
POLO ATIVO: OSMARINA ALVES DE OLIVEIRA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: HUMBERTO AFFONSO DEL NERY - MT6945-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1008375-08.2019.4.01.3600
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelações interpostas pela parte autora pelo INSS, de sentença na qual foi julgado improcedente o pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, em razão de não ter sido constatada a incapacidade laboral (fls. 297/300)1.
Em suas razões, a autora suscita a preliminar de cerceamento de defesa, sob o fundamento de que o laudo da perícia médica judicial está incompleto, e pugna pela anulação da sentença para que os autos retornem ao juízo de origem, a fim de que seja designada novo exame pericial. Alternativamente, pede a reforma da sentença para que o seu pedido seja julgado procedente (fls. 373/392).
Por sua vez, a autarquia previdenciária pugna requer a reforma parcial da sentença, a fim de que lhe seja possibilitada a cobrança dos valores recebidos pela autora em razão da antecipação dos efeitos da tutela (fls. 340/347)
Sem contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
DA PRELIMINAR
Da nulidade processual por cerceamento de defesa
A parte apelante suscita a nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, porque embasada em prova pericial que entende superficial, incompleta e insuficiente para esclarecer sobre existência da sua incapacidade.
Todavia, esta questão deverá ser analisada juntamente com o mérito, pois com ele se confunde.
DO MÉRITO
Os benefícios por incapacidade laboral estão previstos nos artigos 42 e 59 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.”
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.”
Assim sendo, são requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento do período de carência de 12 contribuições, quando necessárias; 3) incapacidade permanente e insuscetível de reabilitação profissional para o exercício de qualquer atividade laboral; ou 4) incapacidade para o exercício da atividade exercida.
O deferimento dos benefícios previdenciários pressupõe a identificação, por meio de exame médico-pericial, da total impossibilidade de o segurado exercer de atividade que garanta a sua subsistência.
Do caso em exame
A parte autora ajuizou a ação em 17/9/2019 pleiteando a concessão de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, com o pagamento das parcelas retroativas desde a data do indeferimento administrativo, em 12/7/2016.
Obteve êxito no pedido de antecipação dos efeitos da tutela, para imediata implantação do benefício, por meio de decisão que foi posteriormente revogada pela sentença que julgou improcedente o pedido, por não ter sido constatada a sua incapacidade para o trabalho.
De acordo com o laudo da perícia médica judicial realizada em 7/7/2021, a autora apresenta diagnóstico de "dor articular e síndrome compressiva do nervo mediano" (fls. 275/279), tendo o perito afirmado que a patologia degenerativa é compatível com a idade e não apresenta limitação ou comprometimento da sua capacidade laborativa e de seus hábitos de vida.
Os demais elementos constantes dos autos não são suficientes para afastar as conclusões da prova técnica.
Dispõe o art. 480 do Código de Processo Civil que o juiz deve determinar, de ofício ou a requerimento da parte, a realização de nova perícia quando a matéria não estiver suficientemente esclarecida. Não é a hipótese dos autos.
Com efeito, trata-se de trabalho realizado por profissional habilitado e sob o crivo do contraditório, da confiança do juízo, que respondeu a todos os quesitos apresentados pelas partes, contendo elementos suficientes para avaliar a existência de incapacidade para fins de concessão do benefício pretendido.
Constata-se que o perito realizou a descrição dos documentos médicos apresentados pela autora, narrou o histórico da doença e dos seus sintomas e respondeu aos quesitos com clareza suficiente para formar a convicção do julgador.
Importa registrar que as respostas aos quesitos apresentados pelas partes de forma objetiva, não implica em nulidade da sentença, ainda mais quando se constata, pelo seu conteúdo, que se encontram fundamentados indiretamente no laudo.
Assim sendo, não há nulidade na perícia judicial realizada, mas mero inconformismo da parte quanto às suas conclusões.
Em caso semelhante, assim já decidiu esta Corte:
"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ERRO MATERIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ACLARATÓRIOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS. ESCLARECIMENTOS. 1. Nos termos do art. 1.022 do CPC, são cabíveis embargos de declaração quando houver no acórdão obscuridade, contradição ou quando for omitido ponto sobre o qual deveria pronunciar-se o juiz ou tribunal, bem assim para corrigir erro material no julgado. 2. Na hipótese em apreço, no tocante à valoração da prova pericial oficial, não se verifica omissão, contradição ou quaisquer dos vícios processuais, que, em tese, poderiam ensejar o acolhimento do presente recurso, porquanto o acórdão embargado tratou expressamente das questões relativas à incapacidade laborativa da parte autora. Ademais, o voto-condutor nitidamente consignou que "em decorrência da presumida isenção e equidistância que o perito judicial tem das partes, deve prevalecer o laudo técnico sobre as conclusões dos exames particulares, sobretudo, em razão da capacitação profissional do expert e da fundamentação elucidativa esposada no laudo. Os laudos produzidos por médicos particulares, de per si, não tem o condão de constituir prova suficiente a ensejar o afastamento do laudo judicial, vez que realizados sem a presença do requerido", restando incabível, neste ponto, a insurgência autoral. 3. Havendo contradição no acórdão por erro material quanto à fixação dos honorários de sucumbência, os embargos de declaração devem ser acolhidos. 4. In casu, o acórdão arbitrou os honorários advocatícios em "20% (vinte por cento) sobre o valor fixado pelo juízo a quo e sem prejuízo deste, a serem pagos em favor da parte autora", incorrendo em evidente erro material a condenação em honorários de sucumbência à parte vencedora da lide. Desta forma, forçoso reconhecer a necessidade de retificação desta parte do acórdão, conforme fundamentação declinada no voto. 5. Embargos de declaração parcialmente acolhidos para retificar a parte do acórdão que fixa os honorários recursais, de modo que os importes de sucumbência sejam devidos pela parte autora em favor do INSS, ficando suspenso o pagamento por força da assistência judiciária gratuita." (EDAC 0071864-25.2016.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 04/09/2018 PAG.)
Com base nestes elementos, ausente a incapacidade para o desempenho das atividades laborativas habituais da requerente, que é pressuposto indispensável ao deferimento benefícios previdenciários de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, não merece reforma a sentença recorrida.
A controvérsia remanescente cinge-se acerca da necessidade, ou não, de devolução dos valores recebidos pela parte autora por força de decisão que deferiu a tutela provisória de urgência (fls. 129/131).
Ora, conforme se verá a seguir, a questão trazida para acertamento não comporta maiores reflexões, isso porque a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já se encontra totalmente pacificada no sentido de que "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago" — Tema Repetitivo 692.
Nesse sentido, aliás, vale conferir os seguintes precedentes do STJ (ementas parcialmente transcritas):
PROCESSUAL CIVIL. PROPOSTA DE REVISÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO TEMA REPETITIVO 692/STJ (RESP N. 1.401.560/MT). ART. 927, § 4º, DO CPC/2015. ARTS. 256-S, 256-T, 256-U E 256-V DO RISTJ. DEVOLUÇÃO DE VALORES DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO LIMINAR POSTERIORMENTE REVOGADA. ADVENTO DE NOVA LEGISLAÇÃO. ART. 115, INC. II, DA LEI N. 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 13.846/2019. TEMA N. 799/STF (ARE 722.421/MG): POSSIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS EM VIRTUDE DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL. QUESTÃO DE ORDEM JULGADA NO SENTIDO DA REAFIRMAÇÃO, COM AJUSTES REDACIONAIS, DO PRECEDENTE FIRMADO NO TEMA REPETITIVO N. 692/STJ.
1. A presente questão de ordem foi proposta com a finalidade de definir se o entendimento firmado no Tema Repetitivo 692/STJ (REsp n. 1.401.560/MT) deve ser reafirmado, alterado ou cancelado, diante da variedade de situações que ensejam dúvidas quanto à persistência da orientação firmada pela tese repetitiva referida, bem como à jurisprudência do STF, estabelecida em sentido contrário, mesmo que não tendo sido com repercussão geral ou em controle concentrado de constitucionalidade.
[...]
21. Questão de ordem julgada no sentido da reafirmação da tese jurídica, com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação de regência, nos termos a seguir: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.". (Pet n. 12.482/DF, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 11/5/2022, DJe de 24/5/2022.)
......................
PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVERSIBILIDADE DA DECISÃO.
[...]Orientação a ser seguida nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil: a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. Recurso especial conhecido e provido. (REsp n. 1.401.560/MT, relator Ministro Sérgio Kukina, relator para acórdão Ministro Ari Pargendler, Primeira Seção, julgado em 12/2/2014, DJe de 13/10/2015.)
A jurisprudência deste TRF – 1ª Região, ademais, também se alinha ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme se pode ver do seguinte julgado:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DEVOLUÇÃO DE VALORES PERCEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. REPETIBILIDADE. APLICAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ SOBRE A MATÉRIA. REVISÃO DO TEMA REPETITIVO 692. 1. A compreensão jurisprudencial do STJ em relevo acompanhada por esta Corte Regional é clara no sentido de ser necessária a devolução dos valores percebidos em razão de decisão precária posteriormente reformada, tendo em vista a tese revista e mantida, no julgamento do Tema Repetitivo 692, realizado em 11/05/2022. Veja-se: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago (Pet n. 12.482/DF, Relator Min. Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 11/5/2022, in DJe de 24/5/2022). Precedentes. 2.Agravo de instrumento provido para reconhecer a repetibilidade dos valores recebidos em razão da tutela judicial posteriormente revogada, observando-se os limites estabelecidos na tese firmada pelo STJ no julgamento do Tema 692." (AG 1043550-96.2019.4.01.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 27/07/2023 PAG.)
Com esses fundamentos, dou provimento à apelação interposta pelo INSS para condenar a parte autora a devolver à aludida autarquia os valores recebidos em razão da tutela de urgência concedida nos autos, devidamente atualizados monetariamente, observando-se os limites estabelecidos na tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema Repetitivo n. 692. Considerando, todavia, a improcedência do pedido, a restituição dos valores pode ser requerida nos próprios autos.
Por conseguinte, nego provimento à apelação da parte autora.
Os honorários advocatícios recursais ficam fixados em quantia equivalente a 1% (um por cento) do valor da causa, ficando suspensa a respectiva cobrança em razão dos benefícios da assistência judiciária concedidos.
É o voto.
Brasília, 28 de fevereiro de 2024.
DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS
RELATORA

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1008375-08.2019.4.01.3600
OSMARINA ALVES DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELANTE: HUMBERTO AFFONSO DEL NERY - MT6945-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. TRABALHADOR URBANO. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE INCAPACIDADE LABORAL. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA DE URGÊNCIA NÃO CONFIRMADA EM SENTENÇA. CABIMENTO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DESTA CORTE REGIONAL.
1. São requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) qualidade de segurado; b) cumprimento da carência de 12 (doze) contribuições, quando necessária; c) incapacidade permanente e insuscetível de reabilitação profissional para o exercício de qualquer atividade laboral; ou d) incapacidade para o exercício da atividade exercida.
2. O deferimento dos benefícios por incapacidade pressupõe a identificação, por meio de exame médico-pericial, da total impossibilidade de o segurado exercer de atividade que garanta a sua subsistência.
3.Deve ser acolhido o laudo pericial que, de forma clara e objetiva, conclui pela ausência de incapacidade parcial ou total da parte, não havendo elementos que possam contradizer as suas conclusões.
4. Comprovada a ausência de incapacidade, por meio de perícia médica judicial, não se configura o direito ao recebimento do benefício.
5. Estando a matéria suficientemente esclarecida, não se verifica necessidade de realização de nova perícia, nos termos do art. 480 do Código de Processo Civil.
6. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já se encontra pacificada no sentido de que "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.". (Pet n. 12.482/DF, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 11/5/2022, DJe de 24/5/2022.) — Tema Repetitivo 692.
7. Apelação do INSS provida. Apelação da parte autora a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS e negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto da relatora.
Brasília, 28 de fevereiro de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
