
POLO ATIVO: JOAO DE DEUS VIEGAS BARROS e outros
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1001955-52.2021.4.01.3200
PROCESSO REFERÊNCIA: 1001955-52.2021.4.01.3200
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora e pelo INSS, em face de sentença (fl. 405) que julgou parcialmente procedente o pedido inicial apenas para reconhecer como especial parte do período pleiteado e conceder aposentadoria por tempo de contribuição ao autor, desde a DER (09.09.2020), com incidência do fator previdenciário. Com antecipação de tutela. Honorários na forma da Súmula 111/STJ.
O autor apela (fl. 456), alegando cerceamento de defesa ante a necessidade de prova pericial para quantificar o agente ruído e comprovar o reconhecimento da especialidade do período trabalhado junto à empresa Metalúrgica Magalhães Comércio, requerendo a anulação da sentença para reabertura de instrução processual.
O INSS também apela (fl. 411), aduzindo, preliminarmente, a aplicação de remessa oficial, porquanto a sentença é ilíquida. No mérito, aduz que os períodos laborados entre 19.03.1986 a 21.05.1987; 12.08.1989 a 09.06.1990; 12.12.1996 a 05.08.2002, não podem ser reconhecidos como especial à míngua de assinatura do representante legal da empresa nos respectivos PPPs. Afirma também que os períodos em que o autor alega que esteve exposto a ruído acima do limite legal não podem ser considerados, isso porque os PPPs não informam a metodologia usada para a aferição do ruído, ou se ultrapassa a dose unitária exigida a partir de 01.01.2004, que utiliza a metodologia NHO-01 da FUNDACENTRO. Assevera que deve ser analisado a metodologia utilizada para aferir a medição, pois a informação da intensidade do ruído por NEN é imprescindível à caracterização da nocividade da exposição. Alega que os períodos reconhecidos como especial por enquadramento de categoria também não podem ser considerados porquanto não é possível o enquadramento por analogia de profissões. Pugna pela reforma da sentença porquanto o autor não preenche os requisitos da regra de transição da EC 103/2019. Invoca o Tema 709/STF, aduzindo que o autor não pode permanecer em atividades nocivas após a concessão do benefício pleiteado. Por fim, requer a fixação de honorários consoante Súmula111/STJ.
Com contrarrazões (fl. 500), subiram os autos.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1001955-52.2021.4.01.3200
PROCESSO REFERÊNCIA: 1001955-52.2021.4.01.3200
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC.
Mérito
O benefício previdenciário é regido pela lei vigente ao tempo da aquisição do direito, dessa forma, tratando-se de tempo de serviço prestado no exercício de atividade sujeita a agente nocivo à saúde, deve ser levado em consideração à lei vigente ao tempo em que foram exercidas as atividades tidas como prejudiciais à saúde.
O tempo de serviço especial é aquele decorrente de serviços prestados sob condições prejudiciais à saúde ou em atividades com riscos superiores aos normais para o segurado e, cumpridos os requisitos legais, dá direito à aposentadoria especial.
Tal aposentadoria especial foi instituída pela Lei n. 3.807/60, regulamentada pelo Decreto n. 87.374/82, e era concedida ao segurado que contasse no mínimo 50 anos de idade e 15 anos de contribuição, sendo necessário que ele trabalhasse durante 15, 20 ou 25 anos, pelo menos, em serviços que fossem considerados, por Decreto do Poder Executivo, penosos, insalubres ou perigosos (art. 31). Posteriormente, essa lei foi alterada pela Lei n. 5.440-A/68, que suprimiu o requisito de idade de 50 anos. A Lei n. 5.890/73, art. 9º, também alterou os requisitos da aposentadoria em questão. A Lei n. 8.213/91, por sua vez, nos arts. 57 e 58, regulamentou a aposentadoria em referência.
No tocante a possibilidade de conversão desse período em tempo comum, cabe registrar que a Lei n. 6.887, de 10.12.80, permitiu a soma ao tempo de serviço comum do tempo de serviço das atividades especiais que tivessem sido exercidas alternadamente com atividade comum, depois de convertido o tempo especial para comum. O coeficiente de multiplicação para fins de conversão era 1.20, levando-se em conta que o tempo de aposentadoria comum era de 30 (trinta) anos.
A possibilidade de conversão foi mantida pela Lei n. 8.213/91 (art. 57, §3º), sendo que, posteriormente, foi alterada pela Lei n. 9.032/95 (agora no § 5º do mesmo artigo), que passou a exigir comprovação pelo segurado do tempo de trabalho permanente em atividades com efetiva exposição a agentes nocivos físicos, químicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física. Como o art. 58 da Lei n. 8.213/91 não foi alterado, até a edição da lei específica, o enquadramento seria efetuado de acordo com os Decretos ns. 83.080/79 e 53.831/64. O fator de conversão, entretanto, passou a ser 1,40 e 1,20, para homem e mulher, respectivamente, em virtude da relação proporcional entre o tempo de serviço necessário para que o segurado possa se aposentar, 25 (vinte e cinco) anos para aposentadoria especial e 35 (trinta e cinco) anos e 30 (trinta) anos, para comum.
Editada a MP n. 1.663-10/98, revogou-se o § 5º acima referido, não sendo mais possível a conversão de tempo especial em comum. No entanto, a 13ª edição da MP N. 1663 inseriu uma norma de transição prevendo critérios de conversão de tempo comum em especial. Essa medida provisória foi, posteriormente, parcialmente convertida na Lei n. 9.711/98. Eis os termos da Lei:
“Art. 28. O Poder Executivo estabelecerá critérios para a conversão do tempo de trabalho exercido até 28 de maio de 1998, sob condições especiais que sejam prejudiciais à saúde ou à integridade física, nos termos dos arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213, de 1991, na redação dada pelas Leis n.s 9.032, de 28 de abril de 1995, e 9.528, de 10 de dezembro de 1997, e de seu regulamento, em tempo de trabalho exercido em atividade comum, desde que o segurado tenha implementado o percentual do tempo necessário para a obtenção da respectiva aposentadoria especial, conforme estabelecido em regulamento”.
O Decreto n. 2.782, de 14.09.1998, regulamentando o artigo acima referido, estabeleceu como requisito para a conversão de tempo especial em comum, que o segurado tenha completado, até 28 de maio de 1998, pelo menos vinte por cento do tempo necessário para obtenção da respectiva aposentadoria especial.
A Emenda Constitucional n. 20, de 16.12.98, manteve em vigor o disposto nos arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213/91, na redação vigente à época de sua publicação, até lei complementar discipline a matéria. “Assim, quem já obteve tempo de serviço exigido para a concessão da aposentadoria até a data de publicação da EC n. 20/98 continua sob o pálio da regra antiga. Poderá, pois, o impetrante, se aposentar em qualquer época, sem que haja necessidade da comprovação de idade mínima
Cabe salientar, entretanto, que o Decreto n. 3.048/99, de 06.05.99, revogou o Decreto n. 2.782/98, estabelecendo, no art. 70, restrições para a conversão:
“Art. 70. É vedada a conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum.
Parágrafo único. O tempo de trabalho exercido até 5 de março de 1997, com efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes constantes do Quadro Anexo ao Decreto no 53.831, de 25 de março de 1964, e do Anexo I do Decreto no 83.080, de 24 de janeiro de 1979, e até 28 de maio de 1998, constantes do Anexo IV do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Decreto no 2.172, de 5 de março de 1997, será somado, após a respectiva conversão, ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, desde que o segurado tenha completado, até as referidas datas, pelo menos vinte por cento do tempo necessário para a obtenção da respectiva aposentadoria, observada a seguinte tabela:
TEMPO A CONVERTER MULTIPLICADORES TEMPO MÍNIMO EXIGIDO
MULHER (PARA 30) HOMEM (PARA 35)
DE 15 ANOS 2,00 2,33 3 ANOS
DE 20 ANOS 1,50 1,75 4 ANOS
DE 25 ANOS 1,20 1,40 5 ANOS”
Destarte, a despeito das alterações promovidas, a Lei n. 9.711/98 e o Decreto n. 3.048/99, resguardam o direito do segurado de converter o tempo de serviço especial em tempo de serviço comum, nos termos da legislação em vigor à época da prestação do serviço. Entretanto as restrições estabelecidas pelo Decreto em referência, além de extrapolar os limites da Lei n. 9.711/98 não se apresentam em consonância com o art. 201, § 1º, da CF/88. Cabe ressaltar, que a Lei n. 9.711/98 não estabeleceu a impossibilidade de conversão do tempo especial para comum, prestado antes ou após sua vigência, autorizou apenas o Poder Executivo estabelecer regras para a conversão.
Tem-se reconhecido, pois, que o § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/91 está em plena vigência, sendo que, atualmente, não cabe mais dúvida quanto à possibilidade de conversão de todo tempo trabalhado em condições especiais, para ser somado ao restante do tempo sujeito a contagem comum e, consequentemente, fazer jus à aposentadoria por tempo de serviço.
Acerca de quais condições de trabalho são consideradas insalubres e como devem ser comprovadas, cabe pontuar que as atividades exercidas em condições especiais eram definidas pela própria legislação previdenciária (Decreto n. 53.831, de 25.03.64 e Decreto n. 83.080, de 24.01.79), sendo que esses decretos foram expressamente acolhidos pelo Decreto n. 611/92, o qual regulamentou a Lei de Benefícios da Previdência Social (art. 292), até que fosse promulgada lei dispondo sobre as atividades prejudiciais à saúde.
Quanto à comprovação da exposição ao agente insalubre, tratando-se de período anterior à vigência da Lei n. 9.032/95, de 28.04.95, que deu nova redação ao § 3º do art. 57 da Lei n. 8.213/91, basta que a atividade seja enquadrada nas relações dos Decretos 53.831/64 ou 83.080/79, não sendo necessário laudo pericial, exceto a atividade exercida com exposição a ruído superior ao previsto na legislação de regência.
Importa ressaltar que determinadas categorias estavam elencadas como especiais em virtude da atividade profissional exercida pelo trabalhador, hipótese em que havia uma presunção legal de exercício profissional em condições ambientais agressivas ou perigosas. Nesses casos, o reconhecimento do tempo de serviço especial não depende da exposição efetiva aos agentes nocivos. Essa presunção, consoante acima explicitado, é possível até o advento da Lei n. 9.032/95 (28.04.95). A partir dessa lei a comprovação da atividade especial é feita por intermédio dos formulários SB-40 e DSS-8030, até a edição do Decreto n. 2.172/97, que regulamentou a MP N. 1523/96, a qual foi posteriormente convertida na Lei n. 9.528, de 10.12.97, momento em que se passou a exigir o laudo técnico.
Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, até o advento da Lei n. 9.032/1995 é possível o reconhecimento do tempo de serviço especial em face do enquadramento na categoria profissional do trabalhador. A partir de então, passou a ser necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física. (REsp 1806883/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/05/2019, DJe 14/06/2019).
De igual modo, a jurisprudência do egrégio STJ orienta-se no sentido de que o rol de atividades consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física descritas pelos Decretos 53.831/1964, 83.080/1979 e 2.172/1997 é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo admissível, portanto, que atividades não elencadas no referido rol sejam reconhecidas como especiais, desde que tal situação seja devidamente demonstrada no caso concreto. REsp 1460188/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/06/2018, DJe 08/08/2018).
O e. Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, para comprovação da sujeição do segurado a agentes nocivos, para fins de reconhecimento de tempo especial, é suficiente o PPP, sendo dispensável a juntada do Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), a menos que este último esteja sendo impugnado. (AgInt no AREsp 434.635/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/04/2017, DJe 09/05/2017)
É que o PPP é assinado pelo representante legal da empresa ou seu preposto, que assume a responsabilidade sobre a fidedignidade das informações prestadas (art. 264 da IN 77/2015/INSS), e é preenchido com base em laudo técnico ambiental elaborado por Médico do Trabalho ou Engenheiro de Segurança do Trabalho. Assim, presumem-se verídicas as informações ali contidas.
Conforme decidido pela TNU, em 20.11.2020, no julgamento do processo n. 0500940-26.2017.4.05.8312/PE, para a validade do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) como prova do tempo trabalhado em condições especiais nos períodos em que há exigência de preenchimento do formulário com base em Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT) – MP 1.523, de 10.11.1996 e Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, é necessária a indicação do responsável técnico pelos registros ambientais, sendo dispensada a informação sobre monitoração biológica.
A ausência da informação no PPP, pode ser suprida pela apresentação de LTCAT ou por elementos técnicos equivalentes, cujas informações podem ser estendidas a período anterior ou posterior à sua elaboração, desde que acompanhados da declaração do empregador sobre a inexistência de alteração no ambiente de trabalho ou em sua organização ao longo do tempo” (Tema 208).
Outrossim, vale consignar que o reconhecimento do tempo especial não pode ser afastado em razão de os laudos serem extemporâneos à prestação do serviço. Desde que comprovado o exercício da atividade especial, através de formulários e laudos periciais, com os requisitos necessários, embora tais documentos tenham sido elaborados em data posterior à prestação dos serviços, tal fato não compromete a prova do exercício de atividade em condições especiais.
No mais, a exigência legal de habitualidade e permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho (REsp 1890010/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 18/11/2021, DJe 25/11/2021)
Uso de EPI – Equipamento de proteção individual
No que diz respeito ao uso de equipamento de proteção individual (EPI), o egrégio Supremo Tribunal Federal, em julgamento com repercussão geral reconhecida, (ARE 664335 / SC. Min. LUIZ FUX. Tribunal Pleno. DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015) analisando especificamente o agente nocivo ruído e a fonte de custeio do benefício de aposentadoria especial, decidiu que, em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento da atividade como especial.
A jurisprudência desta Corte, tem entendido que quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, há a especialidade do período de atividade; a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor: i) em períodos anteriores a 3.12.1998; ii) quando há enquadramento legal pela categoria profissional; iii) em relação aos agentes nocivos: ruído, biológicos, cancerígenos (como asbestos e benzeno) e periculosos (como eletricidade).
Outrossim, nos demais casos, conforme afirmado no supracitado julgado, em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento da atividade como especial.
Agente agressivo Ruído
O tempo de trabalho laborado com exposição a ruído é considerado especial nos seguintes níveis: antes do Decreto 2.171/97 (até 05/03/1997) acima de 80 decibéis, depois do Decreto 2.171/97 e antes do Decreto 4.882/2003 (de 06/03/1997 a 18/11/2003) - acima de 90 decibéis e, a partir do Decreto 4.882/2003 (de 19/11/2003) acima de 85 decibéis.
O entendimento adotado pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça, em julgamento realizado sob o regime dos recursos especiais repetitivos, é pela impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003 no que se refere ao agente ruído. Confira-se:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC 1. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor.
Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC.
2. O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ.
Caso concreto 3. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço decorrente da supressão do acréscimo da especialidade do período controvertido não prejudica a concessão da aposentadoria integral.
4. Recurso Especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008. (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014); (Sublinhei).
No julgamento do Tema 1083, em 18/11/2021, o STJ firmou a seguinte tese: "O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço."
No julgado ficou consignado, ainda, que somente após a edição do Decreto 4.882/2003, que alterou o Decreto n. 3.048/1999, tornou-se exigível a referência ao critério NEN no LTCAT e no PPP.
Acerca da metodologia utilizada na medição do nível de ruído, a jurisprudência desta Corte tem entendido que, “No PPP não contém informação exata sobre a metodologia empregada na medição do nível de ruído a que estava exposto o segurado, utilizando a simples designação de "dosimetria", mas atesta claramente que o uso de EPI se deu ao longo do tempo, demonstrando que a exposição ao ruído era ininterrupta e não pontual, de forma que não há necessidade de realização de perícia técnica para a comprovação da habitualidade e a permanência”.”(EDAC 0054843-34.2016.4.01.3800, JUIZ FEDERAL MURILO FERNANDES DE ALMEIDA, TRF1 - 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, e-DJF1 07/03/2022.
Particularidade do caso – Soldador – agente agressivo ruído
No caso concreto, a controvérsia trazida pela parte autora, em razões de apelação, limita-se ao período laborado junto à empresa Metalúrgica Magalhães Comércio, entre 29.04.1995 a 10.09.1996, na função de soldador, afim de comprovar que os níveis de intensidade do agente nocivo ruído, ao qual o autor esteve exposto, estavam acima do limite legal permitido. Pretende, com isso, melhorar o RMI do benefício deferido em sentença.
Vê-se que o autor requereu a prova pericial do aduzido período à fl. 367. O INSS também pugnou pela realização da prova pericial, à fl. 377, o que foi deferida, à fl. 369, com nomeação de perito. Entretanto, o juízo a quo, à fl. 394, tornou sem efeito a nomeação do perito, e indeferiu a produção da prova pericial por entender inócua.
Ocorre que, “Em matéria previdenciária, a prova pericial é condição essencial, é certo que as únicas provas discutidas em contraditório são a prova pericial e a testemunhal. O contraditório não se estabelece no que diz respeito ao formulário fornecido pela empresa (PPP), um documento criado fora dos autos, isto é, sem a participação do Segurado, razão pela qual é possível reconhecer que houve o cerceamento do direito de defesa do Segurado. Ademais, não se desconhece a complexidade da ação que envolve o reconhecimento da atividade especial, assim, razoável e necessário o pedido de realização de perícia técnica. Não se pode olvidar, ademais, que nas lides previdenciárias o Segurado é hipossuficiente informacional, tem maior dificuldade de acesso aos documentos que comprovam seu histórico laboral, uma vez que as empresas dificilmente fornecem esses documentos ao trabalhador na rescisão do contrato de trabalho. E, em muitas vezes, as empresas perdem tais documentos ou encerram suas atividades sem que seja possível o acesso a tais documentos” (STJ, AgInt no AREsp 576.733/RN, Primeira Turma, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJ de 07/11/2018).
No mais, “não se trata, ainda, de relação entre o segurado e o empregador visando a desconstituir o PPP, o que seria da competência da Justiça do Trabalho, mas da apreciação da nocividade da atividade para configuração de direito previdenciário”. (AC 1041817-21.2021.4.01.3300, DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 21/09/2023 PAG.)
A falta da prova pericial e/ou a apresentação do LTCAT foi prejudicial ao segurado, uma vez que a sentença não reconheceu como especial o período requerido, e, embora concedendo a aposentadoria por tempo de contribuição, houve incidência de fator previdenciário, com redução do RMI do autor, configurando cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide.
Conclusão
Em face do exposto, dou provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, com devolução dos autos à origem para reabertura da fase instrutória, nos termos da fundamentação do voto. Prejudicada a apelação do INSS.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1001955-52.2021.4.01.3200
PROCESSO REFERÊNCIA: 1001955-52.2021.4.01.3200
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: JOAO DE DEUS VIEGAS BARROS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO DE DEUS VIEGAS BARROS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO DO PERÍODO ESPECIAL PARA COMUM. EXPOSIÇÃO A AGENTES INSALUBRES. RUÍDO. INDEFERIMENTO DA PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. REABERTURA DA FASE INSTRUTÓRIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. SENTENÇA ANULADA. APELAÇÃO DO INSS PREJUDICADA.
1. Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra sentença que reconheceu a especialidade de apenas parte dos períodos requeridos na inicial.
2. O tempo de serviço especial é aquele decorrente de serviços prestados sob condições prejudiciais à saúde ou em atividades com riscos superiores aos normais para o segurado e, cumpridos os requisitos legais, dá direito à aposentadoria especial. As atividades consideradas prejudiciais à saúde foram definidas pela legislação previdenciária, especificamente, pelos Decretos 53.831/64 e 83.080.
3. Exercendo o segurado uma ou mais atividades sujeitas a condições prejudiciais à saúde sem que tenha complementado o prazo mínimo para aposentadoria especial, é permitida a conversão de tempo de serviço prestado sob condições especiais em comum, para fins de concessão de aposentadoria.
4. Para a comprovação da exposição ao agente insalubre, na redação original do art. 57 da Lei 8.213/91, bastava que a atividade fosse enquadrada nas relações dos Decretos 53.831/64 ou 83.080/79, não sendo necessário laudo pericial, exceto a atividade exercida com exposição a ruído superior ao previsto na legislação de regência.
5. No caso concreto, a controvérsia trazida pela parte autora, em razões de apelação, limita-se ao período laborado junto à empresa Metalúrgica Magalhães Comércio, entre 29.04.1995 a 10.09.1996, na função de soldador, afim de comprovar que os níveis de intensidade do agente nocivo ruído, ao qual o autor esteve exposto, estavam acima do limite legal permitido. Pretende, com isso, melhorar o RMI do benefício deferido em sentença.
6. Vê-se que o autor requereu a prova pericial do aduzido período à fl. 367. O INSS também pugnou pela realização da prova pericial, à fl. 377, o que foi deferida, à fl. 369, com nomeação de perito. Entretanto, o juízo a quo, à fl. 394, tornou sem efeito a nomeação do perito, e indeferiu a produção da prova pericial por entender inócua.
7. “Em matéria previdenciária, a prova pericial é condição essencial, é certo que as únicas provas discutidas em contraditório são a prova pericial e a testemunhal. O contraditório não se estabelece no que diz respeito ao formulário fornecido pela empresa (PPP), um documento criado fora dos autos, isto é, sem a participação do Segurado, razão pela qual é possível reconhecer que houve o cerceamento do direito de defesa do Segurado. Ademais, não se desconhece a complexidade da ação que envolve o reconhecimento da atividade especial, assim, razoável e necessário o pedido de realização de perícia técnica. Não se pode olvidar, ademais, que nas lides previdenciárias o Segurado é hipossuficiente informacional, tem maior dificuldade de acesso aos documentos que comprovam seu histórico laboral, uma vez que as empresas dificilmente fornecem esses documentos ao trabalhador na rescisão do contrato de trabalho. E, em muitas vezes, as empresas perdem tais documentos ou encerram suas atividades sem que seja possível o acesso a tais documentos” (STJ, AgInt no AREsp 576.733/RN, Primeira Turma, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJ de 07/11/2018).
8. No mais, “não se trata, ainda, de relação entre o segurado e o empregador visando a desconstituir o PPP, o que seria da competência da Justiça do Trabalho, mas da apreciação da nocividade da atividade para configuração de direito previdenciário”. (AC 1041817-21.2021.4.01.3300, DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 21/09/2023 PAG.).
9. A falta da prova pericial e/ou a apresentação do LTCAT foi prejudicial ao segurado, uma vez que a sentença não reconheceu como especial o período requerido, e, embora concedendo a aposentadoria por tempo de contribuição, houve incidência de fator previdenciário, com redução do RMI do autor, configurando cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide.
10. Apelação da parte autora provida. Sentença anulada, com devolução dos autos à origem para reabertura da fase instrutória. Apelação do INSS prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e julgar prejudicada a apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
