
POLO ATIVO: ARMANDO DOS REIS ESPINDOLA PIRES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: JOAO BERNARDES DOS REIS - GO11592-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1036193-70.2021.4.01.9999
APELANTE: ARMANDO DOS REIS ESPINDOLA PIRES
Advogado do(a) APELANTE: JOAO BERNARDES DOS REIS - GO11592-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por ARMANDO DOS REIS ESPINDOLA PIRES contra sentença na qual foi julgado improcedente o pedido de aposentadoria rural por idade, por ausência de prova material da condição de segurado especial.
A parte recorrente sustenta em suas razões que restou comprovado o exercício de atividade rural pelo tempo necessário ao deferimento do benefício. Assim, requer o provimento do recurso para que seja concedida a aposentadoria rural por idade.
Contrarrazões não apresentadas.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1036193-70.2021.4.01.9999
APELANTE: ARMANDO DOS REIS ESPINDOLA PIRES
Advogado do(a) APELANTE: JOAO BERNARDES DOS REIS - GO11592-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado através do início de prova material, corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Convém registrar, ainda, que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 14/12/1954, preencheu o requisito etário em 14/12/2014 (60 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 27/01/2015 e em 13/11/2019, os quais restaram indeferidos por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ajuizou a presente ação em 21/11/2019, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do primeiro requerimento administrativo.
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos: certidão de casamento, em 1982, constando a profissão do autor como fazendeiro; certidão de nascimento do filho, em 1984, constando a profissão como autor como fazendeiro; certidão da divisão amigável no ano de 2005, indicando ser o autor proprietário de uma gleba de terras, constando a profissão do autor como pecuarista; INCRAS em nome do pai, nos anos de 84, 85, 86; ITR nos anos de 92, 93 e CCIR nos anos de 1996/1997; notas fiscais em nome do autor: anos de 96, 97, 98, 99; CCIR dos anos de 1996/1997, Fazenda Mata da Fartura, em nome do requerente; ITR em nome do autor nos anos de 2005/2006; CCIR em nome do autor nos anos de 2006/2007/2008/2009; ITR dos anos de 2009/2010/2011/2012/2013; Inscrição estadual emitida em 12/06/2014; Declaração de aptidão ao PRONAF, datada de 2014; Certidão de Inteiro Teor averbada no ano de 2005, constando a divisão de condôminos, também em nome do autor; comprovante de endereço rural.
Da análise dos documentos apresentados, verifica-se que a certidão de casamento, em 1982, e a certidão de nascimento do filho, em 1984, constando a profissão do autor como fazendeiro; a certidão da divisão amigável no ano de 2005, indicando ser o autor proprietário de uma gleba de terras, constando a profissão do autor como pecuarista; o CCIR dos anos de 1996/1997, da Fazenda Mata da Fartura, em nome do requerente; o ITR em nome do autor nos anos de 2005/2006; o CCIR em nome do autor nos anos de 2006/2007/2008/2009; o ITR dos anos de 2009/2010/2011/2012/2013; e a Declaração de aptidão ao PRONAF, datada de 2014, constituem início razoável de prova material da condição de segurado especial.
Ainda, os documentos de propriedade rural em nome do genitor (ITR e CCIR) indicam a origem rurícola do autor e comprovam o desempenho da atividade campesina pelo requerente em imóvel pertencente à família.
Os recolhimentos como autônomo registrados no seu CNIS (01/1985 a 04/1986; 09/1986 a 04/1987; 10/1993 a 12/1993; 06/1994 a 09/1994; 11/1994 a 12/1994; 02/1995 a 09/1995;02/1996 a 04/1996), sem comprovação de vinculação a atividade urbana e em período anterior ao início da carência, não desqualificam a condição de segurado especial do requerente.
O autor também acostou aos autos a sua CTPS, a qual não contém registro de vínculos urbanos.
Registra-se, por oportuno, que a mera qualificação do autor como motorista, na abertura do inventário de seu pai em 2003, não descaracteriza sua condição de trabalhador rural, tendo vista a vasta documentação apresentada nos autos que demonstra o desempenho de atividade rural nos anos posteriores e até a data do requerimento administrativo formulado em 2015.
Ressalta-se que veículos antigos e de pequeno valor em nome do autor e/ou de sua esposa não são incompatíveis com o reconhecimento da condição de segurado especial. Sobre o tema, registra-se o entendimento deste e. Tribunal no sentido de que a mera existência de veículos populares e/ou utilitários em nome da parte autora e de seu cônjuge não se afigura bastante e suficiente para elidir o conjunto probatório dos autos (AC 1027917-21.2019.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 23/03/2021 PAG). No caso, consta dos autos a propriedade de um GM OPALA SS, 1977/1977, veículo muito antigo e de baixo valor, o que não desqualifica o autor como segurado especial.
No tocante à alegação do INSS de que a parte autora possui endereço urbano, registro, por oportuno, o entendimento adotado por este e. Tribunal no sentido de que o fato de a parte autora possuir endereço urbano não descaracteriza a sua qualidade de segurada especial, uma vez que a própria redação do inciso VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91 prevê expressamente que o trabalhador rural pode residir tanto em imóvel rural quanto em aglomerado urbano próximo a área rural (AC 1000402-69.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 31/03/2023).
Outrossim, o fato da fatura de energia elétrica superar R$ 200,00 também não afasta a condição de segurado especial.
Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova oral colhida, que confirmou o exercício da atividade rural pelo prazo necessário à concessão do benefício. Veja-se teor da sentença:
“Na oportunidade, o autor declarou que reside na zona rural que possui pouco mais meio alqueire, trabalha com criação de porco e de galinha e faz algumas plantações, disse que não trabalha na cidade e nunca trabalhou na cidade tampouco de carteira assinada. Afirmou que subsiste do que produz na terra e que trabalha sozinho e que atualmente tem um pedaço de cana, de bananeira e de mandiocal e que a produção é para consumo.
A testemunha WILMAR CÉSAR PEIXOTO declarou que conhece o autor há mais de trinta anos e que o autor reside em seu sítio, que é um local pequeno, cerca de um alqueire e que no local o autor cria porcos, galinhas e planta horta, banana, mandioca. Afirmou que ele não trabalha na cidade e que ele sempre trabalhou na roça.
A testemunha CELSO ANTÔNIO DA SILVA declarou que conhece o autor há cerca de vinte anos e que ele tem uma chácara, sempre o vê trabalhando na chácara, que a chácara pertence ao autor e é pequena. Disse que ele trabalha sozinho, sem empregados. Relatou que ele planta hortaliça e mandioca e que ele vende essas produções. Sempre o viu trabalhar apenas na zona rural.”
Há, portanto, comprovação da qualidade de segurado especial da parte autora, na condição de trabalhador rural, durante o cumprimento do prazo de carência previsto no art. 142 da Lei n. 8.213, de 1991, possibilitando o deferimento do benefício postulado a partir da data do primeiro requerimento administrativo formulado nos autos, em 27/01/2015, ocasião em que o autor já cumpria todos os requisitos legais.
Não há valores prescritos no presente caso, tendo em vista que não decorreu prazo superior a cinco anos entre a data do requerimento administrativo e do ajuizamento da ação.
Logo, diante da robustez do conjunto probatório, a sentença deve ser reformada.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
CUSTAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
O INSS é isento de custas na Justiça Federal.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus, que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da condenação, consideradas as parcelas vencidas até a prolação do acórdão de procedência.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação da parte autora, a fim de lhe conceder aposentadoria por idade rural, a partir do requerimento administrativo apresentado em 27/01/2015, nos termos da fundamentação acima.
Devem ser compensadas parcelas eventualmente pagas administrativamente e parcelas decorrentes de benefícios inacumuláveis recebidos no mesmo período.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1036193-70.2021.4.01.9999
APELANTE: ARMANDO DOS REIS ESPINDOLA PIRES
Advogado do(a) APELANTE: JOAO BERNARDES DOS REIS - GO11592-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA ORAL CORROBORADA. SEGURADO ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. APELAÇÃO PROVIDA.
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A concessão do benefício de aposentadoria por idade rural exige a comprovação de idade mínima (60 anos para homens) e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao período de carência exigido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142 da Lei nº 8.213/91).
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O início de prova material do exercício da atividade rural pode ser corroborado por prova testemunhal, sendo desnecessário que a prova documental abranja todo o período de carência. O rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP).
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No caso dos autos, a parte autora apresentou documentos hábeis a demonstrar o início de prova material da condição de segurado especial, corroborada pela prova testemunhal, o que permite o deferimento da aposentadoria por idade rural.
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As alegações de propriedade de veículos de baixo valor e de existência de endereço urbano não descaracterizam a qualidade de segurado especial do requerente.
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Apelação provida para conceder a aposentadoria por idade rural a partir do requerimento administrativo apresentado em 27/01/2015.
Tese de julgamento:
"1. A prova documental corroborada por testemunhal é suficiente para o reconhecimento da condição de segurado especial para fins de aposentadoria rural por idade."
Legislação relevante citada:
Lei nº 8.213/91, arts. 48, §§ 1º e 2º, 55, § 3º, 106 e 142.
CPC, art. 85.
EC nº 113/2021, art. 3º.
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp 1.719.021/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 23/11/2018.
STJ, AgRg no REsp 967344/DF, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJe 07/04/2008
TRF1, AC 1027917-21.2019.4.01.9999, Rel. Desembargador Federal Wilson Alves de Souza, Primeira Turma, PJe 23/03/2021.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
