
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:CARMELITA DE FARIA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ADRIANE ALVES THEODORO DE MORAES - MT11950-A e NILZA GOMES MACHRY - MT8245-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1021635-15.2024.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARMELITA DE FARIA
Advogados do(a) APELADO: ADRIANE ALVES THEODORO DE MORAES - MT11950-A, NILZA GOMES MACHRY - MT8245-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de aposentadoria rural por idade.
Em suas razões, o INSS sustenta que a parte autora não trouxe aos autos documentos suficientes que pudessem servir de início razoável de prova material do efetivo exercício das atividades campesinas no período total afirmado, tal como exigido pelo §3º, do art. 55 da Lei 8.213/91.
Em contrarrazões, a parte autora pugna pela manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1021635-15.2024.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARMELITA DE FARIA
Advogados do(a) APELADO: ADRIANE ALVES THEODORO DE MORAES - MT11950-A, NILZA GOMES MACHRY - MT8245-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado, no mínimo, mediante razoável início de prova material corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que ateste a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Por fim, convém registrar que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar etc., não são aptos a demonstrar o início de prova material na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
A parte autora, nascida em 23/03/1964, preencheu o requisito etário em 23/03/2019 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurada especial em 05/12/2019 (DER). Ato contínuo, ajuizou a presente ação em 22/09/2020 pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
Para comprovar sua qualidade de segurada especial e o exercício de atividade rural pelo prazo de carência, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos: certidão de casamento; certidão de nascimento dos filhos; CNIS; notas fiscais de venda de produtos agrícolas (notas fiscais de compra e entrada de produtos nos estabelecimentos comerciais emitentes); registro de matrícula de imóvel.
Da análise das provas apresentadas, verifica-se que a certidão de casamento, celebrado em 13/09/1980, em que consta a qualificação da autora como serviços gerais e do cônjuge como agricultor, a certidão de nascimento do filho, ocorrido em 27/11/1981, em que consta a qualificação da autora como do lar e do cônjuge como agricultor, a certidão de nascimento da filha, ocorrido em 23/11/1987, em que consta a qualificação do cônjuge como agricultor, a certidão de nascimento do filho, ocorrido em 19/09/1997, em que consta a qualificação da autora e do cônjuge como agricultores, o registro de matrícula de imóvel, de 1977 e 1983, em que consta a qualificação do cônjuge como agricultor, constituem início razoável de prova material da sua condição de segurado especial.
Ademais, consta na sentença que as testemunhas corroboraram as provas apresentadas. Afinal, a testemunha afirmou que conheceu a autora há 30 anos; que eram vizinhas na zona rural da região sul do país; que a autora sempre morou e trabalhou na roça, criando porco, galinha, vaca de leite, para subsistência; que a autora se mudou para o Mato Grosso com a família em busca de melhores condições de vida e trabalho, mas, mesmo assim, continuou residindo e produzindo na zona rural
Em que pese o INSS alegar que a autora e o cônjuge exerceriam atividade empresarial entre 2008 e 2019, o fato é que a Autarquia Previdenciária não juntou aos autos documentos comprovando o efetivo funcionamento da citada empresa durante o lapso mencionado, demonstrando, por exemplo, o percebimento de faturamento no mencionado período. Ademais, a prova oral corrobora a tese defensiva apresentada nas contrarrazões recursais acerca do ponto acima, a saber: “Já no tocante à sociedade empresarial, esta não condiz com a realidade, uma vez que seu filho apenas adicionou a mãe ao CNPJ por conta do nome que esta possui sem restrições e visando facilidade a empréstimos junto aos bancos, tanto é que há anos esta já havia pedido a baixa de seu nome, sendo que somente nesta data conseguiu o documento, o qual segue anexo”. Com efeito, a prova oral afirmou que a autora sempre trabalhou na zona rural. Note-se que a alegação de atividade empresarial foi apresentada pelo INSS apenas em sede de apelação, sem possibilitar contraprova adicional (prova oral) pela parte autora, devendo-se admitir como razoável a justificativa apresentada pela apelada, em homenagem ao princípio do contraditório (que restou comprometido pela apresentação tardia de informação nova pelo INSS) e ao princípio in dubio pro misero.
Quanto à alegação de que a parte autora possui veículos em seu nome, registra-se o entendimento deste e. Tribunal no sentido de que a mera existência de veículos populares e/ou utilitários em nome da parte autora e de seu cônjuge não se afigura bastante e suficiente para elidir o conjunto probatório dos autos (AC 1027917-21.2019.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 23/03/2021 PAG). No caso, o fato da autora possuir um GM/CHEVROLET 1977/1977 (veículo de baixo valor) e uma I/TOYOTA/HILUX 2005/2005 (veículo utilitário e antigo) não desconstitui a qualificação da apelada como segurada especial, especialmente considerando que a prova é forte no sentido de que ele realiza atividade rurícola dessa natureza.
Embora o INSS argumente que os documentos são extemporâneos, por serem antigos, eles são suficientes para comprovar o labor rurícola exercido pela autora durante o período de carência, sobretudo quando se verifica que não há, nos autos, documento posterior que desconstitua a presunção de que o labor rural se estendeu ao longo de sua vida.
Considerando que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurado especial, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo (05/12/2019), nos termos do art. 49 da Lei nº 8.213/91.
Juros e correção monetária
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
CUSTAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
A isenção de custas já foi reconhecida na sentença.
Honorários advocatícios
Os honorários já foram arbitrados no mínimo legal e com observância da Súmula 111/STJ. Devem ser mantidos da forma como restaram arbitrados na sentença.
CONCLUSÃO
Ate o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1021635-15.2024.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARMELITA DE FARIA
Advogados do(a) APELADO: ADRIANE ALVES THEODORO DE MORAES - MT11950-A, NILZA GOMES MACHRY - MT8245-A
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. ATIVIDADE EMPRESARIAL NÃO COMPROVADA PELO INSS. POSSE DE VEÍCULOS DE BAIXO VALOR. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra sentença que concedeu à parte autora o benefício de aposentadoria rural por idade, reconhecendo sua condição de segurada especial.
2. Discute-se a suficiência da prova material apresentada pela parte autora para comprovar o exercício de atividade rural, requisito essencial para a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, nos termos do art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142 da Lei n. 8.213/91. Examina-se também o alegado exercício de atividade empresarial e a propriedade de veículos.
3. A concessão de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o cumprimento da idade mínima (60 anos para homens e 55 anos para mulheres) e a comprovação de atividade rural no período de carência, ainda que de forma descontínua.
4. Os documentos apresentados pela autora, como a certidão de casamento e certidões de nascimento dos filhos, nas quais o cônjuge consta qualificado como agricultor, além de contratos de comodato rural, foram considerados início razoável de prova material, corroborados por prova testemunhal que confirmou o trabalho rural da autora.
5. Embora o INSS alegue que a autora exerceu atividade empresarial entre 2008 e 2019, não foram apresentados documentos que comprovassem o efetivo funcionamento da empresa ou o recebimento de faturamento nesse período. Ademais, a prova testemunhal corrobora a alegação de que a inclusão da autora no CNPJ visava facilitar empréstimos para o filho, sem vínculo com atividades empresariais regulares.
6. Quanto à posse de veículos, o entendimento consolidado nesta Corte é de que a propriedade de veículos populares e/ou utilitários, por si só, não descaracteriza a condição de segurado especial. No caso, os veículos em nome da autora (um GM/CHEVROLET 1977/1977 e uma I/TOYOTA/HILUX 2005/2005) não desconstituem o conjunto probatório apresentado.
7. As alegações do INSS quanto à extemporaneidade dos documentos são infundadas, pois estes, mesmo antigos, foram considerados suficientes para comprovar o labor rural durante o período de carência. A ausência de documentos que desconstituam a condição de segurado especial da autora reforça seu direito ao benefício.
8. Apelação do INSS desprovida. Concessão do benefício de aposentadoria rural por idade mantida, com termo inicial na data do requerimento administrativo (05/12/2019), nos termos do art. 49 da Lei nº 8.213/91.
Tese de julgamento:
- A concessão de aposentadoria rural por idade para segurado especial pode ser fundamentada em início razoável de prova material, mesmo que extemporânea, desde que corroborada por prova testemunhal idônea.
- O exercício de atividade empresarial não comprovado e a posse de veículos populares e/ou utilitários não descaracteriza a condição de segurado especial para fins previdenciários.
Legislação relevante citada:
Lei n. 8.213/1991, art. 48, §§ 1º e 2º
Lei n. 8.213/1991, art. 142
Lei n. 8.213/1991, art. 49
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp 1.719.021/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 1º/3/2018
TRF1, AC 1027917-21.2019.4.01.9999, Des. Fed. Wilson Alves de Souza, Primeira Turma, PJe 23/03/2021
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
