
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:JOSE DE SOUZA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: RONALDO DOS SANTOS CIRQUEIRA - MT26066-A e JOSILENE DIAS DOS SANTOS - MT29330-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002803-07.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JOSE DE SOUZA
Advogados do(a) APELADO: JOSILENE DIAS DOS SANTOS - MT29330-A, RONALDO DOS SANTOS CIRQUEIRA - MT26066-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de aposentadoria rural por idade.
Em suas razões, o INSS sustenta que a parte autora não trouxe aos autos documentos suficientes que pudessem servir de início razoável de prova material do efetivo exercício das atividades campesinas no período total afirmado, tal como exigido pelo §3º, do art. 55 da Lei 8.213/91.
Em contrarrazões, a parte autora pugna pela manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002803-07.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JOSE DE SOUZA
Advogados do(a) APELADO: JOSILENE DIAS DOS SANTOS - MT29330-A, RONALDO DOS SANTOS CIRQUEIRA - MT26066-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Da prescrição
A parte recorrente suscita a observância da prescrição quinquenal.
Tratando-se de relação jurídica de trato sucessivo, prescrevem as prestações vencidas no período anterior ao quinquênio que precede ao ajuizamento da ação, nos exatos termos da Súmula n. 85/STJ.
No caso em análise, não há que se falar em prescrição, não tendo transcorrido o lustro prescricional entre o ajuizamento da ação e o requerimento administrativo do benefício.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado, no mínimo, mediante razoável início de prova material corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que ateste a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Por fim, convém registrar que documentos tais como carteiras, comprovantes e declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
Na presente demanda, a parte autora, nascida em 28/05/1957, preencheu o requisito etário em 28/05/2017 (60 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurada especial em 07/10/2020 (DER), que foi indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ato contínuo, ajuizou a presente ação em 03/10/2022, pleiteando a concessão do benefício supracitado, a contar do requerimento administrativo.
Para comprovar sua qualidade de segurada especial e o exercício de atividade rural pelo prazo de carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos: declaração emitida pela Prefeitura Municipal de Matupá - MT; contrato particular de compromisso de cessão e transferência de direito de posse, com reconhecimento de firma; carteira sindical e recibo de mensalidade de julho de 1999 a 2000; CNIS; extrato previdenciário.
A declaração expedida pela Prefeitura Municipal de Matupá-MT, de 28/01/2002, constando que, para fins do Programa Luz no Campo, o autor é produtor rural e possuidor da Chácara Souza, constitui início razoável de prova material de que o autor, em tal ocasião, se qualificava como rurícola. Tal documento goza de presunção de legitimidade e veracidade. Não havendo prova de vínculos urbanos posteriores, presume-se que a parte autora permaneceu nas atividades rurais (regra de experiência comum).
Ademais, o contrato particular de compromisso de cessão e transferência de direito de posse, celebrado entre o autor e Josivaldo Felisardo em 15/10/2015, com reconhecimento de firma na mesma data, a carteira sindical juntamente com recibo de mensalidade de julho de 1999 a 2000, o CNIS e extrato previdenciário em que consta vínculo de origem rural com Agropastoril Ouro Verde Ltda., de 01/02/1981 a 17/05/1982, também constituem início de prova material da sua condição de segurado especial.
Quanto à alegação do INSS de que o requerente fez parte de sociedade empresária, registre-se que não constam no CNIS ou extrato previdenciário do autor recolhimentos vinculados à referida sociedade, além de estar na situação “INAPTA” por “Omissão de Declarações”, o que sugere ausência de atividade efetiva. Ademais, o autor alegou nas contrarrazões que o registro se deu por falta de conhecimento e “que não esteve envolvido de modo algum na instauração ou operacionalização das empresas em questão”.
O curto vínculo urbano constante no CNIS de Luiza Belair Nunes não descaracteriza a condição de rurícola do autor, ademais, ele possui documentos em seu próprio nome (Tema 532/STJ).
Embora o INSS alegue que os documentos são extemporâneos, por serem antigos, eles são suficientes como início de prova material para comprovar o labor rurícola exercido pela parte autora durante o período de carência, sobretudo quando se verifica que não há, nos autos, documento posterior que desconstitua a presunção de que o labor rural se estendeu ao longo de sua vida.
Ademais, a prova testemunhal corroborou a pretensão da parte autora, pelo tempo de carência suficiente para a concessão do benefício.
Considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurado especial, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo (07/10/2020), nos termos do art. 49 da Lei nº 8.213/91, observada a prescrição quinquenal no que se refere ao pagamento de prestações vencidas.
Juros e correção monetária
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
A sentença destoa dessa diretriz, devendo ser ajustada quanto ao ponto.
DESPESAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
No entanto, conforme consignado na sentença, são devidas “custas processuais pelo INSS, diante da revogação da isenção conferida pelo art. 24, inc. I, da Lei Estadual 3.779/2009”.
O INSS é isento de custas na Justiça Federal.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
A sentença já arbitrou os honorários advocatícios no percentual mínimo e aplicou a Súmula 111 do STJ, conforme requerido pelo INSS.
Tendo a apelação sido parcialmente provida sem inversão do resultado, descabe a majoração de honorários advocatícios na fase recursal (Tema 1059/STJ).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS para ajustar os encargos moratórios, nos temos da fundamentação do voto.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002803-07.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JOSE DE SOUZA
Advogados do(a) APELADO: JOSILENE DIAS DOS SANTOS - MT29330-A, RONALDO DOS SANTOS CIRQUEIRA - MT26066-A
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. ENCARGOS MORATÓRIOS AJUSTADOS. ISENÇÃO DE CUSTAS NA JUSTIÇA ESTADUAL. INEXISTÊNCIA NO CASO CONCRETO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
- A concessão de aposentadoria por idade rural exige o cumprimento de dois requisitos: idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulheres e a comprovação do exercício de atividade rural por período equivalente ao da carência exigida (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142 da Lei nº 8.213/91).
- O exercício da atividade rural pode ser comprovado por início razoável de prova material, mesmo que não cubra todo o período de carência, desde que corroborado por prova testemunhal idônea, nos termos do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e da jurisprudência consolidada do STJ (REsp 1.719.021/SP).
- No caso dos autos, os documentos apresentados pela parte autora, como declaração de propriedade rural, contratos e registros em carteira sindical, constituem início de prova material apta a comprovar o exercício de atividade rural, corroborada pela prova testemunhal.
- A parte autora faz jus à aposentadoria por idade rural, a partir da data do requerimento administrativo (DER 07/10/2020).
- As parcelas vencidas deverão ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios, conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualizado com base no RE 870.947-SE (Tema 810/STF) e no REsp 1.495.146/MG (Tema 905/STJ). Após 08/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC (art. 3º da EC nº 113/2021).
- Conforme consignado na sentença, são devidas “custas processuais pelo INSS, diante da revogação da isenção conferida pelo art. 24, inc. I, da Lei Estadual 3.779/2009”.
- Apelação parcialmente provida para ajustar os encargos moratórios.
Tese de julgamento:
“1. A comprovação de atividade rural para fins de concessão de aposentadoria por idade pode ser feita mediante início de prova material corroborada por prova testemunhal. 2. A correção monetária e os juros de mora deverão seguir os parâmetros definidos no Tema 810/STF e no Tema 905/STJ, com a aplicação da taxa SELIC após 08/12/2021.”
Legislação relevante citada:
Lei nº 8.213/91, arts. 48, §§ 1º e 2º; 55, § 3º; 142.
EC nº 113/2021, art. 3º.
CF/88, art. 109, § 3º.
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp 1.719.021/SP, relator Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 01/03/2018, DJe 23/11/2018.
STF, RE 870.947-SE, relator Min. Luiz Fux, julgado em 20/09/2017 (Tema 810).
STJ, REsp 1.495.146/MG, relator Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/02/2018 (Tema 905).
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
