
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:CLAUDIO FERREIRA DE CARVALHO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: JOSE CARLOS SABADINI JUNIOR - RO8698-A e DANIELLI VITORIA SABADINI - RO10128-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1027546-23.2020.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAUDIO FERREIRA DE CARVALHO
Advogados do(a) APELADO: DANIELLI VITORIA SABADINI - RO10128-A, JOSE CARLOS SABADINI JUNIOR - RO8698-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face da r. sentença proferida pelo Juízo a quo, que dispensou a prova testemunhal e julgou procedente o pedido da parte autora.
O apelante, em razões de apelação, postula a reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido, ao fundamento de que a parte autora não possui qualidade de segurado especial para a concessão do benefício postulado. Subsidiariamente, requer a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem, para que seja realizada a audiência de instrução e julgamento com oitiva de testemunhas.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1027546-23.2020.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAUDIO FERREIRA DE CARVALHO
Advogados do(a) APELADO: DANIELLI VITORIA SABADINI - RO10128-A, JOSE CARLOS SABADINI JUNIOR - RO8698-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Mérito
Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
O cerne do presente recurso cinge-se na comprovação da qualidade de segurado especial rural da parte autora.
Das provas – qualidade de segurado especial
O reconhecimento da qualidade de segurado especial desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Convém registrar, ainda, que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Caso dos autos
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos: certidão de seu casamento, realizado em 25/06/2012, na qual consta que o autor exerce a profissão de agricultor; cadastro de marcas do produtor; notas fiscais que comprovam a venda de leite in natura referentes aos anos de 2011, 2013, 2015, 2016 e 2017; guias de trânsito animal de bovinos emitidas em 2014, 2016 e 2018; contrato particular de compra de imóvel rural, com firma reconhecida em cartório na data de 14/08/2018; e escritura pública de compra de imóvel, datada de 14/03/2019. Todos os documentos estão em nome do autor.
No caso dos autos, o início de prova material restou comprovado por todos os documentos acima.
A perícia médica judicial fixou o início da incapacidade laboral do apelado em 27/02/2020.
Dessa forma, havendo início de prova material contemporânea à data do início da incapacidade, a prova testemunhal idônea torna-se indispensável para comprovar a qualidade de segurado especial rural da parte autora.
O direito à ampla defesa e ao contraditório é amparado pelo art. 5º, LV, da Constituição Federal, e decorre dele a nulidade de qualquer decisão que ao contraditório não for submetida, especialmente quando causar algum prejuízo.
Deve-se atentar que, em matéria previdenciária, as regras processuais devem ser aplicadas visando à busca da verdade real.
Tratando-se de benefício devido a trabalhador rural especial, a prova testemunhal é essencial à comprovação da atividade rurícola em regime familiar, uma vez que se presta a corroborar os inícios de prova material apresentados. Trata-se, pois, de prova que, segundo o entendimento desta Corte, é indispensável à adequada solução do processo.
Este também é o posicionamento adotado pela 1ª Turma deste Tribunal, conforme ementa abaixo transcrita:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA.
1. A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena.
2. Na esteira do julgamento proferido no REsp n. 1.348.633/SP (Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima), em sede de recurso representativo da controvérsia, a Primeira Seção do e. STJ concluiu que, para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea. (AgInt no AREsp n. 852.494/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 9/12/2021; AREsp n. 1.550.603/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 11/10/2019, entre outros.)
3. Os documentos trazidos aos autos pela parte autora configuram o início razoável de prova material da atividade campesina, em atenção à solução pro misero adotada no âmbito do Colendo STJ e pelos Tribunais Regionais Federais.
4. Configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide ou o indeferimento de produção de prova testemunhal, pois somente com a completa instrução do processo é que se pode realizar exame a respeito da suficiência da prova produzida para a comprovação da qualidade de segurado especial.
5. Apelação parcialmente provida. Sentença anulada, com o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular instrução e julgamento do feito, com a oitiva de testemunhas.
(AC 1023635-03.2020.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 01/08/2022 PAG.) (destaquei)
Na espécie, observa-se dos autos que não houve produção de prova testemunhal. A referida ausência decorreu de julgamento antecipado da lide, pois, apesar de requerida sua produção na exordial, ainda que genericamente (ID 86881555 - Pág. 10 – fl. 12), o Juízo de origem dispensou a audiência de instrução e proferiu julgamento imediato (ID 86881556 - Pág. 29 – fl. 86).
Dessa forma, a ausência de prova testemunhal impossibilita a análise da suficiência do conjunto probatório para comprovação da qualidade de segurado especial durante o período de carência, fato que configura cerceamento de defesa de ambas as partes constantes do processo.
Assim, a sentença deve ser anulada, com o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular instrução e julgamento do feito, com a oitiva de testemunhas.
Da tutela antecipada deferida pelo Juízo de origem
Considerando os elementos presentes nos autos, concluo que estão satisfeitos os requisitos para a concessão da antecipação da tutela, sendo incontestável o caráter alimentar das prestações do benefício previdenciário em questão.
Portanto, mantenho a tutela antecipada pelo menos até a realização de audiência de instrução e julgamento e nova deliberação do juízo de origem.
CONCLUSÃO
Em face do exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular instrução e julgamento do feito, com a oitiva de testemunhas.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1027546-23.2020.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAUDIO FERREIRA DE CARVALHO
Advogados do(a) APELADO: DANIELLI VITORIA SABADINI - RO10128-A, JOSE CARLOS SABADINI JUNIOR - RO8698-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. SENTENÇA ANULADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA OTIVA DAS TESTEMUNHAS E REGULAR INSTRUÇÃO DO FEITO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
2. O reconhecimento da qualidade de segurado especial desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal. O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018). Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar. Convém registrar, ainda, que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
3. Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos: certidão de seu casamento, realizado em 25/06/2012, na qual consta que o autor exerce a profissão de agricultor; cadastro de marcas do produtor; notas fiscais que comprovam a venda de leite in natura referentes aos anos de 2011, 2013, 2015, 2016 e 2017; guias de trânsito animal de bovinos emitidas em 2014, 2016 e 2018; contrato particular de compra de imóvel rural, com firma reconhecida em cartório na data de 14/08/2018; e escritura pública de compra de imóvel, datada de 14/03/2019. Todos os documentos estão em nome do autor. No caso dos autos, o início de prova material restou comprovado por todos os documentos acima. A perícia médica judicial fixou o início da incapacidade laboral do apelado em 27/02/2020. Dessa forma, havendo início de prova material contemporânea à data do início da incapacidade, a prova testemunhal idônea torna-se indispensável para comprovar a qualidade de segurado especial rural da parte autora.
4. O direito à ampla defesa e ao contraditório é amparado pelo art. 5º, LV, da Constituição Federal, e decorre dele a nulidade de qualquer decisão que ao contraditório não for submetida, especialmente quando causar algum prejuízo. Deve-se atentar que, em matéria previdenciária, as regras processuais devem ser aplicadas visando à busca da verdade real. Tratando-se de benefício devido a trabalhador rural especial, a prova testemunhal é essencial à comprovação da atividade rurícola em regime familiar, uma vez que se presta a corroborar os inícios de prova material apresentados. Trata-se, pois, de prova que, segundo o entendimento desta Corte, é indispensável à adequada solução do processo.
5. Na espécie, observa-se dos autos que não houve produção de prova testemunhal. A referida ausência decorreu de julgamento antecipado da lide, pois, apesar de requerida sua produção na exordial, ainda que genericamente (ID 86881555 - Pág. 10 – fl. 12), o Juízo de origem dispensou a audiência de instrução e proferiu julgamento imediato (ID 86881556 - Pág. 29 – fl. 86). Dessa forma, a ausência de prova testemunhal impossibilita a análise da suficiência do conjunto probatório para comprovação da qualidade de segurado especial durante o período de carência, fato que configura cerceamento de defesa de ambas as partes constantes do processo. Assim, a sentença deve ser anulada, com o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular instrução e julgamento do feito, com a oitiva de testemunhas.
6. Apelação do INSS parcialmente provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular instrução e julgamento do feito, com a oitiva de testemunhas.
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
