
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:RAIMUNDA MORAES PINHEIRO MOURA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ELMARY MACHADO TORRES NETO - MA9395-A e JEAN FABIO MATSUYAMA - SP281625-A
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

APELAÇÃO CÍVEL (198)1000073-57.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente o pedido de concessão de aposentadoria de trabalhador rural, por idade, no valor de um salário mínimo, a partir da data do requerimento administrativo (17/04/2018). (id. 283694516 fls. 01/03).
Em suas razões, a autarquia previdenciária requer o recebimento do seu recurso em seu duplo efeito. No mérito, a parte apelante pretende a reforma da sentença para que o pedido seja julgado improcedente, sustentando a ausência de prova material contemporânea e idônea do labor rural em regime de economia familiar. (id. 283694516 fls. 08/10).
Foram apresentadas contrarrazões (id. 283694516 fls. 12/18).
É o relatório.

VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Do efeito suspensivo
Tratando-se de sentença que concedeu benefício previdenciário, parcela de natureza alimentar, não merece acolhimento o pedido da autarquia apelante no sentido de que o seu recurso seja recebido com efeito suspensivo, uma vez que, como se verá a seguir, o apelo interposto nos autos não será provido no tocante à pretensão principal direcionada à concessão ou ao restabelecimento do benefício previdenciário.
Desse modo, ausentes a probabilidade e a relevância dos fundamentos da tese recursal, rejeito o pedido de atribuição de efeito suspensivo à apelação, porque não configurada a hipótese prevista no art. 1.012, § 4º, do Código de Processo Civil.
MÉRITO
No mérito, impõe-se examinar a presença, ou não, dos requisitos legalmente estabelecidos para a concessão do benefício pleiteado.
Da aposentadoria rural, por idade
Nos termos do art. 48 da Lei nº 8.213/91, a concessão do benefício de aposentadoria rural, por idade, exige a demonstração do efetivo exercício do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91 mediante prova documental plena ou, ao menos, um início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal. Como requisito etário, a lei exige idade superior a 60 anos para o homem e 55 anos para a mulher.
Período de carência
Este requisito legal deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida: “O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Regime de economia familiar
Conforme dispõe o art. 11 da Lei do RGPS, considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, a atividade na qual o efetivo labor campesino dos membros da família é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes, sendo indispensável, sobretudo, à sua própria subsistência.
Início de prova material
Para o reconhecimento de tempo do efetivo exercício da atividade rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental alcance todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior àquele a que especificamente se refira, desde que seja contemporânea à época da ocorrência dos fatos a comprovar (TNU, Súmula 34).
Aliando-se a esse aspecto, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), tornando admissíveis, portanto, a utilização de outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, com indicação da parte autora, do seu cônjuge ou companheiro, na qualidade de trabalhador rural.
Do caso em exame
A parte autora, nascida em 25/12/1949, implementou o requisito etário em 25/12/2004 (55 anos), tendo formulado o seu requerimento administrativo em 17/04/2018.
Para a comprovação da qualidade de segurado e do período de carência, a autora apresentou, dentre outros, os seguintes documentos: a) extrato do CNIS; b) certidão de casamento com Aroldo Abreu Moura, realizado em 2009; c) declaração emitida pela Agência Estadual de Defesa Agropecuária do Maranhão, constando a autora como produtora, bem como, constando como propriedade a Fazenda Vereda Bonita, datado em 2017; d) fatura de consumo de energia elétrica, em nome do seu esposo, relativa ao ano de 2018; e) portaria emitindo declaração de trabalhadora rural, em nome da autora, datado em 2018; f) matrícula de imóvel rural, constando o esposo da autora como proprietário, datado em 2011; g) declaração de trabalhadora rural, na condição de comodatária em regime de economia familiar, referente ao período entre 2001 a 2018; h) recibo de entrega da declaração de ITR, referente aos anos de 2013, 2017; i) carteira emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Estreito, datado em 2013; j) declaração emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Estreito, constando atividade rural em nome da autora referente ao período entre 2001 a 2018; k) declaração emitida pelo Sr. Aroldo Abreu Moura, constando que a autora residiu e trabalhou na Fazenda Vereda Bonita em regime de economia familiar, referente ao período entre 2001 a 2018. (fls. 15/42).
Aliado a tais elementos, foram tomados os depoimentos dos Srs. Manoel Lobato e Pedro Aguiar, testemunhas no caso em tela, os quais confirmaram o labor rural desenvolvido pela parte autora.
Ao proferir sentença nos autos, o Juízo a quo assim entendeu: “Como se vê, a prova documental somada à prova testemunhal produzida em juízo apresenta-se coerente e segura, tendo as testemunhas afirmado que a autora sempre exerceu atividade rural no período que se pretende comprovar. Em que pese a autora receba pensão pela morte de seu primeiro marido, pelo exercício de trabalho urbano, tal não é suficiente para afastar a condição de rurícola, visto que, após a morte de seu marido, já se passaram 21 (vinte e um)anos. Além disso, quando se casaram em 1969, ambos exerciam atividades rurais, tendo retornado ao campo no ano de1985. Assim, restou sobejamente comprovada a atividade rural desempenhada pela requerente por período superior a 180meses, devendo o pedido de aposentadoria rural ser julgado procedente.”.
Por outro lado, o INSS alega que a parte apelada perdeu a qualidade de segurado especial, uma vez que a parte foi titular de empresa individual durante o período de carência do benefício pleiteado.
Sobre o tema, assim dispõe o §12, art. 11, da lei 8.213/91:
“§ 12. A participação do segurado especial em sociedade empresária, em sociedade simples, como empresário individual ou como titular de empresa individual de responsabilidade limitada de objeto ou âmbito agrícola, agroindustrial ou agroturístico, considerada microempresa nos termos da Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006, não o exclui de tal categoria previdenciária, desde que, mantido o exercício da sua atividade rural na forma do inciso VII do caput e do § 1o, a pessoa jurídica componha-se apenas de segurados de igual natureza e sedie-se no mesmo Município ou em Município limítrofe àquele em que eles desenvolvam suas atividades.”
No caso sob exame, verifica-se, todavia, que embora os documentos apresentados pela requerente possam representar um início de prova material do seu labor rural, ela manteve a exploração de empresa durante o período de carência, em segmento estranho ao da área agrícola.
Com efeito, foi titular de "37.426.228/0001-58 – RP SILVA VAREJISTA", no período de 1993 a 2018.
Ressalta-se que, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural como segurado especial, a parte necessita comprovar, ainda que de forma descontínua, o labor rural pelo período de meses idênticos ao da carência no momento em que preencher o requisito etário, ou quando der entrada no requerimento administrativo, ou seja, de 17/04/2018.
De fato, restou comprovado que a parte recorrida explorou a referida atividade empresarial durante todo o período de carência legalmente exigido para a concessão do benefício que ora pleiteia, restando, assim, descaracterizado o trabalho rural em regime de economia familiar e, por conseguinte, a sua condição de segurado especial.
Dos acessórios
Com esses fundamentos, DOU PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS para, reformando a sentença que concedeu a aposentadoria rural por idade, julgar improcedente o pedido formulado pela parte autora na inicial.
Inverto os ônus de sucumbência, ficando suspensa a sua exigibilidade, nos termos do art. 98, §3º do Código de Processo Civil.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada

24APELAÇÃO CÍVEL (198)1000073-57.2023.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RAIMUNDA MORAES PINHEIRO MOURA
Advogados do(a) APELADO: ELMARY MACHADO TORRES NETO - MA9395-A, JEAN FABIO MATSUYAMA - SP281625-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE EMPRESARIAL DURANTE O PERÍODO DE CARÊNCIA DO BENEFÍCIO PLEITEADO. APELAÇÃO PROVIDA.
1. São requisitos para aposentadoria de trabalhador(a) rural: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
2. Fica excluído da categoria de segurado especial, a parte que participar de sociedade civil, como empresário individual ou como titular de empresa individual de responsabilidade limitada, em desacordo com as limitações impostas pela lei.
3. Havendo nos autos documentos que comprovam a atividade empresarial durante o período de carência, resta afastada a condição de segurado especial, nos termos do art. 1, § 9º, inc. III, da Lei n. 8.213/91.
4. Apelação provida para reformar a sentença que concedeu o benefício de aposentadoria rural, por idade, na condição de segurado especial.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação interposto pela Autarquia, nos termos do voto da relatora..
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada
