
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:SELMA DOMINGOS DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: TATIANE DALLA COSTA SAVIO - MT26039-A e MILTON DOS SANTOS SOUZA JUNIOR - MT19385-A
RELATOR(A):EDUARDO MORAIS DA ROCHA

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1004882-27.2022.4.01.9999
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA (RELATOR CONVOCADO):
A parte autora ajuizou ação de procedimento comum contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, objetivando o reconhecimento do exercício de atividade rural e, de consequência, a aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER (12/09/2019).
Sentença recorrida julgou procedentes os pedidos deduzidos na inicial.
Em razões de recurso, alegou o INSS, em linhas gerais, ser incabível o reconhecimento da atividade rural para fins de concessão de benefício tipicamente urbano, notadamente ante a falta de provas do exercício labor campesino. Pugnou pela improcedência do pedido inicial.
É o breve relatório.
Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA
Relator convocado

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1004882-27.2022.4.01.9999
V O T O
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA (RELATOR CONVOCADO):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS contra a sentença que determinou a averbação de parte do período vindicado na inicial, bem assim julgou procedente o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC.
Prescrição
A prescrição atinge as prestações anteriores ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula 85/STJ.
Mérito
Quanto ao reconhecimento do tempo de serviço, seja ele urbano ou rural, estabelece o § 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991 que ''a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento''.
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34). Ressalte-se o teor da Súmula 577 do STJ: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob contraditório.”
Na esteira do julgamento proferido no REsp n. 1.348.633/SP (Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima), em sede de recurso representativo da controvérsia, a Primeira Seção do e. STJ concluiu que, para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea. (AgInt no AREsp n. 852.494/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 9/12/2021; AREsp n. 1.550.603/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 11/10/2019, entre outros.)
Destaca-se que, embora o art. 5º, XXXIII, Constituição Federal, vede o trabalho aos menores de 16 anos de idade, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos, a jurisprudência remansosa do Superior Tribunal de Justiça reconhece o tempo de serviço prestado pelo menor, a fim de que evitar que a vedação ao trabalho infantil, criada com o intuito de proteger o menor, seja tomada em seu prejuízo. Precedente: STJ, AgInt no AREsp 956.558/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2020, DJe 17/06/2020).
O tempo de labor na atividade rural, em período anterior à Lei 8.213/91, pode ser adicionado ao tempo de serviço urbano para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, salvo na hipótese da contagem recíproca noutro regime previdenciário, a teor do disposto nos artigos 55, § § 1º e 2º, 94 e 96, inciso IV, todos da Lei 8.213/91, e 201, parágrafo 9º, da Constituição Federal de 1988, sendo vedado o cômputo desse período para efeito de carência.
A carência exigida no caso de aposentadoria por tempo de contribuição é de 180 contribuições.
No tocante à aposentadoria, considerando o cumprimento dos requisitos legais anterior ao advento da reforma da previdência/2019, três situações devem ser consideradas.
A Emenda Constitucional nº 20/98 assegurou em seu art. 3º a concessão da aposentadoria integral ou proporcional àqueles que na data de sua publicação já houvessem implementado os requisitos exigidos pela legislação até então vigente, em razão do direito adquirido. Assim, preenchidos os requisitos de tempo de serviço até 16/12/98, é devida ao segurado a aposentadoria integral/proporcional independentemente de qualquer outra exigência (integral aos 35 (trinta e cinco) anos de serviço para o homem e 30 (trinta) anos para a mulher, e, proporcional com redução de 5 (cinco) anos de trabalho para cada.
O não preenchimento do período mínimo de 30 (trinta) anos em 16/12/1998, tornando-se obrigatória para a aposentadoria a observância dos requisitos contidos na EC nº 20/1998, sendo indispensável contar o segurado com 53 (cinquenta e três anos) de idade, se homem, e 48 (quarenta e oito) anos de idade, se mulher, bem como a integralização do percentual de contribuição pedágio de 20% (vinte por cento) para aposentadoria integral e 40% (quarenta por cento) para a proporcional.
Quanto ao tempo de serviço posterior à Emenda Constitucional nº 20/98, o entendimento esposado pelo STF é no sentido de que, se o segurado quiser agregar tempo de serviço posterior à referida emenda, tem de se submeter ao novo ordenamento, com observância das regras de transição, tanto em relação ao pedágio, como no que concerne à idade mínima. A adoção de um sistema híbrido não é admitida pelo Supremo Tribunal Federal. (RE 575089, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 10/09/2008, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-202 DIVULG 23-10-2008 PUBLIC 24-10-2008 EMENT VOL-02338-09 PP-01773 RB v. 20, n. 541, 2008, p. 23-26 RT v. 98, n. 880, 2009, p. 122-129).
Por fim, cumprindo os requisitos para a aposentadoria integral, prevista no § 7º do art. 201 da CF/1988, não se aplicam as regras de transição, sendo necessário apenas o tempo de contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, se homem, e 30(trinta anos), se mulher.
Caso dos autos
Conforme consta dos autos (fls. 103 – autos digitalizados) a autora contava na DER (12/09/2019) com 16 anos, 3 meses e 14 dias de contribuições urbanas, ficando suprido o requisito da carência legal (180 contribuições).
A sentença recorrida reconheceu a atividade rural – regime de economia familiar do período de 01/10/1990 até 30/11/2004, determinando a soma com o tempo de labor urbano, e, de consequência, a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
O conjunto probatório formado (prova indiciária e prova testemunhal), de fato, aponta para a atividade campesina da demandante no período vindicado, sem, no entanto, estar satisfatoriamente demonstrado que a atividade rural se deu na condição de segurado especial, em regime de economia familiar. Como início de prova material consta dos autos, dentre outros: escritura de compra e venda de imóvel rural (1989), Relatório INDEA (1990), Autorização para desmatamento e para queima (1991), declaração anual de produtor rural (1992), notas fiscais de produtor/produtos veterinários (1993/2004), ITR’s (imóvel rural com 38,6 hectares - minifúndio), DARF e CCIR.
Desta forma, para a contagem de período rural, posterior à edição da Lei n. 8.213/91, para fins de soma ao tempo necessário para direito à aposentadoria por tempo de contribuição deve ser precedido do respectivo recolhimento das contribuições (artigo 39, inciso II, da Lei n° 8.213/91), ainda que o requisito carência já esteja cumprido, como no caso dos autos.
O STJ possui jurisprudência firme e consolidada no sentido de que, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, com o reconhecimento de atividade rural referente a períodos posteriores à edição da Lei 8.213/1991, faz-se necessário o recolhimento de contribuições previdenciárias. (AgInt no REsp n. 1.991.852/RS, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 22/8/2022, DJe de 24/8/2022).
Assim, para utilização do período de labor rural, após 30/10/1991, é necessário o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, inexistentes na espécie. De consequência, a autora não faz jus a aposentadoria por tempo de contribuição vindicada, ante a ausência de falta de tempo de contribuição mínima (30 anos).
Em julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos para aplicação restrita às ações previdenciárias, o e. STJ decidiu que "a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV, do CPC), e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp n. 1.352.721-SP, Rel. MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, j. 16/12/2015, DJe 28/4/2016).
É imperativa a devolução pela parte autora dos valores por ela recebidos nestes autos por força da decisão antecipatória revogada, observando-se os limites estabelecidos na tese firmada pelo STJ no julgamento do Tema 692.
Conclusão
Em face do exposto, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC, ficando prejudicada a apelação do INSS. Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários de advogado, fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, cuja exigibilidade ficará suspensa em razão da gratuidade de justiça.
Custas ex lege.
É como voto.
Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA
Relator convocado

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004882-27.2022.4.01.9999
RELATOR: Des. MORAIS DA ROCHA
RELATOR CONVOCADO: JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SELMA DOMINGOS DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: MILTON DOS SANTOS SOUZA JUNIOR - MT19385-A, TATIANE DALLA COSTA SAVIO - MT26039-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CARÊNCIA LEGAL CUMPRIDA. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR A LEI 8.213/91. POSSIBILIDADE. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL POSTERIOR A LEI 8.213/91. NECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES. REQUISITOS LEGAIS NÃO CUMPRIDOS. PROCESSO EXTINTO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. APELAÇAO DO INSS PREJUDICADA.
1. A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC.
2. Na esteira do julgamento proferido no REsp n. 1.348.633/SP (Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima), em sede de recurso representativo da controvérsia, a Primeira Seção do e. STJ concluiu que, para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea. (AgInt no AREsp n. 852.494/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 9/12/2021; AREsp n. 1.550.603/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 11/10/2019, entre outros.).
3. O tempo de labor na atividade rural, em período anterior à Lei 8.213/91, pode ser adicionado ao tempo de serviço urbano para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, salvo na hipótese da contagem recíproca noutro regime previdenciário, a teor do disposto nos artigos 55, § § 1º e 2º, 94 e 96, inciso IV, todos da Lei 8.213/91, e 201, parágrafo 9º, da Constituição Federal de 1988, sendo vedado o cômputo desse período para efeito de carência.
4. A carência exigida no caso de aposentadoria por tempo de contribuição é de 180 contribuições.
5. Conforme consta dos autos (fls. 103 – autos digitalizados) a autora contava na DER (12/09/2019) com 16 anos, 3 meses e 14 dias de contribuições urbanas, ficando suprido o requisito da carência legal.
6. O conjunto probatório formado (prova indiciária e prova testemunhal), de fato, aponta para a atividade campesina da demandante no período vindicado, sem, no entanto, estar satisfatoriamente demonstrado que a atividade rural se deu na condição de segurado especial, em regime de economia familiar. Como início de prova material consta dos autos, dentre outros: escritura de compra e venda de imóvel rural (1989), relatório INDEA (1990), autorização para desmatamento e para queima (1991), declaração anual de produtor rural (1992), notas fiscais de produtor/produtos veterinários (1993/2004), ITR’s (imóvel rural com 38,6 hectares - minifúndio), DARF e CCIR.
7. Desta forma, para a contagem de período rural, posterior à edição da Lei n. 8.213/91, para fins de soma ao tempo necessário, para direito à aposentadoria por tempo de contribuição, deve ser precedido do respectivo recolhimento das contribuições (artigo 39, inciso II, da Lei n° 8.213/91), ainda que o requisito carência já esteja cumprido, como no caso dos autos.
8. O STJ possui jurisprudência firme e consolidada no sentido de que, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, com o reconhecimento de atividade rural referente a períodos posteriores à edição da Lei 8.213/1991, faz-se necessário o recolhimento de contribuições previdenciárias. (AgInt no REsp n. 1.991.852/RS, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 22/8/2022, DJe de 24/8/2022).
9. Assim, para a demandante utilizar o período de labor rural na contagem do tempo de contribuição, após 30/10/1991, é necessário o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, inexistentes na espécie. De consequência, a autora não faz jus a aposentadoria por tempo de contribuição vindicada, ante a ausência de falta de tempo de contribuição mínima (30 anos).
10. Em julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos para aplicação restrita às ações previdenciárias, o e. STJ decidiu que "a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV, do CPC), e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp n. 1.352.721-SP, Rel. MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, j. 16/12/2015, DJe 28/4/2016).
11. Honorários de advogado devidos pela parte autora e fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, cuja exigibilidade ficará suspensa em razão da gratuidade de justiça.
12. Processo extinto, sem resolução do mérito. Apelação do INSS prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma, por unanimidade, julgar extinto o processo, sem resolução do mérito, e julgar prejudicada a apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA
