtude do agravamento das condições de saúde da parte autora e antes disso residido no sítio onde exercia suas atividades como agricultora (ID 152420033, 152420036 e 152420048).
O INSS, mesmo citado, não compareceu à audiência, quando foram colhidos os testemunhos e proferida a sentença que deferiu os benefícios.
Em análise ao CNIS da parte autora, constam alguns vínculos urbanos, porém, muito anteriores à incapacidade fixada em 2014, sendo o último vínculo em 1994, não sendo tal documento apto para descaracterizar a condição de segurada especial da parte autora.
O CNIS do cônjuge da parte autora só foi juntado aos autos em momento muito posterior à própria apelação interposta, não podendo ser analisado para descaracterizar a condição de segurada especial da parte autora, pois incidiria em inovação recursal, devendo tal questão ter sido submetida em sede de contestação pela Autarquia.
No entanto, o início de prova material - em especial, o título de concessão de terras pelo INCRA de 2003 - é muito anterior ao período em que o perito definiu como início da incapacidade, que foi em 2014, não se podendo presumir que a parte autora permaneceu exercendo atividades como segurada especial durante nove anos sem qualquer outra prova dentro do período de carência.
Além disso, a própria parte autora declarou, tanto na perícia do INSS quanto na perícia judicial, que suas atividades laborais eram de faxineira, do lar e zeladora, o que também contraria a própria afirmação nos autos de que sempre exerceu atividade rural.
Assim, não houve o início de prova material do exercício de atividade rural exercida dentro da carência de 12 (doze) meses anteriores à apresentação da incapacidade, sendo indevido, portanto, o benefício.
Nesse contexto, assento que o STJ fixou no Tema Repetitivo nº 629 a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial (art. 283 do CPC/1973 e art. 320 do CPC/2015) implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC/1973 e art. 485, IV, do CPC/2015) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC/1973 e art. 486 do CPC/2015), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa.
Ausentes os requisitos legais exigidos, o benefício se revela indevido, devendo a tutela concedida ser revogada.
No caso presente, houve deferimento da tutela antecipada, é, portanto, devida a restituição dos valores porventura recebidos, tendo em vista a conclusão do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça na revisão do Tema Repetitivo 692/STJ, em que ficou decidido que: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
Ante o exposto, EXTINGO o processo, sem resolução do mérito, julgando PREJUDICADO o recurso de apelação do INSS por ausência de início de prova material da condição de segurada especial anterior à incapacidade. Revogo a ordem de antecipação dos efeitos da tutela. Fica o INSS autorizado a cobrar os valores pagos em razão da tutela antecipada ora revogada.
É como voto.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1004881-47.2019.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEFA DIAS DA COSTA SANTOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PERÍCIA CONCLUSIVA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA DA QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL. DOCUMENTO MUITO ANTERIOR À DATA DE INÍCIO DA INCAPACIDADE. DECLARAÇÕES DA PARTE AUTORA QUE CONTRADIZEM O LABOR RURAL. PROCESSO EXTINTO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. REVOGAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA. APELAÇÃO DO INSS PREJUDICADA.
1. Pretende a parte apelante o julgamento pela improcedência do pedido de concessão de auxílio por incapacidade temporária ou aposentadoria por incapacidade.
2. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) qualidade de segurado; b) carência de 12 (doze) contribuições mensais; c) incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
3. Quanto à preliminar de nulidade da sentença por ausência de fundamentação, essa não deverá ser acolhida. O magistrado a quo fundamentou de forma suficiente sua decisão com base nos parâmetros legais e pelos documentos juntados aos autos, não sendo o magistrado obrigado a especificar quais documentos considerou como início de prova material, sendo que o mero inconformismo com o julgamento não é razão suficiente para declarar nula a sentença.
4. A autarquia não contesta a incapacidade total e permanente da parte autora, por isso, deixo de analisar esse ponto.
5. Quanto à qualidade de segurada especial, a parte autora juntou aos autos: a) certidão de casamento com o senhor José Teixeira Santos em 1977, em que o cônjuge é qualificado como lavrador e a parte autora como doméstica e b) título de domínio, sob condição resolutiva, de pequeno imóvel rural, fornecida pelo INCRA em nome do casal, qualificados como lavradores/agricultores, de 2003.
6. A prova testemunhal corroborou as alegações da parte autora de que é segurada especial, e de que ela se mudou para a cidade em virtude do agravamento das condições de saúde e antes disso residiu no sítio onde exercia suas atividades como agricultora.
7. Em análise ao CNIS da parte autora, constam alguns vínculos urbanos, porém, muito anteriores à incapacidade fixada em 2014 (o último vínculo em 1994), não sendo tal documento apto para descaracterizar a condição de segurada especial da parte autora.
8. O CNIS do cônjuge da parte autora só foi juntado aos autos em momento muito posterior à própria apelação interposta, não podendo ser analisado para descaracterizar a condição de segurada especial da parte autora, pois incidiria em inovação recursal, devendo tal questão ter sido submetida em sede de contestação pela Autarquia.
9. No entanto, o início de prova material - em especial, o título de concessão de terras pelo INCRA de 2003 - é muito anterior ao período em que o perito definiu como início da incapacidade, que foi em 2014, não se podendo presumir que a parte autora permaneceu exercendo atividades como segurada especial durante nove anos sem qualquer outra prova dentro do período de carência.
10. Além disso, a própria parte autora declarou, tanto na perícia do INSS quanto na perícia judicial, que suas atividades laborais eram de faxineira, do lar e zeladora, o que também contraria a própria afirmação nos autos de que sempre exerceu atividade rural.
11. Assim, não há o início de prova material do exercício de atividade rural exercida dentro da carência de 12 (doze) meses anteriores à apresentação da incapacidade, sendo indevido, portanto, o benefício.
12. Nesse contexto, assento que o STJ fixou no Tema Repetitivo nº 629 a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial (art. 283 do CPC/1973 e art. 320 do CPC/2015) implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC/1973 e art. 485, IV, do CPC/2015) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC/1973 e art. 486 do CPC/2015), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa.
13. Ausentes os requisitos legais exigidos, o benefício se revela indevido, devendo a tutela concedida ser revogada. No caso presente, houve deferimento da tutela antecipada, é, portanto, devida a restituição dos valores porventura recebidos, tendo em vista a conclusão do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça na revisão do Tema Repetitivo 692/STJ, em que ficou decidido que: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
14. Processo extinto, sem resolução do mérito.
15. Apelação do INSS prejudicada.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, EXTINGUIR o processo, sem resolução do mérito, julgando PREJUDICADO o recurso de apelação, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora
