
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA OLANDA DA SILVA e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MICHELLY FERNANDA MELCHERT - MT18610-A e TAINA DE CAMPOS RONDON - MT22017-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1000172-61.2022.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001080-54.2018.8.11.0044
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA OLANDA DA SILVA e outros
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MICHELLY FERNANDA MELCHERT - MT18610-A e TAINA DE CAMPOS RONDON - MT22017-A
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
R E L A T Ó R I O
O EXMO DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO (Relator):
Trata-se de Apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face de sentença que julgou procedente o pedido inicial para condenar a autarquia a pagar benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência.
Em suas razões (id 180923019, pág. 145), alega o INSS que o apelado não preencheu o requisito de miserabilidade, necessário à concessão do benefício. Requer o provimento do recurso, de modo a reformar a sentença.
O apelado apresentou contrarrazões (id 180923019, pág. 158).
É o relatório.

PROCESSO: 1000172-61.2022.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001080-54.2018.8.11.0044
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA OLANDA DA SILVA e outros
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MICHELLY FERNANDA MELCHERT - MT18610-A e TAINA DE CAMPOS RONDON - MT22017-A
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
V O T O
O EXMO DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO (Relator):
O art. 203, inciso V da Constituição da República de 1988 estabelece como objetivo da assistência social a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
Visando regulamentar o estatuto constitucional, o art. 20 da Lei nº 8.742/1993 dispõe que o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
O § 2o do aludido dispositivo esclarece que, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Extrai-se do laudo médico pericial de id 180923019, pág. 92 que o apelado tem sete anos de idade e sofre de artrogripose congênita múltipla (Q 74.3), ptose da pálpebra (H02.4) e luxação congênita do quadril (Q 65.1). Conforme consta do laudo, o periciando possui hipotrofia muscular em membros inferiores; mãos com deformidades em botoeira nos 3QDD bilateral; quadril esquerdo com luxação e encurtamento do membro; deformidades com joelhos em hiperextensão, pés planos valgos e teste de Neer positivo bilateralmente. Possui ainda importante opacificação, olhar não conjugado e óbvia perda de acuidade visual.
Concluiu o médico perito que o apelado apresenta incapacidade laboral total e permanente devido a processo congênito de múltiplas malformações. Há impossibilidade de exercer atividades laborais habituais sem prognóstico de melhora devido ao aspecto múltiplo e permanente das lesões. Apresenta acometimento da visão, dos membros superiores, do eixo da coluna e dos membros inferioresm enquadrando o menor como deficiente físico e portador de necessidades especiais (id 180923019, pág. 95).
Quanto ao requisito da miserabilidade, aduz o INSS que o apelado não faria jus ao benefício, pois seu genitor está empregado e recebe o valor de R$ 2.300,00 (id 180923019, pág. 147).
De fato, o CNIS juntado com a apelação (id 180923019, pág. 153) revela que o pai da parte autora esteve empregado entre os dias 01/04/2019 e 23/08/2021 e, posteriormente, a partir do dia 01/09/2021, com salário de R$ 2.300,00, o que, em tese, ultrapassa o permissivo legal.
Ocorre que o relatório do estudo social de id 180923019, pág. 126 evidencia que o grupo familiar do apelado é composto por quatro pessoas, sendo ele, seu pai, sua mãe e um irmão mais novo.
A mãe, conforme consta do laudo, tem dois filhos, ambos nasceram com deficiência congênita. O irmão, devido às várias limitações que possui de saúde, recebe o benefício de prestação continuada – BPC LOAS (pág. 126).
O autor precisa, com máxima urgência, realizar uma cirurgia para o estrabismo que não é feita pelo SUS. Necessita ainda de acompanhamento especializado que a rede SUS não disponibilizou até o momento, fazendo com que a família tenha gastos constantes para proporcionar uma melhor qualidade de vida ao menor.
Conforme pontuou o magistrado sentenciante:
No caso dos autos, é cristalino que o autor é pessoa e pobre e não possui expectativa de alçar uma condição laboral. Soma-se que o contexto socioeconômico vivenciado pela população desta comarca não dá azo à eventual profissionalização e desempenho de função que não aquelas que exigem labor pesado (id 180923019, pág. 138 - grifamos).
Destarte, transferindo-se todo o arcabouço retro montado ao caso concreto, deflui-se que o lado hipossuficiente faz jus ao benefício de prestação continuada. Afinal, é portador de deficiência e se encontra em situação de miserabilidade.
Outrossim, o plenário do Supremo Tribunal Federal – STF, em decisão proferida na RCL 4374/PE, de 18 de abril de 2013, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do §3º do art. 20 da Lei 8.742/93 – LOAS. Neste contexto, ainda que o “quantum” da renda “per capita” ultrapasse o valor de ¼ do salário mínimo, caberá ao órgão julgador avaliar a vulnerabilidade social de acordo com o caso concreto.
Por conseguinte, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, consagrou a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade do beneficiário por outros meios de prova, quando a renda per capita do núcleo familiar for superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo. É este também o posicionamento deste Tribunal Regional Federal:
CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93. PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA FÍSICA E/OU MENTAL. PERÍCIA MÉDICA. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E VIDA INDEPENDENTE. HIPOSSUFICIÊNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. A Constituição Federal, em seu artigo 203, inciso V, e a Lei n. 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social) garantem um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independentemente de contribuição à seguridade social. 2. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão estabelecidos no art. 20 da Lei n. 8.742/93. São eles: i) o requerente deve ser portador de deficiência ou ser idoso com 65 anos ou mais; ii) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e iii) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade). 3. O Col. STF, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.232-1/DF, declarou que a regra constante do art. 20, § 3º, da LOAS não contempla a única hipótese de concessão do benefício, e sim presunção objetiva de miserabilidade, de forma a admitir a análise da necessidade assistencial em cada caso concreto, mesmo que o “quantum” da renda “per capita” ultrapasse o valor de ¼ do salário mínimo, cabendo ao julgador avaliar a vulnerabilidade social de acordo com o caso concreto. 4. Também o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, consagrou a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade do beneficiário por outros meios de prova, quando a renda per capita do núcleo familiar for superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo. Nesse sentido, cf. REsp 1.112.557/MG, Terceira Seção, Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 20/11/2009. 5. Firmou-se o entendimento jurisprudencial de que, para fins de cálculo da renda familiar mensal, não deve ser considerado o benefício (mesmo que de natureza previdenciária) que já venha sendo pago a algum membro da família, desde que seja de apenas 1 (um) salário mínimo, forte na aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). Precedentes. 6. Considera-se deficiente aquela pessoa que apresenta impedimentos (físico, mental, intelectual ou sensorial) de longo prazo (mínimo de 2 anos) que podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Tal deficiência e o grau de impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, consoante o § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social. 7. Na hipótese, a incapacidade da parte-autora ao trabalho restou comprovada pelo laudo médico acostado; já a condição de miserabilidade, nos termos alinhavados acima, encontra-se escudada no Estudo Social e documentos catalogados ao feito, autorizando, assim, a concessão do benefício vindicado, conforme deferido pelo juízo a quo. 8. O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir do ajuizamento da ação, em observância ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, firmado no RE n. 631240, respeitados os limites do pedido inicial e da pretensão recursal, sob pena de violação ao princípio da no reformatio in pejus. 9. Honorários recursais arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor/percentual a que foi condenada a parte ré na sentença, e sem prejuízo deste, observados os limites mínimo e máximo estabelecidos nos incisos do §3º do art. 85 do CPC 10. A correção monetária e os juros de mora devem observar os termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. 11. Apelação do INSS desprovida.
(AC 1001534-35.2021.4.01.9999. Relatoria Desembargador Federal João Luiz de Sousa. Publicado em PJe 27/07/2023 PAG)
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.
Majoro os honorários advocatícios em 1%, nos termos da súmula 111, do STJ.
É o voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

PROCESSO: 1000172-61.2022.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001080-54.2018.8.11.0044
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA OLANDA DA SILVA e outros
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MICHELLY FERNANDA MELCHERT - MT18610-A e TAINA DE CAMPOS RONDON - MT22017-A
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E/OU MENTAL. LAUDO MÉDICO PERICIAL. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. LAUDO SOCIAL. MISERABILIDADE COMPROVADA. HIPOSSUFICIÊNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA.
1. O art. 203, inciso V da Constituição da República de 1988 estabelece como objetivo da assistência social a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Visando regulamentar o estatuto constitucional, o art. 20 da Lei nº 8.742/1993 dispõe que o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
3. O § 2o do aludido dispositivo esclarece que, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
4. Extrai-se do laudo médico pericial que o apelado tem sete anos de idade e sofre de artrogripose congênita múltipla (Q 74.3), ptose da pálpebra (H02.4) e luxação congênita do quadril (Q 65.1). Conforme consta do laudo, o periciando possui hipotrofia muscular em membros inferiores; mãos com deformidades em botoeira nos 3QDD bilateral; quadril esquerdo com luxação e encurtamento do membro; deformidades com joelhos em hiperextensão, pés planos valgos e teste de Neer positivo bilateralmente. Possui ainda importante opacificação, olhar não conjugado e óbvia perda de acuidade visual.
5. Concluiu o médico perito que o apelado apresenta incapacidade laboral total e permanente devido a processo congênito de múltiplas malformações. Há impossibilidade de exercer atividades laborais habituais sem prognóstico de melhora devido ao aspecto múltiplo e permanente das lesões. Apresenta acometimento da visão, dos membros superiores, do eixo da coluna e dos membros inferioresm enquadrando o menor como deficiente físico e portador de necessidades especiais.
6. Quanto ao requisito da miserabilidade, aduz o INSS que o apelado não faria jus ao benefício, pois seu genitor está empregado e recebe o valor de R$ 2.300,00. De fato, o CNIS juntado com a apelação revela que o pai da parte autora esteve empregado entre os dias 01/04/2019 e 23/08/2021 e, posteriormente, a partir do dia 01/09/2021, com salário de R$ 2.300,00, o que, em tese, ultrapassa o permissivo legal.
7. Ocorre que o relatório do estudo social evidencia que o grupo familiar do apelado é composto por quatro pessoas, sendo ele, seu pai, sua mãe e um irmão mais novo. A mãe, conforme consta do laudo, tem dois filhos, ambos nasceram com deficiência congênita. O irmão, devido às várias limitações que possui de saúde, recebe o benefício de prestação continuada – BPC LOAS. O autor precisa, com máxima urgência, realizar cirurgia para o estrabismo que não é feita pelo SUS. Necessita ainda de acompanhamento especializado que a rede SUS não disponibilizou até o momento, fazendo com que a família tenha gastos constantes para proporcionar uma melhor qualidade de vida ao menor.
8. Conforme pontuou o magistrado sentenciante: “No caso dos autos, é cristalino que o autor é pessoa e pobre e não possui expectativa de alçar uma condição laboral. Soma-se que o contexto socioeconômico vivenciado pela população desta comarca não dá azo à eventual profissionalização e desempenho de função que não aquelas que exigem labor pesado”
9. Outrossim, o plenário do Supremo Tribunal Federal – STF, em decisão proferida na RCL 4374/PE, de 18 de abril de 2013, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do §3º do art. 20 da Lei 8.742/93 – LOAS. Neste contexto, ainda que o “quantum” da renda “per capita” ultrapasse o valor de ¼ do salário mínimo, caberá ao órgão julgador avaliar a vulnerabilidade social de acordo com o caso concreto. Por conseguinte, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, consagrou a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade do beneficiário por outros meios de prova, quando a renda per capita do núcleo familiar for superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
10.Transferindo-se todo o arcabouço retro montado ao caso concreto, deflui-se que o lado hipossuficiente faz jus ao benefício de prestação continuada. Afinal, é portador de deficiência e se encontra em situação de miserabilidade.
11. Apelação do INSS não provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
