
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:DANIELE RODRIGUES NERES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CYNTHIA MAYANNE AYRES BATISTA ARAUJO - TO8890-A
RELATOR(A):LUIS GUSTAVO SOARES AMORIM DE SOUSA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS contra sentença (proferida da vigência do NCPC), que julgou procedente o pedido de benefício assistencial de prestação continuada ao deficiente (LOAS), a partir do requerimento administrativo (03/09/2016), respeitada a prescrição qüinqüenal, com as parcelas monetariamente corrigidas pela Taxa Selic.
A autarquia previdenciária foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 14% (quatorze por cento) sobre o valor da condenação.
Em suas razões recursais, o INSS afirma que a parte autora não preenche os requisitos legais para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada, pois sua incapacidade não é total e permanente, bem como a renda familiar per capita não é inferior a ¼ do salário mínimo.
Não houve remessa oficial.
É o relatório.
Desembargador Federal GUSTAVO SOARES AMORIM
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
Processo Judicial Eletrônico
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM (RELATOR):
Conheço do recurso interposto por entender preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade.
Remessa necessária
Não se sujeita ao duplo grau de jurisdição a sentença – proferida na vigência do CPC/2015 – que condena a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público em quantia inferior a mil salários mínimos (CPC, art. 496, § 3º, I).
No caso, tratando-se de ação de natureza previdenciária, ainda que ilíquida, a condenação não alcançará o limite fixado no aludido regramento legal (STJ: AgInt no REsp 1871438/SC, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/09/2020, DJe 11/09/2020; TRF1: AC 0030880-28.2018.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 10/04/2019 PAG).
Na espécie, não houve remessa necessária.
Mérito:
Cuida-se de ação de conhecimento proposta por contra o INSS, objetivando a condenação do réu a conceder-lhe o benefício assistencial de amparo ao deficiente.
Alega a parte autora que é portadora de , o que a incapacitaria total e permanentemente.
A Lei 8.742/93, em seu art. 20, determina os critérios para a concessão do citado benefício, nos seguintes termos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
(...)
Na análise do requisito da renda per capita, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Recursos Extraordinários nº 567.985/MT e 580.963/PR, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, da lei nº 8.742/93, e a inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, em observância ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da isonomia, com a finalidade de alargar os critérios de aferição da hipossuficiência, não limitando apenas à análise da renda inferior a 1/4 do salário mínimo, bem como para determinar a exclusão do cálculo da renda familiar per capita os benefícios assistenciais conferidos a deficientes e os benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo percebidos por idosos.
Na hipótese, estão supridos os requisitos para a concessão do benefício assistencial requerido, conforme o disposto na sentença, nos seguintes termos (Id 260338684):
“Analisando o laudo subscrito pela perita assistente social, constata-se que o núcleo familiar da demandante é composto por quatro membros: ela própria e três filhas, sendo duas delas menor de idade: Carliane Rodrigues de Souza, nascida em 29/03/2004, Karolainy Rodrigues Neres, nascida em 22/02/2006 e Estefany Vitória Rodrigues, nascida em 10/04/2015.
36. A renda familiar mensal é de aproximadamente R$ 900,00, menor que um salário mínimo, sendo formada pelo valor do benefício do governo federal, Bolsa-Família (R$ 400,00) e de uma média de R$ 500,00 oriundos das faxinas realizadas pela demandante que trabalha como diarista e possui apenas o 1º grau incompleto (5ª série).
37. Em relação ao requisito econômico, há presunção absoluta de miserabilidade nos casos em que a renda familiar per capita for inferior a ¼ de salário-mínimo (LOAS, art. 20, § 3º), restando cumprido este requisito.
38. Em complementação, observa-se que a casa que serve de residência para a família é alugada pelo valor de R$ 280,00 mensais, é bastante humilde, sem reboco nas paredes e o piso de cimento queimado. Os móveis são escassos e estão bastante deteriorados, sendo a maioria da proprietária da casa, que vive no Pará e alugou a casa já “semimobiliada”.
39. Deve ser ressaltado as combalidas finanças do núcleo familiar serão afetadas pela chegada de um bebê, visto que uma das filhas da demandante estava gestante no momento da avaliação social.
40. Quanto à perícia médica, foi afirmado pelo perito que a autora apresenta deformidade no tornozelo e pé direitos em razão de acidente sofrido com arma branca que evoluiu para artrose grave, condições que impõe à demandante o caminhar realizando apoio na porção lateral do retropé.
41. Afirma ainda que, além dos problemas ortopédicos, apresenta hipertensão arterial e diabetes mellitus, fazendo uso contínuo de remédios para controlar a dor, para regular a pressão arterial e insulinoterapia.
42. A conclusão do perito médico foi que a demandante não apresenta incapacidade para o trabalho.
43. A afirmação do perito que o estado de saúde da autora não impede que trabalhe normalmente como empregada doméstica, pois nada impediu que exercesse esta mesma função desde os seus dezoito anos de idade não conduz à conclusão de que tenha capacidade laboral.
45. A vida penosa da grande maioria dos brasileiros de baixa renda é deixar de lado a própria segurança e saúde para buscar a subsistência. Não é porque a autora trava uma verdadeira luta diária contra suas dores e dificuldades para conseguir seu sustento desde cedo que consegue prosseguir nessa condição laboral.
46. A demandante é obesa, possui uma deformidade no pé que evoluiu, pela descrição do próprio perito, para artrose grave, condição esta compatível com dores que a obrigam a viver tomando constantemente analgésicos; a autora é diabética insulinodependente e sofre com pressão alta.
47. O que se pode observar no presente caso é uma mulher que vive em condições de inconteste miserabilidade, doente (insulinodependente e hipertensa), obesa, com dores, deformidades físicas e, como chefe de família, se vê compelida a enfrentar as algias e batalhar a duras penas para tentar sustentar suas filhas e, em breve, sua neta. O conjunto de doenças, deformidades e condição física da demandante conduzem a um estado de impossibilidade de exercício de trabalho remunerado digno.
48. Não se pode comparar os afazeres do cotidiano do lar, em sua própria residência, com a atividade doméstica realizada de modo profissional e remunerado que, por óbvio, exige maiores esforços e dedicação.
49. As limitações físicas e da saúde em geral da autora são incompatíveis com o exercício das atividades do trabalhador doméstico formal, que por sua natureza essencial exigem esforço físico e mobilidade para exercerem extensa lista de afazeres.
50. A lei considera a pessoa com deficiência apta a receber o auxílio assistencial e quem tem obesidade pode ser considerado pessoa com deficiência pela própria definição trazida pela Lei de nº 13.146/2015.
(...)
53. A demandante faz jus ao benefício assistencial à pessoa com deficiência desde o requerimento administrativo, respeitada a prescrição quinquenal.”
Portanto, supridos os requisitos exigidos pela Lei n. 8.742/93, para a concessão do benefício assistencial ao deficiente (LOAS), não merece reforma a sentença.
Consectários legais
Atualização monetária e juros devem incidir nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Honorários recursais
Publicada a sentença na vigência do atual CPC (a partir de 18/03/2016, inclusive) e desprovido o recurso de apelação, deve-se aplicar o disposto no art. 85, § 11, do CPC, para majorar os honorários arbitrados na origem em 1% (um por cento).
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS.
É como voto.
Desembargador Federal GUSTAVO SOARES AMORIM
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1007707-03.2021.4.01.4300
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DANIELE RODRIGUES NERES
Advogado do(a) APELADO: CYNTHIA MAYANNE AYRES BATISTA ARAUJO - TO8890-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA E AO IDOSO. ART. 203, V, CF/88. LEI 8.742/93. REQUISITOS PREENCHIDOS. SENTENÇA MANTIDA.
1. Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS contra sentença (proferida da vigência do NCPC), que julgou procedente o pedido de benefício assistencial de prestação continuada ao deficiente (LOAS), a partir do requerimento administrativo (03/09/2016), respeitada a prescrição quinquenal, com as parcelas monetariamente corrigidas pela Taxa Selic.
2. A Lei 8.742/93, em seu art. 20, determina os critérios para a concessão do citado benefício, nos seguintes termos: Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) § 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) § 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011) § 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) (...).
3. Na hipótese, estão supridos os requisitos para a concessão do benefício assistencial requerido, conforme o disposto na sentença, nos seguintes termos (Id 260338684): “Analisando o laudo subscrito pela perita assistente social, constata-se que o núcleo familiar da demandante é composto por quatro membros: ela própria e três filhas, sendo duas delas menor de idade: Carliane Rodrigues de Souza, nascida em 29/03/2004, Karolainy Rodrigues Neres, nascida em 22/02/2006 e Estefany Vitória Rodrigues, nascida em 10/04/2015. A renda familiar mensal é de aproximadamente R$ 900,00, menor que um salário mínimo, sendo formada pelo valor do benefício do governo federal, Bolsa-Família (R$ 400,00) e de uma média de R$ 500,00 oriundos das faxinas realizadas pela demandante que trabalha como diarista e possui apenas o 1º grau incompleto (5ª série). Em relação ao requisito econômico, há presunção absoluta de miserabilidade nos casos em que a renda familiar per capita for inferior a ¼ de salário-mínimo (LOAS, art. 20, § 3º), restando cumprido este requisito. Em complementação, observa-se que a casa que serve de residência para a família é alugada pelo valor de R$ 280,00 mensais, é bastante humilde, sem reboco nas paredes e o piso de cimento queimado. Os móveis são escassos e estão bastante deteriorados, sendo a maioria da proprietária da casa, que vive no Pará e alugou a casa já “semimobiliada”. Deve ser ressaltado as combalidas finanças do núcleo familiar serão afetadas pela chegada de um bebê, visto que uma das filhas da demandante estava gestante no momento da avaliação social. Quanto à perícia médica, foi afirmado pelo perito que a autora apresenta deformidade no tornozelo e pé direitos em razão de acidente sofrido com arma branca que evoluiu para artrose grave, condições que impõe à demandante o caminhar realizando apoio na porção lateral do retropé. Afirma ainda que, além dos problemas ortopédicos, apresenta hipertensão arterial e diabetes mellitus, fazendo uso contínuo de remédios para controlar a dor, para regular a pressão arterial e insulinoterapia. A conclusão do perito médico foi que a demandante não apresenta incapacidade para o trabalho. A afirmação do perito que o estado de saúde da autora não impede que trabalhe normalmente como empregada doméstica, pois nada impediu que exercesse esta mesma função desde os seus dezoito anos de idade não conduz à conclusão de que tenha capacidade laboral. A vida penosa da grande maioria dos brasileiros de baixa renda é deixar de lado a própria segurança e saúde para buscar a subsistência. Não é porque a autora trava uma verdadeira luta diária contra suas dores e dificuldades para conseguir seu sustento desde cedo que consegue prosseguir nessa condição laboral. A demandante é obesa, possui uma deformidade no pé que evoluiu, pela descrição do próprio perito, para artrose grave, condição esta compatível com dores que a obrigam a viver tomando constantemente analgésicos; a autora é diabética insulinodependente e sofre com pressão alta. O que se pode observar no presente caso é uma mulher que vive em condições de inconteste miserabilidade, doente (insulinodependente e hipertensa), obesa, com dores, deformidades físicas e, como chefe de família, se vê compelida a enfrentar as algias e batalhar a duras penas para tentar sustentar suas filhas e, em breve, sua neta. O conjunto de doenças, deformidades e condição física da demandante conduzem a um estado de impossibilidade de exercício de trabalho remunerado digno. Não se pode comparar os afazeres do cotidiano do lar, em sua própria residência, com a atividade doméstica realizada de modo profissional e remunerado que, por óbvio, exige maiores esforços e dedicação. As limitações físicas e da saúde em geral da autora são incompatíveis com o exercício das atividades do trabalhador doméstico formal, que por sua natureza essencial exigem esforço físico e mobilidade para exercerem extensa lista de afazeres. A lei considera a pessoa com deficiência apta a receber o auxílio assistencial e quem tem obesidade pode ser considerado pessoa com deficiência pela própria definição trazida pela Lei de nº 13.146/2015. (...) A demandante faz jus ao benefício assistencial à pessoa com deficiência desde o requerimento administrativo, respeitada a prescrição quinquenal.”
4. Supridos os requisitos exigidos pela Lei n. 8.742/93, para a concessão do benefício assistencial ao deficiente (LOAS), não merece reforma a sentença.
5. Atualização monetária e juros devem incidir nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
6. Publicada a sentença na vigência do atual CPC (a partir de 18/03/2016, inclusive) e desprovido o recurso de apelação, deve-se aplicar o disposto no art. 85, § 11, do CPC, para majorar os honorários arbitrados na origem em 1% (um por cento).
7. Apelação do INSS desprovida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília-DF,
Desembargador Federal GUSTAVO SOARES AMORIM
Relator
