
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:PEDRO ALVES PEREIRA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ARIANE DE PAULA MARTINS TATESHITA - TO4130-S
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1022338-53.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001622-37.2021.8.27.2723
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:PEDRO ALVES PEREIRA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ARIANE DE PAULA MARTINS TATESHITA - TO4130-S
RELATOR: Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
R E L A T Ó R I O
O EXMO. JUIZ FEDERAL PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA (relator convocado):
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente o pedido do autor, concedendo-lhe o benefício previdenciário de pensão por morte.
Em suas razões, em síntese, o apelante alega que, em se tratando de óbito anterior à Constituição de 1988, sob a égide da LC 11/1971 e do Decreto 89.312/1984, não é possível o pagamento de pensão ao marido não inválido.
Regularmente intimado, o autor não apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PROCESSO: 1022338-53.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001622-37.2021.8.27.2723
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:PEDRO ALVES PEREIRA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ARIANE DE PAULA MARTINS TATESHITA - TO4130-S
RELATOR: Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
V O T O
O EXMO. JUIZ FEDERAL PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA (relator convocado):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Passo à análise do apelo do INSS que alega a impossibilidade de concessão da pensão por morte ao marido não inválido da pretensa instituidora do benefício, falecida anteriormente à Constituição de 1988.
Razão não assiste ao apelante.
Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte Regional.
In casu, o cônjuge do autor faleceu em 1985 (fl. 26), na vigência da Lei Complementar nº 11/1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL), assegurando pensão por morte aos dependentes de trabalhador rural.
A Lei Complementar nº 11/71, que criou o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL), a ser executado pelo FUNRURAL, com personalidade jurídica de natureza autárquica, instituiu as regras para concessão e manutenção de vários benefícios ao trabalhador rural, dentre eles a pensão por morte.
Eis seu teor, sobre o tema:
Art. 3º São beneficiários do Programa de Assistência instituído nesta Lei Complementar o trabalhador rural e seus dependentes.
§ 1º Considera-se trabalhador rural, para os efeitos desta Lei Complementar:
a) a pessoa física que presta serviços de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie.
b) o produtor, proprietário ou não, que sem empregado, trabalhe na atividade rural, individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da família indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mutua dependência e colaboração.
§ 2º Considera-se dependente o definido como tal na Lei Orgânica da Previdência Social e legislação posterior em relação aos segurados do Sistema Geral de Previdência Social.
De sua vez, aplicava-se especialmente aos trabalhadores rurais as disposições do Decreto 83.080/79, que regulamentava a matéria:
Art. 274. A previdência social rural e executada pelo INPS e compreende:
I - o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural - PRO-RURAL, instituído pela Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, com as alterações da Lei Complementar nº 16, de 30 de outubro de 1973;
II - benefícios por acidentes do trabalho para o trabalhador rural, instituídos pela Lei nº 6.195, de 19 de dezembro de 1974;
III - o amparo previdenciário instituído pela Lei nº 6.179, de 11 de dezembro de 1974;
IV - o regime de previdência social instituído para o empregador rural e seus dependentes pela Lei nº 6.260, de 06 de novembro de 1975.
Art. 275. São beneficiários da previdência social rural:
(...)
III - na qualidade de dependentes do trabalhador rural ou do segurado empregador rural - as pessoas assim definidas nos termos e nas condições da Seção II do Capítulo II do Título I da Parte I.
Art. 12. São dependentes do segurado:
I - A esposa, o marido inválido, a companheira mantida há mais de 5 (cinco) anos, os filhos de qualquer condição menores de 18 (dezoito) anos ou inválidos e as filhas solteiras de qualquer condição menores de 21 (vinte e um) anos ou inválidas;
Art. 298. A pensão por morte do trabalhador rural é devida aos seus dependentes, a contar da data do óbito, e consiste numa renda mensal de 50% (cinqüenta por cento) do maior salário-mínimo do País, arredondada a fração de cruzeiro para a unidade imediatamente superior.
Parágrafo único. Somente fazem jus a pensão os dependentes do trabalhador rural chefe ou arrimo da unidade familiar falecido depois de 31 de dezembro de 1971, ou, no caso de pescador, depois de 31 de dezembro de 1972.
A opção legislativa da época concedia, portanto, a pensão por morte somente aos dependentes do chefe de família ou arrimo de família. Neste regime, a unidade familiar era composta de apenas um único trabalhador rural; os outros membros eram seus dependentes. Assim, apenas ao chefe ou arrimo do grupo familiar era devida a aposentadoria (art. 4º, parágrafo único, da LC 11/71), pois somente ele era considerado segurado especial da Previdência Social. Aos demais membros do núcleo familiar era reservada a condição de dependente, e, por via de consequência, o direito ao pensionamento.
Contudo, não há que se falar que esta condição não pode ser ostentada pelas mulheres, como já consagrado pela jurisprudência, mormente lastreando-se na Constituição Federal de 1988. Vejamos o entendimento do Supremo Tribunal Federal:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PENSÃO POR MORTE AO CÔNJUGE VARÃO. ÓBITO DA SEGURADA EM DATA ANTERIOR AO ADVENTO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. PRINCÍPIO DA ISONOMIA (ART. 153, § 1º, DA CF/1967, NA REDAÇÃO DA EC 1/1969). PRECEDENTES. 1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o óbito da segurada em data anterior ao advento da Constituição Federal de 1988 não afasta o direito à pensão por morte ao seu cônjuge varão. Nesse sentido: RE 439.484-AgR, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe de 5/5/2014; RE 535.156-AgR, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, DJe de 11/4/2011. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - AgR RE: 880521 SP - SÃO PAULO 0049637-90.2008.4.03.9999, Relator: Min. TEORI ZAVASCKI, Data de Julgamento: 08/03/2016, Segunda Turma)
Em outras palavras, as disposições da Lei Complementar nº 11/1971 e do Decreto 83.080/79, quanto à possibilidade de concessão de benefícios previdenciários somente ao arrimo de família não foram recepcionados pela nova ordem constitucional de 1988, devendo ser feita a sua adequação aos novos princípios constitucionais que repulsam qualquer tipo de discriminação que vise violar direitos com base na raça, sexo, idade, gênero, estado civil etc.
Outrossim, o Supremo Tribunal Federal passou a entender que a exigência de comprovação da condição de invalidez do cônjuge varão, para concessão de pensão por morte, fere o princípio da isonomia.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PENSÃO POR MORTE AO CÔNJUGE VARÃO. ÓBITO DA SEGURADA ANTERIOR AO ADVENTO DA LEI 8.213/91. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. AUTOAPLICABILIDADE DO ART. 201, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o óbito da segurada em data anterior ao advento da Lei 8.213/91 não afasta o direito à pensão por morte ao seu cônjuge varão, tendo o art. 201, V, da Constituição Federal, que equiparou homens e mulheres para efeito de pensão por morte, aplicabilidade imediata. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 603.223-AgR, de minha relatoria, Segunda Turma, DJe de 24/3/2015)
Agravo regimental no recurso extraordinário. Previdenciário. Pensão por morte. Cônjuge varão. Demonstração de invalidez. Princípio da isonomia. Aplicabilidade imediata do Regime Geral de Previdência Social. Precedentes. 1. A regra isonômica aplicada ao Regime Próprio de Previdência Social também se estende ao Regime Geral de Previdência Social. 2. O art. 201, inciso V, da Constituição Federal, que equiparou homens e mulheres para efeito de pensão por morte, tem aplicabilidade imediata e independe de fonte de custeio. 3. A Lei nº 8.213/91 apenas fixou o termo inicial para a aferição do benefício de pensão por morte. 4. Agravo regimental não provido. (RE 415.861-AgR, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe de 1/8/2012)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCESSÃO AO CÔNJUGE VARÃO. ÓBITO DA SEGURADA ANTERIOR AO ADVENTO DA LEI N. 8.213/91. EXIGÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE INVALIDEZ. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. ARTIGO 201, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUTOAPLICABILIDADE. 1. O Princípio da Isonomia resta violado por lei que exige do marido, para fins de recebimento de pensão por morte da segurada, a comprovação de estado de invalidez (Plenário desta Corte no julgamento do RE n. 385.397- AgR, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJe 6.9.2007)
A regra isonômica aplicada ao Regime Próprio de Previdência Social tem aplicabilidade ao Regime Geral (RE n. 352.744-AgR, Relator o Ministro JOAQUIM BARBOSA, 2ª Turma, DJe de 18.4.11; RE n. 585.620-AgR, Relator o Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, 1ª Turma, Dje de 11.5.11; RE n. 573.813-AgR, Relatora a Ministra CÁRMEN LÚCIA, 1ª Turma, DJe de 17.3.11; AI n. 561.788-AgR, Relatora a Ministra CÁRMEN LÚCIA, 1ª Turma, DJe de 22.3.11; RE 207.282, Relator o Ministro CEZAR PELUSO, 2ª Turma, DJ 19.03.2010; entre outros). 2. Os óbitos de segurados ocorridos entre o advento da Constituição de 1988 e a Lei 8.213/91 regem-se, direta e imediatamente, pelo disposto no artigo 201, inciso V, da Constituição Federal, que, sem recepcionar a parte discriminatória da legislação anterior, equiparou homens e mulheres para efeito de pensão por morte. 3. Agravo regimental não provido. (RE 607.907-AgR, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 1/8/2011)
Diante disso, em observância ao disposto no artigo 5º, inciso I, e no artigo 201, inciso V, ambos da Constituição Federal, o entendimento que prevalece é no sentido de que, desde o advento da CF/88, não há justificativa para tratamento desigual entre homens e mulheres, devendo o autor ser considerado dependente da segurada/falecida.
No mesmo sentido, precedente desta Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. PROCEDIMENTO COMUM. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 8.213/91. CÔNJUGE DEPENDENTE DA SEGURADA FALECIDA. INCONSTITUCIONALIDADE DA NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA INVALIDEZ DO CÔNJUGE VARÃO. SENTENÇA MANTIDA. I Em observância ao que dispõe o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça sumulado no verbete de nº 340, a legislação aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente à data do óbito do segurado, tendo, no caso dos autos, falecida a instituidora da pensão em 09 de abril de 1984. II A concessão de pensão por morte aos dependentes da falecida segue o regramento previsto na Lei Complementar nº 11/1971, vigente à época do óbito, que prevê o benefício de pensão por morte aos dependentes do beneficiário do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, disciplinado pela retromencionada norma, como trabalhador rural. III O apelante, ao interpor recurso de apelação, impugnando a sentença concessiva de benefício previdenciário de pensão por morte, concentrou seus argumentos na alegada necessidade de que, ao marido, para que fosse qualificado como dependente do cônjuge falecido, fosse imprescindível a comprovação de que era inválido à data do óbito. IV Diante do princípio da isonomia, fora reconhecido pelo STF a inconstitucionalidade da exigência contida no inciso I do art. 11 da Lei 3.807/1960 bem como no art. 12, inciso I, do Decreto nº 83.080/1979 no que se refere à necessidade de comprovação de invalidez do cônjuge varão para que fosse tido como dependente da segurada falecida (RE 880.521-AgR, Ministro Teori Zavascki, Segunda Turma, DJe de 08/03/2016). V Ademais, na jurisprudência do STF, o entendimento é pela irrazoabilidade da exigência de que a instituidora do benefício ostentasse a condição de chefe ou arrimo de unidade familiar para a concessão de pensão por morte ao autor, em razão do falecimento de sua esposa ( AI 735.861/PR, Ministro Dias Tóffoli, DJ de 07/11/2012). VI Recurso de Apelação do INSS a que se nega provimento. (TRF-1 - AC: 10019146320184019999, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO, Data de Julgamento: 18/08/2021, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: PJe 24/08/2021 PAG PJe 24/08/2021)
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS.
Em razão da sucumbência recursal, majoro o valor fixado a título de honorários advocatícios em primeira instância em um ponto percentual.
É como voto.
Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
Relator convocado

PROCESSO: 1022338-53.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001622-37.2021.8.27.2723
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:PEDRO ALVES PEREIRA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ARIANE DE PAULA MARTINS TATESHITA - TO4130-S
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO ANTERIOR AO ADVENTO DA LEI 8.213/1991. APLICAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR 11/1971 E DO DECRETO 89.312/1984. CÔNJUGE VARÃO. MARIDO NÃO INVÁLIDO. CONDIÇÃO DE DEPENDENTE COMPROVADA. PRINCÍPIOS DA IGUALIDADE E DA ISONOMIA. SENTENÇA MANTIDA.
1. Cuida-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de concessão da pensão por morte, cujo óbito da pretensa instituidora do benefício ocorreu anteriormente à Constituição de 1988.
2. A concessão de pensões no sistema previdenciário rural, anteriormente à edição da Lei 8.213/91, era regida pela Lei Complementar 11/1971, que criou o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL), a ser executado pelo FUNRURAL, com personalidade jurídica de natureza autárquica.
3. A opção legislativa da época concedia a pensão por morte somente aos dependentes do chefe de família ou arrimo de família. Neste regime, a unidade familiar era composta de apenas um único trabalhador rural; os outros membros eram seus dependentes. Contudo, não há que se falar que esta condição não pode ser ostentada pelas mulheres, como já consagrado pela jurisprudência, mormente lastreando-se na Constituição Federal de 1988.
4. As disposições da Lei Complementar 11/1971 e do Decreto 89.312/1984, quanto à possibilidade de concessão de benefícios previdenciários somente ao arrimo de família, não foram recepcionadas pela nova ordem constitucional de 1988, devendo ser feita a sua adequação aos novos princípios constitucionais que repulsam qualquer tipo de discriminação que vise violar direitos com base na raça, sexo, idade, gênero, estado civil etc. Precedentes.
5. O Supremo Tribunal Federal passou a entender que a exigência de comprovação da condição de invalidez do cônjuge varão, para concessão de pensão por morte, fere o princípio da isonomia. Precedentes.
6. Apelação não provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
Relator convocado
