
POLO ATIVO: CELIO VIEIRA DE SOUZA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: LUCIENE LOURENCO DE ARAUJO - GO35024-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):JOSE GODINHO FILHO

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1003751-56.2018.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por Célio Vieira de Souza em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com a finalidade de obter a anulação da sentença que não concedeu o benefício previdenciário de pensão por morte (ID 6695920, pág. 11).
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos.
Nas razões recursais (ID 6695920, pág. 20 a 29), foi alegada, preliminarmente, a necessidade de nova concessão do benefício da assistência judiciária gratuita, revogado pelo juízo antecedente e, no mérito, a questão processual de que a ausência de oitiva das testemunhas presentes na audiência de instrução e julgamento gerou nulidade processual. Foi sustentado, ainda, que não houve reprodução do inteiro teor do despacho que designou a audiência, e que não se sabia acerca da necessidade de reapresentação do rol, cuja listagem já constaria na inicial. Além disso, entendeu a parte recorrente que a exigência não seria razoável, com realização de ato desnecessário e repetitivo, e o fato de já constar nos autos demonstraria a realização do ato antes do termo inicial previsto, na forma da legislação processual de regência. Foi pedido, assim, o conhecimento e o provimento do recurso para anular a sentença, com reabertura da instrução processual e realização da oitiva das testemunhas arroladas na inicial.
Subsidiariamente, sob o fundamento de entender pela incompetência do juízo cível no exercício da competência delegada, foi pedida a declaração de nulidade de todos os atos praticados e a devida redistribuição a juízo das Fazendas Públicas da comarca de Iporá/GO.
Em contrarrazões (ID 6695920, pág. 32 a 33), foram ratificados os termos da contestação e da sentença. Foi pedido, assim, o não provimento do recurso.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1003751-56.2018.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal), e processado em ambos os efeitos (§1º do art. 1.012 e conexos do CPC/2015).
Passa-se à análise do mérito recursal.
A concessão do benefício previdenciário da pensão por morte rege-se pelo princípio do tempus regit actum, nos termos da Súmula 340 do STJ, isto é, aplica-se a lei vigente na data de falecimento do instituidor, com a necessidade da demonstração da qualidade de dependente por prova idônea e suficiente, além da observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 16, 74 e demais dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
Os requisitos exigidos para a concessão do benefício previdenciário pela Lei 8.213/91 são: a) prova do óbito; b) prova de que a pessoa falecida mantinha a qualidade de segurado ao tempo do óbito ou, na hipótese de já tê-la perdido, se fazia jus ao gozo de aposentadoria; e b) dependência econômica de quem postula a pensão, segundo a qualificação disposta no art. 16 do referido diploma legal, na hipótese com a redação vigente à época do falecimento: (original sem destaque)
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
(...)
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida (...)
Em relação aos beneficiários elencados na parte transcrita do dispositivo, basta que seja comprovado o enquadramento na referida classe, que se demonstrado atrai presunção legal da dependência econômica, que é absoluta, conforme Tese 226 da TNU (original sem destaque): “A dependência econômica do cônjuge ou do companheiro relacionados no inciso I do art. 16 da Lei 8.213/91, em atenção à presunção disposta no §4º do mesmo dispositivo legal, é absoluta”.
A sentença recorrida deve ser anulada, conforme as razões a seguir.
No caso concreto, o falecimento foi devidamente comprovado pela Certidão de Óbito (ID 6695919, pág. 17), e ocorreu em 07/06/2017. A qualidade de segurada da falecida, decorrente de vínculo empregatício de atividade urbana, foi devidamente demonstrada por informação do CNIS (ID 6695919, pág. 72).
Em relação à união estável e a qualidade como companheiro da falecida, foram juntados registros fotográficos (ID 6695919, pág. 19 a 22) e a Ficha Proposta de Admissão de Associado (ID 6695919, pág. 24) como início de prova material, que seria até desnecessária em razão da inexistência da exigência na legislação de regência à época do óbito, ocorrido antes da vigência da Lei nº 13.846/2019. Nesse contexto, ainda seria possível o reconhecimento da união estável com base unicamente na prova testemunhal, na esteira do entendimento da Súmula 63 da TNU.
Ocorre que foi negada à parte autora a oportunidade de produção da prova testemunhal, porque não apresentado o rol no prazo dado em despacho (ID 6695920, pág. 06), sendo que já constaria tal informação na petição inicial (ID 6695919, pág. 06). Assim, mesmo ao comparecer em audiência com as testemunhas arroladas, a negativa do juízo antecedente na respectiva oitiva configurou violação à ampla defesa e ao contraditório, na medida em que a prova produzida poderia alterar o resultado do julgamento realizado. Nesse contexto, a anulação da sentença e retorno dos autos à origem é medida que se impõe.
Nesse mesmo sentido, já decidiu este Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região em caso de pensão rural, mas cujos fundamentos servem para a pensão decorrente de óbito de segurado urbano (originais sem destaques):
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR RURAL. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL E UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. SENTENÇA ANULADA. 1. A concessão de pensão por morte rege-se pelo princípio do tempus regit actum, isto é, pela lei vigente na data de falecimento do instituidor. 2. O benefício de pensão por morte de trabalhador pressupõe: a) óbito do instituidor que mantinha a condição de segurado; b) qualidade de dependente; e c) dependência econômica (art. 74 da Lei 8.213/91). 3. Aos dependentes de segurado especial de que trata o art. 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, fica garantida a concessão de pensão por morte no valor de um salário mínimo, dispensada carência (art. 39, I), exigindo, tão-só, a comprovação de filiação à Previdência Social, que, no caso, poderá ser feita depois do falecimento (Dec. 3.048/99, art.18, § 5º). 4. A Lei 8.213/1991, na redação anterior, não exigia para fins de comprovação de união estável início de prova material, podendo ser feita por prova exclusivamente testemunhal. A exigência de início de prova material para comprovação da condição de companheiro apenas veio a lume com a Lei 13.846/2019 de 18.06.2019 (conversão da Medida Provisória 871 de 18.01.2019). 5. Conforme documento apresentado pela parte autora, o óbito do instituidor da pensão por morte ocorreu em 25/11/2006. DER: 01/06/2007. 6. A autora sustenta a qualidade de segurada especial do de cujus, bem assim a convivência marital. Como início de prova material da atividade campesina foram juntados aos autos a carteira de inscrição na colônia de pescadores, acompanhada de recolhimentos de contribuições mensais, bem assim o INFBEN comprovando que a autora se encontra aposentada como trabalhadora rural. 7. Apesar de o início de prova material apresentado ser de força duvidosa, o julgamento em colegiado, em segunda instância, permite a apresentação de variados pontos de vista e, nesse sentido, a prova testemunhal deve estar presente nos autos, caso seja necessária à sua análise. (AC 1013939-69.2022.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 18/08/2022 PAG.) 8. O comparecimento de forma espontânea das testemunhas na audiência de instrução designada previamente atesta o interesse na produção da prova e afasta a preclusão temporal. A não apresentação do rol de testemunhas no prazo legal não implica não possam ser aquelas ouvidas em audiência de instrução e julgamento, se comparecem junto com a parte no dia de sua realização, mormente quando não demonstrado que a sua oitiva acarretaria prejuízos à outra parte. (AC 0000894-88.2014.4.01.3825, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO NEVES DA CUNHA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 07/10/2016 PAG.) 9. Configura cerceamento de defesa da parte autora o julgamento antecipado da lide, pois somente com a completa instrução do processo, inclusive com prova testemunhal, é que se pode realizar exame a respeito da suficiência da prova produzida para a comprovação da alegada condição de segurada especial do de cujus, bem assim em relação a união estável. 10. Apelação da parte autora provida. Sentença anulada, de ofício, com o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular instrução e julgamento do feito, com a oitiva de testemunhas.
(AC 1012676-65.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL EDUARDO MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 03/10/2023 PAG.)
Esses são os razões para que seja anulada a sentença recorrida, proferida em desacordo com a jurisprudência dominante e a legislação de regência à época do falecimento.
Ante o exposto, conheço do recurso para, no mérito, dar-lhe provimento, a fim de anular a sentença do juízo antecedente e determinar o retorno dos autos à origem, com reabertura da instrução processual e oitiva das testemunhas arroladas.
Concedo a assistência judiciária gratuita ao recorrente, porque presentes os requisitos legais.
Sem honorários em razão da anulação do julgado, a serem oportunamente fixados quando da prolação da nova sentença.
Sem custas em devolução, observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1003751-56.2018.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 5451301-77.2017.8.09.0076
RECORRENTE: CELIO VIEIRA DE SOUZA
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RGPS. SEGURADO URBANO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA LEGALMENTE PRESUMIDA. NÃO APRESENTAÇÃO DE ROL DE TESTEMUNHAS APÓS DETERMINAÇÃO ESPECÍFICA DO JUÍZO. COMPARECIMENTO EM AUDIÊNCIA ACOMPANHADO DAS TESTEMUNHAS. AUSÊNCIA DE OITIVA. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. NECESSIDADE DE REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. RETORNO À ORIGEM.
1. O benefício previdenciário de pensão por morte é concedido mediante o preenchimento dos seguintes requisitos: o óbito do instituidor do benefício; a qualidade de segurado do de cujus perante a Previdência Social no momento do evento morte; e a condição de dependente do requerente, sem prejuízo da observância das demais condições legais da legislação de regência à época do falecimento (art. 226, §3º, da CF; arts.16, 74 e conexos da Lei 8.213/91; e arts. 5º, inciso V, e 105, inciso I, do Decreto 3.048/99).
2. Hipótese em que a parte autora não apresentou rol de testemunhas após a intimação do juízo, mas que já constavam listadas na petição inicial, e cujo comparecimento espontâneo ocorreu em audiência de instrução e julgamento, mas que não foram ouvidas pelo descumprimento da determinação do juízo antecedente.
3. Provados o óbito e a qualidade de segurada da falecida, porém não realizada a oitiva de testemunhas que compareceram à audiência de instrução e julgamento para comprovar a existência e constância da união estável até o falecimento, resta configurado o cerceamento de defesa e o prejuízo ao contraditório, razão pela qual se impõe a anulação da sentença, o retorno dos autos ao juízo antecedente e a reabertura da instrução processual para regular prosseguimento do feito.
4. Apelação provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, com reabertura da instrução processual e produção da prova testemunhal.
5. Sem condenação em honorários advocatícios, a serem oportunamente fixados quando da prolação de nova sentença.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
