
POLO ATIVO: JOSE BOMFIM GOMES DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: DEBORA REGINA MACEDO MOURA - TO3811-A e MARLA GONCALVES GOMES - TO6476-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1031321-12.2021.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença na qual foi julgado improcedente o seu pedido de concessão de aposentadoria rural, por idade, sem condenação no pagamento das custas e honorários advocatícios, em razão da justiça gratuita (fl. 200)
Em suas razões, a apelante requer a reforma da sentença para que seja julgado procedente o seu pedido, argumentando haver comprovado todos os requisitos necessários para concessão do benefício. (fls. 205/232)
Sem contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo, portanto, ser conhecido.
No mérito, impõe-se examinar se estão presentes, ou não, os requisitos legais imprescindíveis à concessão do benefício.
Do mérito
Aposentadoria rural por idade. A concessão do benefício exige a demonstração do efetivo exercício do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91, mediante prova documental plena ou, ao menos, um início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal. Como requisito etário, a lei exige idade superior a 60 anos, para o homem e 55 anos, para a mulher (artigo 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Período de carência. O requisito de carência deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida: “O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Regime de economia familiar. Conforme dispõe o art. 11 da Lei do RGPS, considera-se trabalho rural, em regime de economia familiar, a atividade em que o labor dos membros da família é indispensável à própria subsistência, é exercido em condições de mútua dependência e colaboração e sem a utilização de empregados permanentes.
Início de prova material. Para o reconhecimento do tempo de efetivo exercício da atividade rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental alcance todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que seja contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
É pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, nos quais esteja especificada a profissão da parte autora, a do seu cônjuge ou companheiro, como trabalhador rural.
Do caso em exame:
A parte autora, nascida em 15/08/1954, implementou o requisito etário em 15/08/2014 (60 anos), tendo formulado o seu requerimento administrativo do benefício em 16/11/2017.
Para comprovar a atividade rural, juntou aos autos os seguintes documentos: a) Conta de energia elétrica com endereço rural (2018); b) Declaração de Exercício de atividade rural junto ao INSS em 2018; c) Escritura de compra de imóvel rural em 2008; d) Declaração de residência e atividade rural expedida pela FUNAI em 2008; e) Certidão de casamento com Juscelina Teixeira Lima, realizado em 1977, da qual consta a profissão de lavrador da parte autora; f) Notas fiscais de aquisição de produtos agrícolas; g) ficha de matricula escolar dos filhos (fl. 16/50)
Ocorre, todavia, que os documentos apresentados pela parte não representam um início razoável de prova material da sua condição de segurado especial.
De fato, documentos tais como carteiras, comprovantes e declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público, não são aptos a demonstrar a existência de um razoável início de prova material da qualidade de trabalhador campesino, na medida em que não se revestem de formalidades legais exigidas para tanto.
Das informações constantes dos autos, verifica-se que, em 2008, a parte autora adquiriu imóvel rural com área de 160,64 ha, com pagamento “a vista” do valor de R$ 230.000,00 (duzentos e trinta mil reais)., valor incompatível com a qualidade do trabalhador rural.
Não fosse isso, a prova testemunhal também se mostrou frágil, pois as testemunhas arrolada e ouvidas em audiência confirmaram o fato de ser o autor um criador de gado e proprietário de 3 (três) automóveis, ou seja, não há como reconhecer a sua qualidade de trabalhador rural em regime de economia familiar.
Com efeito, o regime de economia familiar se caracteriza pelo exercício de atividade cujo rendimento é indispensável à subsistência do núcleo familiar, hipótese que não se consubstancia no caso sob análise.
Em caso semelhante, assim decidiu esta Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. MARIDO EMPREGADO RURAL. BENEFÍCIO INDEVIDO.
1. A despeito da iliquidez do julgado, percebe-se nitidamente que as diferenças devidas não ultrapassarão sessenta salários mínimos, pois a aposentadoria deferida, no valor de um salário mínimo, foi concedida a partir de 10/04/2015 e a sentença proferida em 09/07/2015. Aplicação do § 2º do art. 475 do CPC/73, vigente ao tempo da sentença 2. A aposentadoria por idade será devida ao segurado especial que, cumprida a carência exigida em lei, completar 60 anos de idade, se homem, e 55, se mulher. Além disso, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural em regime de economia familiar, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anteror ao requerimento do benefício ou ao implemento do requisito etário. 3. No caso, para fins de demonstração do labor rural pelo período de carência, a parte autora junta certidão de nascimento da filha de 1998, em que o marido é qualificado como vaqueiro e a autora "do lar", e um contracheque do consorte de outubro/2011, demonstrando que este mantém vínculo empregatício desde 01/01/2002 (data de admissão), recebendo salário superior ao mínimo. Tais elementos depõem contra a pretensão autoral, pois demonstram que a subsistência da família advinha do salário recebido pelo marido na condição de empregado, descaracterizando a condição de segurado especial prevista no art. 11, VII, da Lei 8.213/91. 4. Benefício indevido. Ressalte-se que esta Câmara assentou o entendimento que o benefício previdenciário, recebido de boa-fé, como na hipótese, ainda que não tenha havido erro da Administração, é irrepetível, tendo em vista a sua natureza alimentar. É deste modo que a presente relação jurídica será disciplinada neste ponto. 5. Apelação parcialmente provida. Sentença reformada. Antecipação da tutela cessada, com efeitos ex nunc. 6. Inversão do ônus da sucumbência. Honorários fixados em 10% do valor da causa, cuja exigibilidade ficará condicionada às hipóteses do § 3º do art. 98 do CPC/2015, em razão da assistência judiciária gratuita ora deferida.” (AC 006558-92.2016.4.01.9199, Relator: JUIZ FEDERAL CRISTIANO MIRANDA DE SANTANA, 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DA BAHIA, julgamento 10 de Novembro de 2017, Publicação 21/02/2018)
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. SEGURADOESPECIAL/RURAL. MARIDO EMPREGADO/TRABALHADOR RURAL. CONDIÇÃO NÃO EXTENSÍVEL. AUSÊNCIA DE REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR.1. Conforme relatório, trata-se de apelação da parte autora (fls. 131/139) em face de sentença (fls. 122/126) do Juízo de Direito de Presidente Olegário/MG, que, em ação de 09/03/2010, julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade rural/segurado especial, contra o que se opõe a recorrente sustentando que a condição de lavrador do marido é extensível a ela e que os depoimentos das testemunhas favorecem seu pleito.2. MÉRITO: A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade superior a 60 anos para homem e 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º da Lei de Benefícios).3. Se a filiação ao RGPS é de antes de 24 de julho de 1991, considera-se a tabela constante do art. 142 e a data da implementação das condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, isto é, idade mínima, variante conforme o gênero, e tempo de trabalho rural. Se posterior àquela data, a carência é de 180 contribuições, nos termos do art. 25, II, da Lei 8.213/91.4. Para fins de reconhecimento de tempo rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34). 5. É pacífica a jurisprudência do STJ e do TRF1 no sentido de que o rol do art. 106da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos. 6. Registre-se que, nos termos da Lei 8.213/91, artigo 49, I, b, o benefício previdenciário vindicado é devido a partir da data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal. Em caso de ausência de tal requerimento, o benefício será devido a contar da citação. (...)."(Recurso Especial Representativo de Controvérsia. Art. 543-C do CPC. REsp 1369165/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 26/02/2014, DJe 07/03/2014). 7. NO PRESENTE CASO: Data de nascimento 25/12/1954, 55 anos em 2009; 168 meses de carência, 14 anos; S/DER. 8. Sem razão a parte autora, pois, como se vê na documentação por ela juntada, a atividade de seu marido era de empregado/trabalhador rural, condição que não se estende a ela, já que não há falar em regime de economia familiar nessa situação. 9. Eventual ajuda prestada pela autora ao marido no desempenho de seu trabalho decorre de liberalidade sua (da autora), o que, assim, não gera os efeitos pretendidos, tanto mais que poderia interferir em relação trabalhista com impactos na esfera patrimonial do empregador, talvez sem que até mesmo tivesse conhecimento dessa alegada ajuda ao marido. 10. Registre-se, ainda, que não há nenhuma informação nos autos de que em algum momento a autora tenha reivindicado direitos trabalhistas. 11. Ademais, observa-se que no ano de implemento do requisito etário já haviam decorridos mais de 15 anos de edição da Lei 8.213/91 e, ainda assim, a autora não juntou nenhum documento em seu próprio nome, o que reforça a convicção de que não houve exercício de atividade rural de forma relevante à sua caracterização como segurada especial. 12. Uma vez que o conjunto probatório não favorece a autora, deve ser mantida a sentença, diante de tudo exposto. 13. Apelação desprovida.” (AC:0064571-14.2010.4.01.9199, Relator JUIZ FEDERAL GRIGÓRIO CARLOS DOS SANTOS, 2ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, Julgamento 28 de Agosto de 2017, Publicação 16/10/2017 e-DJF1).
Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação interposto pela parte autora.
Fixo os honorários advocatícios recursais em percentual equivalente a 1% (um por cento) sobre o valor atualizado da causa. Ressalta-se a condição suspensiva em relação ao(à) autor(a), consoante art. 98, §3º, do CPC.
É como voto.
Brasília, 20 de março de 2024.
DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS
RELATORA

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1031321-12.2021.4.01.9999
JOSE BOMFIM GOMES DA SILVA
Advogados do(a) APELANTE: DEBORA REGINA MACEDO MOURA - TO3811-A, MARLA GONCALVES GOMES - TO6476-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE . PROPRIEDADES DE BENS DE VALOR INCOMPATÍVEL COM O LABOR CAMPESINO EM REGIME DE SUBSISTÊNCIA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL NÃO DEMONSTRADA. INDEFERIMENTO DO BENEFÍCIO.DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO.
1. A concessão do benefício de aposentadoria por idade exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal e idade superior a 60 anos para homens e 55 anos para mulheres (artigo 48, § 1º da Lei de Benefícios).
2. O requisito de carência deve ser cumprido em período imediatamente anterior à apresentação do requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642).
3. Propriedade da parte autora sobre bens de valores incompatíveis com o labor rural em regime de subsistência, a evidenciar a descaracterização da sua qualidade de segurado especial.
4. Apelação interposta pelo INSS a que se dá provimento para julgar improcedente o pedido.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação interposto pelo INSS, nos termos do voto da relatora.
Brasília, 20 de março de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
