
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:APARECIDA FREITAS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ANDREIA CRISTINA ANDRADE MATTOS - MT14423-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1021283-04.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDA FREITAS
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA CRISTINA ANDRADE MATTOS - MT14423-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença na qual foi julgado procedente o pedido de aposentadoria rural por idade, com termo inicial na data do requerimento administrativo.
O recorrente sustenta requer o recebimento do recurso no duplo efeito. Suscita a preliminar de nulidade da sentença por ausência de fundamentação e valoração arbitrária das provas. Sustenta que não há início razoável de prova material da condição de segurado especial. Pugna pela improcedência do pedido. Em razão do princípio da eventualidade, na hipótese de ser julgado procedente o pedido deduzido na inicial, requer seja a data de início do benefício fixada na data da audiência de instrução e julgamento, visto que, em tese, não foi comprovada a alegada atividade rural, em regime de economia familiar, em momento anterior. Argui também a prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação, nos termos do art. 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91. Requer a fixação dos honorários de sucumbência em no máximo 5% sobre o valor da causa.
A parte autora apresentou contrarrazões e suscitou a preliminar de intempestividade do recurso.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1021283-04.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDA FREITAS
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA CRISTINA ANDRADE MATTOS - MT14423-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
PRELIMINARES
Da intempestividade do recurso
Afasto a preliminar de intempestividade do recurso suscitada na contestação, tendo em vista que a apelação foi apresentada dentro do prazo legal, conforme consta da certidão de tempestividade acostada à fl. 176 do Id 247112592.
Da nulidade da sentença por ausência de fundamentação
Conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça, [o] órgão julgador não é obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos apresentados pelas partes em defesa da tese que sustentam, devendo apenas enfrentar as questões relevantes e imprescindíveis à resolução da demanda (AgRg no HC n. 705.639/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 22/5/2023, DJe de 26/5/2023).
No caso em análise, o juiz sentenciante enfrentou as questões relevantes e analisou de forma específica o benefício pleiteado (aposentadoria por idade rural), com indicação de quais provas serviram para fundamentar o seu convencimento.
Logo, a preliminar não merece acolhimento.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado através do início de prova material corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Por fim, convém registrar que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar etc., não são aptos a demonstrar o início de prova material na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 29/10/1957, preencheu o requisito etário em 29/10/2012 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 20/02/2020 (fl. 59, Id 247112592). Ajuizou a presente ação em 04/08/2020, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
Para comprovar sua qualidade de segurada especial e o exercício de atividade rural pelo prazo de carência, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos: certidão de nascimento próprio, com registro da profissão do genitor como lavrador; carteira do sindicato dos trabalhadores rurais; declaração de exercício de atividade rural; alguns recibos de pagamento de mensalidades; fatura de energia elétrica em nome de Benedito Freitas; escritura de compra e venda de lote de terras localizado na Chácara Alegria, localizada na zona urbana, adquirida pela autora e Antônio José de Oliveira em 30/10/2007.
Da análise dos documentos apresentados, vê-se que a escritura de compra e venda de lote de terras localizado na Chácara Alegria, localizada na zona urbana, adquirida pela autora e Antônio José de Oliveira em 30/10/2007, constitui início razoável de prova material do exercício de atividade rural a partir desta data.
Não obstante, não há início razoável de prova material quanto ao exercício de atividade no período anterior a 2007, a fim de comprovar o exercício de atividade rural nos 180 meses anteriores ao implemento da idade (2012) ou à apresentação do requerimento administrativo (2020).
A certidão de nascimento próprio, embora possa indicar a sua origem rurícola, não faz prova do exercício da atividade rural durante todo o período de carência, na medida em que a requerente não juntou outros documentos que demonstrem o desempenho da lida campesina em regime de economia familiar com os seus genitores ou em propriedade pertencente à família.
Vale ressaltar que a autora declarou que exerceu atividade rural como assentada de 2006 a 2019 e como arrendatária no período de 1990 a 1993. Não obstante, não juntou aos autos contrato de concessão de uso pelo INCRA ou de arrendamento/parceria agrícola com firma reconhecida capazes de corroborar suas alegações.
Registra-se que a declaração de atividade rural emitida pelo sindicato, sem a devida homologação, a carteira do sindicato acompanhada de alguns recibos de pagamento de mensalidades, sem descrição da finalidade do valor pago e sem se revestirem de maiores formalidades, e o comprovante de endereço rural em nome de terceiro não constituem início razoável de prova material.
Assim, uma vez que os documentos juntados pela parte autora não foram aptos a demonstrar o início de prova material do exercício de labor rural, durante todo o período de carência necessário à concessão do benefício, a prova testemunhal carreada nos autos, por conseguinte, também não se mostra bastante para a comprovação da atividade rural por força do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, a qual dispõe que “a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”.
O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.352.721 na sistemática dos recursos repetitivos (Tema 629), firmou a tese de que “a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”.
Logo, faz-se necessária a extinção do processo sem julgamento do mérito.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E CUSTAS PROCESSUAIS
Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em custas e honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus (art. 85, §11, CPC), que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da causa. Suspensa sua exigibilidade em razão da assistência judiciária gratuita deferida.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, JULGO EXTINTO O PROCESSO, DE OFÍCIO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurado, e JULGO PREJUDICADA a apelação do INSS.
Eventuais valores pagos a título de tutela provisória estarão sujeitos a restituição, conforme Tema 692/STJ: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos, na forma do art. 520, II, do CPC/2015 (art. 475-O, II, do CPC/73)".
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1021283-04.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDA FREITAS
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA CRISTINA ANDRADE MATTOS - MT14423-A
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. PROVA TESTEMUNHAL NÃO SUPRE A AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. SÚMULA 149 DO STJ. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS A TÍTULO DE TUTELA PROVISÓRIA. TEMA 692/STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. APELAÇÃO PREJUDICADA.
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A concessão do benefício de aposentadoria por idade rural exige a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, pelo período correspondente à carência, conforme disposto nos arts. 48, §§ 1º e 2º, e 142 da Lei nº 8.213/91.
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A prova do tempo de serviço rural deve ser feita mediante início de prova material, corroborado por prova testemunhal idônea, não sendo possível a comprovação exclusiva por meio de prova testemunhal (Súmula 149 do STJ).
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No caso, os documentos apresentados pela parte autora são insuficientes para constituir início razoável de prova material do labor rural durante o período de carência exigido para a concessão do benefício.
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Diante da ausência de início de prova material, faz-se necessária a extinção do processo sem julgamento do mérito, conforme o entendimento do STJ no REsp 1.352.721 (Tema 629), que possibilita a repropositura da ação, caso sejam reunidos os elementos probatórios necessários.
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Eventuais valores pagos a título de tutela provisória devem ser restituídos, conforme decidido no Tema 692 do STJ, com a possibilidade de desconto de até 30% de eventual benefício ainda pago à parte autora.
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Inversão dos ônus da sucumbência. Honorários advocatícios fixados em 1% (um por cento), acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da causa, suspensa sua exigibilidade em razão da assistência judiciária gratuita deferida.
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Processo extinto sem resolução do mérito. Apelação prejudicada.
Legislação relevante citada:
- Lei nº 8.213/1991, arts. 48, §§ 1º e 2º, 55, § 3º, 106, 142.
- Código de Processo Civil (CPC), art. 85, §§ 2º, 3º e 11.
- Súmula 149 do STJ.
Jurisprudência relevante citada:
- STJ, REsp 1.352.721 (Tema 629)
- STJ, AgRg no REsp 967344/DF
- STJ, Tema 692
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo, de ofício, sem resolução do mérito, e julgar prejudicada a apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
