
POLO ATIVO: UNIÃO FEDERAL
POLO PASSIVO:JORGE BARRETO TAVARES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: EDUARDO JORGE ALBUQUERQUE DE MENEZES FILHO - PB26553-A e ELEDISON DE SOUZA SAMPAIO - BA54481-A
RELATOR(A):ALEXANDRE JORGE FONTES LARANJEIRA
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 37 - JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA
PJe/TRF1ª – Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 1031850-49.2021.4.01.3300
RELATÓRIO
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA (RELATOR CONVOCADO):
Trata-se de apelação interposta pela União contra sentença proferida pelo Juízo da 13ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária da Bahia nos autos da Ação Ordinária n° 1031850-49.2021.4.01.3300 que condenou a apelante ao pagamento de indenização por danos morais à parte autora.
A parte recorrente aduz, em síntese, que:
DA PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE PROCESSUAL
Conforme se verifica do anexo documental à contestação (id 641150471), a Marinha do Brasil solicitou a desvinculação do autor no CNIS e efetuou a transmissão da declaração na Relação Anual de Informações Sociais - RAIS, ano-base 1978, resolvendo administrativamente o pleito feito pelo acionante nesta ação.
Ora, com a providência já efetivada no início do processo, verifica-se que deixou de existir a necessidade da tutela jurisdicional, razão pela qual a Pessoa política federal requereu a extinção do processo, sem resolução do mérito, com base no art. 485, VI, do CPC, em relação aos pedidos 3, 4 e 5 da inicial.
[...]
PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO
Pois bem. O autor narra que constava no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS como militar ativo da Marinha do Brasil, condição que manteve apenas no período de 28.01.1977 a 10.05.1978, portanto em momento muito anterior ao lustro legal, pelo que restou fulminada a pretensão pela prescrição.
Requer a União o reconhecimento da prescrição total do fundo do direito, com a consequente resolução de mérito , nos termos do disposto no art. 487, II, CPC.
[...]
DA AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE CIVIL DA UNIÃO
Em sede de mérito, a Pessoa política federal vem asseverar que não desconhece o fato de que a responsabilidade civil do Estado é objetiva em face de atos comissivos, com base no risco administrativo, exigindo, para a sua configuração, três pressupostos: 1) ação administrativa/ato comissivo ilícito; 2) nexo causal entre a ação e o dano; 3) o dano (art. 37, §6º, da CRFB/1988).
Por outro lado, a responsabilidade civil estatal por atos omissivos é subjetiva, já que exige a prova da negligência do agente público, requerendo, ademais, a configuração do nexo causal e do dano (art. 927, caput, do Código Civil).
Nesta causa, porém, bem se vê que estão ausentes elementos imprescindíveis para a configuração da responsabilidade civil da Pessoa política federal.
Ao fim, requer o provimento de seu recurso.
As contrarrazões foram devidamente colacionadas aos autos.
É o relatório.
Juiz Federal MARLLON SOUSA
Relator Convocado
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 37 - JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA
PJe/TRF1ª – Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 1031850-49.2021.4.01.3300
VOTO
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA (RELATOR CONVOCADO):
Inicialmente, consigne-se que, in casu, concorrem os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade recursal.
Preliminarmente, no que tange à tese de perda do objeto, essa não merece prosperar. Isso porque, conforme o documento (id. 641150471), a recorrente comprovou a desvinculação do recorrido do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), não mais subsistindo, portanto, o evento factual que deu origem à demanda. Porém, a providência só foi adotada no dia 8 de junho de 2021, isto é, após o início da demanda e citação da ora apelante, quando a lide já estava em curso; bem como, porque persiste a pretensão do autor em obter a reparação pelo dano moral alegadamente sofrido (tese de responsabilidade civil objetiva do Estado).
Antes de adentrar no mérito propriamente dito, faz-se necessário analisar a prejudicial de mérito levantada pela recorrente, qual seja: a prescrição.
Prescrição é o encobrimento da pretensão pelo decurso do tempo. Em regra, o prazo prescricional contra o Estado está encampado no art. 1º da Lei 20.910/32:
Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
A recorrente assevera, em síntese, que houve a prescrição do fundo do direito, porquanto “o autor narra que constava no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS como militar ativo da Marinha do Brasil, condição que manteve apenas no período de 28.01.1977 a 10.05.1978, portanto em momento muito anterior ao lustro legal, pelo que restou fulminada a pretensão pela prescrição”.
Sem razão, contudo.
Isso porque, em homenagem ao princípio do actio nata, o termo a quo do prazo prescricional é a data do nascimento da pretensão resistida, o que ocorre quando se toma ciência inequívoca do fato danoso.
Cite-se:
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ERRO JUDICIÁRIO. PRAZO DE PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA. 1. As ações que visam discutir a responsabilidade civil do Estado prescrevem em cinco anos, nos termos do Decreto 20.910/1932. 2. O termo inicial do prazo prescricional dá-se, como regra, no momento em que constatada a lesão e seus efeitos, conforme o princípio da actio nata. 3. In casu, o prazo prescricional de cinco anos, previsto no art. 1º do Decreto 20.910/1932, aplicável às ações indenizatórias propostas contra a Fazenda, começou a fluir na data em que foi expedido erroneamente o oficio com o valor da pensão alimentícia a menor, momento a partir do qual a direito de ação poderia ter sido exercido. Não há relação de trato sucessivo. 4. Consoante se extrai da leitura do acórdão recorrido, o erro judiciário ocorreu em outubro de 1997, tendo sido a ação ajuizada somente em janeiro de 2012, de modo que a prescrição deve ser reconhecida. 5. Recurso Especial provido. (REsp n. 1.662.621/GO, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 27/4/2017, DJe de 16/6/2017.)
No caso em análise, apesar da argumentação trazida à baila pelo recorrente, é evidente que o recorrido só tomou conhecimento do dano sofrido ao buscar, junto ao INSS, a percepção de benefício previdenciário (10 de março de 2020), onde teve seu pedido negado, porque constava como militar da marinha. Assim, constata-se que não ocorreu a prescrição.
Posto isso, passo ao exame do mérito.
A responsabilidade civil estatal é, em regra, objetiva e decorre do risco administrativo. Logo, não se exige a existência de culpa por parte do Estado. Isso está previsto no Art. 37, § 6º, da Constituição Federal:
Art. 37 (...) § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Importante também citar os arts. 186 e 927 do CC/02:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
(...)
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Existe certa controvérsia sobre os atos estatais omissivos.
Apesar de a lei não tenha feito distinção, há os que entendem que, em se tratando de atos omissivos, a responsabilidade do ente público teria caráter subjetivo.
Vale ressaltar, contudo, que o STF e o STJ possuem diversos julgados afirmando que o Poder Público responde de forma objetiva, inclusive em caso de atos omissivos, quando constatada a precariedade/vício no serviço decorrente da falha no dever legal e específico de agir.
A responsabilidade civil do Estado, seja de ordem subjetiva, seja objetiva - depende, para a configuração da ocorrência de dos seguintes elementos: I) ato ilícito; II) dano sofrido; e III) nexo de causalidade entre o evento danoso e a ação ou omissão do agente público.
Colecionam-se os seguintes julgados:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONTAMINAÇÃO PELO VIRUS HIV DURANTE TRANSFUSÃO DE SANGUE. RISCO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. ACÓRDÃO CUJAS CONCLUSÕES NÃO PODEM SER REVISTAS SEM REEXAME DO ACERVO PROBATÓRIO. INADMISSIBILIDADE. 2. Conforme atual e sedimentado entendimento jurisprudencial do STF, a responsabilidade civil do Estado, seja por ato comissivo, seja por ato omissivo, é orientada pela teoria do risco administrativo e resulta na responsabilidade objetiva, presente o nexo causal entre a conduta, ou sua ausência, e o dano provocado ao cidadão. Precedentes. (AgInt no AREsp n. 2.025.085/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 20/3/2023, DJe de 22/3/2023.)
ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO ORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. BLOQUEIO JUDICIAL DE VALORES EM CONTA BANCÁRIA. SISTEMA BACENJUD. RESTRIÇÃO INDEVIDA EM DESFAVOR DE TERCEIRO. ERRO NA INDICAÇÃO DA CONTA CORRENTE. DEMONSTRAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CABIMENTO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. SENTENÇA REFORMADA. 1. O art. 37, § 6º, da Constituição Federal estabelece que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Ademais, para a configuração da responsabilidade civil objetiva do Estado, fundada na teoria do risco administrativo, é necessária a presença de uma conduta, de um dano e do nexo causal, não se exigindo a demonstração de dolo ou culpa. (AC 0003422-79.2014.4.01.3313, DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA, TRF1 - QUINTA TURMA, PJe 29/09/2023)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. RESPONSABILIDADE CIVIL. SETOR SUCROALCOOLEIRO. INSTITUTO DO AÇÚCAR E DO ÁLCOOL - IAA. FIXAÇÃO DE PREÇOS. LEI 4.870/1965. LEVANTAMENTO DE CUSTOS DE PRODUÇÃO. FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS - FGV. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CF/1988. COMPROVAÇÃO DO DANO. NECESSIDADE. APURAÇÃO DO QUANTUM DEBEATUR. LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO. CABIMENTO. INDENIZAÇÃO. NATUREZA JURÍDICA. LIQUIDAÇÃO COM "DANO ZERO" OU "SEM RESULTADO POSITIVO". POSSIBILIDADE. EFICÁCIA DA LEI 4.870/1965. RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. 2. Tratando-se de hipótese de responsabilidade civil objetiva do Estado, prevista no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, necessária a demonstração da ação governamental, nexo de causalidade e dano. (REsp n. 1.347.136/DF, relatora Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, julgado em 11/12/2013, DJe de 7/3/2014.)
No caso em análise, o Juízo ad quo decidiu que:
Quanto ao evento danoso propriamente dito, o documento apresentado pelo INSS no id – 1120449287, fls. 192 dos autos, evidencia que o benefício de prestação continuada pleiteado pelo autor foi, de fato, indeferido em virtude da existência de vínculo a regime próprio de previdência junto ao Comando da Marinha.
Ou seja, resta claro que a falha da União em desvincular, a tempo e modo devidos, o nome do autor de seus registros de empregados foi causa precípua para o indeferimento do benefício previdenciário buscado pelo demandante na via administrativa.
Tal fato revela grave falha na atuação da Administração Pública, notadamente pelo fato de o autor ter encerrado seu vínculo junto a Marinha em 1978, de modo que o a negativa de benefício previdenciário em decorrência desta falha ultrapassa o mero dissabor, gerando angústia e sofrimento injusto na vítima, configurando dano moral indenizável.
É cediço que os danos morais decorrem de lesão aos direitos da personalidade e caracterizam-se pela ofensa à honra subjetiva, pela perturbação psíquica, desconfortos na tranquilidade, na alma, no ego, nos sentimentos e nos afetos de uma pessoa, acarretando dor, sofrimento, angústia, depressão, etc.
No caso que ora se apresenta, a exigência de prova do dano moral se satisfaz com a comprovação do fato que gerou a dor, o sofrimento, os sentimentos íntimos que o ensejam, amplamente evidenciado pelos documentos que guarnecem o feito.
Quanto ao valor da indenização do dano moral, deve-se sopesar as circunstâncias e peculiaridades do caso, as condições financeiras dos envolvidos, sua repercussão e a participação do ofendido para configuração do evento danoso.
Ademais, o quantum da indenização deve ser arbitrado, em especial, considerando-se o caráter punitivo (punitive damage) que também deve representar, embora buscando se evitar o enriquecimento sem causa de quem sofre o dano.
Assim, constata-se que os elementos para caracterização da responsabilidade civil objetiva do Estado estão configurados, quais sejam: dano (benefício previdenciário indeferido) e nexo causal (em decorrência da errada informação da existência de vínculo a regime próprio de previdência junto ao Comando da Marinha).
No mais, os danos morais são aqueles que ferem o interior da pessoa, seu psicológico, bem como os direitos da personalidade e vão além do mero dissabor.
Cite-se:
CIVIL E ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO ORDINÁRIO. NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA. PREJUDICIAL REJEITADA. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ESCOLA NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO FAZENDÁRIA - ENAP. CURSO DE FORMAÇÃO. AGRESSÃO VERBAL PERPETRADA POR ALUNO. COMPROVAÇÃO. PENALIDADE DE ADVERTÊNCIA. MERO DISSABOR. PEDIDO IMPROCEDENTE. SENTENÇA CONFIRMADA. II - A controvérsia posta nos presentes autos gira em torno da responsabilidade dos réus em indenizar o autor pelos danos morais decorrentes de suposta agressão física e verbal perpetrada por aluno nas dependências da Escola Nacional de Administração Pública - ENAP durante curso de formação profissional. III - Na hipótese dos autos, é fato incontroverso que o autor foi vítima de ofensas verbais por parte do primeiro requerido nas dependências do ENAP, no entanto, não restou comprovada a ocorrência da alegada agressão física, nem tampouco que os fatos narrados nestes autos tenham ganhado grande repercussão, a ponto de abalar a imagem do requerente. IV - É inegável que a atitude do primeiro requerido é reprovável, especialmente considerando que as ofensas ocorreram durante a realização do curso de formação profissional para ingresso no serviço público, não sendo esta a conduta que se espera de um aluno, nem tampouco de um futuro servidor público. Todavia, não se vislumbra, na espécie, que os fatos narrados tenham causado prejuízos à integridade moral e psicológica do autor. V - Conforme o entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça, "Não há dano moral quando os fatos narrados estão no contexto de meros dissabores, sem abalo à honra do autor. Ainda mais, se os aborrecimentos ficaram limitados à indignação da pessoa, sem qualquer repercussão no mundo exterior" (AgRg no AgRg no Ag 775.948/RJ, Rel. Ministro Humberto Gomes De Barros, Terceira Turma, julgado em 12.02.2008, DJ 03.03.2008 p. 1). VI - No caso em exame, restou demonstrado que a ENAP adotou as providências cabíveis para investigar a denúncia de agressão, tendo instaurado processo administrativo disciplinar, que ao final culminou na imposição da sanção de advertência ao aluno, sendo certo que não poderia ser aplicada qualquer penalidade que não fosse prevista no Regulamento do Curso, não havendo que se falar, portanto, na negligência ou conivência da ENAP com a conduta descrita nestes autos. VII - Apelação desprovida. Sentença confirmada. Inaplicável o disposto no § 11 do art. 85 do NCPC, visto que a sentença foi proferida na vigência da legislação processual anterior. (AC 0063675-39.2009.4.01.3400, JUIZ FEDERAL EMMANUEL MASCENA DE MEDEIROS (CONV.), TRF1 - QUINTA TURMA, PJe 12/10/2023)
Analisando os autos, verifica-se que, de fato, ocorreu dano moral, porquanto amplamente evidenciado pelos documentos constantes dos autos que o recorrido sofreu danos que vão além do mero dissabor.
Por fim, no que tange ao quantum, o juízo a quo fixou o valor da indenização em R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais):
No presente caso, observando-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o montante indenizatório deve ser fixado levando em consideração: a) a data em que o autor formulou o requerimento administrativo (10 de março de 2020); b) a data em que a União efetuou a baixa do nome do autor no CAGEB (8 de junho de 2021) e c) o período médio para conclusão de novo pedido junto ao INSS (sessenta dias); correspondendo ao número de meses em que o autor ficou privado do seu benefício.
Com base nesse critério, fixo em R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) o valor a ser indenizado, monetariamente corrigido pela variação acumulada da Taxa SELIC (art. 3º da EC 113/21) até a data de seu efetivo pagamento.
A jurisprudência deste TRF e do STJ, inspirada na ideia de “concreção individualizadora”, de Karl Engisch, tem consagrado o método bifásico de arbitramento, o qual leva em consideração o bem jurídico lesado e as circunstâncias do caso concreto. Na primeira fase, fixa-se um valor básico de indenização (considerando-se o que vem sendo ditado pela jurisprudência para situações de lesão ao mesmo bem jurídico considerado), o qual, na segunda fase, é aumentado ou diminuído à luz das circunstâncias do caso concreto.
No caso, a jurisprudência deste TRF tem julgados no seguinte sentido:
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. DANO MORAL. REALIZAÇÃO DE OPERAÇÕES FINANCEIRAS MEDIANTE FRAUDE. DEMORA E INEFICIÊNCIA NA INVESTIGAÇÃO E NA CORREÇÃO DO QUADRO LESIVO. DANO MORAL INDENIZÁVEL CONFIGURADO. VALOR. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DETERMINANTES BIFÁSICOS. MAJORAÇÃO NECESSÁRIA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Na espécie dos autos, a matéria devolvida à apreciação deste Tribunal restringe-se ao valor da indenização por danos morais fixado na origem em razão do reconhecimento de violação ao direito da personalidade do autor, ante a inclusão indevida de seu nome em entidade de proteção ao crédito, por conta de mútuo bancário realizado de forma fraudulenta em seu nome com a utilização de documentos pessoais. 2. Conforme orientação fixada pelo. Superior Tribunal de Justiça (STJ), a fixação do valor devido a título de indenização por danos morais deve considerar o método bifásico, que conjuga os critérios da valorização das circunstâncias do caso e do interesse jurídico lesado, e minimiza eventual arbitrariedade ao se adotar critérios unicamente subjetivos do julgador, além de afastar eventual tarifação do dano. (por todos, o AgInt no REsp 1533342/PR, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 25/03/2019, DJe 27/03/2019). 3. Considerando que a inscrição indevida restou incontroversa ante a ausência de recurso interposto pela parte requerida e que, no caso concreto, restou demonstrada a recalcitrância da ré no exame na correção do quadro marcado pela contratação ilícita de mútuo em nome do apelante, reputa-se razoável a majoração do valor da condenação, de R$ 3.000,00, para R$ 10.000,00. 4. Apelação a que se dá parcial provimento, nos termos do item anterior. (AC 0020078-10.2015.4.01.3400, DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA, TRF1 - QUINTA TURMA, PJe 19/04/2023 PAG.)
CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. PROFESSOR DA REDE PÚBLICA FEDERAL DE ENSINO. PARTICIPAÇÃO EM PROGRAMA DE DOUTORADO. ETAPA FINAL A SER CURSADA NO EXTERIOR. NEGATIVA INDEVIDA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DANOS MATERIAIS NÃO COMPROVADOS. DANOS MORAIS. QUANTIFICAÇÃO. MÉTODO BIFÁSICO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EQUIDADE. MAJORAÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. I Cuida-se de ação indenizatória interposta por professor da rede pública federal de ensino, objetivando reparação pelos alegados prejuízos de ordem moral e material suportados em decorrência de ato arbitrário praticado pela Administração Pública, que lhe negou prosseguimento no Curso de Doutorado em Ciências da Educação, cuja etapa final seria cursada no exterior. II Os danos materiais não restaram demonstrados, tendo em vista que as despesas médicas resultantes de um acidente vascular-cerebral (AVC) sofrido pelo postulante não possuem comprovado nexo de causalidade com a conduta da parte ré, tampouco foi demonstrado que o custeio da etapa final do doutorado, o qual cabia ao próprio interessado, foi realizado em duplicidade. III As diferenças salariais a que o apelante faria jus caso tivesse obtido oportunamente o doutorado encontra-se na seara do dano hipotético, tendo em vista que o êxito na obtenção da referida titulação não é garantido, consubstanciando mera expectativa de direito. IV À míngua de irresignação recursal por parte da União Federal, a ocorrência de abalo moral é incontroversa nos autos, tendo o juízo monocrático decidido que a negativa da Administração Pública foi indevida, pois a etapa do doutorado a ser realizada no exterior deveria se seguir necessariamente às etapas anteriores, estas sim devidamente autorizadas. V - Inexiste parâmetro legal definido para a fixação dos danos morais, devendo ser quantificados segundo os critérios de proporcionalidade, moderação e razoabilidade, submetidos ao prudente arbítrio judicial, com observância das peculiaridades inerentes aos fatos e circunstâncias que envolvem o caso concreto. O quantum da reparação, portanto, não pode ser ínfimo, para não representar uma ausência de sanção efetiva ao ofensor, nem excessivo, para não constituir um enriquecimento sem causa em favor do ofendido. VI - Tendo em vista o método bifásico adotado pelo STJ (REsp 1.332.366/MS, Rel. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, e-DJF1 de 07/12/2016), tem-se como razoável, na espécie, o montante correspondente a R$ 10.000,00 (dez mil reais), tomando por parâmetro de comparação caso semelhante já julgado por esta Corte Regional e considerando as peculiaridades do caso, mormente o fato de que o autor obteve, em prazo relativamente exíguo, provimento jurisdicional que lhe assegurou o direito de viajar à cidade de Buenos Aires (Argentina) para concluir seu doutorado. VII O arbitramento dos honorários advocatícios em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação não remunera condignamente a nobre função dos advogados, na espécie, devendo ser majorados para R$ 2.000,00 (dois mil reais), por equidade, em atenção ao disposto no art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC/73, vigente à época da sentença, observando-se os parâmetros estabelecidos nas respectivas alíneas e atentando-se para a importância da causa, a natureza da demanda e o princípio da razoabilidade. VIII Apelação parcialmente provida. Remessa oficial desprovida. Sentença parcialmente reformada, para majorar o montante arbitrado a título de danos morais para R$ 10.000,00 (dez mil reais) e os honorários advocatícios para R$ 2.000,00 (dois mil reais), pro rata. Inaplicabilidade do art. 85, § 11, do CPC/2015. (AC 0010546-74.2009.4.01.3900, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, TRF1 - QUINTA TURMA, e-DJF1 01/04/2022 PAG.)
Na espécie, constata-se que a sentença também não merece reforma no ponto, porquanto o juízo a quo, em sua fundamentação, considerou os valores habitualmente fixados jurisprudencialmente para situações assemelhadas, e ante as particularidades do caso analisado (correspondendo ao número de meses em que o autor ficou privado do seu benefício) fixou valor proporcional e razoável a título de dano moral.
Os honorários advocatícios fixados na sentença deverão ser acrescidos de 2%, na forma do art. 85, §11, do CPC.
Ante o exposto, nego provimento à apelação, mantendo a decisão da instância a quo, pelos fundamentos acima expostos.
É o voto.
Juiz Federal MARLLON SOUSA
Relator Convocado
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 37 - JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA
PJe/TRF1ª – Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 1031850-49.2021.4.01.3300
Processo Referência: 1031850-49.2021.4.01.3300
APELANTE: UNIÃO FEDERAL
APELADO: JORGE BARRETO TAVARES
EMENTA
CIVIL E ADMINISTRATIVO. ALEGADA PERDA DO OBJETO. NÃO OCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA. DECRETO 20.910/1932. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. DANO MORAL INDENIZÁVEL CONFIGURAÇÃO. VALOR. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DETERMINANTES (BIFÁSICOS).
1. Preliminarmente, no que tange à tese de perda do objeto, essa não merece prosperar. Isso porque, conforme o documento (id. 641150471), a recorrente comprovou a desvinculação do recorrido do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), não mais subsistindo, portanto, o evento factual que deu origem à demanda. Porém, a providência só foi adotada no dia 8 de junho de 2021, isto é, após o início da demanda e citação da ora apelante, quando a lide já estava em curso; bem como, porque persiste a pretensão do autor em obter a reparação pelo dano moral alegadamente sofrido (tese de responsabilidade civil objetiva do Estado).
2. Em homenagem ao princípio do actio nata, o termo a quo do prazo prescricional é a data do nascimento da pretensão resistida, o que ocorre quando se toma ciência inequívoca do fato danoso. Precedente.
3. No caso em análise, apesar da argumentação trazida à baila pelo recorrente, é evidente que o recorrido só tomou conhecimento do dano sofrido ao buscar, junto ao INSS, a percepção de benefício previdenciário (10 de março de 2020), onde teve seu pedido negado, porque constava como militar da marinha. Assim, constata-se que não ocorreu a prescrição.
4. A responsabilidade civil estatal é, em regra, objetiva e decorre do risco administrativo. Logo, não se exige a existência de culpa por parte do Estado. Isso está previsto no Art. 37, § 6º, da Constituição Federal.
5. Constata-se que os elementos para caracterização da responsabilidade civil objetiva do Estado estão configurados, quais sejam: dano (benefício previdenciário indeferido) e nexo causal (em decorrência da errada informação da existência de vínculo a regime próprio de previdência junto ao Comando da Marinha).
6. Danos morais são aqueles que ferem o interior da pessoa, seu psicológico, bem como os direitos da personalidade e vão além do mero dissabor. Precedente.
7. Amplamente evidenciado pelos documentos constantes dos autos que o recorrido sofreu danos que vão além do mero dissabor.
8. A jurisprudência deste TRF e do STJ, inspirada na ideia de “concreção individualizadora”, de Karl Engisch, tem consagrado o método bifásico de arbitramento, o qual leva em consideração o bem jurídico lesado e as circunstâncias do caso concreto. Na primeira fase, fixa-se um valor básico de indenização (considerando-se o que vem sendo ditado pela jurisprudência para situações de lesão ao mesmo bem jurídico considerado), o qual, na segunda fase, é aumentado ou diminuído à luz das circunstâncias do caso concreto.
9. A sentença também não merece reforma, porquanto o juízo a quo, em sua fundamentação, considerou os valores habitualmente fixados jurisprudencialmente para situações assemelhadas, e ante as particularidades do caso analisado (correspondendo ao número de meses em que o autor ficou privado do seu benefício) fixou valor proporcional e razoável a título de dano moral.
10. Apelação não provida.
ACÓRDÃO
Decide a Décima Segunda Turma, por unanimidade, negar provimento à Apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília, data e assinatura eletrônicas.
Juiz Federal MARLLON SOUSA
Relator Convocado