
POLO ATIVO: MARIELCI RIBEIRO
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: TARCISO DE OLIVEIRA - GO40004-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1008894-55.2020.4.01.9999
APELANTE: MARIELCI RIBEIRO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de embargos de declaração interpostos pelo Ministério Público Federal e pela parte autora em face de acórdão que denegou o benefício de aposentadoria híbrida.
Nas razões recursais (ID 87165053), o MPF sustenta que deveria ter havido a intimação do ente para se manifestar nos autos, o que não ocorreu na primeira nem na segunda instância.
Já nas razões recursais da parte autora (ID 87335531), essa sustenta que os fundamentos do acórdão estão dissociados dos autos do processo.
As contrarrazões não foram apresentadas.
É o relatório.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1008894-55.2020.4.01.9999
APELANTE: MARIELCI RIBEIRO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de Embargos de Declaração interpostos pelo Ministério Público Federal e pela parte autora. Nas razões recursais, o MPF sustenta que deveria ter havido a intimação do ente para se manifestar nos autos, o que não ocorreu na primeira nem na segunda instância. Já a recorrente autora sustenta que as razões do acórdão estão dissociadas dos documentos do processo.
Os embargos de declaração, à semelhança dos recursos extraordinário e especial, consistem em recurso de impugnação vinculada, devendo o recorrente indicar expressamente em qual fundamento legal ele se ampara no momento da interposição do recurso.
No que se refere aos embargos de declaração, o Código de Processo Civil fixou os seguintes fundamentos vinculados:
Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:
I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;
II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;
III - corrigir erro material.
No caso, os recursos estão fundamentados nos inciso I e III do art. 1.022.
Resta verificar se, de fato, existe contradição e omissão na decisão colegiada embargada (ID 85400060).
De início, cito a ementa do decisum recorrido:
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. APOSENTADORIA RURAL MISTA OU HIBRIDA. CONDIÇÃO DE SEGURADA ESPECIAL. NÃO-COMPROVAÇÃO. VÍNCULOS URBANOS. TESTEMUNHA FRÁGIL IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO.
1. Para que sirvam como início de prova material do labor rural alegado, os documentos apresentados pela parte autora devem ser dotados de integridade probante autorizadora de sua utilização, não se enquadrando em tal situação aqueles documentos que, confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário, deixam antever a possibilidade de sua obtenção com a finalidade precípua de servirem como instrumento de prova em ações de índole previdenciária.
2. Os documentos que, em regra, são admitidos como início de prova material do labor rural alegado, passam a ter afastada essa serventia, quando confrontados com outros documentos que ilidem a condição campesina outrora demonstrada.
3. O CNIS da parte autora demonstra a existência de vínculos urbanos de extensa duração durante o período de carência.
4. No caso dos autos, embora a parte autora apresente documentos que, em princípio, possam servir para atestar sua condição de rurícola, o INSS junta aos autos o CNIS da autora informando atividade remunerada na condição de trabalhadora urbano - empregado, inclusive auferindo remuneração bem superior ao salário mínimo, possuidor de vários automóveis, o que afasta o desempenho de atividade rural em regime de economia familiar.
5. A comprovação da condição de empregado da parte autora, inclusive auferindo remuneração bem superior ao salário mínimo, possuidor de vários automóveis, o que afasta a atividade rural em regime de economia familiar para subsistência do grupo, pois é exatamente nessa perspectiva que se consideram todos os membros da família como segurados especiais (art. 11, inciso VII, da Lei de Benefícios).
6. Registre-se, que no caso dos autos não há a possibilidade de aplicação da regra prevista no art. 48, § 3º, da Lei nº 8.213/91.
7. Ademais A fragilidade da prova testemunhal produzida não permitiu a comprovação do exercício do labor rural alegado, na condição de segurado especial, pelo tempo necessário ao deferimento do benefício requerido.
8. Coisa julgada secundum eventum litis, permitindo o ajuizamento de nova demanda pelo segurado na hipótese de alteração das circunstâncias verificadas na causa. Precedentes.
9. Apelação a que se nega provimento
Quanto aos aclaratórios do MPF, não há erro material na ausência de intimação da procuradoria dos atos do processo, uma vez que a parte autora é capaz, está devidamente representada por advogado constituído e o direito discutido na demanda é disponível, não subsistindo interesse público ou social que justificasse a intervenção do MPF, nos termos do art. 6º, inciso XV, da Lei Complementar nº 75/93, não competindo à Instituição defender ou fiscalizar os autos, conforme o art. 127, caput, da Constituição Federal. Portanto, os embargos de declaração interpostos pelo MPF devem ser rejeitados.
Portanto, REJEITO os embargos de declaração interpostos pelo MPF.
Por sua vez, assiste razão à parte embargante quanto à contradição entre as provas dos autos e aquelas mencionadas nos fundamentos do acórdão. Em nenhum momento do processo houve a juntada de comprovantes de propriedade de “vários automóveis” em nome da parte autora ou em nome de seu companheiro. Além disso, não há comprovante de recebimento de “remuneração bem superior ao salário mínimo” quando exerceu trabalho urbano.
Assim, ACOLHO os embargos de declaração para sanar a contradição apontada e ANULO o acórdão recorrido.
Por conseguinte, passo à análise das razões do recurso de apelação interposto pela parte autora.
Na espécie, a questão discutida nos autos se refere ao direito da parte autora à concessão de aposentadoria híbrida.
Dispõe a Lei 8.213/91 que os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, são os seguintes: a) a idade completa de 55 anos, se mulher, e 60 anos, se homem (art. 48, § 1º); b) a comprovação do exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício (art. 48, § 2º, c/c 143); e (c) a condição de empregado prestador de serviço de natureza rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado (art. 11, I, a), ou de trabalhador autônomo rural (art. 11, V, ‘g’), trabalhador avulso rural (art. 11, VI) ou de segurado especial (art. 11, VII).
A jurisprudência do STJ admite, inclusive, que a comprovação da condição de rurícola seja feita com base em dados do registro civil, como em certidão de casamento ou de nascimento dos filhos e, ainda, em assentos de óbito, no caso de pensão, em suma, por meio de quaisquer documentos que contenham fé pública, o que é extensível, inclusive, ao cônjuge do segurado, sendo certo que o art. 106 da Lei n. 8.213/91 contém rol meramente exemplificativo, e não taxativo, (REsp 1081919/PB, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 02/06/2009, DJe 03/08/2009).
Com o advento da Lei n.º 11.718/2008, a qual acrescentou os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei n.º 8.213/91, o ordenamento jurídico passou a admitir expressamente a soma do tempo de exercício de labor rural ao período de trabalho urbano, para fins de concessão do benefício da aposentadoria rural por idade aos 60 (sessenta) anos, se mulher, e aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem. Assim, permite-se ao segurado mesclar o período urbano ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício etário híbrido.
Na hipótese, verifica-se que os documentos de identificação existentes nos autos comprovam haver a parte autora atendido ao requisito etário, pois completou 60 anos em 2011 e apresentou requerimento administrativo em 2015.
Portanto, o período a ser provado equivale a 1996 a 2011 ou de 2000 a 2015 de atividade rural e urbana.
Para constituir início de prova material de suas alegações a parte autora anexou nos autos: a) Certidão de casamento, realizado em 1968, indicando a profissão do cônjuge como lavrador; b) Certidão de nascimento dos filhos, em que o cônjuge é qualificado como lavrador de 1972, 1974 e 1976; c) Certidão de óbito do cônjuge, aposentado como rural, em 1992; d) Certidão de óbito do filho em 2008, em que é qualificado como lavrador; e) Declaração de união estável da parte autora com segundo companheiro, em que ele é qualificado como lavrador de 2015, f) CTPS do atual companheiro com vínculos rurais e g) Comprovação de recebimento de pensão por morte rural do primeiro cônjuge.
Os depoimentos pessoais colhidos no Juízo de primeiro grau, por sua vez, são uníssonos e corroboram as mencionadas condições fáticas (ID 72255041).
Por sua vez, a comprovação de atividade urbana pode ser constatada no CNIS da parte autora com vínculos empregatícios urbanos, nos períodos de 02/04/1988 a 09/08/1990, 01/10/1991 a 17/01/1992 01/07/1992 a 28/02/1994, 01/08/1994 a 05/11/1994, 01/10/1996 a 31/10/1996 e 01/11/1996 a 31/01/1997. Conforme demonstrativo de simulação de cálculo do tempo de contribuição, a parte autora perfaz 04 anos e 11 meses de contribuição.
Assim, somados o tempo de trabalho urbano e o tempo de labor rural de 1968 a 2015, a parte autora apresenta mais de 25 anos de labor, tempo suficiente para a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida. Dessa forma, a sentença deve ser reformada para o conceder o benefício de aposentadoria híbrida à parte autora desde a data do requerimento administrativo (26/06/2015). Sobre o montante da condenação incidirão juros segundo o índice previsto no art. 1º-F da Lei 9.494/97 com a redação dada pela Lei 11.960/2009, desde a data da citação, e correção monetária mediante a aplicação do INPC até 08/12/2021 e, a partir de 09/12/2021, deverá incidir a SELIC, nos termos do art. 3º da EC 113/2021 e do Manual de Cálculos da Justiça Federal, respeitada a prescrição quinquenal.
Inverto o ônus de sucumbência a favor da parte autora, mas deixo de majorá-los em face da ausência de contrarrazões.
Ante o exposto, CONHEÇO dos recursos e, no mérito, REJEITO os embargos de declaração do Ministério Público Federal e ACOLHO os embargos de declaração da parte autora, com efeitos modificativos para sanar a contradição apontada e ANULAR o acórdão proferido e para CONCEDER o benefício de aposentadoria por idade híbrida desde a data do requerimento administrativo em 26/06/2015.
É como voto.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1008894-55.2020.4.01.9999
APELANTE: MARIELCI RIBEIRO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ERRO MATERIAL. OCORRÊNCIA. RAZÕES DO ACÓRDÃO DISSOCIADAS DO PROCESSO. APOSENTADORIA HÍBRIDA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA PELA PROVA TESTEMUNHAL E CNIS COM VÍNCULOS URBANOS. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. DIB DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INTERVENÇÃO DO MPF. DESNECESSIDADE. PARTE CAPAZ E REPRESENTADA POR ADVOGADO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DO MPF REJEITADOS E EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA PARTE AUTORA ACOLHIDOS COM EFEITOS MODIFICATIVOS.
1. Trata-se de Embargos de Declaração interpostos pelo Ministério Público Federal e pela parte autora. Nas razões recursais, o MPF sustenta que deveria ter havido a intimação do ente para se manifestar nos autos, o que não ocorreu na primeira nem na segunda instância. Já a recorrente autora sustenta que as razões do acórdão estão dissociadas dos documentos do processo.
2. Os embargos de declaração, à semelhança dos recursos extraordinário e especial, consistem em recurso de impugnação vinculada, devendo o recorrente indicar expressamente em qual fundamento legal ele se ampara no momento da interposição do recurso. No caso, os recursos estão fundamentados no inciso III do art. 1.022.
3. Quanto aos aclaratórios do MPF, não há erro material na ausência de intimação da procuradoria dos atos do processo, uma vez que a parte autora é capaz, está devidamente representada por advogado constituído e o direito discutido na demanda é disponível, não subsistindo interesse público ou social que justifique a intervenção do MPF, nos termos do art. 6º, inciso XV, da Lei Complementar nº 75/93, não competindo à Instituição defender ou fiscalizar os autos, conforme o art. 127, caput, da Constituição Federal. Portanto, os embargos de declaração interpostos pelo MPF devem ser rejeitados.
4. Por sua vez, assiste razão à parte embargante quanto à contradição entre as provas dos autos e aquelas mencionadas nos fundamentos do acórdão. Em nenhum momento do processo houve a juntada de comprovantes de propriedade de “vários automóveis” em nome da parte autora ou em nome de seu companheiro. Além disso, não há comprovante de recebimento de “remuneração bem superior ao salário mínimo” quando exerceu trabalho urbano.
5. Assim, havendo contradição entre a conclusão firmada no acórdão recorrido e os elementos de prova presentes nos autos, os embargos de declaração devem ser acolhidos para anular o acórdão recorrido.
6. Sanada a contradição, passo à análise das razões do recurso de apelação interposto pela parte autora.
7. Na espécie, a questão discutida nos autos se refere ao direito da parte autora à concessão de aposentadoria híbrida.
8. Na hipótese, verifica-se que os documentos de identificação existentes nos autos comprovam haver a parte autora atendido ao requisito etário da Lei 8.213/91, pois completou 60 anos em 2011 e apresentou requerimento administrativo em 2015. Portanto, o período a ser provado equivale a 1996 a 2011 ou de 2000 a 2015 de atividade rural e urbana.
9. Para constituir início de prova material de suas alegações a parte autora anexou nos autos: a) Certidão de casamento, realizado em 1968, indicando a profissão do cônjuge como lavrador; b) Certidão de nascimento dos filhos, em que o cônjuge é qualificado como lavrador de 1972, 1974 e 1976; c) Certidão de óbito do cônjuge, aposentado como rural, em 1992; d) Certidão de óbito do filho em 2008, em que é qualificado como lavrador; e) Declaração de união estável da parte autora com segundo companheiro, em que ele é qualificado como lavrador de 2015, f) CTPS do atual companheiro com vínculos rurais e g) Comprovação de recebimento de pensão por morte rural do primeiro cônjuge.
10. Os depoimentos colhidos em audiência corroboraram as alegações autorais quanto ao labor rural. Nesse sentido, a atividade rurícola da parte autora de 1976 a 2015 foi comprovada.
11. A comprovação de atividade urbana pode ser constatada no CNIS da parte autora, que demonstra vínculos empregatícios urbanos nos períodos de 02/04/1988 a 09/08/1990, 01/10/1991 a 17/01/1992 01/07/1992 a 28/02/1994, 01/08/1994 a 05/11/1994, 01/10/1996 a 31/10/1996 e de 01/11/1996 a 31/01/1997, perfazendo o tempo de contribuição de 4 anos e 11 meses.
12. Assim, somados o tempo de trabalho urbano e o tempo de labor rural de 1968 a 2015, a parte autora apresenta mais de 25 anos de labor, tempo suficiente para a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida, motivo pelo qual a sentença deve ser reformada para o deferimento do benefício de aposentadoria híbrida desde o requerimento administrativo (26/06/2015). Sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947 (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221 (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal.
13. Embargos de declaração do MPF rejeitados e Embargos de declaração da parte autora acolhidos, com efeitos modificativos, para anular o acórdão recorrido e conceder o benefício de aposentadoria híbrida desde a data do requerimento administrativo (26/06/2015).
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, REJEITAR os Embargos de Declaração do MPF e ACOLHER os Embargos de Declaração da parte autora, com efeitos modificativos, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora
