
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ANDREIA LIMA DE CASTRO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ELOIR FRANCISCO MILANO DA SILVA - SP273806-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001749-06.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDREIA LIMA DE CASTRO
Advogado do(a) APELADO: ELOIR FRANCISCO MILANO DA SILVA - SP273806-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
A parte autora interpôs ação de procedimento comum em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), visando à obtenção do pagamento do seguro-desemprego destinado ao pescador artesanal durante o período de defeso correspondente ao biênio 2015/2016.
Sentença proferida pelo Magistrado a quo, julgando procedente o pleito inicial.
O INSS interpôs apelação, alegando, preliminarmente, a incidência da prescrição quinquenal, a ausência de interesse processual, o reconhecimento de litispendência/coisa julgada e a ilegitimidade passiva do INSS quanto ao pediso de emissão ou validação de RGP. No mérito, resumidamente, argumentou sobre a ausência dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado e alegou a improcedência do pedido de dano moral.
A parte autora apresentou contrarrazões defendendo a manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001749-06.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDREIA LIMA DE CASTRO
Advogado do(a) APELADO: ELOIR FRANCISCO MILANO DA SILVA - SP273806-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Ademais, cumpre salientar que na presente demanda não figura pedido específico para emissão e validação de RGP. Nesse contexto, restam prejudicadas as assertivas genéricas apresentadas pelo apelante concernentes a tal questão.
Prescrição
Em conformidade com a jurisprudência dominante no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, os benefícios previdenciários são imprescritíveis, uma vez que podem ser requeridos a qualquer tempo, atendidos os requisitos legais, não havendo falar em decadência ou prescrição do fundo de direito, na hipótese de pretensão de concessão inicial do benefício previdenciário.
Porém, tratando-se de relação jurídica de trato sucessivo, prescrevem as prestações vencidas no período anterior ao quinquênio que precede ao ajuizamento da ação, nos exatos termos da Súmula n. 85/STJ.
O seguro-defeso – biênio 2015/2016 – encontrava-se suspenso até 25 de maio de 2020, data do julgamento conjunto da ADI n. 5.447 e ADPF n. 389 pelo Plenário do STF.
Assim, o prazo prescricional passou a ser contabilizado com o trânsito em julgado da ADIN 5.447, qual seja, a partir de 26/10/2020.
Nesta senda, tendo em vista que o ajuizamento da presente demanda ocorrera em setembro de 2023, o pedido da parte autora não foi atingido pelo instituto da prescrição quinquenal.
Requerimento administrativo
Nos termos do entendimento firmado pelo e. STF no RE 631240, em sede de repercussão geral, exige-se o prévio requerimento administrativo para a propositura de ação judicial em que se pretende a concessão de benefício previdenciário.
Em razão da Portaria Interministerial nº192/2015, o INSS não processou os pedidos administrativos, mostrando resistência notória da Administração ao interesse do demandante, nos termos do RE 631240. Sobre a matéria, cito o seguinte julgado desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. SEGURO DEFESO. STF RE Nº 631.240. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. RESISTÊNCIA NOTÓRIA PELA ADMINISTRAÇÃO. SENTENÇA ANULADA. Em sede de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 631.240, decidiu ser indispensável a apresentação de prévio requerimento administrativo nas causas previdenciárias, em vista de não haver, antes disso, pretensão resistida por parte da Administração. Entretanto, foram ressalvados os casos em que a posição do Poder Público fosse notoriamente contrária ao direito postulado, ou seja, as situações em que o interesse de agir já se encontrasse evidenciado. Durante o período de vigência da Portaria Interministerial nº 192/2015, por força da suspensão da proibição da realização da atividade, o Poder Público decidiu, em consequência, suspender naquele período, o pagamento do seguro desemprego devido aos pescadores artesanais, conforme previsto na Lei nº 10.779/2003. Decorre do ato normativo a notória posição contrária do Poder Público à pretensão ao recebimento do benefício, o que afasta a exigência de demonstração de interesse de agir mediante apresentação de prévio requerimento administrativo pelos beneficiários. Deve ser reformada a sentença que extingue o processo sem apreciação do mérito, por ausência de prévio requerimento administrativo, estando demonstrada a notória posição do Poder Público em realizar o pagamento do seguro desemprego no período de vigência da Portaria Interministerial nº 192, de 2015. Apelação provida para declarar a nulidade da sentença e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para o regular processamento. (AC 1019379-17.2020.4.01.9999, JUÍZA MARIA MAURA MARTINS MORAES TAYER (CONV.), TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 18/11/2021 PAG.).
Portanto, a recusa administrativa se qualificava como notória, decorrente de ato administrativo normativo, o que se mostra suficiente para afastar a exigência de demonstração de interesse de agir mediante apresentação de prévio requerimento administrativo.
Litispendência/Coisa julgada
O INSS sequer indicou processo paradigma para sustentar a alegação. Portanto, não prospera a alegação de coisa julgada/litispendência.
Ausência de interesse processual. Períodos enquadrados/reconhecidos como especiais administrativamente
O INSS não transcreveu os períodos em que supostamente teria reconhecido administrativamente os períodos como atividade especial. Portanto, a alegação de ausência de interesse processual não merece provimento.
MÉRITO
A questão controvertida versa sobre a análise da concessão do benefício de seguro-defeso aos pescadores artesanais do Estado do Amazonas no biênio 2015/2016.
Conforme estabelecido pelo artigo 1º da Lei 10.779/2003, o pescador artesanal que exerce sua atividade profissional de forma ininterrupta, seja de maneira individual ou em regime de economia familiar, faz jus ao seguro-desemprego no montante equivalente a um salário mínimo mensal durante o período de defeso da atividade pesqueira, visando à preservação das espécies marinhas.
A Portaria Interministerial nº 192/2015, publicada em 09/10/2015, suspendeu períodos de defeso (proibição temporária da atividade pesqueira para a preservação das espécies) por 120 dias, prorrogáveis por igual prazo.
Posteriormente, o Decreto Legislativo nº 293/2015, publicado em 11/12/2015, sustou os efeitos da aludida portaria, restabelecendo os períodos originais de defeso, ao argumento de que o Executivo, ao editá-la, teria exorbitado de seu poder regulamentar.
Em sequência, a União ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5447 em face do Decreto Legislativo nº 293/2015. Nesse contexto, decisão liminar foi proferida em 07/01/2016, com publicação em 01/02/2016, sustando os efeitos do referido ato normativo e, assim, restabelecendo a permissão para o exercício da pesca.
A cautelar deferida na ADI de n.º 5447 foi revogada por nova decisão publicada do STF em 16/03/2016, restabelecendo o Decreto Legislativo de nº. 293/2015, passando a vigorar, de imediato e com efeitos ex nunc, todos os períodos de defeso suspensos pela Portaria Interministerial nº 192/2015 (sem efeitos retroativos).
O plenário do Supremo Tribunal Federal, por fim, no julgamento da ADI 5.447 e da ADPF 389 julgou inconstitucional a Portaria Interministerial 192/2005.Confira-se o teor do julgado:
Direito ambiental. Ação direta de inconstitucionalidade. Suspensão do período de defeso da pesca por ato do Executivo. Violação ao princípio da precaução. Ameaça à fauna brasileira, à segurança alimentar e à pesca artesanal.
1. Ação que tem por objeto a (in)constitucionalidade do Decreto Legislativo nº 293/2015, que sustou os efeitos da Portaria Interministerial nº 192/2015, a qual, por sua vez, suspendeu períodos de defeso da pesca de algumas espécies por 120 dias, prorrogáveis por igual prazo. O Decreto Legislativo restabeleceu os períodos originais de defeso, ao argumento de que o Executivo, ao editá-la, teria exorbitado de seu poder regulamentar.
2. Ausência de estudos técnicos que comprovem a desnecessidade do defeso nas hipóteses em que foi suspenso pela Portaria. Não apresentação de indícios mínimos da alegada ocorrência de fraude, em proporção que justifique a interrupção do pagamento de seguro-defeso.
3. Inobservância do princípio ambiental da precaução. Risco ao meio ambiente equilibrado, à fauna brasileira, à segurança alimentar da população e à preservação de grupos vulneráveis, que se dedicam à pesca artesanal. Nesse sentido: ADPF 101, Rel. Min. Cármen Lúcia; RE 835.559, Rel. Min. Luiz Fux; RE 627.189, Rel. Min. Dias Toffoli; AI 781.547, Rel. Min. Luiz Fux.
4. Modulação de efeitos da decisão para preservar os atos praticados entre 7/1/2016 e 11/3/2016, período em que o defeso esteve suspenso com respaldo em cautelar deferida pelo Supremo Tribunal Federal e posteriormente revogada (art. 27 da Lei 9.868/1999).
5. Ação julgada improcedente. (ADI 5447, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-197 DIVULG 06-08-2020 PUBLIC 07-08-2020)
Considerando as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, verifica-se a manutenção da eficácia do Decreto-Legislativo n. 293/2015, o que resulta na anulação da validade da Portaria Interministerial n. 192/2015. Em virtude desse cenário, restabeleceu-se a proibição da pesca conforme previamente estabelecido, e o seguro defeso passou a ser devido para o biênio 2015/2016.
O conjunto probatório formado nos autos, de fato, demonstra que a demandante se enquadra como pescadora no Estado do Amazonas (fls. 26,29,32 39 e 40, ID 391026129):
a) Registro como pescador profissional, categoria artesanal, devidamente atualizado no Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP), emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura com antecedência mínima de 1 (um) ano, contado da data de requerimento do benefício (fl. 26, ID 391026129);
b) comprovante de recolhimento da contribuição previdenciária (fls. 27, 30 e 40 ID 391026129);
c) CNIS indicando que a autora não dispõe de outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira (fls. 41/42, ID 391026129);
Nesse contexto, é relevante frisar que o INSS não apresentou evidências que refutem a categorização da parte autora, tampouco contestou de forma substantiva a documentação que lhe foi submetida.
Ressalto que a aplicação do tema 303 da Turma Nacional de Uniformização (TNU) não se faz pertinente no presente caso, uma vez que a autora logrou comprovar a posse do Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP), emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, com uma antecedência mínima de um ano a contar da data em que foi solicitado o benefício em questão.
Portanto, a manutenção da sentença é medida que se impõe.
Juros de mora e correção monetária
Sentença determinou a utilização dos índices de correção monetária de acordo com o IPCA-E.
Ante o entendimento firmado no julgamento do Tema 810-STF e do Tema 905-STJ, em se tratando de condenação de natureza previdenciária imposta à Fazenda Pública, a correção monetária segue o Manual de Cálculos da Justiça Federal (IGP-DI/IPC-R/IRSM/IPC/BTN, etc.) até a vigência da Lei nº. 11.430/2006, quando passa a incidir o INPC.
Honorários advocatícios
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos acima explicitados.
Ex officio, altero os índices aplicados na correção monetária.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001749-06.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDREIA LIMA DE CASTRO
Advogado do(a) APELADO: ELOIR FRANCISCO MILANO DA SILVA - SP273806-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. PESCADOR ARTESANAL. SEGURO-DESEMPREGO NO PERÍODO DE DEFESO DA ATIVIDADE PESQUEIRA. PRESCRIÇÃO. PORTARIA INTERMINISTERIAL 192/2005. DECRETO LEGISLATIVO 293/2015. ADI 5.447. ADPF 389. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. BENEFÍCIO DEVIDO. TEMA 303 TNU. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. O seguro-defeso – biênio 2015/2016 – encontrava-se suspenso até 25 de maio de 2020, data do julgamento conjunto da ADI n. 5.447 e ADPF n. 389 pelo Plenário do STF. Assim, o prazo prescricional passou a ser contabilizado com o trânsito em julgado da ADIN 5.447, qual seja, a partir de 26/10/2020. Nesta senda, tendo em vista que o ajuizamento da presente demanda ocorrera em setembro de 2023, o pedido da parte autora não foi atingido pelo instituto da prescrição quinquenal.
2. Em razão da Portaria Interministerial nº 192/2015, o INSS não processou os pedidos administrativos, evidenciando resistência notória da Administração ao interesse do demandante, nos termos do RE 631240, o que se mostra suficiente para afastar a exigência de demonstração de interesse de agir mediante apresentação de prévio requerimento administrativo.
3. Considerando as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 5.447 e na ADPF 389), verifica-se a manutenção da eficácia do Decreto-Legislativo n. 293/2015, o que resulta na anulação da validade da Portaria Interministerial n. 192/2015. Em virtude desse cenário, restabeleceu-se a proibição da pesca conforme previamente estabelecido, e o seguro defeso passou a ser devido para o biênio 2015/2016.
4. Caso em que o conjunto probatório formado nos autos, de fato, demonstra que a demandante se enquadra como pescadora do Estado do Amazonas: a) Registro como pescador profissional, categoria artesanal, devidamente atualizado no Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP), emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura com antecedência mínima de 1 (um) ano, contado da data de requerimento do benefício (fl. 26, ID 391026129); b) comprovante de recolhimento da contribuição previdenciária (fls. 27, 30 e 40 ID 391026129); e c) CNIS indicando que a autora não dispõe de outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira (fls. 41/42, ID 391026129);
5. A aplicação do Tema 303 da Turma Nacional de Uniformização (TNU) não se faz pertinente no presente caso, uma vez que a autora logrou comprovar a posse do Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP), emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, com uma antecedência mínima de um ano a contar da data em que foi solicitado o benefício em questão.
6. Assim sendo, conclui-se que a autora faz jus ao recebimento do seguro-defeso referente ao biênio 2015/2016, em conformidade com os fundamentos jurídicos e normativos pertinentes ao caso em apreço.
7. As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE em sede de repercussão geral (Tema 810) e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905).
8. Apelação do INSS desprovida. Ajuste, de ofício, dos índices de correção monetária.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e ajustar, de ofício, os índices de correção monetária, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
