
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:DIANA CARDOSO DOS SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MIRALINE PEREIRA DUTRA RODRIGUES - GO43321-A
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

APELAÇÃO CÍVEL (198)1017314-44.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente, em parte, o pedido inicial de concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo, a partir da data do requerimento administrativo (fls. 114/119).
Em suas razões, a autarquia previdenciária requer o recebimento do seu recurso em seu duplo efeito. No mérito, pretende a reforma da sentença para que o pedido da parte autora seja julgado improcedente, em razão da ausência de prova material contemporânea e idônea do labor rural em regime de economia familiar. Subsidiariamente, arguiu a prescrição quinquenal das parcelas vencidas, requerendo, ainda, a fixação do termo inicial do benefício a partir da data de prolação da sentença e a aplicação da correção monetária nos termos previstos no TEMA 905 do STJ.
Sem contrarrazões (fl. 134).
É o relatório.

VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Da prescrição
Em se tratando de relações jurídicas de trato sucessivo, a prescrição quinquenal atinge apenas as parcelas vencidas no período anterior aos cinco anos que precedem o ajuizamento da ação, não atingindo a pretensão ao próprio fundo de direito (Súmula 85 do STJ).
Tendo em vista que a presente ação foi ajuizada em 26/08/2019, há de ser rejeitada a ocorrência da prescrição quinquenal prevista no art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/1991, uma vez que o benefício foi deferido a partir de 02/08/2017.
Da aposentadoria rural por idade
A concessão desse benefício exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade a partir de 60 anos, para homem, e de 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Da Carência
O requisito da carência deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida:
“O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Do Regime de economia familiar
Considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, conforme dispõe o art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, “a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
Das provas
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que, diante da dificuldade do segurado especial na obtenção de prova escrita do exercício de sua profissão, o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo, inclusive aqueles que estejam em nome de membros do grupo familiar (REsp n. 1.354.908/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/9/2015, DJe de 10/2/2016).
Ademais, a Primeira Seção da Corte Superior sedimentou entendimento, inclusive sob a sistemática do art. 543-C do Código de Processo Civil/1973, acerca da possibilidade de extensão da eficácia probatória da prova material, tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento apresentado, desde que corroborada por robusta prova testemunhal (Súmula n. 577/STJ), não admitindo, nos termos da Súmula 149, a prova exclusivamente testemunhal (AgInt no REsp n. 1.949.509/MS, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 14/2/2022, DJe de 17/2/2022.).
O caso em exame
A parte autora, nascida em 08/06/1959, implementou o requisito etário em 08/06/2014 (55 anos), tendo formulado o requerimento administrativo do benefício em 13/07/2016.
Para a comprovação da qualidade de segurada e do período de carência, a autora apresentou, entre outros, os seguintes documentos: a) declaração de comodato feita por José Gilmar Ribeiro de Morais, atestando que a autora trabalha e reside em sua propriedade, datada em 2016; b) certidão de imóvel, em nome de terceiro, datada em 2016; c) certidão de casamento com Leônidas Morais dos Santos, na qual o cônjuge se encontra qualificado como lavrador, realizado em 1976; d) certidão de nascimento do filho Fábio Cardoso Dos Santos, constando a profissão dos genitores como lavrador e lides do lar, datada em 1977; e) fatura de consumo de energia elétrica, com endereço urbano, em nome do seu esposo, relativa ao ano de 2019; f) comprovante de indeferimento; e g) autodeclaração do segurado especial rural, datada em 2021.
Por outro lado, o INSS apresentou o extrato do CNIS para demonstrar que a parte autora, ora apelada, esteve filiada à previdência no mês de 07/2006 como contribuinte individual, e o seu cônjuge possui registro de vínculos empregatícios, nos períodos de 08/1973 a 01/1974, 04/1975 a 04/1975, 10/1975 a 01/1976, 10/1980 a 11/1981, 11/1982 a 07/1983, 05/1985 a 01/1986, 06/1986 a 07/1987, 03/1988 a 03/1988, 03/1988 a 04/1988, 05/1988 a 10/1988, 02/1991 a 05/1991, 09/1991 a 10/1991, 11/1991 a 05/1992, 09/1994 a 12/1994, 10/1996 a 06/1998, 10/1999 a 12/1999, 02/2000 a 03/2000, 04/2001 a 11/2001, 11/2004 a 03/2005, 05/2005 a 09/2006, 05/2007 a 06/2007, 04/2013 a 12/2016, 04/2013 a 03/2014, 04/2014 a 12/2014, 03/2015 a 03/2015, 06/2015 a 06/2015 e de 09/2015 a 09/2015, bem como concessão de auxilio doença de 07/2015 a 09/2015 e aposentadoria por idade em 2016.
As certidões de casamento e de nascimento, na qual o cônjuge da parte se encontra qualificado como lavrador, tiveram o seu valor probatório afastado, em razão dos vínculos urbanos posteriores, que extrapolam o limite previsto no artigo 11, § 9º, III, da Lei 8.213/1991, descaracterizando a condição de segurado especial da apelante.
Importa registrar que o enquadramento como segurado especial, em regime de economia familiar, pressupõe que o trabalho rural seja indispensável à manutenção da própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o fato de o cônjuge exercer atividade urbana não é suficiente para afastar a condição de segurada especial do outro, mas afasta a eficácia probatória dos documentos apresentados em nome do seu consorte, evidenciando que o interessado deve trazer aos autos prova material dos fatos concernentes à sua pessoa, evidenciando, assim, que devem ser expedidos em seu próprio nome.
Nesse sentido é o seguinte precedente, entre outros:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ATIVIDADE RURAL. EXTENSÃO DE CONDIÇÃO DE RURAL AO CÔNJUGE. IMPOSSIBILIDADE. VÍNCULO URBANO. AUSÊNCIA DE PROVA EM NOME PRÓPRIO. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL DE ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ.
1. O labor campesino, para fins de percepção de aposentadoria rural, deve ser demonstrado por início de prova material e ampliado por prova testemunhal, ainda que de maneira descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento, pelo número de meses idêntico à carência.
2. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que o exercício de atividade urbana pelo cônjuge, por si só, não descaracterizaria a parte autora como segurada especial, mas afasta a eficácia probatória dos documentos apresentados em nome do consorte, devendo ser juntada prova material em nome próprio.
3. No caso, a Corte de origem, após minucioso exame dos elementos fáticos contidos nos autos, consignou a fragilidade do conjunto probatório, haja vista que, a par de a documentação estar no nome do esposo da parte autora, que passou a exercer atividade urbana e se aposentou por tempo de contribuição, todo o acervo probatório juntado aos autos revelou-se insuficiente à comprovação de trabalho rural no período de carência.
4. A alteração dessas conclusões, tal como colocada a questão nas razões recursais, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, a teor do óbice previsto na Súmula 7/STJ.
5. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1749069/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/05/2021, DJe 20/05/2021)
Nesse contexto, não remanesce dúvida de que a parte autora, ora recorrente, não se desincumbiu do ônus de instruir a petição inicial com início razoável de prova material, em nome próprio, da atividade rural em regime de economia familiar, no período de carência legalmente exigida.
Importa registrar, mais uma vez, que a prova testemunhal não pode ser considerada suficiente para a comprovação do exercício da atividade rural, nos termos do entendimento consolidado na Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça.
No julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que nas ações previdenciárias, em vista da natureza das normas de proteção social, a ausência de prova a instruir a petição inicial implica no reconhecimento de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito, podendo o autor ajuizar novamente a ação reunindo novos elementos probatórios (Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julg. 16/02/2015).
Ante o exposto, DECLARO EXTINTO o processo, sem apreciação do mérito, e julgo PREJUDICADO o exame do recurso de apelação interposto pelo INSS.
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada

52APELAÇÃO CÍVEL (198)1017314-44.2023.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
DIANA CARDOSO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: MIRALINE PEREIRA DUTRA RODRIGUES - GO43321-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. APOSENTADORIA RURAL, POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. VÍNCULOS URBANOS EM NOME DO CÔNJUGE. AUSÊNCIA DE UM INÍCIO DE PROVA MATERIAL EM NOME PRÓPRIO. PROCESSO JULGADO EXTINTO. EXAME DA APELAÇÃO PREJUDICADO.
1. São requisitos para a aposentadoria de trabalhador(a) rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que o exercício de atividade urbana pelo cônjuge, por si só, não descaracteriza a qualidade de segurada especial da parte autora, mas afasta a eficácia probatória dos documentos apresentados em nome do consorte, devendo ser juntada prova material em nome próprio. Precedentes.
3. O Superior Tribunal de Justiça decidiu, em sede de recurso repetitivo, que trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar. Precedente.
4. Não tendo sido apresentado, em nome próprio, um início de prova material da condição de segurado especial, o direito à aposentadoria rural, por idade não se configura, porque o benefício não pode ser concedido apenas com base em prova unicamente testemunhal (Súmula nº 149, Superior Tribunal de Justiça).
5. O Superior Tribunal de Justiça decidiu, em sede de recurso repetitivo, que, nas ações previdenciárias, em vista da natureza das normas de proteção social, a ausência de prova a instruir a inicial implica no reconhecimento de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem apreciação do mérito, podendo o autor ajuizar novamente a ação desde que reunidos novos elementos probatórios (Tema 629).
6. Processo julgado extinto, sem exame do mérito. Exame do recurso de apelação do INSS prejudicado.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo, sem apreciação do mérito, dando por prejudicado o exame do recurso de apelação interposto pelo INSS, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada
