
POLO ATIVO: YURI STALYN ALVES DE LIMA
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):LUIS GUSTAVO SOARES AMORIM DE SOUSA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido para declarar inexistente o débito de R$ 157.734,57 (cento e cinquenta e sete mil, setecentos e trinta e quatro reais e cinquenta e sete centavos), cobrado pelo INSS, referente às parcelas do benefício assistencial (87/531.624.499-7), que recebeu cumulativamente com salários oriundos de contratos de trabalho.
Aduz o apelante que o débito que lhe foi imputado deve ser declarado inexistente, afastando a hipótese de restituição das quantias recebidas do INSS, a título de benefício assistencial, uma vez que desconhecia a irregularidade do recebimento desse benefício com valores salariais.
É o relatório.
Desembargador Federal GUSTAVO SOARES AMORIM
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
Processo Judicial Eletrônico
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM (RELATOR):
Admissibilidade
Conheço do recurso interposto, por entender preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade.
Mérito
Cuida-se de ação de conhecimento proposta pela parte autora para que seja declarada a inexistência do débito de R$ R$ 157.734,57 (cento e cinquenta e sete mil, setecentos e trinta e quatro reais e cinquenta e sete centavos), referente às parcelas do benefício assistencial (87/531.624.499-7), cobrado pelo INSS, referente às parcelas do benefício assistencial (87/531.624.499-7) que recebeu cumulativamente com salários oriundos de contratos de trabalho.
Alega a parte apelante, ora autor, que o débito, que lhe foi imputado pelo INSS, deve ser declarado inexistente, para afastar a hipótese de restituição à Previdência Social das quantias recebidas, uma vez que desconhecia da irregularidade em receber o benefício assistencial cumulativamente com renda salarial.
A Lei 8.742/93, em seu artigo 20, § 4º, dispõe:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
(...)
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória, bem como as transferências de renda de que tratam o parágrafo único do art. 6º e o inciso VI do caput do art. 203 da Constituição Federal e o caput e o § 1º do art. 1º da Lei nº 10.835, de 8 de janeiro de 2004. (Redação dada pela Lei nº 14.601, de 2023)
Na hipótese, não merece acolhida a alegação do autor de que desconhecia a irregularidade de receber benefício assistencial concomitantemente com salários, pois tal argumentação não é capaz de infirmar o entendimento do juízo de primeiro grau de que é devida cobrança de valores indevidamente pagos ao demandante, a título de benefício previdenciário, nos seguintes termos (Id 417948621):
“(...)
No caso dos autos, a parte autora alega que percebeu o benefício assistencial à pessoa com deficiência cumulativamente com salários oriundos de contratos de trabalho, mas desconhecia a irregularidade deste ato.
Nesse ponto, acerca da repetibilidade de valores recebidos de forma equivocada pelo beneficiário, o Superior Tribunal de Justiça, por meio do Tema 979, REsp nº 1381734/RN, estabeleceu orientações conforme ementa que se transcreve:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇADE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA. 1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991. 2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social. 3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido. 4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário. 5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício : O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento). 6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido. 7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão. 8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa. Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado. 9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015 (STJ, REsp nº 1381734 / RN, 1ª Seção, Relator Ministro Benedito Gonçalves, DJ 10/03/2020) (grifo nosso)
Como se nota, o Superior Tribunal de Justiça distinguiu a situação de recebimento indevido em razão erro de interpretação e má aplicação da lei pelo INSS, quando as verbas se revelam irrepetíveis, da hipótese de recebimento indevido em razão de erro administrativo, circunstância em que repetível os valores, inclusive mediante o desconto no percentual de 30% de eventual benefício. Nesta última hipótese, permite-se ao beneficiário comprovar sua boa-fé objetiva, de forma a demonstrar que não lhe seria possível identificar o pagamento indevido.
No caso dos autos, o benefício assistencial à pessoa com deficiência NB 5316244997 foi deferido ao autor pela autarquia previdenciária em 11/07/2008, tendo o pagamento do referido benefício sido suspenso pelo INSS após a constatação de irregularidades decorrentes da coexistência de vínculos empregatícios pelo requerente (id 1192888754, p. 39).
Restou apurado que foi recebido indevidamente a importância total de R$ 157.734,27 (cento e cinquenta e sete mil, setecentos e trinta e quatro reais e vinte e sete centavos), já observada a prescrição quinquenal, conforme Ofício nº 202100660782 e Registro de Análise da Fase de Defesa, ambos datados de 19/05/2021 (id 1192888754, p/40/41).
Conforme documentação que instrui a petição inicial, nota-se a existência de vínculos empregatícios iniciados pelo demandante após a concessão do benefício assistencial, a saber: ARAÚJO & SARAIVA LTDA (26/09/2011 a 08/10/2012); CMT ENGENHARIA EIRELI (15/10/2012 a 11/06/2013); ASATUR TRANSPORTE LTDA (12/08/2013 a 01/2014); MERCANTIL NOVA ERA LTDA (17/11/2014 a 04/04/2018) e ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE RORAIMA (10/05/2019 a 08/2020) (id 1192888754, p. 7/14).
Não obstante a parte autora alegue na inicial que "não tinha conhecimento acerca de eventual irregularidade na manutenção dos vínculos juntamente com o recebimento dos valores do benefício", não houve a apresentação com a inicial de provas acerca da suposta presença de elementos que demonstrassem não ser possível ao autor identificar o pagamento indevido.
A despeito de não haver nos autos informações acerca de sua escolaridade, observa-se que se trata de beneficiário com vínculos de trabalho urbano desde 25/07/2002 (id 1192888754, p. 7/14), com 37 anos (id (id 1192888754, p. 4), tendo como último vínculo laboral emprego na Assembleia Legislativa do Estado de Roraima.
Portanto, não se verifica a demonstração segura de que não seria possível ao requerente constatar ser indevido o benefício.
Outrossim, o demandante se declarou desempregado quando do requerimento do benefício (id 1192888755, p. 5/6), mas o extrato de relações previdenciárias – Portal CNIS registra a existência de vínculo ativo como empregado com o MUNICÍPIO DE BOA VISTA desde 01/03/2005, tendo como última remuneração a competência 07/2012 (id 1192888754, p. 4/5).
Embora se observe das contribuições ao município de Boa Vista o registro para as competências 04 a 11/2005, 01/2006, retornando em 03/2011, não há outros elementos acerca da manutenção do vínculo, o que se chocaria com a declaração de desemprego quando do requerimento administrativo.
Como acima exposto, em razão deste fato o INSS justifica a cobrança do valor integral do benefício, desde a data do requerimento administrativo, já que o autor declarou ser desempregado e não possuir renda no momento da solicitação, o que configuraria declaração falsa (id 1192888754, fl. 41). E neste aspecto não houve abordagem na inicial nem na réplica.
Por fim, menciona-se precedente do Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região:
APELAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS PELO SEGURADO EM DECORRÊNCIA DE ATO ILÍCITO. RECEBIMENTO DE BENEFÍCIO APÓS ÓBITO DO BENEFICIARIO. MÁ-FÉ DO RECEBEDOR. CONFIGURADA. NÃO INCIDÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. RE 669.069/MG. COBRANÇA DO DÉBITO ANTERIORMENTE AO DECURSO DE 5 (CINCO) ANOS DO FINAL DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. NÃO OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO PARA RECEBIMENTO DO DÉBITO. RECURSO DA RÉ NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. SUCUMBÊNCIA MAJORADA. APLICAÇÃO DO ART. 85, § 11 DO CPC/2015. SUSPENSA A EXIGIBILIDADE ENQUANTO PERSISTIREM OS MOTIVOS AUTORIZADORES DO DEFERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA. 1. O caso dos autos não se amolda à questão submetida a julgamento no Tema Repetitivo n. 979/STJ, qual seja, devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social, afetada pelo procedimento do art. 1.036, caput e § 5º do CPC/2015, inclusive com determinação expressa de suspensão nacional de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos (Art. 1.037, II, CPC). (acórdão publicado no DJ de 16/08/2017). 2. Isso porque, conforme a análise dos autos, a autarquia previdenciária apurou o recebimento de benefício após o óbito do beneficiário. E, de fato, a ré confirmou que recebeu o benefício LOAS destinado ao filho por mais de dois anos após a morte dele, não havendo prova de comunicação do óbito à autarquia previdenciária para que fosse cessado o pagamento do benefício, o que afasta qualquer alegação de erro administrativo e até de boa-fé da ré, sendo certo, seu dever de restituir ao erário os valores indevidamente recebidos, visto que o foram em decorrência de ato ilícito. 3. O Superior Tribunal de Justiça, em caso análogo ao dos autos, fixou o entendimento de que a sustentabilidade do Regime Geral de Previdência Social Brasileiro é frequentemente colocada em debate, devendo, desse contexto sensível, não somente exsurgir as soluções costumeiras de redução de direitos e aumento da base contributiva, mas também deve aflorar a maior conscientização social tanto do gestor, no comprometimento de não desvio dos recursos previdenciários, e do responsável tributário, pelo recolhimento correto das contribuições, quanto dos segurados do regime no respeito à cláusula geral de boa-fé nas relações jurídicas, consubstanciada na responsabilidade social de respeito aos comandos mais básicos oriundos da legislação. Admitir exceções a uma obrigação decorrente de comando legal expresso que define o limite de uma cobertura previdenciária, passível de compreensão pelo mais leigo dos cidadãos, significa transmitir a mensagem de que se pode sugar tudo do Erário, por mais ilegal que seja, já que para o Estado não é preciso devolver aquilo que foi recebido ilegalmente. Em uma era de debates sobre apropriação ilegal de recursos públicos e seus níveis, essa reflexão é imensamente simbólica para que se passe a correta mensagem a toda a sociedade (STJ, REsp 1.554.318/SP, Ministro Herman Benjamin Segunda Turma, DJ de 02/09/2016). (...) (AC 0004748-58.2016.4.01.3813, JUÍZA FEDERAL LUCIANA PINHEIRO COSTA, TRF1 - 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, PJe 30/09/2021 PAG.)
III. DISPOSITIVO Ante o exporto, julgo improcedente o pedido deduzido na petição inicial, extinguindo o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC.
Condeno a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios os quais fixo em 10% sobre o valor da causa. Ante o deferimento do benefício da Justiça Gratuita, as custas e os honorários ficam com sua exigibilidade suspensa, na forma do art. 98, §3º, do CPC.
Dessa maneira, não merece reforma a sentença recorrida.
Atualização monetária e juros
Atualização monetária e juros devem incidir nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Honorários recursais
Publicada a sentença na vigência do atual CPC (a partir de 18/03/2016, inclusive) e desprovido o recurso de apelação, deve-se aplicar o disposto no art. 85, § 11, do CPC, para majorar os honorários arbitrados na origem em 1% (um por cento).
Dispositivo
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É como voto.
Desembargador Federal GUSTAVO SOARES AMORIM
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1004626-21.2022.4.01.4200
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM
APELANTE: YURI STALYN ALVES DE LIMA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA E AO IDOSO. ART. 203, V, CF/88. LEI 8.742/93. PERCEPÇÃO CONCOMITANTE COM SALÁRIO. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO CONFIRMADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DE APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO.
1. Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido para declarar inexistente o débito de R$ 157.734,57 (cento e cinquenta e sete mil, setecentos e trinta e quatro reais e cinquenta e sete centavos), cobrado pelo INSS, referente às parcelas do benefício assistencial (87/531.624.499-7), que recebeu cumulativamente com salários oriundos de contratos de trabalho.
2. Alega a parte apelante, ora autor, que o débito, que lhe foi imputado pelo INSS, deve ser declarado inexistente, para afastar a hipótese de restituição à Previdência Social das quantias recebidas, ante a ausência de má-fé no recebimento do benefício assistencial.
3. O artigo 20, § 4º da Lei 8.742/93 dispõe que: "Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) (...) § 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória, bem como as transferências de renda de que tratam o parágrafo único do art. 6º e o inciso VI do caput do art. 203 da Constituição Federal e o caput e o§ 1º do art. 1º da Lei nº 10.835, de 8 de janeiro de 2004. (Redação dada pela Lei nº 14.601, de 2023).".
4.Na hipótese, não merece acolhida a alegação do autor de que desconhecia a irregularidade de receber benefício assistencial concomitantemente com salários, pois tal argumentação não é capaz de infirmar o entendimento do juízo de primeiro grau de que é devida cobrança de valores indevidamente pagos ao demandante, a título de benefício previdenciário, nos seguintes termos (Id 417948621): "(...) No caso dos autos, a parte autora alega que percebeu o benefício assistencial à pessoa com deficiência cumulativamente com salários oriundos de contratos de trabalho, mas desconhecia a irregularidade deste ato. (...) ..., o Superior Tribunal de Justiça distinguiu a situação de recebimento indevido em razão erro de interpretação e má aplicação da lei pelo INSS, quando as verbas se revelam irrepetíveis, da hipótese de recebimento indevido em razão de erro administrativo, circunstância em que repetível os valores, inclusive mediante o desconto no percentual de 30% de eventual benefício. Nesta última hipótese, permite-se ao beneficiário comprovar sua boa-fé objetiva, de forma a demonstrar que não lhe seria possível identificar o pagamento indevido. No caso dos autos, o benefício assistencial à pessoa com deficiência NB 5316244997 foi deferido ao autor pela autarquia previdenciária em 11/07/2008, tendo o pagamento do referido benefício sido suspenso pelo INSS após a constatação de irregularidades decorrentes da coexistência de vínculos empregatícios pelo requerente (id 1192888754, p. 39). Restou apurado que foi recebido indevidamente a importância total de R$ 157.734,27 (cento e cinquenta e sete mil, setecentos e trinta e quatro reais e vinte e sete centavos), já observada a prescrição quinquenal, conforme Ofício nº 202100660782 e Registro de Análise da Fase de Defesa, ambos datados de 19/05/2021 (id 1192888754, p/40/41). Conforme documentação que instrui a petição inicial, nota-se a existência de vínculos empregatícios iniciados pelo demandante após a concessão do benefício assistencial, a saber: ARAÚJO & SARAIVA LTDA (26/09/2011 a 08/10/2012); CMT ENGENHARIA EIRELI (15/10/2012 a 11/06/2013); ASATUR TRANSPORTE LTDA (12/08/2013 a 01/2014); MERCANTIL NOVA ERA LTDA (17/11/2014 a 04/04/2018) e ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE RORAIMA (10/05/2019 a 08/2020) (id 1192888754, p. 7/14). Não obstante a parte autora alegue na inicial que "não tinha conhecimento acerca de eventual irregularidade na manutenção dos vínculos juntamente com o recebimento dos valores do benefício", não houve a apresentação com a inicial de provas acerca da suposta presença de elementos que demonstrassem não ser possível ao autor identificar o pagamento indevido. A despeito de não haver nos autos informações acerca de sua escolaridade, observa-se que se trata de beneficiário com vínculos de trabalho urbano desde 25/07/2002 (id 1192888754, p. 7/14), com 37 anos (id (id 1192888754, p. 4), tendo como último vínculo laboral emprego na Assembleia Legislativa do Estado de Roraima. Portanto, não se verifica a demonstração segura de que não seria possível ao requerente constatar ser indevido o benefício. Outrossim, o demandante se declarou desempregado quando do requerimento do benefício (id 1192888755, p. 5/6), mas o extrato de relações previdenciárias – Portal CNIS registra a existência de vínculo ativo como empregado com o MUNICÍPIO DE BOA VISTA desde 01/03/2005, tendo como última remuneração a competência 07/2012 (id 1192888754, p. 4/5). Embora se observe das contribuições ao município de Boa Vista o registro para as competências 04 a 11/2005, 01/2006, retornando em 03/2011, não há outros elementos acerca da manutenção do vínculo, o que se chocaria com a declaração de desemprego quando do requerimento administrativo. Como acima exposto, em razão deste fato o INSS justifica a cobrança do valor integral do benefício, desde a data do requerimento administrativo, já que o autor declarou ser desempregado e não possuir renda no momento da solicitação, o que configuraria declaração falsa (id 1192888754, fl. 41). E neste aspecto não houve abordagem na inicial nem na réplica. (...) Ante o exporto, julgo improcedente o pedido deduzido na petição inicial, extinguindo o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC. Condeno a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios os quais fixo em 10% sobre o valor da causa. Ante o deferimento do benefício da Justiça Gratuita, as custas e os honorários ficam com sua exigibilidade suspensa, na forma do art. 98, §3º, do CPC.".
5. Assim, não merece reforma a sentença recorrida.
6. Atualização monetária e juros devem incidir nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
7. Publicada a sentença na vigência do atual CPC (a partir de 18/03/2016, inclusive) e desprovido o recurso de apelação, deve-se aplicar o disposto no art. 85, § 11, do CPC, para majorar os honorários arbitrados na origem em 1% (um por cento).
8. Apelação da parte autora desprovida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator.
Brasília-DF,
Desembargador Federal GUSTAVO SOARES AMORIM
Relator
