
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:HERCULANO JOSE DE SOUSA NETO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: RICARDO CICERO PINTO - SP124961
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1004173-55.2023.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: HERCULANO JOSE DE SOUSA NETO
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente o pedido de pensão por morte formulado pela parte autora, com DIB na data do óbito, condenando o recorrido em honorários advocatícios, fixados estes em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, correspondente às parcelas vencidas até o momento da prolação da sentença, de acordo com a Súmula n° 111, do Superior Tribunal de Justiça, com antecipação da tutela.
Em suas razões recursais, requer o apelante a reforma da sentença, aduzindo a inexistência de dependência econômica.
Com contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1004173-55.2023.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: HERCULANO JOSE DE SOUSA NETO
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Impõe-se o conhecimento da apelação, ante a presença dos pressupostos e requisitos para sua admissibilidade.
No caso sob análise, se constata a existência de circunstância a caracterizar a probabilidade do provimento do recurso da autarquia Ré, o que possibilita a concessão do efeito suspensivo postulado.
DO MÉRITO
O objeto da presente demanda é o instituto da pensão por morte, previsto no artigo 201 da Constituição Federal, que em seu inciso V aduz que é devida “pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes”, com a finalidade de preservar a qualidade de vida da família, no caso de morte daquele que é responsável pela sua subsistência.Posteriormente, o artigo 74 da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, regulamentou a questão, prevendo que “a pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não”.
Preliminarmente, importa destacar que a concessão da pensão por morte rege-se pela lei vigente à época do óbito (Súmula 340 do STJ) mediante o preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a demonstração da qualidade do segurado do instituidor na data do óbito e; c) a condição de dependente (art. 74, Lei nº 8.213/91).
A Lei nº 8.213/91, em seu artigo 16, indica os beneficiários que ostentam a qualidade de dependentes do segurado, e, em seu §4º, dispõe que é presumida a dependência econômica do cônjuge, da companheira, do companheiro e do filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou portador de deficiência.
Aos dependentes de segurado especial de que trata o art. 11, inciso VII, da referida lei, fica garantida a concessão de pensão por morte no valor de um salário-mínimo, exigindo-se a comprovação da qualidade de segurado do instituidor mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal coerente e robusta, ou prova documental plena, não sendo admissível a prova exclusivamente testemunhal.
O art. 26, I da Lei 8.213/91, por sua vez, prevê que o deferimento de pensão por morte independe do cumprimento de carência, mas é necessário que o óbito tenha ocorrido enquanto o trabalhador tinha a qualidade de segurado.
A par disso, o artigo 106 da Lei 8.213/91 elenca o rol de documentos aptos à comprovação do exercício da atividade rural, frise-se, de caráter meramente exemplificativo, conforme entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça e deste Colegiado (REsp 1081919/PB, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 02/06/2009, DJe 03/08/2009, e AC 0047556-22.2016.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF1 e-DJF1 02/09/2022 PAG), a saber:
“Art. 106. A comprovação do exercício de atividade rural será feita, complementarmente à autodeclaração de que trata o § 2º e ao cadastro de que trata o § 1º, ambos do art. 38-B desta Lei, por meio de, entre outros:
I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - (revogado);
IV - Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, de que trata o inciso II do caput do art. 2º da Lei nº 12.188, de 11 de janeiro de 2010, ou por documento que a substitua;
V – bloco de notas do produtor rural;
VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7º do art. 30 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor;
VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante;
VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização daprodução;
IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da comercialização de produção rural; ou
X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra.”
Nessa linha, é o entendimento deste Colegiado:
APELAÇAO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. SENTENÇA MANTIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA. RECURSO DESPROVIDO. 1. . Recorre o INSS contra sentença que julgou procedente o pedido autoral de aposentadoria por idade rural. Argui que, não obstante a regulamentação legal dada a matéria, verifica-se que a parte autora não se desincumbiu do ônus de comprovar sua alegada condição de segurado especial, e que a documentação trazida aos presentes autos apresenta-se inservível por si só. Subsidiariamente, que seja aplicado o art.1º F para fins de correção monetária. 2. A concessão do benefício de aposentadoria rural por idade exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade superior a 60 anos para homem e 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º da Lei de Benefícios). 3.No tocante à prova do labor rural, é pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos, nos quais esteja especificada a profissão da parte autora ou de seu cônjuge/companheiro como trabalhador rural. 4. A parte autora atingiu a idade mínima necessária para aposentar, conforme documento de fl. 12. 5. Na hipótese, quanto a qualidade de segurada especial, a parte autora juntou como início de prova material: indeferimento administrativo; conta de energia; documentos pessoais; certidão de casamento em 1979, constando a profissão de lavrador do nubente, extensível à esposa; certidão de nascimento de filho constando a profissão de lavrador do genitor em 1981; INFBEN do marido da apelada demonstrando que este é aposentado por invalidez RURAL; declaração de residência. 6. Deste modo, está comprovada a qualidade de segurada especial da apelada, em especial pela certidão de casamento em que a profissão do marido como lavrador fica evidenciada, bem como os vínculos rurais da autora no CNIS. Restou comprovado ainda que autora continuou morando com o marido mesmo após divorciarem, separando-se novamente há cerca de um ano da data sentença de 1ºgrau. A prova testemunhal, fl. 56 confirmou o início de prova material, conforme conclusões do juiz sentenciante, devendo ser dado primazia, pois teve contato imediato com a parte e testemunhas. 7. Diante da análise do conjunto probatório, a apelada demonstrou o cumprimento dos requisitos. Há de se observar que não há necessidade de que em tais documentos seja imprescindível a informação se referir unicamente ao segurado, nem que corresponda a todo o período de carência. Ademais, o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213-91, é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis, portanto, outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo. 8. Sobre as parcelas pretéritas incide correção monetária pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do TEMA 905 STJ. Ressalva do entendimento desta Relatora pela aplicação do IPCA-E (TEMA 810 STF). Incidência da SELIC após a entrada em vigor da EC 113\2021. 9. Recurso do INSS desprovido. (AC 0047556-22.2016.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF1 e-DJF1 02/09/2022 PAG)(grifos nossos)
Da análise dos autos, a parte autora juntou os seguintes documentos: a) certidão de óbito de Maria Madalena da Silva Soares, falecida em 15/11/2014, constando a observação que vivia em união estável com o Requerente; b) documentos de filho em comum da falecida e do Requerente, nascido em 1999; c) certidão emitida em 26/07/2018 pela Superintendência Regional do Incra atestando que o Requerente é assentado no Projeto de Assentamento Chapadinha desde 17/04/2001, constando Maria Luiza Aguiar de Souza como sua cônjuge; d) declaração emitida em 16/10/2018 pelo Instituto de Defesa Agropecuária atestando que o Requerente lá possui cadastro; e) ficha de cadastro de estabelecimento rural do Instituto de Defesa Agropecuária, constando o Requerente como responsável pela propriedade, com a data de cadastro em 29/05/2017 e que os produtores do estabelecimento são o Requerente e Maria Luiza Aguiar de Souza; f) ficha de cadastro do Sindicato de Trabalhadores Rurais em nome da falecida, qualificada como viúva, constando que sua filiação ocorreu em 21/05/2003.
Por sua vez, o INSS apresentou cópia do processo administrativo do Requerente, constando certidão de casamento do Requerente com Maria Luiza Aguiar de Souza, ocorrido em 1987, com a averbação do divórcio ocorrido em 15/03/2011.
Pelos documentos apresentados, a qualidade de segurada especial da falecida restou comprovada, em especial a ficha de cadastro do Sindicato de Trabalhadores Rurais.
Resta-nos, então, analisar a existência de dependência econômica.
Em atenta análise aos autos, constata-se que não há nos autos prova material capaz de comprovar que o vínculo afetivo do Requerente com a falecida.
Há nos autos comprovação de filho em comum 15 (quinze) anos antes do óbito, enquanto o falecido era casado com a Sra. Maria Luiza Aguiar de Souza, havendo o casamento finalizado em 15/03/2011, pouco mais de 3 (três) anos antes do óbito da suposta instituidora do benefício.
Ademais, por ocasião da análise do Tema nº 529 pelo Supremo Tribunal Federal, firmou-se a tese de repercussão geral no sentido de que “a preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1.723, § 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro.” (RE 1045273, Relator(a): Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 21-12-2020, processo eletrônico repercussão geral - mérito DJe-066 divulg 08-04-2021 public 09-04-2021)
Ademais, não foram juntadas aos autos provas suficientes da existência de relação afetiva do período de 15/03/2011 (data do divórcio) até 15/11/2014 (data do óbito). Sendo que a única prova colacionada é a certidão de óbito, documento declaratório, no qual se fez constar que a falecida vivia em união estável com o Requerente.
Diante das provas careadas aos autos, não restam atendidos os requisitos indispensáveis à concessão do benefício previdenciário (1. óbito, 2. qualidade de segurado e 3. dependência econômica do demandante), uma vez que a união estável não restou comprovada, não fazendo a parte autora jus, então, ao benefício de pensão por morte.
Deve a sentença de procedência ser reformada.
Não obstante tais circunstâncias, o STJ, em sede de recurso repetitivo no julgamento do REsp 1352721/SP, decidiu que, nas ações previdenciárias, em vista da natureza das normas de proteção social, a ausência de prova a instruir a inicial implica no reconhecimento de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem a apreciação do mérito, sendo possível que o autor ajuíze novamente a ação desde que reunidos novos elementos probatórios.
Por consequência, fica revogada a decisão que antecipou os efeitos da tutela.
Prejudicado o exame da apelação.
É como voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1004173-55.2023.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: HERCULANO JOSE DE SOUSA NETO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. EFEITO SUSPENSIVO. PENSÃO POR MORTE RURAL. UNIÃO ESTÁVEL NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. TEMA Nº 529 DO STF. PROCESSO JULGADO EXTINTO. EXAME DA APELAÇÃO PREJUDICADO.
1. Presentes os requisitos para a concessão de efeito suspensivo.
2. A pensão por morte é benefício previdenciário regido pela lei vigente à época do óbito do segurado instituidor, sendo ele aposentado ou não, devida aos seus dependentes, nos termos do art. 74 da Lei 8.213/91.
3. São requisitos indispensáveis à concessão do benefício: o óbito, a dependência econômica em relação ao falecido, e a qualidade de segurado especial do instituidor da pensão.
4. Comprovada a qualidade de segurada da falecida.
5. Não há nos autos prova material apta a comprovar o vínculo afetivo do Requerente com a falecida de 15/03/2011 (data do divórcio do Requerente) até 15/11/2014 (data do óbito da suposta instituidora). O único documento juntado para tal desiderato foi a certidão de óbito com registro de que o de cujus vivia em união estável com o Requerente.
6. Verifica-se, ainda, dos autos que o requerente e o de cujus têm uma filha em comum, nascida em 15.10.1999, 15 anos antes do óbito, quando referido autor estava casado com Maria Luiza Aguiar de Souza, tendo havido a dissolução do vínculo matrimonial em 15/03/2011, 3 (três) anos antes do óbito da suposta instituidora do benefício.
6. Em casos análogos, o STF, no Tema nº 529, fixou a seguinte tese, com repercussão geral: “a preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1.723, § 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro.”
7. Ante a insuficiência de provas quanto à existência de união estável, deve ser aplicado o atendimento do STJ, em sede de recurso repetitivo no julgamento do REsp 1352721/SP, de que, nas ações previdenciárias, em vista da natureza das normas de proteção social, a ausência de prova a instruir a inicial implica no reconhecimento de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem a apreciação do mérito, sendo possível que o autor ajuíze novamente a ação desde que reunidos novos elementos probatórios.
8. Revogada a decisão que antecipou os efeitos da tutela.
9. Processo julgado extinto. Exame da apelação da parte autora prejudicado.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo sem apreciação do mérito, e julgar prejudicado o exame da apelação interposta, nos termos do voto do relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
